Crise monetária à vista (Concurso IMB)
Nota do IMB: o artigo a seguir faz parte do concurso de artigos promovidos pelo Instituto Mises Brasil (leia mais aqui). As opiniões contidas nele não necessariamente representam as visões do Instituto e são de inteira responsabilidade de seu autor.
Já é consenso entre todos os economistas de bom senso, independente de sua
linha de pensamento, que o estado, encarnado principalmente na figura do Sr.
Alan Greenspan, ex-presidente do Fed, e do Sr. George W. Bush, ex-presidente americano,
foi o principal responsável pela formação da atual crise econômica mundial,
tendo o conjunto de erros praticados por ambos como o principal fator de
contribuição para o surgimento da mesma. A dupla Bush/Greenspan coordenou de
forma desastrosa a economia americana durante o decorrer da atual década,
mantendo os juros baixos demais por um período muito longo, aumentando
estrondosamente a oferta de crédito do sistema bancário durante esse período, além
de incentivar irresponsavelmente o mercado imobiliário americano.
A dupla Bush/Greenspan já se foi. Hoje, em seu lugar está a dupla
Obama/Bernanke. Obama foi eleito presidente dos EUA fazendo severas críticas à
forma como o ex-presidente George W. Bush coordenou a economia americana
durante os seus 8 anos de mandato. As críticas de Obama se acentuavam ainda
mais quando o assunto eram os enormes déficits do governo. Hoje, eleito, parece
que o atual presidente se "esqueceu" do que defendia e está a continuar
as políticas econômicas do seu antecessor de uma forma ainda mais agressiva,
aumentando os gastos do governo e intervindo cada vez mais no mercado, que, na
teoria, é chamado de "livre"...
Recuperação Econômica ou mera ilusão?
Apesar de as medidas tomadas pelo governo - que consistem unicamente em usar a
"impressora mágica de Keynes" para distribuir dinheiro às instituições
financeiras "grandes demais pra falir" e criar "planos" de estímulo
ao consumo das famílias americanas - tenham, aparentemente, surtido algum
efeito positivo em relação ao declínio da economia americana, pelo menos por
enquanto, a situação tende a piorar bastante num futuro não muito distante.
Uma recuperação econômica criada artificialmente através de uma manipulação monetária do Banco Central está longe de ser algo eficaz e duradouro. Ao impedir que empresas insolventes quebrem e ao tentar manter os preços das casas em níveis elevados, o governo apenas estará adiando e intensificando ainda mais o inevitável processo de correção do mercado.
O que fazia a economia, não só a norte-americana, mas a do mundo todo, girar
era o consumo exacerbado da população dos EUA (O consumo dos cidadãos é
responsável por mais de 70% do total do PIB americano). Porém, o que se vê hoje
é que toda aquela exuberância estava fundamentada em uma gigantesca bolha de
crédito gerada pelo Fed. Com o estouro da bolha, está havendo um grande
reajuste pra baixo no nível de consumo americano: Antes do estouro da crise, no
ano passado, a taxa de poupança da população americana era de quase zero. Menos
de um ano depois essa taxa já chega aos 7%.
EUA à beira da insolvência
A dupla Obama/Bernanke não satisfeita com os déficits deixados pela
administração anterior, está a aumentar intensamente os gastos do governo
americano, promovendo, desde o início do atual mandato, diversos pacotes de
estímulos econômicos cada vez mais vultosos. O gasto da atual administração é
tamanho que o déficit fiscal dos três primeiros meses da administração
Obama é equivalente ao déficit fiscal de todo o ano de 2004, que até então era
considerado o maior de toda história. Hoje, a previsão é de que o déficit
fiscal do primeiro ano da administração Obama seja mais do que o triplo do
déficit do ano anterior.
Dessa forma, com déficits batendo recordes seguidos, os americanos caminham
para a falência. Para se ter uma idéia, a dívida pública americana em 2000 era
de 5.6 trilhões de dólares. Em setembro de 2008, a dívida já era de 9.6
trilhões de dólares. Hoje, exatamente um ano depois, essa dívida está prestes a
bater a casa dos 12 trilhões de dólares. Ou seja, em um ano os Estados Unidos
gastaram mais do que todo o PIB brasileiro. Atualmente, segundo o governo, o
PIB americano é de 14,2 trilhões de dólares. Fazendo as contas, a relação
dívida/PIB está cada vez mais próxima dos 100%.
Títulos da dívida
Para financiar seus déficits, os países emitem um tipo de recibo chamado de
título da dívida. Esse título é uma espécie de garantia que atesta que
você emprestou dinheiro a esse governo e que futuramente você receberá o
pagamento com desconto (juros). Esse título tem um prazo determinado de
vencimento. Quando esse prazo se encerra, o comprador tem o direito de
resgatá-lo pelo seu valor de compra mais os juros. Os títulos da dívida
americana, mais conhecidos como Treasuries ou T-bonds, são considerados os mais
seguros do mundo, o que significa, na teoria, que o risco de calote é "mínimo".
