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Economia

Demissões em massa: por que os EUA ainda estão longe da recuperação

30/07/2009

Demissões em massa: por que os EUA ainda estão longe da recuperação

Toda a mídia mundial vem repetindo com entusiasmo as declarações de Obama e Bernanke sobre o fim iminente da recessão americana.  Porém, assim como os investidores da bolsa de valores, todos estão desprezando um desastre iminente: as demissões em massa. 

Os investidores seguem se comportando na crença de que, dentro de poucos meses, tudo voltará ao normal.  As empresas seguem cortando custos, demitindo funcionários que trabalhavam pra elas havia décadas.  Com isso elas podem anunciar lucros maiores em decorrência dessas medidas de corte de custos.  A mídia, consequentemente, reporta esse aumento dos lucros.  Mas como esse aumento pode ser sustentável?  Como uma taxa de desemprego de 11% poderá ajudar a economia a se recuperar?

As empresas de fato têm de cortar custos.  Os consumidores estão dizendo isso pra elas de maneira inequívoca.  Mas não há porque se regozijar quando as pessoas estão sendo demitidas.  Elas confiaram na alta administração.  Elas confiaram no sistema econômico.  Elas nunca haviam ouvido falar no Federal Reserve System (o banco central americano).  Elas nada sabem sobre derivativos.  Tudo o que elas sabem é que o governo americano socorreu os grandes bancos em 2008, enquanto que elas perderam seus empregos.  Nesse artigo, abordarei a questão das demissões em massa.  Trata-se de um tópico que não ganha muita atenção da mídia.  Deveria.

Ao invés disso, somos informados sobre três estatísticas: a taxa de desemprego, os pedidos de auxílio-desemprego e o desemprego total.

ESTATÍSTICAS DE DESEMPREGO

Primeiramente, consideremos a taxa de desemprego.  O último número, para o mês de junho, foi de 9,5%.  Espera-se que esteja acima dos 10% ao final do ano.  Nenhuma autoridade está prevendo uma grande redução dessa taxa até o final de 2010.

A taxa de desemprego não é bem entendida.  Não se trata da razão entre pessoas desempregadas e adultos da economia.  Trata-se da razão entre pessoas desempregadas e o total da força de trabalho.  O Bureau of Labor Statistics explica da seguinte forma:

Quais são os conceitos básicos do emprego e do desemprego?

Os conceitos básicos envolvidos na identificação dos empregados e desempregados são bem simples:

  •   Pessoas com empregos estão empregadas.
  •  Pessoas sem empregos, à procura de empregos e disponíveis para o trabalho estão desempregadas.
  •  As pessoas que não estão nem empregadas e nem desempregadas não estão não força de trabalho.

... A soma dos empregados com os desempregados constitui a força de trabalho civil.

Sigamos o raciocínio.  Joe Smith é demitido.  Ele está desempregado.  Ele sai à procura de um novo emprego.  Ele ainda faz parte da força de trabalho.  Assim, a taxa de desemprego aumenta: a razão entre aqueles que estão sem emprego e toda a força de trabalho.  

Joe segue procurando um emprego.  Seu seguro-desemprego expira.  Ele desiste de procurar emprego.  Ou ele passa a procurar emprego no mercado informal.  Em ambos os casos, ele está fora da força de trabalho.  Ele portanto foi retirado das estatísticas do desemprego.

Quando estava desempregado, ele tinha um maior peso no numerador do que no denominador.  Portanto, quando ele é retirado de ambos os termos da fração, a taxa de desemprego cai.  Uma vitória para os pacotes de estímulo! O problema é que essa vitória é puramente estatística.

Agora vamos para os pedidos de auxílio-desemprego.  Os pedidos mais recentes têm estado na casa dos 566.000 por semana (em uma média de 4 semanas).  Há um mês, essa média era de 616.000.  Há dois meses, foi de 623.000.  Tem havido, portanto, uma ligeira melhora.  As pessoas entram na estatística e depois saem, à medida que arrumam emprego ou perdem seus auxílios.

