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Economia

4 ocasiões em que os austríacos contrariaram o mainstream

A realidade os provou corretos

02/06/2025

4 ocasiões em que os austríacos contrariaram o mainstream

A realidade os provou corretos

Não é coincidência os austríacos realizarem análises muito mais precisas em comparação aos economistas convencionais.

O grande diferencial da Escola Austríaca em relação às demais correntes econômicas está em sua metodologia praxeológica, fundamentada a partir de axiomas auto-evidentes e lógica dedutiva, cujos teoremas são 100% derivados de forma lógica e explicados por relações causais, sem juízos de valor.

Em contraste, as escolas clássica, keynesiana e monetarista baseiam suas teorias predominantemente em observações empíricas, modelos estatísticos ou até mesmo em pressupostos normativos — aparentemente, mais influenciados por desejos políticos do que por uma compreensão coerente da realidade.

Essa diferença metodológica permitiu que os teóricos da Escola Austríaca se destacassem em suas previsões, uma vez que a teoria que embasa suas análises proporcionou uma compreensão muito mais próxima da realidade.

Em dezenas de casos na história, as previsões de teóricos mainstream - cuja opinião costuma ser a predominante no mercado e na mídia - foram contrariadas por teóricos austríacos, que traziam uma perspectiva antagônica, e a realidade deu razão aos austríacos.

Nesse artigo, vou abordar quatro casos emblemáticos em que teóricos da Escola Austríaca demonstraram superior capacidade analítica na identificação de relações de causa e efeito dos eventos econômicos, oferecendo previsões muito mais precisas do que aquelas feitas por outros teóricos.

 

1) A crise de 1929  

Em 1924, o Federal Reserve deu início a um ciclo de política monetária expansionista, com redução de juros e aumento da oferta de crédito, ao mesmo tempo em que flexibilizava a prática de reserva fracionária por parte dos bancos comerciais. Como resultado, a economia e o mercado de ações americanos passaram por um dos maiores booms especulativos da história.

Alguns dias antes do crash, Irving Fisher (economista desenvolvimentista), que era o economista mais conhecido nos EUA na época, deu a infame declaração: “As ações atingiram aquilo que parece ser um patamar estável e permanentemente alto” (16/10/1929).

John M. Keynes, que à época ainda não era amplamente conhecido, era um ávido investidor em sua pessoa física e gestor do fundo da Universidade de Cambridge. Entusiasta da atuação dos bancos centrais, Keynes acreditava no efeito positivo das políticas expansionistas que o Fed e o Bank of England estavam levando a cabo e estava operando alavancado no mercado. Com o crash de 1929, ele sofreu perdas severas, perdendo mais da metade do seu patrimônio pessoal e causando uma redução significativa no valor do King's College Fund.

 

Os austríacos

Em contraste, os economistas da Escola Austríaca observavam com grande preocupação as políticas fiscais e monetárias da década de 1920. Ludwig von Mises havia recusado uma alta posição no banco central austríaco em meados da década de 1920, pois não queria ser cúmplice das políticas monetárias do país, cujos riscos ele já vinha alertando publicamente.

Friedrich Hayek, então à frente do Instituto Austríaco de Pesquisa de Ciclos Econômicos, também demonstrava preocupação com os efeitos das políticas expansionistas adotadas nos Estados Unidos. Em fevereiro de 1929, poucos meses antes do crash, ele alertou que o boom americano era insustentável e que a euforia generalizada daria lugar a um colapso iminente.

 

2) A crise de 2008

Com as subsequentes crise asiática (1997), crise russa (1998) e a bolha da internet (2000), o Federal Reserve, sob a gestão de Alan Greenspan - e, mais tarde, de Ben Bernanke, em 2006 -, reduziu drasticamente a taxa básica de juros americana de 6,5 para 1%, seu menor nível da história. Em paralelo, o mercado imobiliário americano era impulsionado por políticas de juros artificialmente baixos e facilitados, sustentadas pelas agências patrocinadas pelo governo: Fannie Mae e Freddie Mac.

Peter Schiff, um proeminente gestor de investimentos americano e adepto da teoria austríaca, observou como os preços dos imóveis nos EUA estavam sendo artificialmente inflados pelos critérios flexíveis dos bancos comerciais ao realizar financiamentos imobiliários a taxas de juros estranhamente baixas, e que esse era um dos principais fatores para a incrível alta de preços que os EUA estavam atravessando.

