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Filosofia

Como a competição, o cálculo econômico racional e a civilização emergem da propriedade privada

04/05/2025

Como a competição, o cálculo econômico racional e a civilização emergem da propriedade privada

Mises escreve:

“Até o momento, todas as civilizações foram baseadas na propriedade privada dos meios de produção. No passado, a civilização e a propriedade privada estavam ligadas. Se a história pudesse nos ensinar alguma coisa, seria que a propriedade privada está inextricavelmente ligada à civilização”.

Todo ser vivo, seja uma única célula, ou um conjunto delas, como um ser humano, ou um conjunto de seres humanos, como uma comunidade ou uma empresa, está em um ciclo constante de produção e consumo-uso. A produção e o consumo, bem como toda ação, são apenas uma transformação ou realocação da “matéria em formatos mais vantajosos”, orientados por informações. Eugen von Böhm-Bawerk disse:

“‘Produzir’: o que isso significa? Os economistas repetem com frequência que a criação de bens não consiste em trazer à existência materiais que antes não existiam — não é ‘criação’ no sentido verdadeiro da palavra, mas sim o ato de moldar a matéria imperecível em formas mais vantajosas (…).”

Esses ciclos de produção e consumo utilizam informações que levam à lucratividade. Em outras palavras, quando a produção de riqueza supera o consumo, isso permite que a vida continue e cresça.

A informação que coordena a ordem socioeconômica global moderna, ou o que o grande fundador da Escola Austríaca de economia, Carl Menger, e o filósofo britânico Herbert Spencer chamavam de “O Organismo Social”, emerge e se dissemina por meio da competição econômica, que, por sua vez, tem origem na tradição da propriedade privada.

Pessoas livres são motivadas a descobrir as melhores informações para aumentar a velocidade com que reorganizam a matéria que controlam exclusivamente (sua propriedade privada), com o objetivo de produzir riqueza e, em seguida, trocá-la com outros. Se somos empregados, agimos, reorganizamos nossos corpos ao produzir nosso trabalho e o trocamos por dinheiro com os empregadores. Os empregadores combinam esse trabalho com o de outras pessoas para produzir bens, que então são trocados por dinheiro com o público. O dinheiro que obtemos ao trocar o que produzimos é, então, usado para adquirir outros bens que desejamos. Esses ciclos gerais de produção e troca por dinheiro, e troca de dinheiro por bens de consumo, se repetem até que a nossa ordem biológica entre em colapso de maneira irreversível, impedindo a manutenção da nossa própria ordem - e então morremos.

Em nosso papel como produtores, por meio de empresas do setor privado, somos motivados a inovar, criando assim novas e superiores informações. Em nosso papel como consumidores, graças à nossa liberdade de comércio, podemos trocar nossos bens e serviços com as empresas que oferecem os melhores produtos. As empresas precisam aprender e copiar inovações umas das outras (concorrentes) e, dessa forma, acabam cooperando involuntariamente para inovar e disseminar informações superiores. Isso também contribui para a disseminação de uma ordem social mais avançada.

Algumas montadoras inventaram os vidros elétricos, e a concorrência espalhou essa ideia para outras montadoras, ajudando-as a fabricar carros melhores e difundir essa inovação. À medida que ideias para redução de custos surgem e inevitavelmente se espalham por meio da concorrência, levando os preços relativos a caírem continuamente, novas ideias lucrativas surgem com facilidade e também se espalham através desse mesmo processo, em um ciclo sem fim. Computadores já foram extremamente caros, mas conforme os preços diminuíram, as pessoas perceberam que cada lar poderia ter um, o que deu origem ao nosso mundo informatizado. Quanto mais riqueza é produzida, mais riqueza precisa ser oferecida em troca de trabalho, pois as empresas competem entre si pela força de trabalho de que precisam — o que ajuda a explicar por que o “bolo econômico” cresce para todos.

Assim como nas Olimpíadas conseguimos descobrir os melhores atletas do mundo por meio da competição global, o fato de termos liberdade para trocar nossa propriedade privada com outros, em qualquer lugar do mundo, motiva todos os concorrentes a copiar inovações. Isso nos direciona ao melhor arranjo global possível, transformando, involuntariamente, a humanidade em um supercomputador.

A moral consiste em modos de agir. A moral também é uma forma de conhecimento-informação que, em grande parte, se dissemina por meio da concorrência econômica. São as pessoas trabalhadoras, tolerantes e corteses que, graças à competição, inevitavelmente motivam todas as outras a agirem da mesma forma e, assim, se tornarem mais “civilizadas”. Como escreve Hayek:

“Afinal, a concorrência é sempre um processo no qual um pequeno número de pessoas torna necessário que um número maior faça o que não gosta, seja trabalhar mais, mudar hábitos ou dedicar um grau de atenção, aplicação contínua ou regularidade ao trabalho que, sem a concorrência, não seria necessário.”

