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Filosofia

A filosofia confusa de Herbert Marcuse

Uma resenha do livro de Jacob McNulty

24/07/2025

A filosofia confusa de Herbert Marcuse

Uma resenha do livro de Jacob McNulty

Nota da edição:

O artigo a seguir é uma resenha do livro Marcuse do autor Jacob McNulty, escrita pelo filósofo libertário David Gordon. Além de fazer a análise do livro, o autor do artigo também traz informações importantes sobre a filosofia de Herbert Marcuse e da Escola de Frankfurt como um todo.

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Jacob McNulty leciona filosofia na Universidade de Yale, e é como filósofo que ele aborda Herbert Marcuse e a Escola de Frankfurt, da qual Marcuse foi integrante. McNulty argumenta que, embora Marcuse seja frequentemente visto hoje como um divulgador, ao menos em comparação com Theodor Adorno, ele foi, na verdade, um pensador significativo, com ideias interessantes e valiosas sobre epistemologia, metafísica, filosofia da ciência, ética e estética. Nesse objetivo, McNulty em grande parte é bem-sucedido, ao menos se considerarmos que um filósofo deve ser julgado pelas possibilidades que ele propõe, e não apenas pelo rigor de seus argumentos, especialmente se tomarmos “rigor” no sentido da filosofia analítica contemporânea.

No que segue, estarei mais preocupado com os temas políticos e econômicos abordados por Marcuse do que com a maioria das áreas mais abstrusas mencionadas acima. No entanto, um tema que permeia o pensamento de Marcuse está presente em toda a sua obra: o contraste entre idealismo e positivismo. Idealistas sustentam que os seres humanos constroem o mundo, enquanto os positivistas aceitam o mundo tal como ele é. De fato, quando li pela primeira vez Reason and Revolution: Hegel and the Rise of Social Theory (1941) (Razão e Revolução: Hegel e o Advento da Teoria Social, em tradução livre), de Marcuse, há muitas décadas, fiquei impressionado com a frequência com que ele fala em “pensamento negativo”. Para construir o mundo, é preciso antes negá-lo, e McNulty, que é autor de Hegel’s Logic and Metaphysics (2023) (A Lógica e a Metafísica de Hegel, em tradução livre), expõe de maneira competente o uso que Marcuse faz de temas hegelianos nesse contexto.

Mas não é qualquer construção idealista do mundo que interessava a Marcuse. O que lhe importava, na verdade, era a tentativa de fazê-lo por meio dos marxistas que buscavam estabelecer o socialismo. O compromisso de Marcuse com o socialismo marxista jamais vacilou ao longo de sua longa vida, embora ele tenha abandonado a visão de Marx de que o proletariado industrial promoveria essa transformação monumental. Para ele, os trabalhadores estavam demasiado enraizados em categorias convencionais para conseguir derrubar o capitalismo por conta própria, e precisavam da orientação de intelectuais revolucionários, em especial dos membros da Escola de Frankfurt, para conduzi-los à realização socialista.

Surge naturalmente a pergunta: qual é a natureza do socialismo, tal como concebido por Marcuse? Como ele propõe superar as objeções que Ludwig von Mises levantou quanto à sua viabilidade? Mas aqueles que procuram respostas para essas questões não as encontrarão:

“Embora Marcuse reflita sobre as questões a partir de uma perspectiva socialista, ele não tenta defender os pressupostos mais básicos de sua visão socialista contra objeções vindas de quem não compartilha dela ou de quem ocupa posições radicalmente opostas (libertários, capitalistas de livre mercado e até igualitaristas liberais)”.

De fato, há muito pouco no “socialismo” de Marcuse além da derrubada do capitalismo, e é justamente aí que ele se mantém fiel ao seu pensamento negativo. Uma vez desmontado o capitalismo, possibilidades maravilhosas se abrem no horizonte. Freud nos ensinou que a sociedade se sustenta sobre a repressão de nossos impulsos de morte e destruição, mas cometeu o erro de considerar que esse nível de repressão seria uma característica permanente da civilização. Com o fim do capitalismo, os corpos humanos se tornarão erotizados e a “perversidade polimorfa” se espalhará livremente, encerrando assim a “repressão excedente”, embora McNulty se esforce para garantir que isso não é a Saturnália que pode parecer à primeira vista.

Para reforçar, por mais inacreditável que isso possa parecer, Marcuse não acha necessário demonstrar como o argumento do cálculo econômico de Mises poderia ser refutado. Nós, pensadores negativos, afirma ele, superamos essas expressões obscuras do positivismo, como a teoria econômica antimarxista.

O capitalismo é o inimigo e, se não for eliminado, o fascismo logo se instalará. Na verdade, o fascismo nada mais é do que o capitalismo sob outro nome, e os monopólios empresariais continuam firmemente no controle. A análise de Mises sobre o fascismo como uma forma de socialismo não é abordada; em vez disso, Marcuse baseou-se quase inteiramente na descrição da economia nazista feita em Behemoth (1941), obra de seu colega da Escola de Frankfurt, Franz Neumann.

O fascismo, portanto, seria o capitalismo em seu horror despido, e para impedir sua ascensão, medidas drásticas são necessárias. Grupos fascistas não deveriam ter liberdade para expressar suas opiniões, e Marcuse estendeu essa proibição também a defensores de ideias que ele considerava insuficientemente progressistas:

“Marcuse insiste que não há motivo para que os progressistas tolerem tais ideias, e que devem agir contra elas, sejam essas ações legais ou não. Marcuse às vezes se expressava de forma mais cautelosa, mas receio que os defensores do livre mercado estariam entre aqueles que ele buscaria silenciar. Se os progressistas permitirem a circulação dessas ideias, estarão encorajando as pessoas a tentar melhorar as coisas dentro dos limites da sociedade existente, em vez de derrubá-la. Essa pseudoliberdade é o que Marcuse chamava de ‘tolerância repressiva’”.

Se você acha a linha de raciocínio de Marcuse confusa e difícil de acompanhar, o próprio Marcuse não discordaria. Na verdade, em nossa era atual, desordenada, clareza em excesso é algo negativo, pois leva à conformidade. Como conta seu amigo, o filósofo Robert Paul Wolff:

“Marcuse tinha um sotaque alemão bastante carregado, e eu não tinha certeza se tinha ouvido corretamente. ‘Você disse que, na Filosofia, a falta de clareza é uma virtude?’, perguntei. ‘Sim’, ele respondeu. Incrédulo, continuei: ‘Você está dizendo que, na Filosofia, é uma virtude não ser claro?’, insisti, tentando ser o mais claro possível. ‘Sim!’, disse ele, com um sorriso malicioso”.

Marcuse foi, sem dúvida, fiel a esse ensinamento, apesar dos esforços valentes de McNulty para nos ajudar a compreender suas ideias.

 

Este artigo foi originalmente publicado no Mises Institue.

 

Recomendações de leitura:

A Escola de Frankfurt, o marxismo cultural, e o politicamente correto como ferramenta de controle

Marxismo cultural é um paradoxo

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Nota: as visões expressas no artigo não são necessariamente aquelas do Instituto Mises Brasil.

Sobre o autor

David Gordon

É membro sênior do Mises Institute, analisa livros recém-lançados sobre economia, política, filosofia e direito para o periódico The Mises Review, publicado desde 1995 pelo Mises Institute.

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