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Economia

Os membros da nossa suposta "classe bem-pensante" comportam-se como pré-adolescentes mimados

Para eles, sempre há "soluções simples" para tudo

20/06/2022

Os membros da nossa suposta "classe bem-pensante" comportam-se como pré-adolescentes mimados

Para eles, sempre há "soluções simples" para tudo

As atitudes e opiniões da chamada "elite intelectual" de hoje – aqueles formadores de opinião pública que Deirdre McCloskey rotula de "os clérigos", e que outros rotulam de intelligentsia – são infantis. 

Ou pior: na prática, comportam-se como pré-adolescentes mimados que não aceitam a mais básica relação entre causa e consequência.

A maioria dos jornalistas e escritores que trabalha para a maioria das principais empresas de mídia e entretenimento, juntamente com a maioria dos professores e intelectuais públicos, pensam, falam e escrevem sobre a sociedade com uma visão de alunos que ainda estão entre o jardim de infância e o ensino fundamental.

Esta tenebrosa verdade é mascarada pela única característica que distingue a intelligentsia das crianças: o virtuosismo verbal. 

No entanto, sob as belas palavras, as belas frases, as metáforas cativantes e as alusões afetadas, há uma notável imaturidade de pensamento. 

Motivo: tais pessoas realmente acreditam que todo problema social e econômico tem uma solução, e essa solução é quase sempre superficial.

Trade-off são inaceitáveis

Ao contrário das crianças, os adultos entendem que viver bem começa com a aceitação da inevitabilidade de alguns trade-offs

Ao contrário do que você pode ter ouvido por aí, você não pode "ter tudo". 

Você não pode ter mais de uma determinada coisa a menos que esteja disposto a ter menos de uma outra coisa. E o que é verdade para você como indivíduo é verdade para qualquer grupo de indivíduos. 

Nós não podemos, por exemplo, viver em um mundo em que os governos aumentem artificialmente o custo de produção e uso de combustíveis de carbono, e ao mesmo tempo acreditarmos que isso não terá absolutamente nenhum efeito na oferta de combustíveis — e, consequentemente, em seus preços. 

Se quisermos viver neste arranjo temos de estar dispostos a pagar preços mais altos na bomba e, portanto, aceitar que teremos menos renda para gastar na aquisição de outros bens e serviços. 

Lógica básica.

Igualmente, não podemos sair imprimindo dinheiro para aliviar a dor dos lockdowns sem, posteriormente, suportar a dor maior gerada pela inflação generalizada que posteriormente virá.

Ao passo que crianças mimadas batem seus pezinhos no chão, em protesto, quando confrontadas com a necessidade de fazer trade-offs, a necessidade de trade-offs é aceita como uma coisa natural pelos adultos.

Não menos importante, os adultos, ao contrário das crianças, não são seduzidos pelo superficial.

Apenas observe como a intelligentsia (em sua maioria, embora não exclusivamente, progressistas) se propõe a "resolver" quase qualquer problema, real ou imaginário. Você descobrirá que a "solução" proposta é superficial; que está enraizada na suposição ingênua de que a realidade social além daquela que é imediatamente observável não existe ou não é afetada por tentativas de reorganizar os fenômenos superficiais. 

Na visão destes clérigos, a única realidade que importa é a realidade que é facilmente vista e que parece facilmente manipulada com o uso da coerção. As "soluções" propostas envolvem simplesmente reorganizar, ou tentar reorganizar, fenômenos superficiais.

Uma curta lista

Algumas pessoas utilizam armas para matar outras pessoas? Sim, infelizmente. A "solução" superficial da intelligentsia para esse problema real é proibir as armas. 

Algumas pessoas têm patrimônios financeiros substantivamente mais altos do que outras pessoas? Sim. A "solução" juvenil dos clérigos para esse falso problema é tributar pesadamente os ricos e transferir os rendimentos para os menos ricos. 

Alguns trabalhadores recebem salários muito baixos para sustentar uma família no mundo moderno? Sim. A "solução" simplista para esse problema falso – "falso" porque a maioria dos trabalhadores que ganha salários tão baixos não são chefes de família – é fazer com que o governo proíba o pagamento de salários abaixo de um mínimo estipulado.

