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Direito

A “justiça social” não é social nem justa

24/10/2023

A “justiça social” não é social nem justa

Thomas Sowell nos deu uma crítica penetrante à abordagem da justiça adotada por muitos filósofos políticos, especialmente John Rawls e seus inúmeros seguidores. Sowell diz que eles constroem uma imagem de como a sociedade deveria ser, mas não perguntam se seus planos são viáveis. Sua crítica é bem-feita, embora ele não ofereça uma explicação adequada dos direitos que as pessoas têm.

Ele diz sobre Rawls:

“Em grande parte da literatura sobre justiça social, incluindo o clássico Uma Teoria de Justiça, do professor John Rawls, várias políticas têm sido recomendadas com base em sua conveniência do ponto de vista moral – mas muitas vezes com pouca ou nenhuma atenção à questão prática de se essas políticas poderiam de fato ser realizadas e produzir os resultados desejados. Em vários lugares, por exemplo, Rawls se referiu a coisas que a ‘sociedade’ deveria ‘organizar’ – mas sem especificar os instrumentos ou as viabilidades desses arranjos”.

Mais adiante, Sowell observa que “a exaltação da desejabilidade e a negligência da viabilidade, que Adam Smith criticou, ainda hoje é um ingrediente importante nas falácias fundamentais da visão de justiça social”.

Sowell concorda com Rawls que muitas desigualdades nas condições das pessoas parecem arbitrárias e injustas, se vistas como o resultado de um plano. Mas, uma vez que percebemos que em um mercado livre não existe tal plano, é evidente que a crítica ao mercado sob o argumento de que ele permite desigualdades injustas é descabida. A vida é apenas “assim”, e as tentativas de desfazer essas desigualdades provavelmente fracassarão e terão resultados ruins.

O argumento de Sowell segue Friedrich Hayek, sobre quem ele diz:

   “Claramente, Hayek também via a vida em geral como injusta, mesmo dentro do livre mercado que ele defendia. Mas isso não é o mesmo que dizer que ele via a sociedade como injusta. Para Hayek, a sociedade era uma ‘estrutura ordenada’, mas não uma unidade decisória ou uma instituição tomando ações. Isso é o que os governos fazem. Mas nem a sociedade nem o governo compreendem ou controlam todas as muitas e muito variadas circunstâncias – incluindo um grande elemento de sorte – que podem influenciar o destino de indivíduos, classes, raças ou nações”.

Como exemplo, Sowell cita estudos que mostram que os primogênitos tendem a ser mais bem-sucedidos academicamente do que as crianças que têm irmãos ou irmãs mais velhos. “Isso é algo que requer ações corretivas por parte do governo?”, ele pergunta. A própria ideia já é ridícula. Devemos, pensa Sowell, simplesmente viver e deixar viver.

É certamente verdade, como sugere Sowell, que as questões de viabilidade restringem severamente o que aqueles que buscam “justiça social” podem fazer, mas ele não mostrou que essas questões reduzem o espaço de ação a nada. Às vezes, ele implicitamente postula uma falsa antítese entre a rejeição total da justiça social e a aceitação de uma concepção abrangente de justiça social que ele chama de “justiça cósmica”, que tentaria corrigir todas as desigualdades consideradas imerecidas. (Apresso-me a acrescentar que rejeito completamente a justiça social, mas defender adequadamente essa posição requer uma consideração de direitos, o que Sowell não fornece).

Em apoio à sua crítica à justiça social, Sowell faz um argumento dúbio. As pessoas que apoiam a justiça social muitas vezes tomam como um de seus principais exemplos a necessidade de programas especiais para ajudar os negros, porque a discriminação contra eles, tanto no presente quanto no passado, os colocou em uma grave desvantagem em relação aos brancos. Mas as evidências empíricas não apoiam a afirmação de que as desigualdades atuais de renda entre negros e brancos decorrem principalmente do tratamento discriminatório, argumenta.

Sowell é um mestre em implantar evidências, e qualquer um que queira desafiá-lo sobre a causa da desigualdade enfrenta uma tarefa difícil, se não totalmente impossível. Mas um defensor da justiça social pode argumentar que a exigência de corrigir o tratamento discriminatório não é uma reivindicação empírica sobre as fontes da desigualdade atual, mas uma demanda moral. As pessoas que defendem esta opinião podem pensar que, mesmo que agora estejamos muito bem, ainda temos direito a uma indenização se tivermos sofrido discriminação. (Mais uma vez, não sou a favor dessa visão, muito pelo contrário; mas uma resposta adequada a ela deve envolver a teoria moral).

É mais importante, porém, ter em mente a força do argumento de Sowell do que suas limitações. As questões de viabilidade limitam sobremaneira o alcance da justiça social, mesmo que não a excluam completamente. E podemos concordar sem reservas com outro excelente ponto que Sowell faz. Ele diz:

  “Ironicamente, muitas elites intelectuais – antigamente e agora – parecem considerar-se promotoras de uma sociedade mais democrática, quando se antecipam às decisões alheias (...). Sua concepção de democracia parece ser a equalização de resultados pelas elites intelectuais. Isso conferiria benefícios aos menos afortunados, em detrimento daqueles que esses substitutos consideram menos merecedores. (...) [Woodrow Wilson] favoreceu o governo por meio de tomadores de decisão substitutos, armados com conhecimento e compreensão superiores – ‘perícia executiva’ – e facilitados pelo público votante. A resposta de Woodrow Wilson às objeções de que isso privaria as pessoas em geral da liberdade de viver suas próprias vidas como bem entendessem foi redefinir a palavra ‘liberdade’. (...) Ao simplesmente retratar os benefícios fornecidos pelo governo – dispensados por tomadores de decisão substitutos – como uma liberdade adicional para os beneficiários, o presidente Wilson fez desaparecer a questão da perda de liberdade das pessoas, como se fosse um truque verbal”.

Sowell faz um ponto vital. Você é livre se os outros não agredirem sua pessoa e propriedade; se eles agridem, mas lhe dão benefícios, você não está livre. Sowell eloquentemente diz:

   “As ‘complexidades’ dessa definição wilsoniana de liberdade são certamente compreensíveis, uma vez que fugir do óbvio pode se tornar muito complexo. Quando Espártaco liderou uma revolta de escravos, nos tempos do Império Romano [República], ele não estava fazendo isso para obter benefícios do estado de bem-estar social”.

Como o bispo Joseph Butler observou há muito tempo, “tudo é o que é, e não outra coisa”.

 

Esse artigo foi originalmente publicado em https://mises.org/wire/social-justice-neither-social-nor-just 

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Nota: as visões expressas no artigo não são necessariamente aquelas do do Instituto Mises Brasil.

Sobre o autor

David Gordon

É membro sênior do Mises Institute, analisa livros recém-lançados sobre economia, política, filosofia e direito para o periódico The Mises Review, publicado desde 1995 pelo Mises Institute.

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