Os benefícios de criação e disseminação de informações da concorrência econômica só existem com a propriedade privada. Burocracias governamentais ou do “setor público”, sendo monopólios coercitivos que obtêm sua receita de forma compulsória via impostos, não têm incentivo ou pressão para inovar ou copiar inovações de concorrentes, como as empresas do setor privado. Portanto, elas são intelectualmente estagnadas e regressivas. Os planos centrais do governo não podem funcionar se as pessoas forem livres para ignorá-los, portanto, eles inevitavelmente exigem a coerção e a transformação de todos em criminosos em potencial, não porque tenham de fato prejudicado alguém ou sua propriedade, mas simplesmente por não quererem financiar ou concordar com os planos centrais coercitivos e imunes à concorrência.

A propriedade privada também é indispensável para descobrir as informações que coordenam os ciclos de produção e consumo da ordem social de forma lucrativa e, portanto, com aumento de riqueza.

Considere o seguinte exemplo. José é dono de um restaurante cubano localizado em Miami que vende pratos cubanos por 10 dólares cada. Talvez 2 dólares representem o lucro, e os outros 8 dólares sejam gastos com custos. Em outras palavras, trata-se do consumo necessário para produzir a refeição, coisas como equipamentos, eletricidade, insumos e tudo o que os funcionários e suas famílias consumirão em casa (alimentos, energia), graças aos salários pagos com esses 8 dólares por refeição. José descobriu informações vitais: 1) que há clientes suficientes nas proximidades dispostos a frequentar o restaurante pagando 10 dólares por refeição; e 2) como adquirir 8 dólares em recursos (mão de obra, suprimentos etc.) naquele tempo e lugar específicos, reorganizá-los e, assim, produzir a refeição de forma lucrativa.

Se ele definir um preço muito alto, os clientes trocarão livremente seu dinheiro com concorrentes melhores. Se ele definir preços abaixo dos custos, estará consumindo mais do que arrecada em receita e, com isso, acabará saindo do mercado. O socialismo-comunismo ou o “planejamento econômico central” não funcionam porque apenas empresários livres, dispersos pela sociedade e focados nos clientes e nos recursos específicos de cada tempo e lugar, estão nas condições ideais para descobrir os desejos das pessoas.

Diante disso, como descobrimos quanta riqueza precisou ser consumida para produzir um galão de gasolina vendido em Seattle? Ou para uma libra de carne vendida em Londres? Ou para um voo de Miami para Londres? Simples: olhamos os preços, que obrigatoriamente incluem os custos. O preço de qualquer bem no mundo nos mostra que há uma ordem social, naquele tempo e lugar específicos, coordenada por empreendedores que descobriram informações capazes, em média, de produzir aquele bem consumindo menos do que o preço anunciado.

É isso que permite o que Mises chamava de cálculo econômico racional. Isso possibilita que os fatores de produção sejam adquiridos e combinados de forma que a combinação final possa ter um preço definido com facilidade, levando corretamente em conta os custos/o consumo simplesmente somando os preços das partes utilizadas para produzi-la. Os custos para cultivar e colher uma banana na Colômbia podem ser de 2 centavos, mas ela pode representar 30 centavos como parte de um prato cubano transportado, preparado e servido em Miami. Como esteiras transportadoras interconectadas, cada empresa reorganiza a matéria usando informações altamente específicas de tempo e lugar para estimar da melhor forma a lucratividade do crescimento e da expansão da riqueza.

Assim, da propriedade privada emergem: 1) a concorrência econômica, que descobre e dissemina informações e ordens superiores; 2) a liberdade de viver e organizar nossas vidas como desejarmos, já que ninguém pode coagir ou reorganizar nossa propriedade sem o nosso consentimento; e 3) o “cálculo econômico racional”, que nos permite garantir que nossos planos sejam lucrativos e, portanto, maximizem a riqueza e promovam a vida. Mises disse: “A existência contínua da sociedade depende da propriedade privada.”

 

Este artigo foi originalmente publicado no Mises Institute.

 

Recomendações de leitura:

O cálculo econômico sob o socialismo

Não há prosperidade sem propriedade privada

Por que a teoria do cálculo econômico de Mises ainda é relevante

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Nota: as visões expressas no artigo não são necessariamente aquelas do Instituto Mises Brasil.

Sobre o autor

Jorge Besada

É um programador de Miami, Florida.

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