Quase todos os países enfrentam grandes dívidas públicas, porém a dúvida é
saber se esse "país X" tem capacidade de financiar essa dívida
através da emissão desses títulos. Já no caso dos Estados Unidos, a pergunta é
outra: "Até quando os Estados Unidos conseguirão financiar sua dívida?".
Até quando o mundo irá sustentar os Estados Unidos?
Cerca de um terço da dívida pública americana pertence a estrangeiros, sendo a
China a principal detentora, estando o Brasil em 3º lugar. O problema é que
essa dívida está se tornando insustentável para seus financiadores,
principalmente para a China. Por diversas vezes durante esse ano, o governo
chinês anunciou que está preocupado com o seu dinheiro investido nos Estados
Unidos e que uma crise inflacionária de grandes proporções pode acontecer
futuramente, caso o governo americano continue a gerar déficits cada vez
maiores. Mesmo com a pressão americana sobre o governo, a cada mês que se passava,
a demanda chinesa por títulos americanos caia um pouco mais até que em junho,
de maiores compradores da dívida americana, os chineses passaram a ser
vendedores.
Como falado anteriormente, os Treasuries são considerados os títulos mais seguros
do mundo, porém a atratividade desses títulos está muito baixa, já que o
rendimento desses títulos estão muito baixos ao mesmo tempo em que a dívida
americana sobe a uma velocidade muito rápida, o que faz com que exista uma
demanda maior por financiadores. O problema é que essa demanda não vem sendo
preenchida da forma esperada pelo governo americano, chegando ao ponto do
próprio FED (o BC americano) ter de comprar US$ 300 bilhões desses títulos
emitidos pelo governo ainda esse ano.
O mercado já está perdendo a confiança no dólar e os credores americanos não
sabem mais até quando o governo americano poderá cumprir com seus compromissos
Sem financiamento, será só uma questão de tempo para que o governo americano
aumente a sua taxa de juros. O próprio Obama, no início do ano, admitiu que
isso ocorrerá. O problema é que o aumento dos juros será devastador para as
pretensões do governo de estabelecer uma recuperação em uma economia já debilitada
como a americana, na qual o consumo da população, que é a base da sua economia,
despenca a níveis sem precedentes, na qual em média 300 mil empregos são
perdidos por mês, na qual os bancos e as empresas estão sofrendo com a inadimplência.
Se realmente o mercado ainda confiar no dólar, quando os juros americanos
subirem teremos os investimentos do mundo todo voltados para os Estados Unidos,
o que vai fazer com que os juros subam ainda mais no resto do mundo. Caso
contrário, poderemos ter um cenário de estagflação, que é caracterizado por um
período de recessão, com grande aumento do desemprego, além da temida inflação.
Em ambos os casos, o caminho será doloroso e diversas empresas e instituições
financeiras inevitavelmente terão de quebrar.
Corrida contra o dólar e a chegada da inflação
Cada vez mais o mercado se dá conta de que o dólar americano não é mais um
porto-seguro como anteriormente. Países com grandes quantias em dólares nas
suas reservas querem apenas uma desculpa para poder livrar-se dos mesmos e, ao
invés de comprarem títulos da dívida americana, esses países estão investindo
em outros tipos de reservas, monetárias e não-monetárias. A China, por exemplo,
vem comprando enormes quantias de commodities metálicas, muito acima da sua
real necessidade. Outra alternativa é o investimento em ouro, que, no sentido
contrário ao dólar, recentemente ultrapassou a marca dos US$1.000,00 a onça e
continua subindo.
No momento atual, o mundo, preso ao dólar, se vê sem saída, porém todos esperam
apenas por uma desculpa maior, um tiro de largada para que essa corrida comece,
possivelmente uma moratória declarada pelo governo americano. Quando essa
corrida se iniciar, quantias cada vez maiores de dólares serão jogadas no
mercado, fazendo assim com que o preço do dólar despenque de vez. É só uma
questão de tempo para que isso aconteça e o mundo perceba que já não existem
mais motivos para que se permaneça sentado em cima de uma montanha de títulos
americanos.
Conclusão
De forma "inesperada", essa crise econômica, em pouco tempo, passou de uma mera
crise no setor imobiliário americano para se tornar, hoje, uma grande crise
sistêmica que atinge todos os setores da economia mundial. Da mesma forma, o
planeta será atingido "inesperadamente" por uma grande crise
monetária onde certamente a população do mundo inteiro será severamente
castigada por uma forte inflação que afetará todo o globo em um futuro próximo.
Para onde todo esse processo vai nos levar, ninguém sabe. Porém uma coisa é
certa: será um processo inevitável e doloroso para todo o mundo, porém
extremamente necessário para que o mundo consiga novamente estabelecer uma
estrutura econômica sólida e sustentável.
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