Algumas pessoas sofrem danos materiais indescritíveis, ou até mesmo perdem suas vidas, por causa de enchentes, tempestades, secas e catástrofes climáticas? Sim. A "solução" preguiçosa da intelligentsia para esse problema real é simplesmente "mudar o clima", controlar a temperatura e o nível dos oceanos reduzindo as emissões de um elemento, o carbono, o qual agora (um pouco simplista demais) acredita-se que determina fortemente o clima.

Os preços de muitos bens e serviços "essenciais" aumentam significativamente logo após os desastres naturais? Sim. A "solução" contraproducente dos clérigos para esse problema falso – "contraproducente" e "falso" porque esses altos preços refletem e sinalizam com precisão as realidades econômicas subjacentes – é proibir a cobrança e o pagamento desses altos preços. 

Quando as pressões inflacionárias se acumulam devido à excessiva impressão de dinheiro, essas pressões são liberadas na forma de preços crescentes? Sim, inevitavelmente. A "solução" juvenil da intelligentsia para o problema muito real da inflação é culpar a ganância ao mesmo tempo em que propõe aumento de impostos sobre os lucros.

O vírus SARS-CoV-2 é contagioso e potencialmente perigoso para os seres humanos? Sim. A "solução" simplória dos clérigos para esse problema real é impedir forçosamente que as pessoas se aproximem umas das outras.

Muitos ainda não recebem educação escolar de qualidade mínima aceitável? Sim. A "solução" preguiçosa dos clérigos para esse problema real é aumentar os salários dos professores e gastar mais dinheiro com a burocracia escolar.

Alguns trabalhadores perdem seus empregos quando os consumidores compram mais produtos importados? Sim. A 'solução' da intelligentsia é obstruir a capacidade dos consumidores de voluntariamente comprar importados.

Algumas pessoas são preconceituosas e apresentam uma antipatia irracional ou medo de negros, gays, lésbicas e bissexuais? Sim. A "solução" dos clérigos para este problema real é proibir o "ódio" e obrigar as pessoas preconceituosas a se comportarem como se não fossem preconceituosas — o que, obviamente, apenas aumenta ainda mais a revolta e o ódio.

Muitas pessoas que poderiam votar nas eleições políticas abstêm-se de votar? Sim. A "solução" defendida por pelo menos parte dos clérigos para esse problema falso – "falso" porque, em uma sociedade livre, cada pessoa tem o direito de se abster de participar da política – é tornar o voto obrigatório.

Muitas pessoas não sabem cuidar do próprio dinheiro e nem de si próprias? Sim. A solução da intelligentsia é impor vários encargos sociais e trabalhistas que oneram a folha de pagamento das empresas visando a cuidar da aposentadoria e de eventuais acidentes destas pessoas, jurando que isso não trará nenhuma consequência negativa ao mercado de trabalho.

Para concluir

Esta lista de "soluções" simplistas e superficiais para problemas reais e imaginários pode ser facilmente expandida.

A intelligentsia, ao confundir palavras com realidades, supõe que o sucesso em descrever verbalmente realidades mais ao seu gosto prova que essas realidades imaginadas podem se tornar reais ao simplesmente se reorganizar os fenômenos superficiais relevantes. 

Os membros deste clero ignoram as consequências não-premeditadas. E eles ignoram o fato de que muitas das realidades sociais e econômicas que eles abominam são o resultado não de vilania ou de imperfeições corrigíveis, mas de trade-offs complexos feitos por inúmeros indivíduos.

A engenharia social parece algo factível somente para aquelas pessoas que, ao verem apenas alguns poucos fenômenos superficiais, ignoram a espantosa complexidade que sempre está abaixo da superfície para criar esses fenômenos superficiais. 

Para tais pessoas, a realidade social é vista como pelos olhos de uma criança: simples e facilmente manipulável para se alcançar quaisquer que sejam os desejos que motivam os manipuladores.

O batalhão da intelligentsia está repleto de pessoas simplórias que confundem sua felicidade com palavras, e suas boas intenções com pensamento sério. Eles transmitem uns aos outros, e ao público inocente, a aparência de serem pensadores profundos. A realidade, no entanto, é que raramente pensam com mais sofisticação e nuance do que o tipo de pensamento encontrado diariamente nos jardins de infância.

Sobre o autor

Donald Boudreaux

foi presidente da Foudation for Economic Education, leciona economia na George Mason University

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