Esse site usa cookies e dados pessoais de acordo com os nossos Termos de Uso e Política de Privacidade e, ao continuar navegando neste site, você concorda com suas condições.

< Artigos

Direito

A teoria de John Rawls, uma péssima ideia

25/09/2025

A teoria de John Rawls, uma péssima ideia

A teoria de justiça de Rawls é um convite ao caos social

Após cinco décadas da publicação da obra "Uma Teoria da Justiça" ("TJ"), a influência de John Rawls permanece, lamentavelmente, incontestável, tanto em filosofia política como no Direito.

Rawls sugere um ordenamento jurídico (a "estrutura básica") que suprime ou relativiza o direito de propriedade, baluarte da civilização ocidental. Para muitos, a ausência da propriedade privada produtiva entre os esparsos direitos fundamentais desprestigia seu conceito de "justiça como fairness".

Rawls adota linguagem e terminologia vagas e imprecisas. Sua ambiguidade permite que adeptos de distintas filosofias políticas a considerem compatível com a sua própria, principalmente se interpretada com excesso de boa vontade.

"TJ" é concebida como alternativa ao utilitarismo. Rawls procurou desbancar a tese de que a sociedade deve procurar maximizar a prosperidade geral (ou outra forma de "utilidade" agregada).

De fato, o utilitarismo falha ao privilegiar a maioria mesmo quando esta viola os direitos fundamentais da minoria. Fracassa também ao presumir que a democracia (votos em representantes) constitua método adequado para aglutinar as preferências dos indivíduos em uma certa "vontade da maioria", como demonstra o Teorema da Impossibilidade de Arrow.

Porém, em lugar de se limitar a criticar o utilitarismo, Rawls decidiu rasgar os parâmetros milenares de justiça (por exemplo, "dar a cada um o que lhe cabe") e começar do zero. Adotou o construtivismo e fundou a sua teoria da justiça a partir de um experimento mental.

Rawls concebeu uma assembleia de indivíduos desumanizados que decretará o que é a justiça. Estes ignoram sua classe social ou que bens possuem; desconhecem sua inteligência, gênero ou personalidade; não sabem o que é o certo ou errado, bem ou mal; não têm metas de vida, nem conhecem sua genética, seus pais, a cultura em que vivem. Mas são racionais, não têm inveja de nada e conhecem as leis da política, da ciência econômica e da psicologia. Essa assembleia, segundo Rawls, racionalmente decidirá adotar as três regras abaixo, que estabelecem uma repartição de bens de caráter igualitário. A ideia é que egoisticamente decidirão evitar o risco de ficar por baixo na sociedade, e por isso adotarão uma extrema aversão a risco.

Em primeiro lugar, decidirão por assegurar o voto, a livre expressão e a inviolabilidade de pessoa contra opressões e prisões arbitrárias (mas não garantirão a propriedade produtiva nem a livre associação). Em seguida, exigirão que toda e qualquer riqueza, influência ou poder não igualitários possam ser eliminados pelo Estado (por serem oportunidades inerentemente injustas).

Finalmente, estabelecerão que toda e qualquer diferença de renda ou patrimônio alcançado por um indivíduo por meio da cooperação social só será legitimada se ficar demonstrado que traz benefícios aos menos favorecidos.

O pressuposto de Rawls é que ninguém merece a sorte (ou azar) de seu ponto de partida social e biológico. Ninguém merece, alega, sua genética, seus talentos, sua motivação para crescer, os pais que teve, ter nascido onde nasceu, ter tido certas oportunidades. Portanto, tampouco necessariamente merecemos o produto de nossos esforços, que dependem dessas contingências e talentos imerecidos. Pela natureza arbitrária dessas contingências, é preciso haver uma forçada equalização social.

Rawls se vale da falácia do "petitio principii", ou seja, estabelece seu experimento mental de forma a garantir que resulte em uma repartição igualitária, de acordo com seu pressuposto de que qualquer diferença inicial entre indivíduos é injusta. O experimento é encomendado para suprimir a propriedade, e por isso perde significado.

Rawls é o caos. E no Brasil há quem goste.

