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Economia

Bye-Bye PIGS - A crise fiscal do sul da Europa

11/02/2010

Bye-Bye PIGS - A crise fiscal do sul da Europa

O euro virou o centro das atenções recentemente.  Tudo por causa de uma crise fiscal na Grécia, e das promessas de crise em Portugal e Espanha.  A Itália também promete fazer parte do grupo.

E qual é o problema?  A Grécia está com um déficit orçamentário equivalente 12,7% do seu PIB.  O mundo dos investimentos considera um déficit dessa magnitude insustentável.  Há rumores de que uma moratória é inevitável.

A Espanha está com déficit orçamentário equivalente a 11,4% do seu PIB.  Isso é considerado uma ameaça para a estrutura financeira do país.  Há rumores de que uma moratória é inevitável.

Tudo indica que o governo dos EUA irá incorrer em um déficit de US$1,6 trilhão em uma economia cujo PIB é de US$14 trilhões.  Isso significa que o déficit será de aproximadamente 11,4% do PIB.  É claro que os economistas americanos veem isso com naturalidade.  Afinal, os EUA não são a Espanha.  O secretário do Tesouro Timothy Geithner garantiu, em um programa da rede ABC, no domingo, 8 de fevereiro, que não há qualquer possibilidade de que a classificação dos títulos da dívida do Tesouro americano venha a cair para baixo de AAA.  "Isso nunca irá acontecer neste país".  Aparentemente ele se esqueceu de dizer se isso poderia acontecer em outros países, cujas agências de classificação de crédito não são reguladas pelo governo americano.

O euro é oficialmente emitido pelo Banco Central Europeu.  Esse banco central emite a moeda que será utilizada por todas as 16 nações que fazem parte da União Monetária Europeia.  Os não membros são a Grã-Bretanha e a Suíça.

Esse sistema é hoje um aspecto da União Europeia, a qual existe desde 1º de dezembro de 2009, quando o Tratado de Lisboa entrou em vigor.  Entretanto as legislaturas de cada um dos estados membros de União Monetária Europeia possuem políticas fiscais independentes.  Elas não controlam a política monetária, mas controlam os impostos e os gastos.

Antes da vigência do euro, as questões monetárias sempre foram conduzidas por bancos centrais que representavam os governos centrais.  O euro é um experimento novo, em que apenas um banco central opera oficialmente em nome de 16 nações.

FRIEDMAN E O EURO

Em 2005, Milton Friedman comentou sobre o problema que o euro e a Europa Ocidental iriam enfrentar.

O euro será uma grande fonte de problemas, e não uma fonte de ajuda.  O euro não tem precedentes.  Até onde sei, nunca houve uma união monetária, que emitisse uma única moeda fiduciária, composta por estados independentes.

Já houve uniões que se baseavam no ouro ou na prata, mas não em uma moeda fiduciária - dinheiro que pode ser inflacionado - emitida por entidades politicamente independentes (New Perspectives, Spring 2005).

Sua admissão de que já houve uniões que se baseavam no ouro foi expressiva.  Na verdade foi algo um tanto involuntário, pois ele sempre rejeitou o padrão-ouro.  Ele construiu toda a sua reputação de teórico monetário fazendo oposição ao padrão-ouro.  Ele era um fiel discípulo do teórico americano que mais resolutamente se opôs ao padrão ouro: Irving Fisher.  As teorias monetárias de Friedman eram uma extensão das teorias de Fisher.

Fisher acreditava em um papel-moeda fiduciário e de curso forçado totalmente desconectado do ouro.  Friedman também.  Fisher achava que o principal objetivo de uma política monetária era manter um nível de preços constante.  Friedman também.  Fisher estava disposto a aceitar um banco central em principio, pois acreditava que bancos centrais são mais confiáveis do que legislaturas.  Friedman também.  Fisher nunca apresentou uma teoria sobre governo civil ou sobre economia que mostrasse por que poderíamos confiar aos bancos centrais o controle de uma moeda fiduciária e de curso forçado.  Friedman também não.

Friedman acreditava no livre mercado, mas não em um livre mercado de moedas.  Ele não acreditava em um padrão-ouro totalmente lastreado em moedas de ouro e cujo cumprimento fosse fiscalizado apenas por contratos.  Nesse ponto ele foi acompanhado pelos defensores do padrão-ouro tradicional, aquele que era gerido pelo governo e garantido pelo governo.  A pergunta sempre surge: como os cidadãos podem impedir que o governo não pratique fraudes com esse padrão-ouro?  O que irá protegê-los de uma decisão governamental que permita que os bancos comerciais e os bancos centrais confisquem o ouro dos correntistas, como fez o governo dos EUA em 1933?  Até hoje, nunca houve uma resposta além da usual: uma derrota nas próximas eleições.  Entretanto, como os confiscos normalmente ocorrem durante emergências - guerras, colapsos econômicos -, o público docilmente aceita a medida.  Sempre. 

