O futuro será mais plano do que nunca
Thomas Friedman declarou em seu livro de 2005, O Mundo é Plano, que o mundo é plano. Com isso, ele queria dizer que a internet, o liberalismo comercial e outros fatores semelhantes haviam permitido que economias como a da Índia competissem com economias relativamente mais fortes, como a dos EUA e do Japão. Esse “achatamento” (ou nivelamento do campo de jogo, como poderíamos pensar) continua hoje de maneiras radicalmente novas que Friedman pode não ter imaginado.
As criptomoedas permitiram a transferência de valor através das fronteiras de forma totalmente independente de permissão e sem necessidade de autorização de bancos centrais. Apesar de todo o discurso de nacionalismo econômico por parte dos políticos, é mais comum do que nunca que até mesmo pessoas comuns tenham múltiplas cidadanias e residências permanentes, com pouca lealdade a qualquer Estado-nação. Redes complexas, como as manifestadas em plataformas de mídia social, desde a Primavera Árabe de 2011, vem tornando cada vez mais óbvio o quão poderoso pode ser um público em rede. À medida que as plataformas de mídia social se envolvem cada vez mais em várias formas de censura, o público em rede se espalha para aplicativos de mensagens criptografadas, como o Signal, e busca descentralizar a web: aplicativos descentralizados (DApps), contratos inteligentes e similares.
Como Martin Gurri apontou em seu brilhante livro A Revolta do Público e a Crise da Autoridade no Novo Milênio, os membros de movimentos sociais tanto de esquerda quanto de direita (desde Vidas Negras Importam até os caminhoneiros canadenses) parecem concordar que o centro (políticos, mídia tradicional, elite científica e similares) não tem o interesse público em mente.
Não sabemos para onde esse novo mundo, com um público cada vez mais polarizado – mas altamente informado – nos levará. Ou, pelo menos, não sabemos como a disrupção aparentemente inevitável se manifestará nos próximos anos e décadas. Sabemos que o Estado-nação, como o conhecemos, não existia até depois da disrupção que a Igreja Católica experimentou após a invenção da imprensa. Embora possamos querer apontar Martinho Lutero como um catalisador para a disrupção da Cristandade, devemos lembrar que Lutero não foi o primeiro a desafiar a Igreja. Sua publicação das 95 Teses em 1517 em uma porta de igreja em Wittenberg foi oportuna, pois ele tinha a imprensa disponível para divulgar amplamente suas ideias. De repente, a Igreja perdeu seu monopólio sobre a narrativa bíblica, especialmente depois que Lutero publicou sua tradução alemã do Novo Testamento (do latim e do grego). Depois disso, as massas podiam ler o texto por si mesmas e formar suas próprias conclusões diretamente a partir dele. O que era segredo caiu por terra, e o resto é história.
No caso da Europa, não houve um acordo geral entre calvinistas, luteranos e católicos de que talvez as crenças dos outros deveriam ser vistas como excêntricas em vez de heréticas (algo para se “olhar torto” em vez de defender) até o final da Guerra dos Trinta Anos, em 1648. Portanto, a disrupção que a Cristandade experimentou não foi exatamente uma transição tranquila.
Podemos esperar uma transição mais suave quanto possível para as próximas décadas, tanto para nós quanto para nossas famílias. No curto e médio prazo, poderemos ver e participar de emocionantes oportunidades de “votar com seus pés” – isto é, deslocar-se para a jurisdição que melhor atenda aos seus desejos e interesses – à medida que os Estados-nação criam novos caminhos para residência permanente, vistos de nômade digital e até mesmo cidadania para atrair nômades digitais altamente capazes e muitas vezes bem-dotados que possam capitalizar a arbitragem de taxa de câmbio. Também poderíamos ver políticos em Estados-nações do mundo desenvolvido abraçar os argumentos humanitários e econômicos cuidadosamente articulados por pessoas como Ilya Somin e Bryan Caplan para permitir que pessoas dos países em desenvolvimento se mudem para lugares onde possam ser mais produtivas e buscarem sua própria felicidade.
Mudando de assunto, além do seasteading, Prospera, Liberland e outros candidatos na área da governança competitiva, anseio muito em saber como comunidades em rede no ciberespaço com talvez milhões de membros possam iniciar negociações com Estados-nação (“negociação coletiva”) para vantagens tributárias, reconhecimento diplomático e coisas do tipo. Este é o assunto do livro The Network State de Balaji Srinivasan.
Portanto, embora uma grande disrupção pareça inevitável no horizonte, lembremos que tempos turbulentos muitas vezes vêm com oportunidades únicas.
Este artigo foi originalmente publicado em inglês em AIER.
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Nota: as visões expressas no artigo não são necessariamente aquelas do Instituto Mises Brasil.
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