O total de desempregados, em 23 de julho, era de 6,2 milhões.

DEMISSÕES EM MASSA

O Bureau of Labor Statistics (BLS) publica uma outra estatística: demissões em massa.  Uma demissão em massa ocorre quando uma empresa demite 50 ou mais pessoas de uma só vez.

Uma demissão em massa indica estar havendo pânico nas altas esferas administrativas.  Isso significa que as empresas têm de se virar com bem menos empregados.  Não é uma ocorrência normal.  Eis o relato do BLS de 23 de julho: "Demissões em Massa em Junho de 2009"

Empregadores incorreram em 2.763 ações de demissão em massa em junho, resultando no afastamento de 279.231 trabalhadores, com ajuste sazonal.  As medidas são demonstradas pelos novos pedidos de auxílio-desemprego.  Cada ação envolveu a demissão de, pelo menos, 50 pessoas por cada empregador...

Ao longo de um ano, o número de demissões em massa aumentou em 1.046, e os pedidos de auxílio-desemprego associados a esse evento aumentaram 104.483.

Isso significa que, um ano atrás, o número de demissões em massa estava em 1.717.  Agora está em 2.763.

O relatório do BLS também fornece informações relacionadas ao volume dessas demissões em massa desde o início oficial da recessão americana, em dezembro de 2007.

Durante 19 meses - de dezembro de 2007 a junho de 2009 - o número total de demissões em massa (com ajuste sazonal) foi de 39.822, e o número de pedidos de auxílio-desemprego (com ajuste sazonal) nesses eventos foi de 4.090.538.  (Dezembro de 2007 foi apontado pelo National Bureau of Economic Research como o mês em que a recessão se iniciou.)

Se dividirmos o total de demissões em massa (39.822) por 19 meses, temos uma cifra média mensal de 2.095.  Só em junho ocorreram 2.763 demissões em massa.  A mídia não costuma reportar esses números.  Eles são limitados a empresas grandes.  A maioria das empresas não pode demitir 50 pessoas, pois não empregam 50 pessoas.

A maioria dos novos empregos é criada por pequenas empresas.  Grandes empresas empregam muitas pessoas, mas estes empregos são de longo prazo.  Assim, quando as pessoas perdem seus empregos em empresas grandes e sólidas, elas são forçadas a procurar empregos em outras empresas de mesmo porte - caso queiram manter sua renda no mesmo nível.  O problema atual é que as demissões em massa nos EUA estão ocorrendo em números sem precedentes.  E simplesmente não há empregos do mesmo porte daqueles que estão desaparecendo.

Com isso, o indivíduo à procura de emprego tem de ter ambições menores.  Suas aspirações, tanto em termos de salário quanto em termos de graduação, terão de ser mais humildes, pois ele estará entrando no mercado de trabalho no segmento "inicial".  E esses empregos não são seguros.  Eles não costumam pagar tão bem quanto aqueles empregos consagrados em grandes empresas.

Demissões em massa desorganizam e até mesmo interrompem uma carreira.  As pessoas que sonhavam manter seus empregos em empresas de renome - e que ofereciam benefícios como seguro-saúde e fundos de pensão - agora se descobrem sem seu seguro-saúde e com uma pensão insuficiente para dar-lhes qualquer esperança de uma aposentadoria decente.

NOVOS CUSTOS, MAIS DEMISSÕES

A reforma no sistema de saúde proposta pelo governo Obama planeja obrigar os grandes empregadores a pagar os planos de saúde de seus empregados.  Inicialmente, as pequenas empresas estão isentas.  Isso irá aumentar os custos de operação daquelas empresas que já possuem programas de seguro-saúde - que apenas não são tão generosos quanto a nova lei obriga.

Isso irá colocar as grandes empresas em desvantagem.  Elas provavelmente terão de demitir aqueles trabalhadores mais à margem - ou deixar de contratá-los.  Elas passarão a enfrentar a concorrência de pequenas empresas que não estão sujeitas à mesma lei.