Ao expor que o crescimento da economia americana era artificial e insustentável, Schiff passou a ser atacado e ridicularizado por nomes como Art Laffer, que disse em rede nacional em 2006: "Não vai haver recessão. Peter, você está sendo histérico!", e Ben Stein, que disse em 2007 à CNN: "Fannie e Freddie estão sólidas. O mercado está em pânico à toa."

Ben Bernanke, na época presidente do Fed, e Janet Yellen, presidente do Fed de San Francisco, em sua arrogância, chegaram a dizer publicamente:

“Embora a atividade especulativa tenha aumentado em algumas áreas, tais aumentos de preços (no mercado imobiliário) em nível nacional refletem majoritariamente nossos robustos fundamentos econômicos” - Bernanke (10/2005).

“Embora a atividade especulativa possa ter aumentado em alguns mercados imobiliários, neste momento há poucas evidências de que a situação represente um grande risco macroeconômico" - Yellen (11/2005).

Mark Thornton, economista do Mises Institute, fez um alerta ainda mais preciso sobre o cenário:

“Considerando-se o incentivo governamental a práticas negligentes e frouxas de concessão de empréstimos para a aquisição de imóveis, os preços dos imóveis poderão despencar no futuro, o que gerará grandes falências, inclusive as grandes empresas hipotecárias protegidas pelo governo, Fannie Mae e Freddie Mac, poderão ter de ser socorridas com o dinheiro dos pagadores de impostos" (04/2004).

 

3) O valor do ouro após o “Choque de Nixon” (1971)

Os austríacos, por compreenderem que não há capitalismo funcional sem uma moeda saudável, sempre foram defensores ferrenhos do sound money - uma moeda sólida, escassa, de valor estável e livre de manipulação política. Segundo a teoria austríaca, o meio de troca emerge espontaneamente em um processo de mercado, com base na preferência dos agentes econômicos. O ouro, por ser um ativo neutro, escasso, durável e universalmente aceito, acabou sendo naturalmente “escolhido” como principal meio de troca ao longo da história.

No entanto, ao longo do século XX, engenheiros sociais passaram a defender uma atuação mais ativa do estado na economia, não apenas como regulador, mas também como “gestor da economia” - praticando o que ficou eufemisticamente conhecido como “política monetária e fiscal”, advogando em favor de um sistema monetário 100% fiduciário, no qual o estado pode (e deve) criar moeda out of thin air como instrumento para, supostamente, favorecer o crescimento econômico, segundo seus modelos econométricos.

Keynes, um dos primeiros defensores de um sistema monetário 100% fiduciário, declarou, em 1930: “o padrão-ouro é uma relíquia bárbara, um sentimento mais adequado aos hábitos do século XIX do que às necessidades econômicas do século XX.”

Mesmo os monetaristas da Escola de Chicago, apesar de liberais, não defendiam uma moeda livre do controle estatal. Milton Friedman chegou a dizer nos anos 1960: “a defesa de um padrão baseado em commodities como o ouro se baseia na desconfiança da autoridade monetária. Compartilho dessa desconfiança, mas acredito que a melhor solução é impor regras, e não depender de commodities.”

Paul Samuelson, economista keynesiano e Nobel de economia, alegava que “o fim do padrão-ouro permitiria liberdade monetária e política para os governos, e que o valor do ouro tenderia a se limitar ao que o mercado industrial demandasse.” (1969). (Esse foi o mesmo economista que disse, alguns meses antes da queda do Muro de Berlim e dois anos antes do fim da União Soviética, que “a economia planificada pode não apenas funcionar, como também prosperar”).

 

Os austríacos

Embora tenham “perdido” a batalha institucional quando Nixon deu o último golpe no padrão-ouro, em 1971, os austríacos sabiam que o fim do lastro monetário levaria a níveis de inflação elevados, e que o ouro, longe de se tornar obsoleto, tenderia a se valorizaria ainda mais.

Harry Browne, um libertário convicto e adepto das teorias da Escola Austríaca, desenvolveu no final dos anos 1960 sua famosa estratégia de investimentos, conhecida como “Portfólio Permanente”, defendendo uma alocação de 25% dos investimentos em ouro. Durante a década de 1970 - marcada por estagflação e fraco desempenho dos mercados financeiros -, o ouro se valorizou incríveis de 2.300% em dólares, assegurando retornos extraordinários para Browne e seus seguidores.

