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Política

Não, a Suprema Corte americana não é uma meritocracia

É tudo uma questão política

10/08/2023

Não, a Suprema Corte americana não é uma meritocracia

É tudo uma questão política

Com a nomeação de Ketanji Brown Jackson feita pelo presidente Joe Biden para o Supremo Tribunal americano, os suspeitos habituais estão se manifestando com a retórica habitual sobre a candidata. Na nomeação de Jackson, que é negra, Biden declarou:

“Eu acredito que é hora de termos um tribunal que reflita todos os talentos e a grandeza de nossa nação com a nomeação de uma candidata de qualificações extraordinárias, e que nós possamos inspirar todos os jovens a acreditarem que um dia poderão servir seu país no mais alto nível”.

Do lado republicano, o senador Lindsey Graham, da Carolina do Sul, que recentemente votou para confirmar Jackson para o tribunal de apelações de Washington, DC, declarou que a nomeação de Jackson constituiu uma vitória para “a esquerda radical”. Da mesma forma, o senador Ted Cruz, do Texas, vê a indicação como equivalente a “discriminação racial”, porque Biden já havia prometido esta vaga na Suprema Corte dos EUA (SCOTUS – Supreme Court of the United States) a uma mulher negra. Cruz disse:

“O que o presidente disse é que apenas mulheres afro-americanas são elegíveis para essa vaga, que 94% dos americanos são inelegíveis. A maneira como Biden deveria fazer isso é dizer ‘vou procurar o melhor juiz’, entrevistar muitas pessoas e, se acontecer de ele nomear juíza uma mulher afro-americana, ótimo”.

Em outras palavras, Cruz quer que a seleção da SCOTUS seja uma meritocracia em que o presidente nomeia “os melhores e mais brilhantes” para esse alto cargo no governo. Claro, já lidamos com os “melhores e mais brilhantes” antes, do “Brain Trust” de Franklin Roosevelt, que conseguiu colocar o “Grande” na Grande Depressão, e das “crianças prodígios” de John F. Kennedy, que nos deram o desastre no Vietnã.

Afirmar que os presidentes devem procurar colocar os juristas “mais qualificados” no tribunal superior é ignorar a história das nomeações do Supremo Tribunal como se não fossem políticas. Franklin Roosevelt nomeou Hugo Black, do Alabama, que era membro da Ku Klux Klan (algo que Roosevelt e seu governo tentaram esconder do público), não porque Black fosse um grande jurista, mas porque era do Sul e era um fervoroso defensor do New Deal. Roosevelt precisava do apoio dos democratas do sul e queria garantir que a Suprema Corte apoiaria seus programas do New Deal. Não surpreendentemente, Black apoiou fielmente esses programas e qualquer outra coisa do Congresso que expandisse o poder do estado.

O presidente Ronald Reagan nomeou Sandra Day O'Connor para a SCOTUS para cumprir uma promessa de campanha de nomear uma mulher para o tribunal, e Day foi a juíza republicana mais condecorada. A nomeação de Clarence Thomas seguiu-se à aposentadoria de Thurgood Marshall. O presidente George H.W. Bush não queria ser acusado de racismo por nomear um homem branco para ocupar o cargo de Marshall, e Thomas era o juiz republicano negro mais conhecido da época.

Da mesma forma, quando Bill Clinton nomeou Ruth Bader Ginsberg para o tribunal superior, ele estava enviando uma mensagem clara de que seu governo apoiava o direito ao aborto. Ginsberg foi um voto confiável (e previsível) sobre o aborto e outras questões. Na verdade, geralmente é possível prever como os juízes votarão na maioria das questões (embora, às vezes, surpreendam).

Em relação à indicação de Biden de uma mulher negra para o tribunal superior, é irônico que quando Biden estava no Senado dos Estados Unidos e era presidente do Comitê Judiciário do Senado, ele ameaçou obstruir a nomeação de outra mulher negra para o tribunal, Janice Rogers Brown, forçando o presidente George W. Bush a retirar a indicação. Brown era claramente tão qualificada quanto a maioria dos outros no pleito, mas suas inclinações ideológicas e judiciais ofenderam Biden e os democratas. (É duplamente irônico que Biden afirme agora que a obstrução é uma relíquia de “Jim Crow”, mas não teve nenhum problema em usá-la para afundar a nomeação de uma negra).

Podemos continuar, mas está claro que as indicações à Suprema Corte são baseadas mais no que servirá aos interesses das elites políticas que estão no poder do que nas qualificações legais e acadêmicas dos indicados. De fato, dado que, além da juíza Amy Coney Barrett (que estudou direito na Universidade Notre Dame), todos os juízes fizeram faculdade de Direito em Harvard ou Yale, Jackson não perturbará esse equilíbrio, tendo estudado direito em Harvard (onde se formou com honra).

Assim, pode-se dizer que as elites políticas e acadêmicas americanas estão bem representadas na Suprema Corte. Se esses juízes representam o “melhor e mais brilhante” talento jurídico é outra questão. Interpretar leis não é como interpretar problemas matemáticos; em vez disso, trata-se de apresentar interpretações que agradem a um determinado eleitorado.

Veja Janice Rogers Brown novamente. Os democratas e certamente grande parte do establishment legal alegaram que ela era “desqualificada” não por causa de defeitos em seu intelecto, mas porque ela criticava uma série de programas governamentais. Brown certamente não teve uma educação de elite, sendo filha de um meeiro no Alabama, recebeu seu ensino de graduação na Sacramento State University e seu diploma de direito na UCLA. Como jurista, suas opiniões variavam de conservadoras a libertárias, e seus discursos definitivamente irritavam o establishment político, mas ninguém poderia desafiar seu intelecto.

Brown foi afastada da alta corte pelo mesmo motivo pelo qual Jackson será confirmada: política. Não há “meritocracia” aqui. Os juízes não abordam a lei como se fossem reis-filósofos. A realidade é diferente; a última coisa que os políticos querem é que os juízes ajam por conta própria e apliquem a lei como está escrita ou, pior ainda, tentem estabelecer se uma lei realmente se encaixa ou não nos parâmetros legais da Constituição dos EUA. Em vez disso, eles querem Lady Justice com os olhos bem abertos, colocando os polegares na balança.

 

Este artigo foi publicado originalmente em https://mises.org/wire/no-us-supreme-court-not-meritocracy

Sobre o autor

William L. Anderson

É um scholar adjunto do Mises Institute, e leciona economia na Frostburg State University.

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