Musk e a militância de redação
Parece que a jornalista Patrícia Campos Mello leu atentamente “Como Vencer um Debate Sem Precisar Ter Razão”, de Schopenhauer – publicado com esse nome no Brasil por Olavo de Carvalho –, e decidiu adotá-lo como manual de redação para seu mais recente artigo sobre Elon Musk. Em vez de argumentar com precisão, optou por aplicar com maestria as táticas retóricas expostas pelo filósofo alemão, usando falácias e manipulações para moldar a narrativa de forma conveniente. O resultado é uma peça que, apesar da sofisticação aparente, se desmancha ao olhar atento, revelando uma construção argumentativa frágil, repleta de ad hominem, associações duvidosas e distorções que mais servem para confundir do que esclarecer.
Logo no início, Campos Mello recorre à clássica falácia de tu quoque, um dos artifícios prediletos de Schopenhauer. Ela acusa Musk de não criticar a censura digital da China, onde 50% dos veículos da Tesla são fabricados, insinuando uma incoerência entre o discurso de liberdade de expressão e suas ações empresariais. Este é um exemplo perfeito de desvio de foco: ao invés de discutir os méritos da defesa de Musk pela liberdade de expressão, a jornalista opta por atacá-lo pessoalmente, sugerindo hipocrisia. No entanto, é uma crítica que ignora completamente a complexidade da relação entre governos autoritários e corporações, ao mesmo tempo que desconsidera o contexto específico do debate sobre liberdade de expressão nas democracias ocidentais.
A falácia de associação também aparece fortemente no artigo. Ao mencionar que Musk interage com figuras políticas controversas como Donald Trump e Viktor Orbán, Campos Mello tenta desqualificá-lo por proximidade, como se o simples fato de se associar com tais líderes fosse prova suficiente de que Musk compartilha de suas ideologias mais radicais. Aqui, a jornalista habilmente aplica o princípio de “culpa por associação”, outro dos truques sugeridos por Schopenhauer para vencer debates sem lidar com os argumentos centrais. A realidade, porém, é que interações políticas, especialmente de uma figura global como Musk, raramente podem ser simplificadas a tal nível.
Ao tratar da moderação de conteúdo nas plataformas digitais sob o comando de Musk, a autora comete a falácia de generalização apressada. Afirma que Musk removeu “inúmeras contas e postagens alinhadas ao governo”, sem fornecer exemplos concretos ou fontes robustas que corroborem a acusação. Trata-se de uma alegação vaga e imprecisa que, embora atraente para o leitor casual, não se sustenta sob uma análise rigorosa. A intenção aqui é clara: transformar uma crítica válida à moderação de conteúdo em uma acusação genérica, amplamente aplicável, e, portanto, superficial.
A citação de Caio Machado, pesquisador de Harvard e Oxford, é outro exemplo de apelo à autoridade. No artigo, a citação de Machado, que afirma que Musk se sente “autorizado a usar a infraestrutura que detém para coagir países e governos”, é apresentada sem qualquer análise crítica ou detalhamento. Esse tipo de apelo, que Schopenhauer também destacaria, funciona apenas para dar uma aparência de credibilidade ao argumento, sem realmente aprofundar a discussão sobre como exatamente Musk estaria exercendo tal “coerção”. Aqui, a retórica é poderosa, mas o conteúdo é vazio.
A criação de um espantalho é talvez a mais evidente das táticas usadas no artigo. Ao caracterizar Musk como um “absolutista da liberdade de expressão quando convém”, Campos Mello reduz suas motivações a um interesse puramente mercantilista, ignorando por completo a complexidade do debate sobre os limites da liberdade de expressão nas plataformas digitais. Essa simplificação é uma armadilha clássica de retórica: ao criar uma versão distorcida da posição do oponente, o debate se torna muito mais fácil de vencer, mas à custa da verdade.
Por fim, o artigo chega ao seu clímax com uma versão extrema da reductio ad absurdum, ao sugerir que Musk, por controlar uma vasta infraestrutura tecnológica, coage nações e governos. Tal afirmação é desprovida de exemplos específicos ou provas concretas, transformando uma crítica razoável sobre o poder de grandes corporações em uma teoria conspiratória de proporções exageradas.
Ao considerar as ações de Alexandre de Moraes contra Musk, torna-se evidente que a crítica da jornalista se alinha com o crescente movimento de censura no Brasil, como exposto no Wall Street Journal. De acordo com Mary Anastasia O’Grady, a repressão judicial à liberdade de expressão no país atingiu novos níveis com a ordem de Moraes de bloquear as redes sociais de Musk, impondo multas milionárias e ameaçando funcionários da empresa no Brasil com prisão caso não cumpram as determinações judiciais. Tal comportamento revela uma tentativa de controlar a narrativa pública, utilizando o aparato judicial para coagir vozes dissidentes e consolidar uma versão estatal da verdade.
O'Grady aponta que, ao atacar Elon Musk e sua defesa da liberdade de expressão, Moraes também tenta reescrever os limites do debate público no Brasil, utilizando o Judiciário como ferramenta de silenciamento. Essa tentativa de amordaçar influenciadores que desafiam a versão oficial dos fatos foi evidenciada quando o Supremo Tribunal Federal proibiu Musk de mencionar as acusações de corrupção contra Lula durante as eleições, destacando o uso crescente de censura legal como forma de manipulação política.
Em suma, o artigo de Patrícia Campos Mello é uma aula prática de como usar táticas retóricas para construir uma narrativa sem se comprometer com a objetividade ou a profundidade. Se a intenção da autora era pintar Elon Musk como um vilão implacável, ela certamente conseguiu — mas o fez à custa de uma análise genuinamente crítica e bem fundamentada. O resultado é um texto que pode ser sedutor em sua retórica, mas que, quando exposto à luz da lógica e aos eventos recentes no Brasil, como os descritos por O’Grady, revela suas muitas falhas e distorções.
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Nota: as visões expressas no artigo não são necessariamente aquelas do Instituto Mises Brasil.
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