Murray Rothbard, em O Que o Governo Fez com o Nosso Dinheiro? (1963), explica como o ouro emergiu como meio de troca universal e se tornou o lastro monetário através de um processo de mercado. Anos depois, ao comentar o colapso do padrão-ouro, ele escreveu:

"Como qualquer economista austríaco competente preveria, as corridas ao ouro dos EUA não diminuíram (antes de 1971), mas, ao contrário, se intensificaram. O uso do ouro como meio de troca emergiu em um processo de mercado e seu uso como lastro era o que garantia o valor das moedas nacionais, não o contrário."

 

4) Sobre o sucesso do Bitcoin

Como o próprio whitepaper do Bitcoin deixa claro, ele é uma resposta direta à degradação monetária causada pelo sistema monetário fiduciário. Idealizado por Satoshi Nakamoto em 2008, o Bitcoin surgiu como uma forma de dinheiro digital descentralizada, imune à inflação arbitrária, confiscos e manipulação estatal.

Não foi coincidência que os primeiros adeptos do Bitcoin foram libertários convictos e adeptos da teoria austríaca, que o receberam com entusiasmo, enquanto o mainstream reagiu com ceticismo e deboche. Esse contraste decorre de duas visões diametralmente opostas sobre a natureza do dinheiro e o papel do sistema monetário.

Da mesma forma que muitos austríacos se tornaram entusiastas do Bitcoin, muitos conheceram as teorias austro-libertárias por meio do Bitcoin, reconhecendo a convergência conceitual entre ambos em diversos aspectos.

Hayek, em 1984, disse em entrevista: “Eu não acredito que tenhamos novamente um bom dinheiro antes de tirarmos isso das mãos do governo. Ou, dito de outra forma, o que podemos fazer é de alguma maneira, por uma via indireta, introduzir algo que eles não possam parar.”

Certamente, o que Hayek sonhou, Satoshi Nakamoto construiu.

Jeffrey Tucker (libertário americano) escreveu pela primeira vez sobre o Bitcoin em 2011, afirmando seu entusiasmo pela cripto. Lew Rockwell e o Mises Institute passaram a publicar sobre Bitcoin em 2012. No Brasil, Daniel Fraga, Fernando Ulrich e outros libertários foram pioneiros na divulgação do Bitcoin, bem antes de sua popularização.

E o Bitcoin se mostrou tão antifrágil que, mesmo sob críticas ferozes - vindas de autoridades monetárias, ganhadores do prêmio Nobel de economia, banqueiros, grandes gurus do mercado financeiro e até de alguns austríacos mais dogmáticos - sobreviveu, cresceu e hoje se consolidou como um ativo reconhecido até pelo mainstream.

A seguir, listo algumas das críticas mais emblemáticas - e hoje, cômicas - ao Bitcoin:

Paul Krugman (economista keynesiano Nobel): "O Bitcoin é maligno” (2013); “É um esquema Ponzi que colapsará quando os entusiastas perderem o interesse” (2017); Chegou a se contradizer, afirmando que o Bitcoin não possui “valor fundamental” (2015) - ao mesmo tempo em que defende a moeda fiduciária.

Joseph Stiglitz (economista keynesiano Nobel): “O Bitcoin deveria ser banido. Ele não serve a nenhuma função socialmente útil… ele é apenas uma forma de especulação perigosa e sem qualquer regulação." (2017)

Jamie Dimon (CEO do JP Morgan): “O Bitcoin é uma fraude.” (2017)

Kenneth Rogoff (ex-economista-chefe do FMI): “O Bitcoin vai cair para US$ 100 dentro de 10 anos.” (2018)

Warren Buffett e Charlie Munger (ex-sócios majoritários da Berkshire Hathaway): “Criptomoedas são veneno de rato.” (2023)

Christine Lagarde (presidente do Banco Central Europeu): “Criptoativos são especulativos, muito arriscados e não valem nada. Eles precisam ser regulados para proteger as pessoas desinformadas.” (2022)

Eugene Fama (economista chicaguista Nobel): “O Bitcoin vai chegar a zero em 10 anos” (2025).

Peter Schiff: “Bitcoin é apenas um ativo especulativo. Vai cair para zero” (2013); “O Bitcoin é o novo esquema de pirâmide. A bolha está maior do que nunca.” (2020)

 

Conclusão

Espero que este artigo tenha contribuído para mostrar como a Escola Austríaca pode ser uma aliada valiosa na análise e interpretação dos eventos econômicos e políticos, oferecendo uma estrutura teórica sólida para compreender as relações de causa e efeito da realidade.

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Nota: as visões expressas no artigo não são necessariamente aquelas do Instituto Mises Brasil.

Sobre o autor

Arthur Falcão

É planejador financeiro, especialista em Escola Austríaca de Economia. É aluno do Mises Academy.

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