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Economia

“Clube dos Pilantras” mostra por que muitos intelectuais odeiam o capitalismo

29/06/2023

“Clube dos Pilantras” mostra por que muitos intelectuais odeiam o capitalismo

Muitos intelectuais não gostam do capitalismo. De acordo com o Pew Research Center, 35% dos entrevistados com ensino médio, ou alguma faculdade, disseram ter visões “favoráveis” ao socialismo. Porém, mais de 40% daqueles com estudos de pós-graduação tinham percepções favoráveis ​​ao socialismo; para as pessoas que terminaram o doutorado, a taxa de “adoradores do socialismo” é mais da metade.

O jeito de “não gostar” assume muitas formas. Alguns intelectuais querem regular e controlar os processos de mercado, outros querem “abolir” (o que quer que isso signifique) os mercados e a propriedade privada. (Observação: para os propósitos do artigo, vou usar os termos “mercados” e “capitalismo” de forma intercambiável).

Visto que frequento os círculos dos intelectuais e frequentemente assisto às suas cerimônias e celebrações primitivas, tive muitas ocasiões para observar seus costumes e manias. Há alguns anos, argumentei que a alternativa que muitos intelectuais preferem ao capitalismo realmente existe, mas, como a imagem criada pela palavra “unicórnio”, existe apenas em suas mentes. O problema é que o “eu posso imaginar” é suficiente, uma vez que os intelectuais têm tudo a ver com o poder da imaginação e com a visão mental das coisas.

Vários estudiosos levantaram a questão de por que os intelectuais favorecem sistemas complexos projetados de cima para baixo para conter o (aparente) caos emergente dos processos de mercado. Em 1949, Friedrich Hayek escreveu (na University of Chicago Law Review) que:

 

Em todos os países que se moveram em direção ao socialismo, a fase do desenvolvimento em que o socialismo se torna uma influência determinante na política foi precedida por muitos anos por um período durante o qual os ideais socialistas governaram o pensamento dos intelectuais mais ativos. Na Alemanha, esse estágio foi alcançado no final do século passado; na Inglaterra e na França, na época da Primeira Guerra Mundial. Para o observador casual, parece que os Estados Unidos chegaram a essa fase após a Segunda Guerra Mundial e que a atração de um sistema econômico planejado e dirigido é agora tão forte entre os intelectuais americanos quanto sempre foi entre seus companheiros alemães ou ingleses. A experiência sugere que, uma vez alcançada essa fase, é apenas uma questão de tempo até que as opiniões agora defendidas pelos intelectuais se tornem a força governante da política.

 

Por “intelectuais”, Hayek não se referia a pessoas inteligentes ou educadas. O que ele quis dizer foi “vendedores de ideias de segunda mão”, pessoas cujo trabalho, vocação ou hobby obsessivo era discutir e avaliar as ideias dos outros e defender a implementação de um ou outro desses grandes sistemas. Suas razões sempre têm a ver com os resultados positivos que imaginam que virão; enquanto alguns autocratas podem buscar o poder e usar ideias como pretexto, os intelectuais são verdadeiros crentes. É por essa razão que os intelectuais são eficazes.

O que qualifica uma pessoa como “intelectual”? No sentido de Hayek, é seu papel como corretor ou intermediário, ocupando uma posição ou papel na sociedade que confere uma grande vantagem comparativa na disseminação do que parecem ser ideias autorizadas. Ele observa:

 

jornalistas, professores, ministros, conferencistas, publicitários, comentaristas de rádio, escritores de ficção, cartunistas e artistas, mas também profissionais, como cientistas e médicos, que através de sua relação habitual com a palavra impressa tornam-se portadores de novas ideias fora de seus próprios campos e que, por causa de seu conhecimento especializado em seus próprios assuntos, são ouvidos com respeito na maioria dos outros.

