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O “desaparecimento” dos dados da China não esconde sua desaceleração econômica

26/06/2025

O “desaparecimento” dos dados da China não esconde sua desaceleração econômica

As informações sobre a saúde econômica da China estão se tornando cada vez mais difíceis de encontrar. Embora Pequim costume ser opaca em relação a qualquer dado que possa indicar instabilidade ou fragilidade, esse comportamento está chegando a um ponto em que a tentativa de ocultação transmite uma mensagem clara: a economia chinesa está em dificuldades.

No dia 4 de maio, o Wall Street Journal noticiou que o Partido Comunista Chinês (PCC) está fazendo "desaparecer" uma vasta quantidade de dados econômicos, após relatos de queda vertiginosa nas vendas de terrenos, estagnação no crescimento do PIB, aumento do desemprego e até mesmo redução na produção de molho de soja.

“Pequim parou de divulgar centenas de estatísticas”, informou o jornal. “O desaparecimento desses dados tem dificultado a compreensão do que realmente está acontecendo na China em um momento decisivo, com a guerra comercial entre Washington e Pequim prestes a atingir fortemente a economia chinesa e enfraquecer o crescimento global”.

O motivo por trás disso é evidente: o Partido Comunista Chinês (PCC) — especialmente Xi Jinping — está preocupado com o impacto que números econômicos ruins podem ter sobre sua credibilidade e sobre o controle e o poder que exerce.

No entanto, não devemos nos apressar em concluir que estamos em 1989, prestes a testemunhar a queda do Muro de Berlim. Tampouco devemos assumir que se trata apenas de uma fase de transição estrutural antes de a China se tornar uma superpotência tecnológica.

A realidade, muito provavelmente, está em algum ponto intermediário.

A China, assim como os Estados Unidos, enfrenta uma série de desafios político-econômicos que, embora não necessariamente levem o país ao colapso, apontam para um desempenho medíocre no futuro. A grande diferença é que os Estados Unidos contam com um sistema capaz de remover pacificamente seus governantes quando suas ideias fracassam.

 

A trajetória de crescimento da China

A República Popular da China, após uma série de reformas de mercado iniciadas em 1978 e sua entrada na Organização Mundial do Comércio (OMC) em 2001, vivenciou um verdadeiro milagre econômico, passando de um dos países mais pobres do mundo à segunda maior economia global. As explicações para esse feito são numerosas e bem conhecidas. Entre elas estão: a ênfase na manufatura e na mão de obra barata, porém cada vez mais produtiva, os avanços expressivos na educação, a estabilidade governamental e uma postura relativamente aberta aos negócios, especialmente para um regime comunista. Contudo, a China também adota políticas industriais de grande escala, apresenta um grau relativamente baixo de liberdade econômica e possui um sistema político que reage de forma intensa a qualquer ameaça ao controle do Partido Comunista Chinês. Este último ponto tornou-se ainda mais relevante a partir de 2012, quando Xi Jinping assumiu a presidência e decidiu que o país havia concedido demais ao suposto caos do setor privado, promovendo uma severa restrição das liberdades políticas e econômicas.

À medida que o crescimento econômico desacelerou, tanto por razões naturais quanto por decisões políticas, o governo passou a divulgar cada vez menos informações. A China, que antes ostentava taxas de crescimento anual de dois dígitos, hoje cresce a uma taxa estimada em cerca de 3% a 4%, segundo alguns especialistas. Embora isso fosse considerado um bom desempenho para um país desenvolvido, como os Estados Unidos, o PIB per capita chinês ainda é várias vezes menor, o que indica que há espaço considerável para crescimento adicional.

 

Impedimentos ao crescimento

Parte do motivo para a desaceleração do crescimento da China é natural. À medida que uma economia avança, certas transformações estruturais precisam ocorrer antes que ela atinja o próximo estágio de desenvolvimento. Esse fenômeno é conhecido como Armadilha da Renda Média, que descreve a situação em que países majoritariamente rurais experimentam um rápido crescimento econômico durante o processo de modernização, ao migrar de uma economia baseada na agricultura para outra centrada na manufatura e nos investimentos. Contudo, esse crescimento tende a desacelerar, pois o estágio seguinte, além da manufatura, que não exige alta qualificação, passa a demandar níveis mais elevados de educação e infraestrutura. É relativamente simples construir fábricas e preenchê-las com trabalhadores, mas criar as condições para o surgimento de startups de tecnologia, finanças corporativas e uma economia movida pelo consumo exige mais do que apenas mão de obra e estabilidade razoável. Atualmente, a China enfrenta exatamente esse desafio, lidando com enormes disparidades de desenvolvimento entre suas cidades costeiras mais ricas e o interior rural.

No entanto, outro motivo pelo qual a China está passando por uma desaceleração econômica decorre das políticas de seu governo central. O crescimento do PIB está desacelerando por vários motivos, mas determinados setores da economia são particularmente prejudicados pela intervenção do governo. Por exemplo, após um ataque regulatório repentino e agressivo às suas próprias empresas em uma campanha conhecida como “Prosperidade Comum” em 2021, o mercado de ações chinês sofreu um impacto substancial e continua com dificuldades.

