Esse site usa cookies e dados pessoais de acordo com os nossos Termos de Uso e Política de Privacidade e, ao continuar navegando neste site, você concorda com suas condições.

< Artigos

Economia

Como Keynes se equivocou em relação a Say

E por que isso é importante atualmente

19/05/2025

Como Keynes se equivocou em relação a Say

E por que isso é importante atualmente

As ideias dos economistas, estejam certas ou erradas, são muitas vezes mais influentes do que se imagina. Basta considerar as declarações do presidente americano Trump sobre os supostos poderes mágicos das tarifas ou o discurso da presidente mexicana Sheinbaum a respeito da industrialização por substituição de importações. Nossos líderes, mesmo quando se consideram inteligentes e pensadores independentes, frequentemente são prisioneiros das ideias de economistas do passado.

Essa noção é inspirada na reflexão de John Maynard Keynes nas notas finais de sua Teoria Geral. Durante décadas, Keynes foi o "senhor de escravos" da maioria dos líderes mundiais. Suas ideias — tanto as corretas quanto as equivocadas — moldaram a maneira como as pessoas compreendem a economia, mesmo quando essas ideias derivavam de equívocos do próprio Keynes.

Existe uma vasta literatura em economia, cursos de macroeconomia e estudos sobre a história do pensamento econômico que descartam rapidamente as conclusões associadas às ideias da Escola Clássica da economia.

A Lei de Say é uma das principais vítimas dessas interpretações apressadas das ideias dos clássicos. Durante décadas, os estudantes aprenderam que os economistas clássicos acreditavam que “a oferta cria sua própria demanda”. Além disso, costuma-se afirmar que, segundo Jean-Baptiste Say, o mercado sempre opera em concorrência perfeita ou como se estivesse em um estado de equilíbrio constante. Essa suposta lei é frequentemente citada como um pilar de um pensamento econômico ultrapassado, uma alegação que Keynes usou de forma célebre para argumentar contra os princípios do livre mercado em sua Teoria Geral.

A frase “a oferta cria sua própria demanda” não foi cunhada por Say, mas pelo próprio Keynes, que não apenas a interpretou mal e a apresentou de forma distorcida, como também preparou o terreno para décadas de políticas econômicas que ignoraram completamente os princípios fundamentais da ciência econômica.

O que Say realmente afirmou em seu Tratado de Economia Política foi que a produção cria os meios para o consumo, o que implica que a única maneira de adquirir os recursos necessários para comprar bens é vendendo bens valiosos a outras pessoas. Em outras palavras, a troca é uma via de mão dupla: você produz e/ou vende bens valorizados por outros para obter dinheiro e, assim, comprar os bens que deseja.

Isso está muito distante da caricatura keynesiana. Say não era ingênuo, ele compreendia que existem descompassos e que o mercado é um processo que busca continuamente o equilíbrio, embora nunca o alcance plenamente, o que permite inovação, criação e geração de nova riqueza. O objetivo de Keynes era retratar a economia clássica como uma crença dogmática na autorregulação, para então promover suas próprias soluções que envolviam um papel ativo do estado na economia.

A primeira aparição conhecida dessa formulação da lei no mundo econômico ocorreu em 1807, não nas obras de Say, mas nos escritos de James Mill. Anos mais tarde, seu filho, John Stuart Mill, publicou uma versão dela em seus Princípios de Economia. Foi aí que Keynes a encontrou e começou a manipulá-la até que a frase “a oferta cria sua própria demanda” apareceu em seus escritos pela primeira vez, em 1933, nas notas de uma conferência que ele ditou. A partir daí, Keynes repetiu a expressão com tanta frequência que ela se popularizou entre seus alunos. Não demorou para que o mito crescesse tanto que Oskar Lange, outra figura proeminente nas ciências sociais, começou a repeti-lo em seus escritos como se fosse um fato, criticando Say por algo que Keynes afirmava que ele havia dito. Naturalmente, os objetivos de Lange e Keynes estavam alinhados — ambos defendiam um papel ampliado do governo na economia.

Você pode se perguntar: por que desenterrar uma antiga disputa acadêmica? Porque o mal-entendido em torno da Lei de Say ainda influencia as políticas econômicas atuais.

As ideias keynesianas dominaram o pensamento macroeconômico por décadas, frequentemente levando à formulação de políticas que priorizam o gasto público como uma solução universal para crises econômicas. Tomemos como exemplo a pandemia de covid. Governos ao redor do mundo implementaram pacotes massivos de estímulo para impulsionar a demanda, mas as rupturas nas cadeias de suprimento e a produção desalinhada deixaram os mercados com dificuldade de se adaptar. Os insights de Say nos lembram que a produção não é apenas um meio de satisfazer a demanda, é o que torna a demanda possível, em primeiro lugar.

Os desequilíbrios de mercado já eram algo previsto por Say. Para ele, essa equivalência entre o valor da oferta e da demanda não era automática, mas “a existência dessa renda depende de os produtos possuírem valor de troca, o que surge apenas do desejo que existe por essa produção na sociedade.” Enquanto os keynesianos promovem uma interpretação automatizada dos fenômenos econômicos, Say compreendia o lado humano da economia: é o consumidor quem impulsiona a atividade econômica por meio do sistema de preços, e o governo não tem lugar nessa equação.

Essa má interpretação da Lei de Say é um vício generalizado na compreensão das escolas clássicas de economia, e erradicá-lo é uma tarefa de extrema importância. O que Say disse é bastante claro, e já passou da hora de os “espíritos animais” entenderem isso.

 

Este texto foi originalmente publicado no Mises Institute.

 

Recomendações de leitura:

A verdadeira Lei de Say - e não a distorção keynesiana

Lord Keynes e a Lei de Say

_____________________________________________

Nota: as visões expressas no artigo não são necessariamente aquelas do Instituto Mises Brasil.

Sobre o autor

José Torra

É um economista mexicano e chefe de pesquisa da Caminos de la Libertad. Ele também é professor de economia e ética na Universidad de la Libertad, na Cidade do México. É coautor do livro Economic Freedom of North America, do Fraser Institute. Ele é o autor do Emprender México, um relatório anual sobre as dificuldades que as empresas enfrentam no México. Além disso, ele é presidente da Sociedad Tomás de Mercado e co-apresentador do Libertad Aquí y Ahora, o maior podcast voltado para a liberdade no mundo de língua espanhola.

Comentários (9)

Deixe seu comentário

Há campos obrigatórios a serem preenchidos!