Friedman fez essa crítica ao atual arranjo na Europa.  Em uma entrevista durante a fase da expansão econômica em 2003, ele disse isso:

O que irá fazer diferença é a produtividade dos diferentes países.  Mas pessoalmente, como eu digo, creio que a zona do euro irá passar por grandes dificuldades.  Isso porque os diferentes países têm diferentes idiomas, uma mobilidade limitada entre eles, e são afetados diferentemente por eventos externos.

Agora mesmo, por exemplo, Irlanda e Espanha estão indo muito bem, mas, por outro lado, Alemanha e França estão indo muito mal.  A questão é: "Uma mesma política monetária seria algo apropriado para todos eles?"  De um lado, Alemanha e França, e do outro, Irlanda e Espanha: é bastante duvidoso que seja.  É por isso que está havendo dificuldades crescentes dentro do grupo da zona do euro.  A Suécia, que ainda não entrou na União Monetária Europeia, rejeitou a proposta de entrar e irá manter sua própria moeda.

Ele perguntou aquilo que imaginou ser uma questão retórica, que dispensa respostas: "Uma mesma política monetária seria algo apropriado para todos eles?"  Ele respondeu que não.  Por quê?  Porque ele era um economista que sempre defendeu uma moeda fiduciária e de curso forçado.

E qual seria a resposta pró-livre mercado para essa pergunta? "Não deveria haver absolutamente nenhuma política monetária.  Deveria haver apenas a fiscalização e o cumprimento de contratos".

Friedman pressupunha que deveria sempre haver uma política econômica.  Mas isso gera outra pergunta: "Uma política econômica determinada por quem?"  Pelos vários parlamentos?  Pelos vários bancos centrais?  Uma combinação de ambos?  Ele se opunha a um banco central único.  Ele também se opunha ao ouro.  Ele se opunha a um parlamento europeu único.  E isso o colocava num dilema, pois restava apenas uma resposta: parlamentos concorrentes.  E isso é exatamente o que temos hoje.  E esse sistema não está funcionando.

Em 1999, ele escreveu uma carta para um economista.  Esse economista utilizou essa carta e outras fontes para escrever uma monografia sobre a visão que Friedman tinha do euro.  No dia 9 de março de 1999, Friedman escreveu:

Como você sabe, sou muito pessimista quanto ao euro e tenho muitas dúvidas sobre como ele vai funcionar.  Entretanto, estou menos pessimista hoje do já fui antes simplesmente porque eu nunca esperei que os vários países fossem apresentar o tipo de disciplina que era exigida como requerimento para aderir ao euro.  A convergência de taxas de inflação, de taxas de juros, e tudo o mais, foi maior e mais rápida do que eu imaginei.

Ainda assim, ele tinha a esperança de que o acordo não fosse adiante.  Em 17 de abril de 1999, ele escreveu:

O que mais me preocupa é que os membros do euro jogaram a chave fora.  Assim que o euro substituir fisicamente as diferentes moedas, não tem mais como sair desse arranjo.  Será uma enorme crise.  Como resultado, concordo veementemente com a sua visão de que o euro deveria ser abandonado antes de 1º de janeiro de 2002.

Ao mesmo tempo, são grandes as chances de que ele não seja abandonado.  Os defeitos do euro levarão algum tempo para aparecer; nada acontece muito rápido nessa área.  Há pouco menos de três anos até lá.  Mesmo que dificuldades produzidas pelo euro ocorram nesse período de três anos, é improvável que o sistema político reaja rápido o suficiente para cancelar o euro.  Como resultado, creio que seria muito desejável que houvesse algum pensamento metódico que planejasse alguma maneira de sair da camisa de força criada pelo euro após 2002.  O mínimo que a Itália deveria fazer é manter intactas as chapas utilizadas para produzir a lira.

Nenhum país saiu do arranjo.  Todos eles abdicaram sua soberania monetária e a entregaram para a União Monetária Europeia e para o Banco Central Europeu.

O DIA DO JULGAMENTO CHEGOU

A crise em Portugal, Itália, Grécia e Espanha - os PIGS - continua em expansão.  Como esses países entregaram sua política monetária para Banco Central Europeu, eles hoje estão impossibilitados de recorrer à inflação monetária como meio de contornar a crise fiscal.  Isso deixa as seguintes opções:

1. Moratória de algumas ou de todas as suas dívidas
2. Pagar uma taxa de juros maior por suas dívidas, conseguindo assim atrair investidores
3. Cortar gastos
4. Aumentar impostos
5. Sair da União Monetária Europeia
6. Sair da União Europeia
7. Esperar algum socorro do Banco Central Europeu
8. Opções 2-7

Há uma questão legal no que concerne uma saída da UE.  Esses países abdicaram sua soberania nacional em prol da Nova Europa.  Como eles podem reconquistá-la?  A que preço?

