Economia
Eis um gráfico (atualizado) que assusta e deprime: a evolução dos gastos do governo federal
Nenhum descontrole será impune
Eis um gráfico (atualizado) que assusta e deprime: a evolução dos gastos do governo federal
Nenhum descontrole será impune
Que as finanças públicas estejam em descalabro é um fato que a mídia vive relembrando diariamente. Este Instituto possui um artigo detalhado sobre a explosiva situação fiscal do governo federal, mostrando o crescimento exponencial da dívida pública e o total descontrole do déficit orçamentário.
No entanto, algo que é pouco ilustrado -- embora seja muito comentado -- é a evolução dos gastos correntes do governo federal.
Os gastos correntes são, em termos gerais, as despesas do governo destinadas ao seu próprio custeio e a programas de bem-estar social. São as despesas efetuadas com o objetivo de pagar salários de funcionários públicos, de contratar serviços, de pagar toda a rede de seguridade social, e de adquirir produtos necessários para a realização de funções administrativas.
Eis alguns exemplos práticos de despesas correntes:
* Salários e encargos sociais do funcionalismo público.
*Gastos com as contas de água, energia, telefone etc. das instalações do governo federal (os prédios dos ministérios, das agências reguladoras, das secretarias, do Congresso e de todas as repartições federais).
* Gastos com a aquisição de bens de consumo pelo governo. Exemplos: automóveis para autoridades políticas; armas e veículos para a Polícia Federal; o cafezinho do Congresso; canetas, computadores, papeis, clipes, grampeadores, telefones para as repartições públicas; combustível para a locomoção das excelências (inclusive policiais federais).
* Gastos com a contratação de serviços terceirizados. Exemplos: faxinas nos prédios da União; consertos de veículos, de computadores, de aparelhos de ar condicionado etc.; manutenção de prédios, instalações e equipamentos do governo.
* Gastos com os juros e encargos da dívida (os quais não devem ser confundidos nem com amortização e nem com refinanciamento, como faz Ciro Gomes).
* Gastos com a Previdência Social.
Em suma: os gastos correntes são as despesas com pessoal e encargos sociais; com juros e encargos da dívida; com a seguridade social; e todas as demais atividades voltadas para manter a atividade do serviço público.
A evolução descontrolada
Felizmente, essas rubricas são fáceis de ser coletadas na internet, estando totalmente à disposição dos interessados.
O site do Tesouro, utilizando dados do SIAFI (Sistema Integrado de Administração Financeira do Governo Federal) (link aqui), disponibiliza todas as despesas correntes do governo federal desde 1980.
Dei-me ao trabalho de coletar os dados a partir de 1995, que foi o primeiro ano completo do real. Os números vão até o final de 2018.
As rubricas analisadas são:
* Pessoal e encargos sociais (linha azul);
* Juros e encargos da dívida (linha vermelha);
* Demais despesas correntes (linha roxa);
* Previdência Social (linha verde).
A coluna da esquerda mostra o valor dos gastos, em bilhões de reais.
Evolução das despesas correntes do governo federal: quatro rubricas
Comecemos pela notícia boa. É apenas uma.
* O item "Demais despesas correntes", que abrange todos aqueles gastos citados acima (aquisição de bens e serviço pelo governo), começou -- pela primeira vez na história do real -- a apresentar uma tendência de estabilização (tendo havido até mesmo uma pequena queda). Após chegar ao ápice em 2015, se estabilizou em 2016 e recuou em 2017. Seria esse um efeito da lei do teto de gastos? É bem provável.
Agora as notícias ruins.
* As despesas com juros, que haviam se estabilizado em 2016 e 2017, voltaram a subir em 2018. Trata-se de uma inevitabilidade quando se tem um estoque crescente de dívida, a qual cresce por causa dos seguidos déficits orçamentários do governo federal. Quanto maior o estoque da dívida, maiores serão as despesas com os juros desta dívida.
* Não apenas não há nenhuma tendência de estabilização nos gastos com funcionalismo público, como, ao contrário, aparenta ter havido uma aceleração em 2016 e 2018. Os números, por si sós, sugerem que está havendo ou mais contratação de funcionários públicos, ou mais aumentos salariais, ou uma combinação de ambos.
