Esse site usa cookies e dados pessoais de acordo com os nossos Termos de Uso e Política de Privacidade e, ao continuar navegando neste site, você concorda com suas condições.

< Artigos

Economia

Inflação como uma força centralizadora

12/05/2025

Inflação como uma força centralizadora

O que veio primeiro: o ovo ou a galinha? A inflação ou a classe gerencial?

O inflacionismo é tanto uma ferramenta quanto uma ideologia e um fenômeno. A inflação, naturalmente, estimula o consumo imediato, já que os preços mudam mais rápido do que os salários. Ela beneficia os devedores em detrimento dos credores. Favorece os primeiros e mais rápidos recebedores do novo dinheiro, aqueles mais próximos da “torneira” monetária, às custas dos que o recebem por último. Além disso, é uma ferramenta perfeita para a classe gerencial descrita por James Burnham e Sam Francis, uma vez que permite a expansão e centralização ainda maiores do poder.

A teoria desses autores se baseia na ideia de que negócios e estado se fundiram por meio de uma classe de burocratas e gestores que trabalham lado a lado. A União Soviética e a Alemanha Nazista são exemplos óbvios, mas Burnham também via o New Deal como outro caso dessa fusão. Contudo, há uma falha em identificar o New Deal como o início da revolução gerencial que ele observava. Esse processo começou muito antes nos Estados Unidos, durante a Era Progressista, quando grandes empresas se aliaram à expertise tecnocrática progressista para cartelizar indústrias às custas do consumidor/contribuinte. O New Deal foi antecipado pelo socialismo de guerra de Woodrow Wilson, interrompido apenas pelo fim da Primeira Guerra. Um aspecto crucial dessa cartelização empresarial foi o surgimento do banco central.

Se considerarmos válida a versão de Murray Rothbard sobre a origem do Federal Reserve, uma história revisionista, no mínimo, empresas financeiras se aliaram a políticos ideólogos e economistas para sustentar o frágil sistema bancário de reservas fracionárias. J.P. Morgan não precisaria mais atuar como emprestador de última instância para um sistema insustentável. Mas isso acabou fortalecendo ainda mais o governo federal em muitas das ações que logo empreenderia.

Mises enfatizou o “poder do bolso” do povo de impor restrições às ações do governo, dependendo de sua cooperação com a tributação ou da observância do uso do dinheiro do contribuinte. Mas os governos tiram esse poder do povo com empréstimos e inflação. Ao tomar empréstimos, o custo de qualquer política adotada fica oculto até que impostos futuros sejam criados para pagar a dívida emitida (se é que será paga). Quando o inflacionismo é adotado para pagar por bens, o custo fica oculto, pois os preços sobem lentamente e de forma desigual após a injeção do novo dinheiro na economia em geral.

A inflação leva tempo para provocar o aumento de preços nos diferentes setores da economia. Essa ocultação dos custos torna mais fácil apresentar os impactos financeiros e sociais de um conflito como se fossem menos onerosos por um tempo. É por isso que o Dr. Ron Paul comentou: “não é coincidência que o século das guerras totais tenha coincidido com o século dos bancos centrais.” Os custos da guerra são disfarçados pelo inflacionismo e pelo endividamento, ambos viabilizados pela existência de um banco central.

A guerra é uma força centralizadora. O socialismo de guerra que se instala, com a nacionalização de indústrias, o racionamento e o controle de preços, entrega toda a economia nas mãos de burocratas e seus aliados gerenciais nas grandes corporações. Pequenas empresas não conseguem operar nesse tipo de economia. Seus insumos são limitados, desviados para alimentar a máquina de guerra. Elas não têm condições de contratar gestores para interagir com a burocracia. Aos poucos, são absorvidas ou eliminadas. Tudo isso em nome do patriotismo, da luta por uma suposta “guerra justa”, viabilizada pelo banco central.

Não é coincidência que as mesmas figuras que impulsionaram a criação do Federal Reserve, e o Estado gerencial, estavam entre os maiores defensores do socialismo de guerra promovido por Woodrow Wilson. Rothbard descreve isso com clareza no livro The Progressive Era, no capítulo com o título War Collectivism in World War I (“Coletivismo de Guerra na Primeira Guerra Mundial”, em português).

Há outro aspecto em que a inflação atua como uma força centralizadora. A inflação distorce os sinais de preço na economia em benefício dos primeiros receptores. Ela suga os bens reais de outros agentes econômicos sob a ilusão de uma troca normalmente benéfica e os coloca nas mãos daqueles mais próximos do banco central e do governo, ou seja, a classe administrativa.

