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Economia

O encarecimento dos alimentos

24/01/2011

O encarecimento dos alimentos

Qualquer que seja o ponto de vista adotado, parece que o mundo está nos estágios iniciais de um grande ajuste ascendente nos preços dos alimentos.  Essa importante tendência macroeconômica provavelmente irá nortear as políticas econômicas e as perspectivas de investimento para os anos vindouros.  Embora os especialistas convencionais gostem de dar ênfase a fenômenos cíclicos, como a meteorologia, a verdadeira força por trás desse encarecimento dos alimentos é secular.  Os EUA estão liderando o mundo em uma pandemia de inflação monetária que está ajudando a fazer com que os preços das commodities, em particular dos alimentos, disparem vertiginosamente por todo o mundo.

A excessiva criação de dinheiro engendrada pelo Banco Central americano está atualmente sendo intensificada pela equivocada política chinesa de atrelar sua moeda ao dólar.  À medida que os EUA vão desvalorizando sua moeda por meio da criação excessiva de dólares, a China é obrigada a fazer o mesmo com sua moeda.  Para manter a taxa de câmbio constante, a China tem de adotar a mesma política monetária dos Estados Unidos.

Apenas no quarto trimestre de 2010, as reservas internacionais da China cresceram espantosos US$199 bilhões, indo para um total de US$ 2,85 trilhões.  O aumento foi muito maior do que aquele esperado pelos economistas, e sugere que a China está imprimindo uma quantia aproximada de 2 bilhões de renminbis [moeda oficial da China; o yuan é a unidade básica] por dia para poder comprar essa enxurrada de dólares e, com isso, conseguir manter a âncora cambial.  O grande problema é que a China, com sua economia em expansão, está adotando a política monetária de uma economia em recessão.  Trata-se de uma receita perfeita para a inflação de preços.

E não é apenas a China que está mantendo uma âncora cambial.  Vários outros países também intervêm no mercado de câmbio quando sentem que sua moeda apreciou-se muito em relação ao dólar.

Por exemplo, a moeda chilena apreçou-se 17% em relação ao dólar em apenas 7 meses durante 2010.  A valorização da moeda chilena ressaltou a condição do país como uma história de sucesso entre os mercados emergentes.  Porém, essa condição acabou abruptamente há duas semanas, quando o Banco Central do Chile prometeu intervir no mercado de câmbio com o intuito de aumentar suas reservas internacionais em US$12 bilhões ao longo de 2011.  Após o anúncio, o peso chileno previsivelmente desvalorizou-se em relação ao dólar e provocou uma venda maciça de ações chilenas.

A enganosa ideia por trás desta medida é a de que os governos, ao manterem suas moedas depreciadas em relação ao dólar, podem estimular as exportações e, com isso, manterem suas economias robustas e competitivas.  Porém, uma moeda que está se apreciando não necessariamente restringe as exportações.  Se aqueles países que atualmente estão mantendo âncoras cambiais resolvessem abandonar essa política, seus problemas com a inflação de preços locais poderiam diminuir.  Consequentemente, essa redução nos preços internos poderia contrabalançar até certo ponto o declinante poder de compra vivenciado pelos países importadores dos bens produzidos por esses países em questão.

Entretanto, muitos governos são incapazes de entender esse conceito econômico básico.  É como se as árvores não deixassem que toda a floresta fosse vista.  Ao apegarem-se teimosamente à crença de que uma moeda em processo de valorização é ruim para a economia, os líderes econômicos mundiais estão ajudando a desencadear uma onda inflacionária.