* Em 1995, primeiro ano de FHC, os gastos com funcionários públicos terminaram o ano em R$ 38 bilhões. Em 2002, seu último ano, foram de R$ 75 bilhões. Aumento de 97% em sete anos (estamos partindo do final de 1995, e não do final de 1994). Isso dá uma média de 10,2% de aumento ao ano.
* Lula entra em 2003 e sai em 2010 com esta rubrica já em R$ 169 bilhões. Aumento de 125% em oito anos. Uma média de 10,7% de aumento ao ano.
* Dilma entra em 2011 e sai em 2015 (ok, ela saiu em abril de 2016, mas para efeitos práticos consideremos final de 2015) com esta rubrica em R$ 236 bilhões. Aumento de 40% em cinco anos. Uma média de 7% de aumento ao ano.
* Temer entra em 2016. Ao final de 2018, esta rubrica estava em R$ 294 bilhões. Aumento de 24,5%. Uma média de 7,6% de aumento ao ano.
* Vale notar que Temer foi ligeiramente mais generoso com os funcionários públicos do que Dilma.
* Não há nenhuma indicação de que os privilégios deste estrato da sociedade -- que vive à custa dos impostos pagos por trabalhadores e empreendedores -- estão sendo efetivamente atacados.
* Vale ressaltar que, do final 1995 a 2018, estes gastos cresceram a uma média de 9,3% ao ano. Isso é muito acima da inflação de preços, que, de 1996 a 2018, apresentou uma média de 6,32% ao ano.
Por fim, as notícias péssimas.
* Não há o mais mínimo sinal de controle nos gastos previdenciários. Seu crescimento já adquiriu formato exponencial.
* Em 1995, os gastos previdenciários foram de R$ 32,5 bilhões. Em 2018, foram de R$ 587,70 bilhões. Aumento de 1.580% em 23 anos. Uma média 13,4% de aumento ao ano -- contra uma inflação de preços média de 6,32% ao ano.
* Os gastos com a previdência, portanto, cresceram, anualmente, mais que o dobro da inflação de preços.
* Os gastos com previdência são maiores do que a soma dos gastos com salários e encargos de funcionários públicos (linha azul) mais todas as demais despesas correntes (linha roxa). E sua taxa de crescimento anual é muito superior à de todas as demais rubricas.
* Caso os gastos previdenciários mantenham esta exponencial tendência de crescimento -- e manterão caso não haja nenhuma reforma, pois seu principal problema é demográfico, e a população está envelhecendo --, a lei do teto de gastos só poderá ser cumprida se houver um forte corte nas demais despesas do governo. Mas nenhum governante terá a coragem de mexer com os interesses da poderosa e privilegiada casta do funcionalismo público. Ou seja, o teto será furado e, muito provavelmente, a lei será revogada, o que poderá gerar grandes turbulências no mercado de títulos públicos, de juros futuros e de câmbio.
* Não haverá carga tributária que baste para bancar esse escabroso crescimento dos gastos previdenciários.
Conclusão
Não é nenhum exagero dizer que a questão previdenciária é, de fato, o grande nó górdio da atual situação das finanças públicas. Funcionalismo público vem em segundo lugar -- muito embora boa parte dos gastos previdenciários seja com funcionários públicos aposentados e com pensões para seus familiares.
Insistir na necessidade da reforma da previdência não é, portanto, um fetiche "neoliberal reacionário anti-povo". Uma despesa que já é, de longe, a maior entre as despesas correntes, e que, para piorar, ainda cresce a uma taxa de quase 14% ao ano (sendo que essa taxa de crescimento também é a maior entre as despesas correntes) não é sustentável.
Ou ela é corrigida voluntariamente via reformas ou ela é corrigida forçosamente pela realidade econômica e pelas leis da contabilidade. Essas duas não admitem nem mágicas e nem desaforos.
Você, que ainda é jovem, ou que está na faixa dos 30-35 anos de idade, é bom -- aliás, é urgente -- começar a poupar e a investir, pois dificilmente haverá um INSS para bancar sua aposentadoria daqui a 50 anos. Questão de contabilidade. E de realidade econômica.
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