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A cidade de Nova York se tornará o novo paraíso socialista?

30/06/2025

A cidade de Nova York se tornará o novo paraíso socialista?

A impressionante vitória do autodeclarado socialista Zohran Mamdani sobre o ex-governador de Nova York, Andrew Cuomo, nas primárias democratas para a prefeitura da cidade de Nova York nos mostra que, embora o socialismo possa ser um fracasso no mundo real, ele está se saindo bem na política eleitoral americana. Como Nova York é majoritariamente democrata, é altamente improvável que Mamdani perca para Eric Adams, mesmo que Adams seja o atual prefeito (e um prefeito impopular, diga-se de passagem).

Há uma semana, os “especialistas” teriam dito que, embora Mamdani estivesse fazendo uma campanha empolgante e interessante baseada em tornar Nova York “acessível”, Cuomo prevaleceria por conta do reconhecimento de seu nome e sua experiência como governador. (O fato de ele ter renunciado em desgraça devido a acusações de assédio sexual aparentemente não foi um grande problema na campanha atual.) No entanto, no dia da votação (24 de junho), ao menos algumas pesquisas mostravam que a disputa estava empatada tecnicamente, com Mamdani ganhando fôlego para conquistar a vitória pelo sistema de votação por escolha ranqueada. Desta vez, os institutos de pesquisa estavam certos.

O mais revelador foi a divisão demográfica:

- Eleitores com menos de 50 anos preferem Mamdani por uma margem de 2 para 1, enquanto Cuomo lidera entre os eleitores de 50 a 59 anos (63% contra 37%) e entre os maiores de 60 anos (56% contra 44%).

- Eleitores hispânicos apoiam Cuomo por 60% a 40%, e eleitores negros favorecem Cuomo com 62% contra 38%. Mamdani lidera entre eleitores brancos (61% contra 39%) e entre eleitores asiáticos (79% contra 21%).

- Cuomo lidera entre os eleitores que não possuem diploma universitário de quatro anos, com 61% contra 39%, enquanto Mamdani lidera entre os eleitores com ensino superior completo, com 62% contra 38%.

- Homens apoiam Mamdani por 56% a 44%, enquanto mulheres tendem a preferir Cuomo, por 52% contra 48%.

Embora eu não me considere um especialista político, ainda assim, à medida que o Partido Democrata continua a se mover em direção à esquerda socialista, o que vemos em Nova York é um microcosmo do que está acontecendo nos Estados Unidos. Para muitos americanos, o socialismo é uma alternativa atraente ao que existe atualmente e, se a candidatura de Mamdani for um indicativo, parece ser especialmente atraente para brancos e asiáticos com formação universitária, apesar de o fato de que pessoas com ensino superior tendem a estar entre as faixas de renda mais altas do país.

Há uma desconexão evidente: os socialistas afirmam representar e defender os pobres e os membros oprimidos de grupos minoritários, porém a base de apoio de Mamdani, que se declara abertamente socialista, vem do grupo demográfico mais rico de Nova York: brancos e asiáticos com diploma universitário. Dado o discurso que os socialistas utilizam desde o século XIX, seria de se esperar que os eleitores socialistas viessem das camadas mais baixas da sociedade, e não das mais altas.

Se olharmos para a plataforma de campanha de Mamdani, é evidente que ela foi elaborada para atrair pessoas de baixa renda. Entre suas propostas estão:

- Um salário mínimo de 30 dólares por hora até o ano de 2030;

- Congelamento dos aluguéis e mais controle governamental sobre a habitação;

- Ele prometeu “triplicar a produção da Cidade de moradias permanentemente acessíveis, construídas por sindicatos e com aluguel estabilizado, construindo 200.000 novas unidades nos próximos 10 anos”;

- Criação de supermercados municipais estatais que venderiam alimentos a preços baixos;

- Ele eliminaria todas as tarifas de ônibus municipais;

- Ele também “implementaria creches gratuitas para todos os nova-iorquinos de 6 semanas a 5 anos de idade, garantindo programas de alta qualidade para todas as famílias. E aumentaria os salários dos trabalhadores da área de cuidados infantis, um quarto dos quais atualmente vive na pobreza, para que fiquem no mesmo nível dos professores da rede pública”.

É claro que uma agenda tão ambiciosa, que acrescentaria bilhões de dólares ao orçamento da cidade, precisa ser financiada com novas receitas, e sua plataforma inclui:

- Aumentar a alíquota máxima do imposto estadual sobre empresas para 11,5%, a mesma taxa de Nova Jersey. Arrecadar 5 bilhões de dólares por ano.

- Adicionar um imposto de renda municipal de 2% em Nova York para qualquer pessoa que ganhe mais de 1 milhão de dólares por ano. Arrecadar 4 bilhões de dólares por ano.

- Reforma de compras públicas com bom senso. Arrecadar 300 milhões de dólares por ano.

- Cobrança de valores devidos à cidade. Arrecadar 690 milhões de dólares por ano.

