Se os socialistas entendessem o socialismo, não seriam socialistas
À luz dos acontecimentos recentes em Nova York, especificamente as eleições primárias e o surgimento do autodeclarado socialista democrático Zohran Mamdani como potencial candidato a prefeito, bem como o engajamento público cada vez mais agressivo de Bernie Sanders e Alexandria Ocasio-Cortez em sua turnê pelos Estados Unidos, e o fato de que as chances de AOC se tornar a candidata democrata à presidência em 2028 tenham dobrado em apenas uma semana, tornou-se claro para mim que a retórica socialista está ganhando força no discurso político americano.
Essa tendência é ainda confirmada por dados de pesquisa do Pew Research Center, que mostram que aproximadamente 36% dos adultos americanos entre 18 e 29 anos agora veem o socialismo de maneira positiva. Diante desses desdobramentos, é imprescindível contribuir para a educação adequada e para a clarificação do que esses socialistas realmente defendem, ou mesmo do que o verdadeiro socialismo, de fato, advoga.
Friedrich von Hayek, ganhador do Prêmio Nobel e um dos economistas e filósofos políticos mais influentes do século XX, certa vez observou: “Se os socialistas entendessem de economia, não seriam socialistas”. Amparado em sua erudição, acrescento: se os socialistas entendessem o socialismo, não seriam socialistas.
A verdadeira definição de socialismo é uma doutrina social e econômica que defende a propriedade ou o controle público, em vez de privado, sobre os bens e recursos naturais, isto é, sobre os meios de produção. Trata-se de um sistema político e econômico no qual os meios de produção são possuídos e controlados coletivamente pela comunidade ou pelo estado, em vez de por indivíduos privados. Em outras palavras, na prática, os meios de produção ficam sob o domínio de uma elite política minoritária.
Agora, independentemente de o sistema econômico ser capitalista, socialista ou qualquer outro, é importante observar que o sistema em si não constitui uma utopia nem um fim em si mesmo, mas sim um meio para atingir determinados fins. Os sistemas econômicos racionam recursos, bens e serviços escassos; cada um o faz por meio de processos decisórios privados ou socializados, mas apenas indivíduos podem efetivamente tomar decisões. As economias modernas funcionam a partir de preços que refletem os valores atribuídos por indivíduos ou grupos, bem como pela interação entre oferta e demanda. Entretanto, quem decide o que será ofertado e o que será demandado varia de acordo com cada sistema. O socialismo afirma que a propriedade compartilhada promoverá uma participação mais ampla, fazendo com que todos compartilhem os benefícios. Embora isso seja impossível, continua sendo o argumento central que o sustenta.
Muitos socialistas têm ignorado o princípio fundamental da propriedade coletiva da produção e, em vez disso, têm pulado diretamente para as exigências de posse ou de redistribuição do resultado da produção. A produção, nesse raciocínio, é tratada como algo garantido. Esse atalho conceitual faz o socialismo parecer um sistema econômico dos sonhos, justamente por evitar encarar o que o socialismo realmente é.
Portanto, embora muitos argumentos públicos e políticos sejam feitos em nome do socialismo, o que frequentemente se defende não é o socialismo verdadeiro. Na prática, o debate raramente se concentra na propriedade coletiva dos meios de produção, como fábricas, ferramentas, terras e capitais que possibilitam a produção, mas sim na posse ou no controle dos resultados da produção (bens e serviços). Em termos simples: muitos autoproclamados socialistas demonstram menos interesse em possuir os meios de produção e mais interesse em reivindicar direito ao que já está sendo produzido ou ao que outra pessoa já possui. Assim, o debate sobre sistemas econômicos raramente gira em torno de quem controla os meios de produção em si, mas sim sobre a redistribuição dos bens e serviços finais.
Esse desejo de controlar o que é produzido, em vez dos meios de produção em si, é evidente em muitas políticas, programas e agendas frequentemente associadas ao socialismo. Essas iniciativas costumam reivindicar bens e serviços “gratuitos” (embora, na realidade, nada seja verdadeiramente gratuito, já que sempre há alguém arcando com o custo e os bens precisam ser produzidos).
Exemplos de tais políticas incluem assistência médica socializada, moradia pública, empresas estatais de serviços essenciais, programas de bem-estar social e de desemprego, controle de aluguéis e tributação progressiva, voltados a serem sustentados pela redistribuição da riqueza. O que todas essas políticas têm em comum é o foco não em quem possui ou administra a produção, mas em como os resultados finais são distribuídos. Isso levanta uma questão importante: será que os socialistas estão realmente interessados nos meios de produção?
A aplicação e os resultados dessas políticas socialistas demonstraram o contrário. Essas chamadas políticas socialistas não defendem, de fato, a propriedade coletiva dos meios de produção, mas sim o controle sobre os produtos finais da produção. O único “meio” de produção que costuma ser alvo de redistribuição é o capital em forma de dinheiro, mas mesmo este não é desejado por si só. O que as pessoas buscam, em última instância, não é o dinheiro em si, mas sim os resultados concretos da produção ou, dito de forma mais direta, os bens e serviços que o dinheiro pode comprar. Nesse sentido, muitas políticas redistributivas modernas não funcionam socializando a produção, mas realocando seus resultados.