A propriedade desempenha um papel crucial na maneira como o homem se comporta. O homem age para alcançar um estado de coisas mais satisfatório empregando meios. A propriedade privada é a única maneira eficiente de alocar bens econômicos - aqueles bens que são vítimas de escassez e são identificados como meios para algum fim. Para alocar essa propriedade, a ação humana nos presenteia com o sistema de preços de mercado.

Os preços não são números arbitrários ou relações físicas entre mercadorias, mas sim proporções que nos dizem como o homem optou por trocar mercadorias entre si. Isso só é possível com dinheiro. Quando há interferência com o dinheiro - seja o rei medieval que desvaloriza sua moeda, o falsificador comum escondido em um porão ou o banco central que injeta reservas no sistema bancário -, o sistema de preços é distorcido.

O dinheiro não é neutro, ele entra em determinados pontos e aumenta os preços em taxas diferentes, de acordo com as preferências de quem gasta. A inflação distancia as pessoas da propriedade por sua proximidade com a impressora de dinheiro. Quando todos os aspectos de como você se comporta em uma sociedade comum são definidos pela propriedade, a aquisição de seus meios, ser privado dela por meio de um mercado fraudulento leva ao descontentamento.

Com a rápida mudança nos preços, especialmente quando isso ocorre de forma desigual, torna-se impossível prever o valor futuro das economias e dos bens, como o Dr. Joseph Salerno explica em “Hiperinflação e a Destruição da Personalidade Humana”. Isso impede que as pessoas pensem no longo prazo; elas passam a consumir. Precisam consumir agora, pois não há garantia de que o dinheiro que possuem hoje manterá seu valor no futuro. Sam Francis identifica o consumismo em massa como um aspecto essencial do regime gerencial.

Esse consumismo é necessário porque a produção de bens reais acaba sendo comprometida quando as empresas precisam empregar grandes equipes de gerentes apenas para lidar com as exigências da burocracia. Os bens se tornam menos duráveis, pois o horizonte de tempo do consumidor também se encurta. Quando o ser humano age, ele investe, ou seja, ele avalia se o valor de todos os usos possíveis de um bem supera o seu custo. Esse processo se chama capitalização.

Se o valor que um homem obteria com três pás mais baratas for igual ou marginalmente maior do que com uma pá mais cara, ele comprará os três produtos mais baratos. Ele pode obter mais valor com isso. Os bens mais duráveis tendem a subir de preço mais rapidamente e a se tornar mais caros mais rapidamente do que os bens mais baratos produzidos em massa. Assim, a inflação provoca um curto-circuito nesse processo e cria incentivos para que as pessoas comprem bens produzidos em massa.

À medida que as empresas menores são absorvidas e os bens produzidos em massa aumentam devido à demanda do mercado, todos os que desejam ter uma renda estável precisam ingressar em uma grande empresa. Eles se tornam átomos em uma máquina economicamente ineficiente. O que não é suprido pela renda nesses empregos corporativos é suprido por um estado de bem-estar social ineficiente que é financiado por meio de mais endividamento.

O homem não depende mais de sua comunidade ou de um trabalho realmente econômico. Ele se torna um consumidor atômico. Isso sem mencionar os ataques à família causados pelo estado de bem-estar social e pelo sistema educacional. Tudo isso é financiado pela inflação e por seus efeitos. Tudo isso dá poder ao estado burocrático-gerencial. As empresas corruptas que se aproximam do governo federal são recompensadas e são as únicas que sobrevivem. Os burocratas afastam os cidadãos das comunidades locais, de suas propriedades e de seus negócios. Tudo a que as pessoas estão ligadas e de que dependem em suas comunidades locais é eliminado. O homem se torna homo politicus - homem político.

A política se torna uma força totalizadora sob a burocracia. A inflação é a maior ferramenta da classe gerencial. Com ela, eles podem financiar todas as políticas que desejarem. Eles podem recompensar seus amigos e punir seus inimigos. Eles criam um homem consumista - o homem econômico que é usado como um espantalho contra os defensores do livre mercado. O “livre mercado” é criticado por seu “consumismo desenfreado”. Tudo isso só é possível com a ajuda do banco central e seu inflacionismo crônico. Não é coincidência que o século da burocracia tenha coincidido com o século do banco central.

 

Este artigo foi originalmente publicado no Mises Institute.

 

Recomendações de leitura

Hiperinflação e a destruição da personalidade humana

Uma breve história do movimento progressista: eugenia, drogas, aborto, Lei Seca e Ku Klux Klan

Quarta lição: inflação

_____________________________________________

Nota: as visões expressas no artigo não são necessariamente aquelas do Instituto Mises Brasil.

Sobre o autor

David Brady Jr.

Libertário católico e estudante de graduação em economia e finanças no Florida Southern College. Ele é co-apresentador do podcast “Econphonics” e Aprendiz de Mises.

Comentários (3)

Deixe seu comentário

Há campos obrigatórios a serem preenchidos!