Se eles saírem, a UE terá de impor sanções.  Invasão militar está fora de cogitação.  Quer lutar contra a Espanha nos Pirineus?  Que tal lutar contra a Grécia nas montanhas?  Portanto, as sanções teriam de ser econômicas.  Uma poderosa seria a imposição de tarifas sobre esses países.  As fronteiras seriam fechadas.

Esses quatro países são governados por políticos que cooperativamente venderam a soberania de suas nações por uma barganha: acesso ao capital e aos mercados do norte da Europa.  É altamente improvável que haja essa secessão.

Então sobrou o quê?  A UE tem restrições sobre o tamanho dos déficits fiscais: 3% do PIB.  A dívida total não pode ultrapassar 60% do PIB.  Isso foi determinado em 1993 no Pacto de Estabilidade e Crescimento (adotado em 1997).  Em 2005, a regra foi reajustada a pedido da Alemanha e da França.  Nenhum país da UE honrou essas restrições.  Em um relatório, Finanças Públicas na UME, os autores descreveram os efeitos do socorro aos grandes bancos.

Os estados-membros deram auxílios aos seus setores bancários com medidas equivalentes a aproximadamente 13% do PIB e aprovaram fundos que valem outros 31% do PIB.  A maior fatia (7,8% do PIB em termos das medidas tomadas; 24,7% do PIB em termos de medidas aprovadas) é composta de garantias dadas a passivos bancários, que não afetam a dívida pública e os déficits, a menos que sejam utilizados.  O resto é relativo a auxílios dados a ativos debilitados, apoio de liquidez e injeções de capital (p.2).

Portanto, não há sansões transnacionais.  As regras estão sendo violadas.

Isso gera outro problema: a ameaça de uma moratória da dívida nacional por um dos PIGS.  A Grécia insiste que não fará nada disso.  Mas as taxas dos seguros contra um calote nacional da Grécia estão subindo.

O governo grego está encurralado.  Ele não pode se separar de UE.  Ele não pode inflacionar.  Portanto, ele tem de se decidir entre: moratória, taxas de juros mais altas, ou superávit orçamentário.  Esse último está fora de cogitação em qualquer nação europeia.  Portanto, restam apenas moratória ou juros maiores.  Creio que esse último é o mais provável.

Ou a Grécia pode esperar e ver se o Banco Central Europeu libera um pacote de resgate.  Mas se o BCE salvar a Grécia, estará mandando um sinal claro: acabou qualquer exigência de responsabilidade fiscal da parte dos PIGS.  Isso também vai acabar com qualquer esperança de que o euro venha a se tornar uma moeda fiduciária estável e confiável.

CONCLUSÃO

Os PIGS não têm qualquer capacidade política de cortar os custos de seus governos nacionais.  A mentalidade do assistencialismo e do estado de bem-estar é universal.  Os políticos se recusam a diminuir a gastança.  Elevar impostos vai debilitar ainda mais suas economias.  Os políticos podem tentar, mas haverá dolorosas repercussões econômicas.

Aumentar as taxas de juros também vai debilitar suas economias.

Tudo isso deixa apenas uma solução possível: chutar o balde.  Apenas prometer estabilidade e crescimento.  Apenas prometer que eles irão arrumar as finanças.

O estado de bem-estar é todo baseado em promessas.  Por todo o mundo, ele está no limiar da falência.  Mas os eleitores acreditam nas promessas, e os políticos não ousam contar a verdade.

Os PIGS não estão recebendo nenhuma ajuda do Banco Central Europeu.  Os mercados de capital estão elevando os juros.  Suas economias ainda estão declinando.

Há uma resposta: calote explícito do estado de bem-estar.  E eu me refiro a um calote geral, por todo o mundo.  "Lamentamos informar que, ao contrário das nossas expectativas, e das suas também, a Previdência e todos os programas de seguridade social estão completamente insolventes.  Todas as promessas feitas não mais poderão ser cumpridas.  O sistema fechou."  Simultaneamente, os bancos centrais teriam de se recusar a financiar mais dívidas, em qualquer lugar, por qualquer razão.

Isso não vai acontecer.

Juros maiores e recessão no sul da Europa são uma grande probabilidade.  Essa recessão irá se espalhar para além dessas fronteiras.

Sobre o autor

Gary North

é Ph.D. em história, ex-membro adjunto do Mises Institute, e autor de vários livros sobre economia, ética, história e cristianismo. Visite http://www.garynorth.com

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