Um argumento comum feito em defesa do socialismo é o de que existem muitos multibilionários enquanto nós ficamos com pouco. A implicação é que ninguém precisa de tanta riqueza e que ela deveria ser redistribuída, muitas vezes sem considerar como essa riqueza foi adquirida. Muitos acabam concluindo que possuem, de alguma forma, um direito pessoal inerente à riqueza alheia. Mas faço a mesma pergunta que Thomas Sowell fez há muitos anos: qual é a sua “parte justa” daquilo pelo que outra pessoa trabalhou? Além disso, Sowell também afirmou: “Nunca entendi por que é considerado ‘ganância’ querer ficar com o dinheiro que você ganhou, mas não é ganância querer tomar o dinheiro de outra pessoa”.
De todo modo, consideremos o argumento socialista de que a riqueza deveria ser distribuída. Esse raciocínio é frequentemente apresentado como uma crítica moral aos que “têm” e contra os que “não têm”, de que aqueles que “têm” simplesmente têm demais, e que, se os que não possuem tivessem o que os primeiros têm, também poderiam ser bem-sucedidos ou “ricos”. Um exemplo comum envolve um pai ou mãe solteira lutando para garantir necessidades básicas para seus filhos, ou um estudante universitário pobre ou recém-formado tentando começar a vida, o que constitui uma ilustração simpática e frequentemente utilizada da desigualdade. (É claro que isso ignora a realidade universal de que todos têm necessidades não satisfeitas em diferentes graus, e de que tais necessidades são, por natureza, subjetivas.)
Façamos, então, uma pergunta mais precisa: esses pais solteiros ou jovens recém-formados realmente desejam a posse dos meios de produção, terras, maquinário, matérias-primas e processos complexos envolvidos na criação de bens e serviços? Ou simplesmente querem mais dos resultados finais, mais bens, mais serviços, mais renda, de preferência custeados por outra pessoa? Essa é a distinção crucial. O argumento socialista não trata de democratizar a produção, trata de redistribuir o consumo. E isso constitui uma conversa fundamentalmente diferente daquela que o socialismo tradicional propôs em sua origem.
Mesmo quando o argumento se desloca para a questão da riqueza, o renomado economista Thomas Sowell desafia sua premissa central, afirmando: “Há uma questão crucial sobre se a redistribuição de renda ou de riqueza pode realmente ser realizada de maneira abrangente e sustentável”. Sowell cita a expulsão dos judeus da Espanha, no final do século XV. Como frequentemente acontece quando um grupo é forçado a sair, os judeus não puderam levar consigo sua riqueza material. No entanto, carregaram algo muito mais valioso: suas habilidades, seus conhecimentos e seu capital cultural. Com o tempo, muitas dessas comunidades judaicas reconstruíram suas vidas e elevaram seu padrão de vida onde quer que tenham se estabelecido, em especial nos Países Baixos. Enquanto a Espanha pode ter se beneficiado, em algum momento, da riqueza deixada para trás, hoje se encontra atrás da maioria de seus pares da Europa Ocidental tanto em PIB per capita quanto em produtividade.
Esse exemplo histórico ilustra um princípio econômico fundamental: é possível redistribuir a riqueza existente, mas não necessariamente a capacidade de gerar riqueza. Sowell também faz referência a um estudo de caso em Detroit, onde mudanças de políticas e de regulamentações levaram à saída de uma parte significativa da população qualificada da cidade. Apesar de fábricas, máquinas e infraestrutura terem sido deixadas para trás, os que permaneceram não tinham o conhecimento necessário para operá-las ou mantê-las de maneira eficaz. Como resultado, a riqueza herdada se deteriorou. A conclusão de Sowell é clara: a riqueza confiscada inevitavelmente se desgasta, e aqueles que a herdam sem a capacidade de utilizá-la ou sustentá-la terão dificuldades até mesmo para preservá-la, quanto mais para fazê-la crescer. Isso ocorre porque os esforços redistributivos desestimulam a inovação futura, ao sinalizar para os potenciais criadores de riqueza que talvez não lhes seja permitido reter os frutos de seu trabalho.
É isso o que acontece quando as pessoas confundem o dinheiro em si com o capital, tratando-o como se fosse a parte da produção que pode ser redistribuída, sem reconhecer que o dinheiro só tem valor quando existe algo do outro lado da transação a ser comprado. A riqueza só possui valor duradouro quando combinada com o conhecimento, as habilidades, o tempo, a disposição para assumir riscos e a capacidade de coordenação do empreendedor. Não é o dinheiro, por si só, que impulsiona a produção e a riqueza, mas sim a combinação de inúmeros outros fatores.
Este artigo foi originalmente publicado no Mises Institute.
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Nota: as visões expressas no artigo não são necessariamente aquelas do Instituto Mises Brasil.
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