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Economia

A melopeia dos "juros civilizados"

19/03/2010

A melopeia dos "juros civilizados"

Instado pelos entrevistadores da Globonews, anteontem à noite, a resumir em poucas palavras a decisão de manter a taxa básica de juros em 8,75% ao ano, que o Copom acabara de tomar, aquele economista foi incisivo ao bradar: "queremos juros civilizados!"

Entendi o que ele quis dizer, mas confesso que me vieram imediatamente à mente duas constatações: a da formação quase que exclusivamente intervencionista oferecida por nossas faculdades de economia e a da conseqüente falta de conhecimento, por parte da quase totalidade dos economistas, dos ensinamentos da chamada Escola Austríaca de Economia. As duas comprovações representam, indiscutivelmente, uma pena, um verdadeiro desastre em termos de interpretação da economia do mundo real.

É evidente que todos nós queremos não apenas juros "civilizados", mas também saúde, educação, segurança, justiça, infra-estrutura e muitas outras coisas "civilizadas". Ele quis, certamente, dizer que a nossa taxa de juros, quando comparada às dos outros países, ainda está em um patamar elevado, ou seja, em termos reais, em torno de 4% ao ano, enquanto nos Estados Unidos, na União Européia e no Japão está bem próxima de zero ou, até, igual a zero.

Mas quem conhece minimamente a boa teoria econômica convencional - vale dizer, a Escola de Expectativas Racionais - sabe que os juros necessários para manter a inflação sob controle no Brasil precisam ser maiores do que na maioria dos países por causa das necessidades de financiamento de nosso setor público, de sua deterioração e, principalmente, das expectativas de que tal degeneração vai prosseguir no futuro, a ponto de constituir-se em verdadeira bomba relógio a ser desarmada pelo futuro presidente do Brasil.

E quem, além da boa teoria econômica convencional, conhece também a teoria monetária da Escola Austríaca, sabe mais: sabe que as políticas de juros próximos de zero que os bancos centrais mundiais vêm adotando a pretexto de combater a crise não só não vão acabar com a crise, como vão agravá-la; sabe que a crise foi provocada exatamente por políticas monetárias frouxas adotadas no passado, especialmente entre 2003 e 2006, em todo o mundo; e sabe ainda que as necessidades de financiamento assustadoramente crescentes dos governos, com relações dívida interna/PIB ultrapassando os 80%, também são bombas de efeito retardado que terão que ser desarmadas no futuro, se esses governos ditos "civilizados" não desejarem que a inflação surja rapidamente.

Ao invés de "civilizar" artificialmente as taxas de juros, os governos - no Brasil e no mundo - precisam "civilizar" os seus gastos e abandonar definitivamente o que se convencionou denominar de "política monetária", ou seja, precisam gastar o estritamente necessário e permitir que as taxas de juros, que nada mais representam do que preços cobrados pela renúncia ao consumo - isto é, prêmios ao esforço de poupança -, sejam determinadas exclusivamente pela oferta e pela demanda de "loanable funds".
Os "austríacos" já sabiam disso há mais de cem anos. Mas, infelizmente, o mundo acadêmico e o dos negócios, dominado pelo intervencionismo e pela política, talvez só perceba isto daqui a mais cem e resolva extinguir os bancos centrais...

Confesso que morro de rir intimamente quando, ao expor essas ideias em salas de aula e palestras, percebo os olhares de espanto que se entrecruzam incrédulos...

Sobre o autor

Ubiratan Jorge Iorio

Ubiratan Jorge Iorio é economista, professor associado da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) e é um dos nomes mais importantes da Escola Austríaca no Brasil.

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