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Filosofia

As ideias moldam o mundo: o legado filosófico de Mises

17/04/2025

As ideias moldam o mundo: o legado filosófico de Mises

No ensaio The Role of Doctrines in Human History, Ludwig von Mises mostra porque foi mais que um economista, foi também um filósofo do conhecimento e da história. Ele desenvolveu um amplo conhecimento sobre os processos sociais, que estão explicados em livros como Teoria e História e em outros diversos ensaios, como o acima citado.

E de Mises podemos não só extrair conhecimento sobre a natureza dos processos sociais, mas também uma estratégia para a difusão dos ideais da liberdade e, assim, tornar o mundo mais livre.

Para Mises, conforme também foi explicado por Salerno (1990 e 1993), os indivíduos são agentes construtores da história. Ele ressalta o papel da reflexão e da deliberação da ação humana, do comportamento consciente, de como indivíduos escolhem utilizando a sua subjetividade quais os seus fins e, a partir daí, os melhores meios para suas ações.

Mises nesse sentido se diferencia de Hayek. Enquanto Hayek defende a existência de dilatados processos temporais, conduzidos de forma inconsciente em que as pessoas aportam um grão de areia em uma grande praia, Mises explica que mesmo o desenvolvimento da família como a conhecemos modernamente é resultado de um processo de reflexão consciente dos indivíduos, que foram ao longo do tempo agindo, errando, aprendendo e moldando as famílias conforme viam os melhores resultados na sociedade.

Indivíduos desenvolvem doutrinas ao longo do tempo, que vão delimitar as suas escolhas. O processo de reflexão e de moldagem das expectativas que conduzem as nossas ações são resultado de um núcleo de conhecimento, uma teoria sobre a sociedade, que todos nós desenvolvemos, e que bem ou mal moldam as nossas decisões. Por exemplo, um empresário que tem uma visão mais otimista sobre o comportamento das pessoas tende a adotar um comportamento mais descentralizado, enquanto outro mais receoso com a benevolência da humanidade provavelmente adote um controle mais draconiano na sua empresa.

E a mesma dimensão que nos permite moldar as nossas ações e que levou à formação dessas instituições também nos leva a crenças coletivas, ou ideologias na explicação misesiana, que vão permear o desenvolvimento de uma sociedade. Guiam também como os indivíduos agem dentro dela, pois “regula”, de um modo orgânico, de que forma as interações acontecem.  Foi a partir da interpretação coletiva subjetiva que a sociedade desenvolveu os mercados de valores organizados, assim como surgiram as firmas.

Fatos sociais são naturalmente complexos. Envolvendo influências subjetivas e dependendo da significação humana, os fatos sociais tornam-se eventos que não são observáveis, mas sim interpretáveis, seguindo um modo de ver o mundo – como uma programação dinâmica que temos na nossa consciência. É baseado na nossa ideologia, ou seja, na formação subjetiva.

A filosofia da história misesiana tem grandes contribuições para o entendimento dos processos sociais, e curiosamente é uma parte infelizmente ainda pouco conhecida fora do ambiente austríaco. Através da compreensão que Mises tem da racionalidade empregada nos processos sociais, podemos compreender de que forma os indivíduos fazem uso da sua capacidade timológica para compreender padrões e modos de ação de diferentes grupos, identificando subjetivamente também possíveis tendências para o futuro, construindo expectativas e moldando seus planos de ação.

O ser humano em Mises é um ser consciente, mas ele não é um ser super-racional nem um alocador por excelência que toma decisões perfeitas. Ele é um ser de carne e osso, que vive e que reflete sobre a sua realidade, compreendendo os fenômenos sociais dentro das suas possibilidades, para que então molde suas expectativas e seus planos de ação.

Decisões humanas não são decisões de natureza engenheril. Homens não são máquinas pré-programadas que têm um nível ótimo de eficiência, mas sim seres que constantemente criam novo conhecimento conforme vivenciam fatos e usam a sua inteligência subjetiva para criar um emaranhado de conhecimento. Este emaranhado não é um mero conjunto ou soma de dados quantitativos, um estoque matematizável de dados, mas sim a composição de uma série de interações que alteram as nossas expectativas.

Mises colocou o indivíduo no centro da história, e ele foi intransigente na sua defesa. Não somente, ele também reconheceu o papel que o conhecimento e as doutrinas da sociedade exercem na influência da ação dos homens – estes fazem uso desse framework para moldar as suas expectativas e por consequência moldar as suas ações futuras.

Essas doutrinas não moldam de modo determinístico a ação dos homens, até mesmo porque elas são influenciadas pelo decorrer da história. Elas foram centrais para o desenvolvimento da humanidade. Foi a crença no homem enquanto ser produtivo e dotado de uma propensão natural a trocas que guiou o desenvolvimento de conceitos como a abertura comercial e a divisão do trabalho.

Libertários não se podem permitir sentar e esperar a queda do Estado. Por mais que este seja ineficiente por definição, não faltam conjuntos de ideias e doutrinas para justificar as ações estatais, mesmo as mais absurdas, como toda a carnificina vivida pelos escravos dos regimes socialistas no século XX.

Assim como ideais podem ser profícuos, eles podem ser nefastos. A disseminação de ideias erradas não só atrapalha o desenvolvimento como gera retrocesso. O Austro-Libertarianismo, mais que uma filosofia a ser praticada, é também uma verdade a ser difundida, até que possamos enfim viver em uma sociedade livre das correntes do poder estatal. 

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Nota: as visões expressas no artigo não são necessariamente aquelas do Instituto Mises Brasil.

Sobre o autor

Artur Ceolin

Doutorando em Economia na Universidad Rey Juan Carlos (URJC) e Fellow do Instituto Mises Brasil.

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