Caracteristicamente, os preços dos alimentos são mais voláteis do que os preços de bens finalizados.  Logo, é ali que essa nova onda inflacionária manifesta-se antecipadamente.  Infelizmente, isso significa que as pessoas mais pobres de todo o mundo, que gastam uma maior porcentagem de sua renda com alimentação, são justamente aquelas que sofrerão o maior impacto dessa política.  Uma rápida olhada em alguns movimentos alarmantes nos preços dos alimentos poderá dar uma noção do quão ruim as coisas estão ficando:

  • O açúcar encareceu 25% em 2010.
  • Milho e trigo encareceram respectivamente 53% e 49% em 2010.
  • A soja encareceu 28% em 2010.
  • Em dezembro, o Índice de Preços dos Alimentos, divulgado pela ONU, o qual engloba laticínios, carne, açúcar, cereais e oleaginosos, subiu alarmantes 4,2% apenas em relação ao mês anterior.  Com isso, o Índice superou o pico anterior, ocorrido em junho de 2008.
  • A inflação de preços dos alimentos na Índia subiu mais de 18%, o maior valor dos últimos doze meses, de acordo com dados divulgados em janeiro.  Essa ascensão nos preços dos alimentos e da energia convenceu muitos analistas de que o Banco Central da Índia irá elevar a taxa de juros ainda no final deste mês.
  • Na China, os preços dos alimentos subiram 11,7% de janeiro a novembro de 2010.  Como resposta, várias cidades implementaram controles de preços explícitos com o intuito de impedir que houvesse ainda mais aumentos nos preços dos alimentos.  Ademais, o governo central prometeu acabar com a especulação nos mercados de commodities do país.

É claro que essa depreciação global das moedas também faz com que os preços de outras commodities subam.  A produção de alimentos é um processo extremamente intenso no uso de energia, e o barril de petróleo a US$90 ajudou a pressionar os preços dos alimentos para novos níveis recordes.

O crescente custo dos fertilizantes, causados em grande parte pela política americana de subsídios ao etanol, também está acrescentando mais empuxo à subida dos preços dos alimentos.  De acordo com a EPA (agência de proteção ambiental dos EUA), estima-se que as vendas de etanol nos EUA irão aumentar para 13,9 bilhões de galões em 2011, sendo que em 2010 as vendas foram 12,95 bilhões.  A agência está exigindo que pelo menos 8% dos combustíveis vendidos em 2011 sejam advindos de fontes de energia renováveis.  Já o Congresso americano quer que a produção anual de etanol dos EUA aumente para 36 bilhões de galões até 2022.  Com aproximadamente 40% das safras de milho americanas sendo atualmente desviadas para a produção de etanol, a demanda por fertilizantes tende a aumentar substancialmente.

E os preços já estão em disparada.  A Mosaic, uma das maiores empresas produtoras de fertilizante dos EUA, vendeu fosfato de diamônio por US$461 a tonelada no quarto trimestre de 2010, um aumento de 61% em relação ao ano anterior.

É preciso reconhecer também que há outros fatores não inflacionários empurrando para o alto os preços dos alimentos em todo o mundo.  Por exemplo, condições climáticas ruins em grandes países exportadores em todo o mundo reduziram significativamente as colheitas, bem como as expectativas de colheitas futuas.  Além do tempo ruim na Austrália, na Europa, na América do Norte e na Argentina, a crescente demanda asiática está no núcleo desta disparada nos preços.  Espera-se que a China, por exemplo, compre 60% da soja comercializada globalmente em 2011/12, uma porcentagem que é o dobro daquela de quatro anos atrás.

Porém, a gênese da disparada nos custos dos alimentos jaz no Banco Central americano e em seu desejo de estimular a inflação nos EUA, na esperança de que isso irá reavivar sua economia.  Por outro lado, países como Índia e China já começaram a reverter o efeito inflacionário oriundo de sua âncora cambial ao dólar americano, e já estão elevando seus compulsórios e suas taxas básicas de juros.  Enquanto isso, nos EUA, Ben Bernanke segue dizendo que a inflação no país está baixa demais.  Caso essa paixão obsessiva por mais inflação não saia da cabeça do presidente do Fed, tumultos e badernas motivados pela carestia no preço dos alimentos podem gerar inquietação social nos EUA.

Enquanto isso não ocorre, investidores podem aliviar sua exposição ao recente aumento no custo dos alimentos investindo naquelas empresas cujo bom desempenho financeiro esteja ligado a um aumento nos preços dos alimentos.

Sobre o autor

Michael Pento

É economista sênior da Euro Pacific Capital, empresa de investimentos fundada e dirigida por Peter Schiff.

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