 

Quase cinquenta anos depois, Robert Nozick escreveu seu famoso artigo “Por que os intelectuais se opõem ao capitalismo?”. Vale a pena ler tudo, mas o insight pode realmente ser destilado a um nome: Al Czervik, o incorporador imobiliário de classe baixa, mas rico, de “Clube dos Pilantras”. (Se você não entendeu a referência, aqui está um breve resumo em vídeo). Nozick observa que os intelectuais sempre foram o tipo de criança que era nerd e tirava boas notas. Os Al Czerviks do mundo sentavam-se no fundo da classe e jogavam cartas. Mas agora eles abriram negócios e vendem imóveis ou automóveis. Qualquer sistema que recompense o empreendedorismo em vez de boas notas e de ajudar o professor a limpar o quadro depois da aula é obviamente injusto.

Os intelectuais imaginam que em um sistema socialista, especialistas e tecnocratas como eles (ou como eles se consideram) estarão claramente no comando. Na verdade, é claro, os intelectuais estão errados em dois pontos: primeiro, as pessoas que criam valor merecem receber mais do que as pessoas que podem citar “grandes pensadores” literalmente, especialmente porque temos o Google. Mas, mais importante, não há um único caso na história de governos socialistas, o tipo real de governo que governa as nações, que nos faça pensar que alguém, exceto bandidos agressivos e autocratas, estará no controle. Como observou Hayek, “os piores chegam ao poder” no socialismo. Os intelectuais são presos e fuzilados.

Para ser justo, porém, os intelectuais são inteligentes. Por que eles se apaixonam repetidamente por essa ilusão sedutora? Eu estava ouvindo Bob Dylan outro dia e de repente fiquei impressionado com parte de sua letra que eu tinha ouvido mil vezes, mas nunca realmente entendi. Em sua canção de 1963, “Blowin' in the Wind”, Dylan pergunta: “Sim, e quantas vezes as balas de canhão devem voar antes de serem banidas para sempre?” Como você vai impor a proibição de balas de canhão, se ninguém tem balas de canhão?

A resposta parece ser que as pessoas boas, as pessoas inteligentes, os intelectuais, eles terão as balas de canhão e vão impor a proibição ao resto de nós. Os libertários tendem a pensar que o direito de autodefesa pertence aos indivíduos; os intelectuais pensam que se tirarmos de todos a capacidade de se defender, de modo que o poder se concentre entre os intelectuais, então o problema estará resolvido. E como o capitalismo difunde o poder entre as muitas pessoas que adquirem riqueza, o capitalismo deve ser substituído por um sistema que concentra o poder.  

Podemos resumir a isso: no capitalismo, a riqueza é o poder sobre os bens e serviços que eu quero. Esse tipo de poder não é “soma zero”, porque eu posso ter, você pode ter e Al Czervik pode ter. Al Czervik pode ter mais do que você e eu, mas todos podemos ser prósperos.

Os intelectuais, no entanto, favorecem o socialismo, que inverte a cadeia natural. Enquanto no capitalismo a riqueza o torna poderoso e capaz de comprar o que quiser, no socialismo é o poder que o torna rico. Os apparatchiks do partido e os funcionários tecnocráticos têm um poder enorme para tomar decisões de produção e distribuição. Mas o poder, com o que quero dizer o poder político, é sempre de soma zero: se a elite intelectual o tem, você e eu não o temos. E Al Czervik está dirigindo um caminhão de lixo, porque insultou um intelectual no 4° ano e o intelectual contou a seu pai, o chefe do partido. Sob o socialismo, a propriedade estatal e o controle das empresas, a avaliação comparativa do status torna-se importante. Se eu sou poderoso, você não é. O socialismo é uma forma de criar inveja no sistema, na suposição de que as elites – “pessoas educadas, como eu” – sairão por cima. 

Sobre o autor

Michael Munger

É diretor do programa de filosofia, política e economia da Duke University. Ele é ex-presidente da Public Choice Society.

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