A lambança no rodoanel
O fenômeno foi localizado e felizmente não causou vítimas fatais. Porém, os princípios por trás de tudo são lamentavelmente universais.
Como todos já sabem, o governo de São Paulo contratou um consórcio de empreiteiras para construir um anel viário que contorna toda a região metropolitana de São Paulo. Alguns trechos, como o Trecho Oeste, já foram inaugurados há alguns anos; outros ainda estão em construção. A função dessa via é interligar as Rodovias Bandeirantes, Anhanguera, Castelo Branco, Raposo Tavares e Régis Bittencourt.
Fatos
Na noite de sexta-feira, dia 13, três vigas de sustentação de um dos viadutos desse anel viário desabaram sobre a Rodovia Régis Bittencourt, atingindo três veículos e deixando três pessoas feridas.
O que se sabe até agora é que o Ministério Público Federal, com o auxílio do Tribunal de Contas da União, assinou um termo com as empreiteiras e com a Dersa (Desenvolvimento Rodoviário S.A.), estatal que gerencia a construção do Rodoanel, para limitar em R$ 264 milhões os gastos extras com as obras do anel viário.
Porém é sabido que, ainda em agosto, o governo do Estado de São Paulo anunciou que gastaria R$ 500 milhões extras com a obra. Ou seja, após a assinatura desse termo, foi vetado um gasto adicional de mais R$ 200 milhões.
Esses são os fatos conhecidos até o momento. Observe que, até aí,
só vimos entidades políticas e empreiteiras aliadas envolvidas na
situação.
As causas específicas do acidente serão desvendadas por engenheiros, mas já sabemos de antemão quais as causas fundamentais da lambança: ausência de propriedade privada e de mercado - característica essa típica das Parcerias Público-Privadas.
O raciocínio é tristemente linear:
1) As obras têm finalidade política e são gerenciadas por órgãos políticos. Elas precisam estar concluídas antes das eleições.
2) Não há propriedade privada. As empreiteiras estão ali apenas para receber o dinheiro dado pelo governo e entregar a obra finalizada dentro do prazo especificado. Elas não vão gerir o Rodoanel após sua finalização. Logo, elas não têm interesse em sua qualidade e robustez.
3) Da mesma forma, elas não têm autonomia para decidir seus custos, uma vez que não trabalham com capital próprio e nem com empréstimos. Elas simplesmente recebem dinheiro do governo e precisam "se virar" com aquela quantia.
4) Isso significa que as empreiteiras têm de satisfazer o estado e não o consumidor do seu produto final - que, num genuíno livre mercado, é quem realmente manda.
5) Não há mecanismos de mercado para alocar os recursos de modo eficiente. O governo decide quem vai fazer a obra, como ela será feita e em que prazo. O monopólio fica então estabelecido. Eventuais empresas que porventura quisessem construir um Rodoanel por conta própria, sem utilizar um único centavo público, e que, por isso, pudessem cobrar de pedágio o valor que quisessem, estão rematadamente proibidas de incorrer em tal empreendimento. O estado não deixa.
6) Caso houvesse essa liberdade de empreendimento, a empresa que construísse a obra viária seria também a dona dela. Nesse cenário, não é desarrazoado imaginar que ela teria total interesse na qualidade e durabilidade do produto, pois esse arranjo seria o que menos lhe traria custos de longo prazo (não seria inteligente utilizar vigas e asfalto de baixa qualidade, pois as despesas com reposição e indenização por acidente não compensariam a economia inicial de custos).
Portanto, antes que qualquer laudo técnico esteja pronto, o IMB já tem a resposta para as causas do problema, vale repetir: ausência de propriedade privada e ausência de mercado.
Compreendendo bem esses detalhes, chega até a ser surpreendente que algumas PPPs funcionem.
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