A campanha da "Prosperidade Comum" foi agravada pela repressão contínua à sociedade chinesa durante o surto de COVID-19 e pela adoção da estratégia de COVID Zero. O Índice Composto de Xangai, que acompanha todas as ações negociadas na Bolsa de Valores de Xangai, permaneceu relativamente estagnado, enquanto a Alibaba, equivalente chinesa da Amazon, está sendo negociada a menos da metade do seu pico registrado em outubro de 2020. A China, que vinha construindo uma reputação como o futuro dos negócios, passou a ser vista por investidores como um ambiente hostil e imprevisível. A dependência do país em relação ao comércio exterior para sustentar sua base manufatureira também é cada vez mais percebida como um risco, à medida que os Estados Unidos e outras nações buscam reequilibrar suas relações com a China, tanto por razões econômicas quanto geopolíticas.

A realidade é que as políticas industriais da China começaram a produzir efeitos contrários ao desejado. Um dos principais motores de crescimento do país sempre foi o setor imobiliário, que agora está à beira do colapso, resultado de anos de crédito fácil e planejamento estatal excessivo, evidenciado, sobretudo, pela falência da gigante financeira Evergrande. As políticas industriais voltadas para sustentar setores específicos (que vão de semicondutores a veículos elétricos) acabam por alocar mal os recursos, gerar ineficiências e provocar disrupções em larga escala. Em 2023, por exemplo, os noticiários foram tomados por imagens de verdadeiros cemitérios de carros elétricos, à medida que muitos consumidores preferiram simplesmente abandonar seus veículos do que tentar revendê-los. O principal fator por trás desse fenômeno foram os subsídios irresponsáveis, que sustentaram empresas deficitárias e incentivaram os consumidores a comprar veículos, mesmo em cidades sem infraestrutura adequada para recebê-los.

 

O que isso significa daqui em diante?

A desaceleração do crescimento econômico da China deve, sem dúvida, ser vista como uma crítica às políticas de Xi Jinping e, de forma mais ampla, às políticas industriais, bem como à incapacidade do modelo autoritário de Pequim de lidar adequadamente com as dores do crescimento estrutural da economia. Isso, no entanto, não significa necessariamente que a China entrará em colapso amanhã ou deixará de ser uma concorrente geopolítica dos Estados Unidos. O setor de alta tecnologia chinês continua a se expandir, impulsionando o crescimento em áreas estratégicas como drones, minerais de terras raras e inteligência artificial. Embora ainda não esteja claro se as políticas industriais de Pequim serão capazes de conduzir o país rumo à modernidade, ainda há espaço para crescimento, mesmo que em um ritmo muito mais moderado do que o desejado. É seguro afirmar que, para que a China volte a experimentar um crescimento econômico acelerado, muitas variáveis precisariam dar certo ao mesmo tempo.

A China enfrentará um crescimento econômico muito mais lento do que se previa, mas o futuro provavelmente não será de colapso, e sim de mediocridade. A pergunta que se impõe, então, é: como uma entidade cada vez mais paranoica e autoritária como o Partido Comunista Chinês lidará com esse dilema?

O governo tomará medidas radicais para promover a livre iniciativa e restabelecer relações com o Ocidente? Muito improvável. Como Xi Jinping reagirá a sugestões bem-intencionadas de que algumas de suas políticas deveriam ser moderadas? Ele adotará silenciosamente as críticas ou recorrerá a expurgos políticos? Ambos já aconteceram antes.

O desfecho mais provável está em algum ponto intermediário: um comportamento cada vez mais errático por parte do governo chinês, tentando ao mesmo tempo aplacar o descontentamento popular e reprimi-lo. O resultado final será uma perspectiva de crescimento econômico modesto no futuro próximo e um mandato cada vez mais tenso e pressionado para Xi Jinping.

 

Este artigo foi originalmente publicado no The Daily Economy.

 

Recomendações de leitura:

O horror da China comunista e seus pavorosos campos de morte

China: uma aberração econômica keynesiana e mercantilista

O Brasil na armadilha da renda média

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Nota: as visões expressas no artigo não são necessariamente aquelas do Instituto Mises Brasil.

Sobre o autor

Ethan Yang & Ryan Yonk

Ryan M. Yonk é Diretor de Educação e Pesquisador Sênior do American Institute for Economic Research. Ele possui doutorado pela Universidade Estadual da Geórgia e mestrado e bacharelado pela Universidade Estadual de Utah. Ethan Yang é Pesquisador Adjunto do AIER e apresentador do Podcast AIER Authors Corner. Ele é bacharel em Ciência Política com ênfase em Relações Internacionais, com ênfase em Estudos Jurídicos e Organizações Formais, pelo Trinity College em Hartford, Connecticut. Atualmente, cursa o Doutorado em Direito pela Faculdade de Direito Antonin Scalia da Universidade George Mason.

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