 

A função social da riqueza

Em um ambiente liberal, lucros acumulados pelo empreendedor são uma fração do enorme valor gerado aos demais

John Rawls, em Teoria de Justiça (1971), se contrapõe ao utilitarismo, constrói princípios inéditos de justiça, e chega a conclusões indefensáveis e socialmente instáveis, como argumentei nesta coluna na semana passada.

Hoje sigo no assunto para ilustrar que o libertarianismo é uma alternativa não apenas mais justa, mas especialmente mais eficaz, em especial aos menos favorecidos.

A solução igualitária e construtivista de Rawls implicaria uma máquina estatal de contínua redistribuição coercitiva da propriedade privada. Ele afirma defender o status moral de cada indivíduo, mas enfraquece sua posição ao deixar de assegurar a propriedade e a livre associação, aspectos fundamentais de nossa individualidade, daquilo que nos torna humanos. Por exemplo, o direito básico de fundar um pequeno negócio, de contratar e ser contratado no mercado de trabalho em termos mutuamente aceitos, ou mesmo de possuir meios de produção triviais (como um computador ou uma van).

A história desconhece qualquer ordem social que tenha respeitado direitos políticos e individuais sem assegurar a propriedade privada. Como dizia Cícero há 2.000 anos, "não há nada tão absurdo que algum filósofo já não tenha defendido".

Durante sua carreira, Rawls evitou endereçar a filosofia política do libertarianismo. Esta, entre as demais liberdades individuais, reconhece a propriedade privada, que por sua vez é gerada a partir dos talentos, paixões e trabalho.

Robert Nozick, filósofo do libertarianismo deontológico, tira Rawls do conforto em Anarquia, Estado e Utopia (1974). Sustenta que qualquer padrão de distribuição da renda, riqueza ou bens entre indivíduos, não importa quão desigual, é justa desde que derivada de meios legítimos, por exemplo trocas voluntárias com terceiros.

Segundo o libertarianismo deontológico, somos donos de nós mesmos e, por extensão, titulares daquilo que resulta de nosso trabalho e de nossas trocas voluntárias. O esbulho da propriedade por terceiros é, portanto, ilegítimo. Para os libertários, o Estado possui legitimidade apenas ao proteger os cidadãos contra agressões (ou fraude) à pessoa, liberdade e propriedade. Para os libertários anarcocapitalistas, mais estritos, o Estado age de forma legítima apenas se o serviço estatal em questão ocorrer em bases voluntárias e contratuais.

Rawls acreditava que não havia relação entre os mercados e a propriedade, e que, para a formação de preços, tanto fazia o socialismo ou o mercado. Tampouco se ocupou com as precondições para o aumento da oferta de educação, saúde, e outros produtos e serviços voltados a aprimorar as oportunidades e a renda dos mais pobres. Coalho, só olhava a demanda.

Em seu paradigma de contínua redistribuição com altos impostos, haveria muito menos acumulação de poupança, investimento, inovação, e empreendedorismo do que em um ambiente de proteção à propriedade privada e liberdade de contratação e associação. E por extensão, haveria menos oportunidades e prosperidade para os mais precarizados.

O período desde 1800 – denominado pela economista Deirdre McCloskey como "O Grande Enriquecimento" –, multiplicou a renda média de países mais liberais entre dez e 20 vezes, com melhoria ainda mais acentuada dos mais pobres, que na média possuem padrão de vida similar ou superior ao dos nobres de então. Nem Rawls nem Marx compreenderam que, em um ambiente liberal, os lucros e riqueza acumulados pelo empreendedor e pelo provedor de capital representam apenas uma fração do enorme valor gerado aos demais.

Para o libertarianismo consequencialista, portanto, a ciência econômica e a história salientam o motivo mais pertinente para favorecer mercados mais livres, com proteção à propriedade privada: a prosperidade dos menos favorecidos.

_____________________________________________

Nota: as visões expressas no artigo não são necessariamente aquelas do Instituto Mises Brasil.

Sobre o autor

Helio Beltrão

Helio Beltrão é o presidente do Instituto Mises Brasil.

Comentários (0)

Deixe seu comentário

Há campos obrigatórios a serem preenchidos!