É evidente que muitos dos eleitores de Mamdani não votariam com base em seus próprios interesses econômicos, já que é pouco provável que utilizem muitos dos novos serviços “gratuitos” prometidos pelo candidato a prefeito. Embora ninguém goste de pagar aluguel mais caro, é bem provável que esses eleitores não usem os ônibus municipais e, muito menos, se mudem para as “moradias permanentemente acessíveis, construídas por sindicatos e com aluguel estabilizado”, ou façam compras nos mercados de propriedade da cidade. Além disso, a maioria deles provavelmente já ganha mais de 30 dólares por hora, então não estariam votando por um aumento de salário para si próprios.

Da mesma forma, embora os eleitores de Mamdani estejam principalmente nas faixas de renda mais altas, a maioria provavelmente ganha menos de 1 milhão de dólares por ano e, portanto, não seria afetada pelo aumento do imposto de renda. As novas alíquotas do imposto sobre empresas podem ter algum efeito indireto negativo sobre eles, mas isso seria difícil de mensurar. Assim, tudo isso cria uma dinâmica interessante: a maior parte de seu apoio político vem de pessoas que, provavelmente, não teriam benefícios diretos com os programas propostos, mas também não veriam seus impostos aumentarem com a implementação dessas novas políticas.

Pode-se argumentar que uma boa parte da coalizão de Mamdani está engajada em um voto de caráter expressivo, no qual os eleitores estão fazendo uma declaração sobre como acreditam que o mundo deveria ser, em contraste com aqueles que baseiam seu voto na realidade, entendendo os tipos de limitações que os políticos enfrentarão. Os eleitores de Mamdani têm semelhanças com os grupos que apoiaram Bernie Sanders e Alexandria Ocasio-Cortez, ambos também autodeclarados socialistas. De fato, tanto Sanders quanto AOC (juntamente com o ex-secretário do Trabalho de Bill Clinton, Robert Reich) declararam apoio a Mamdani. Assim como Mamdani, Sanders e AOC prometeram aos eleitores uma série de bens e serviços gratuitos a serem pagos por outras pessoas, mas, ao contrário de Mamdani, eles também podem prometer o perdão de dívidas estudantis.

Caso Mamdani vença a eleição para prefeito, enfrentará outro problema: transformar seus projetos socialistas em realidade. Até agora, parece que ele e seus seguidores partem do pressuposto de que o socialismo pode produzir bens de alta qualidade e baixo custo, como os socialistas prometem, desde que os candidatos sejam suficientemente enérgicos e carismáticos e consigam “inspirar” os outros.

Na política moderna, não há forma mais elevada de “sinalização de virtude” do que votar em um socialista, mesmo que a pessoa não seja quem vai arcar com a conta. É claro que, mesmo o candidato que promete coisas gratuitas sabe que alguém terá que pagar por isso, e esse alguém, nesse caso, são as empresas sediadas na cidade e os lares que ganham mais de 1 milhão de dólares por ano. A alíquota corporativa seria igual à de Nova Jersey e de outros estados vizinhos, o que removeria o incentivo para que as empresas se mudem para localidades próximas fora da cidade.

No entanto, empresas realmente deixam Nova York quando os custos se tornam altos demais. Em 2023, o New York Post noticiou:

“Ao todo, 56 empresas de Nova York se mudaram para a Flórida, enquanto a maioria das que permaneceram também migrou para estados mais quentes, como Texas e as Carolinas, segundo o relatório. Nova York não é a única grande perdedora, a Califórnia também perdeu 1 trilhão de dólares em ativos financeiros sob gestão para a Flórida, Texas e outros estados com custos mais baixos”.

Da mesma forma, indivíduos e famílias também deixaram Nova York em direção a estados com menor custo de vida e carga tributária mais leve e, considerando que uma administração Mamdani provavelmente não veria com bons olhos o chamado “1%” mais rico, essas pessoas teriam um forte incentivo para sair de um lugar onde o governo lhes fosse hostil. Assim como tantos outros governos de esquerda em estados e cidades ao redor do país, pode-se presumir que uma cidade de Nova York governada por um socialista autodeclarado faria todo o possível para expulsar as pessoas mais produtivas.

Nem sequer abordamos ainda as propostas da campanha que vão desde o fortalecimento dos controles de aluguel até a construção de milhares de novas unidades de moradia “acessível”. Esquemas socialistas tendem a fracassar nos recifes do que Ludwig von Mises chamou de “cálculo econômico”, algo como kryptonita para o socialismo. É razoável supor que as benesses socialistas prometidas por Mamdani aos eleitores acabarão no mesmo monte de cinzas onde repousam outras promessas socialistas fracassadas.

Mesmo que Andrew Cuomo tivesse saído vitorioso, candidatos socialistas continuam sendo atraentes, especialmente para eleitores brancos com alto nível de escolaridade e relativamente abastados. Resta torcer para que, mais cedo ou mais tarde, essas pessoas compreendam que os socialistas também virão atrás delas.

 

Este artigo foi originalmente publicado no Mises Institute.

 

Recomendações de leitura:

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Nota: as visões expressas no artigo não são necessariamente aquelas do Instituto Mises Brasil.

Sobre o autor

William L. Anderson

É um scholar adjunto do Mises Institute, e leciona economia na Frostburg State University.

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