O resultado será o oposto daquele que os promotores dessa nova lei alegam querer.  Eles querem que mais trabalhadores sejam cobertos por programas financiados pelos empregadores.  Mas haverá menos pessoas cobertas, pois menos estarão empregadas.  Eles querem mais coberturas abrangentes; os trabalhadores terão menos.

O fenômeno das demissões em massa continuará.  Os custos adicionais forçarão as empresas a cortar custos rapidamente.  Elas enfrentarão custos crescentes em uma época de recessão.  Aquelas empresas que resistiram, na esperança de que a recuperação viria, descobrirão que não mais serão capazes de resistir.

O fato de a administração Obama estar pressionando o Congresso a aprovar essa lei antes que haja qualquer sinal de recuperação econômica indica que o presidente acha que a lei não será aprovada caso haja algum atraso.  Obama quer usar sua popularidade como um aríete enquanto ele ainda pode derrubar a resistência.

MUDANÇA DE CARREIRA

Uma demissão em massa é um fenômeno que tem a probabilidade de acontecer apenas em uma cidade.  Não se trata de demissões individuais espalhadas por várias fábricas ou regiões.  Normalmente atinge apenas uma fábrica.  A empresa, em consequência, fecha uma de suas divisões.  Ela descobre que toda a produção de uma fábrica ou de uma divisão não mais é lucrativa.

Quando isso acontece, a perda de renda fica concentrada em uma determinada área geográfica.  Isso afeta as famílias mais do que se as demissões tivessem ocorrido difusamente por várias fábricas localizadas em diferentes cidades.

Sem qualquer aviso, cada pessoa demitida deve lutar para arrumar um novo emprego.  Torna-se custoso para o mercado local absorver todas elas de uma vez.  A resposta óbvia dos empregadores é oferecer um salário menor sem os benefícios adicionais.  Aqueles que estão à procura de emprego não estão em posição de negociar.  Eles têm contas a pagar.

Uma dessas contas é a hipoteca mensal.  Equivale a uma grande fatia do orçamento familiar.  A família vai tentar não dar calote nas prestações.  Porém, se ela agora está enfrentando uma hipoteca que é maior do que o valor de mercado de seu imóvel, ela estará tentada a parar pagar.

Se as famílias soubessem o quão caro é para seus credores contratarem um advogado para executar a hipoteca nos tribunais, várias delas parariam imediatamente de pagar suas hipotecas.  Quanto a execução de uma hipoteca custa ao credor?  Em média, US$50.000.  Isso inclui os prejuízos com os empréstimos (US$40.000 para um imóvel de US$210.000), os honorários dos advogados e os custos judiciais.

Mas o credor (em sua maioria bancos) não quer a reintegração de posse, pois o prejuízo teria de ser divulgado.  Assim, a execução da hipoteca pode ir sendo adiada até o momento da transferência final do imóvel para o credor.  O credor pode se limitar apenas a ameaçar retomar a propriedade, na esperança de que isso intimide os inquilinos e eles sigam pagando.  Porém, se a família abandonar o imóvel, este se tornará um ativo de alto risco.  Ele não estará gerando dinheiro algum.  Ele está se deteriorando.  Vândalos podem saqueá-lo.  Sem-teto podem invadi-lo.

A família finalmente terá de jogar a toalha.  Ou ela sai do imóvel voluntariamente ou é despejada.  Em ambos os casos, o patrimônio é perdido.  A família agora tem uma enorme marca negra em seu histórico de crédito.  Será difícil para ela conseguir algum empréstimo bancário no futuro.  Ela talvez tenha de pedir concordata.

A ameaça de demissões em massa é terrível para uma família.  Entretanto, por algum motivo, as pessoas atualmente não estão vendo as perspectivas disso acontecer.  Elas se mantêm apegadas a uma carreira já condenada, na esperança de que haverá alguma salvação.  Em junho, a salvação não veio para 279.231 trabalhadores.

Mês após mês, esse processo segue implacável.  Ocasionalmente, algum noticiário televisivo mostra uma cidade que foi atingida por uma grande demissão em massa.  Mas não se percebe que esses eventos estão ocorrendo, mês após mês, simultaneamente em milhares de comunidades.      

