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Cortes de gastos não enfraquecerão a economia americana - vão fortalecê-la

19/03/2025

Cortes de gastos não enfraquecerão a economia americana - vão fortalecê-la

A projeção do modelo GDPNow do Federal Reserve Bank [Banco Central americano] de Atlanta para o crescimento do PIB real americano no primeiro trimestre de 2025 (Q1 2025) agora indica uma queda para -1,5%. Isso representa uma revisão significativa para baixo em relação à estimativa anterior de 2,3% em 19 de fevereiro de 2025.

Uma queda tão drástica é estranha. Como passamos de +2,3% para -1,5% em menos de um mês? Esse tipo de colapso em uma economia do tamanho da dos Estados Unidos é extremamente raro.

A reação imediata da mídia tem sido chamar isso de início de uma "recessão de Trump" e culpar as políticas do presidente Trump. Curiosamente, em 1º de junho de 2022, o modelo GDPNow do Fed de Atlanta estimava o crescimento do segundo trimestre de 2022 em +1,3%. Em 1º de julho de 2022, a projeção havia caído para -2,1%, uma mudança de 3,4 pontos percentuais em 30 dias. Como a mídia chamou isso? "Susto de crescimento". Algo semelhante aconteceu no terceiro trimestre de 2021. A estimativa caiu de 6,1% (30 de julho) para 2,3% (1º de outubro), uma queda de 3,8 pontos percentuais em dois meses.

Em 2022, o PIB real caiu por dois trimestres consecutivos sob a administração Biden. De acordo com o Bureau of Economic Analysis [Departamento de Análises Econômicas], o primeiro trimestre registrou uma queda de -1,6% na taxa anualizada, seguida por uma redução de 0,6% no segundo trimestre. Centenas de analistas, comentaristas e economistas, juntamente com o NBER [Sigla em inglês para National Bureau of Economic Research – Departamento Nacional de Pesquisas Econômicas em tradução livre], rapidamente declararam que isso não era uma recessão. Por isso, é cômico ler os inúmeros comentários argumentando que a projeção do Atlanta Fed NowCast significa que as políticas da nova administração estão causando uma recessão.

Como escrevi há alguns meses, os Estados Unidos estão em recessão no setor privado há meses. No entanto, um aumento anormal nos gastos do governo durante um período de crescimento e uma política de endividamento arriscada inflaram artificialmente o Produto Interno Bruto (PIB).

Entre 2021 e 2024, o PIB nominal dos EUA cresceu US$ 7,59 trilhões, enquanto a dívida pública aumentou US$ 8,47 trilhões. Isso representa o pior crescimento do PIB ajustado pelo acúmulo da dívida governamental desde a década de 1930.

Muitos analistas alertam que os esforços do Departamento de Eficiência Governamental (DOGE, na sigla em inglês) podem causar uma recessão se os gastos públicos forem reduzidos de forma agressiva. No entanto, cortar gastos pode “reduzir” o PIB, mas não prejudica o crescimento econômico produtivo - na verdade, é provável que o fortaleça.

É importante lembrar que os gastos do governo, financiados pelo aumento da dívida federal, representaram cerca de 22% a 25% do crescimento total do PIB dos EUA entre 2021 e 2024. Esse aumento extraordinário nos gastos públicos, em meio a uma recuperação, levou a um nível recorde de endividamento governamental e foi a principal causa do crescimento da oferta monetária e, consequentemente, da explosão inflacionária que os americanos enfrentam hoje.

Um estudo da MIT Sloan [Faculdade de negócios do MIT], publicado em 17 de julho de 2024 por Mark Kritzman e outros pesquisadores, chamado "Os Determinantes da Inflação" [The Determinants of Inflation no título original], concluiu que os gastos federais foram o principal fator responsável pelo surto inflacionário de 2022, sendo de duas a três vezes mais impactantes do que qualquer outro fator.

Os gastos do governo saíram de controle, levando a um crescimento acelerado da oferta monetária. Como resultado, a inflação acumulada sofrida pelos americanos nos últimos quatro anos ultrapassa 20,9%, com os preços de alimentos e combustíveis subindo mais de 40%.

O excesso de gastos públicos não apenas impulsionou o crescimento da oferta de dinheiro e a disparada da inflação, mas também levou a um aumento de US$ 8,47 trilhões na dívida, colocando o país em uma trajetória financeira insustentável caso as políticas não fossem alteradas. De acordo com o Escritório de Orçamento do Congresso (CBO), sem mudanças nas políticas, os Estados Unidos acumulariam déficits de US$ 12,6 trilhões entre 2025 e 2030. Além disso, os pagamentos de juros líquidos sobre a dívida cresceriam de US$ 881 bilhões em 2024 para US$ 1,2 trilhão em 2030, mesmo assumindo que não houvesse recessões ou aumentos no desemprego.

Reduzir os gastos do governo é essencial para baixar os preços, controlar a inflação e evitar um iminente colapso nas finanças públicas. Em 2024, ficou evidente que medidas de aumento de receita não seriam suficientes para reduzir o déficit federal dos Estados Unidos. Déficits são sempre um problema de gastos excessivos.

Vale lembrar que o crescimento do PIB de 2,8% em 2024 foi impulsionado por quase US$ 2 trilhões em endividamento, refletindo uma perigosa relação de quase um para um entre aumento dos gastos [em US$ 1 tri] e crescimento - um caminho insustentável rumo a uma crise da dívida.

O PIB privado deve ser a referência para medir a economia, pois os gastos e a dívida do governo não impulsionam o crescimento produtivo. Excluir os gastos governamentais permite uma visão mais precisa da realidade do setor produtivo nos Estados Unidos.

As estimativas mais recentes do Fed de Atlanta mostram uma forte queda nas exportações líquidas (-3,7%) devido a um grande aumento nas importações, uma leve redução no consumo de bens (-0,09%), mas um crescimento sólido nos serviços (+0,62%), aumento nos gastos do governo (+0,34%) e um avanço saudável nos investimentos (+0,62%). O fator mais surpreendente é a queda anormal nas exportações e o aumento das importações, que podem ser revisados, já que o déficit comercial em dezembro de 2024 atingiu o recorde de US$ 98,4 bilhões, enquanto o PIB não refletiu uma queda tão brusca nas exportações líquidas.

O grande problema é que os gastos do governo continuam excessivos, e os Estados Unidos estão operando com um déficit anualizado de US$ 2,5 trilhões.

Os EUA não entrarão em recessão por causa da mudança de governo, mas sim devido às políticas de gastos excessivos dos anos Biden. Reduzir os gastos federais, o déficit e o acúmulo de dívida é essencial para restaurar a saúde da economia.

Inflar o PIB com gastos públicos e endividamento não é crescimento - é uma receita para o desastre.

 

Este artigo foi originalmente publicado no Mises Institute.

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Nota: as visões expressas no artigo não são necessariamente aquelas do Instituto Mises Brasil.

Sobre o autor

Daniel Lacalle

É Ph.D. em economia, gestor de fundos de investimentos, e autor dos livros Escape from the Central Bank Trap

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