SEM PROBLEMAS!

A recuperação econômica ainda não chegou.  A mídia relata - como se fossem boas notícias econômicas - as estatísticas que mostram um declínio econômico menos sério.  O público se tornou menos pessimista quanto à economia.  Qual a base desse otimismo?  Distorções da mídia.  Promessas de políticos.  A garantia dada por Bernanke de que ele já está vendo algumas recuperações.

Mas o que é necessário para haver um real otimismo é termos alguma evidência de que o comércio está se recuperando.  Um aumento no transporte de carga seria um indicador bem-vindo.  Mas o que estamos vendo nessa área é apenas um declínio ligeiramente menor.  Uniformemente, o transporte ferroviário de cargas caiu, e muito mais do que nas recessões de 1991 e 2001.

Um aumento das importações e exportações nos maiores portos dos EUA seria outro indicador bem-vindo.  Novamente, nenhuma evidência cativante.

A retração do declínio certamente é melhor que sua aceleração.  Mas com o desemprego em contínuo aumento, como alguém pode esperar que os consumidores voltem a comprar aqueles mesmos itens que tiveram boa performance na época da bonança?  Por que não deveríamos apenas assumir que os consumidores americanos irão se limitar a comprar apenas coisas básicas, como comida?  Eles vão poupar dinheiro.  Eles vão depositar seu dinheiro nos bancos.  Mas os bancos não estão emprestando.  Eles estão depositando todas as suas reservas - além das compulsórias - no Federal Reserve e ganhando juros de 0,15% ao ano.  Os banqueiros permanecem convictos de que vale a pena investir na atual recuperação da bolsa.

Adoram contar-nos histórias sobre como as pessoas, durante a Grande Depressão, retiravam dinheiro dos bancos para guardá-lo sob o colchão, como se elas fossem tolas.  Elas eram espertas; os bancos estavam insolventes.  Pelo menos 6.000 bancos quebraram no período 1930-33.  Todos que tinham dinheiro naqueles bancos perderam cada centavo.  Além disso, quem hoje está escondendo dinheiro sob o colchão são os banqueiros americanos.  E esse colchão chama-se "reservas em excesso". (Entenda tudo sobre isso aqui.)

Para todas aquelas empresas que se saíram bem apenas durante o boom, de onde virão seus lucros agora?  Por que deveriam os consumidores - que agora estão incertos em relação a seus empregos - sair pegando empréstimos e gastando como se ainda estivéssemos em 2005?

Os administradores dos fundos de investimento estão convencidos de que os bons tempos voltaram para as ações, mesmo com a maioria dos economistas prevendo uma recuperação lenta, débil e prolongada.  Já os outros preveem mais recessão.

CONCLUSÃO

Estamos no meio de um desastre.  A economia ainda está no chão.  Crescimento econômico requer capital, mas o governo americano está absorvendo toda a poupança.  E o sistema bancário não está fornecendo os fundos necessários para as empresas investirem.

O desemprego está em ascensão.  As execuções hipotecárias continuam.  O economista sênior da agência de risco Moody's testemunhou perante o Comitê de Finanças do Senado americano em 21 de julho, e disse que as perdas de US$1,2 trilhão sofridas pelo sistema financeiro até o momento serão seguidas por outras perdas de mais US$1,4 trilhão.  Ele também disse que quase 1.000 bancos americanos correm o risco de quebrar.  Ninguém prestou atenção.

Há uma discrepância entre as análises que os investidores estão fazendo da economia e as análises dos empreendedores.  Estes continuam demitindo em massa.

Empreendedores obtêm lucro quando preveem corretamente as demandas futuras dos consumidores.  Mas consumidores desempregados não são fonte de lucro.


Sobre o autor

Gary North

é Ph.D. em história, ex-membro adjunto do Mises Institute, e autor de vários livros sobre economia, ética, história e cristianismo. Visite http://www.garynorth.com

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