Esse site usa cookies e dados pessoais de acordo com os nossos Termos de Uso e Política de Privacidade e, ao continuar navegando neste site, você concorda com suas condições.

< Artigos

Economia

Por que no socialismo todos morrem de fome?

Campos de trabalho forçado e racionamento são a inevitável consequência da irracionalidade

18/08/2020

Por que no socialismo todos morrem de fome?

Campos de trabalho forçado e racionamento são a inevitável consequência da irracionalidade

Que o socialismo naturalmente mata todos de fome, qualquer pessoa que não vise desconsiderar os fatos históricos sabe. Isso vale tanto para os casos mais antigos de socialismo, quanto para os mais recentes.

Entretanto, são poucas as que conseguem explicar aprioristicamente o porquê de os recursos serem mal distribuídos — ou, melhor, raramente produzidos — sob o socialismo. 

O argumento de Ludwig von Mises sobre a impossibilidade de haver qualquer racionalidade econômica em um arranjo socialista segue definitivo. Entretanto, mesmo ele pode ser auxiliado por uma nova abordagem.

Muita dor, nenhum ganho

Um bem — um objeto útil, mais especificamente — só será produzido se o trabalhador/empreendedor que despendeu energia física e tempo na sua confecção puder extrair da sua produção e do seu uso ganhos suficientemente compensatórios em relação a todos custos envolvidos no processo. 

Isso vale tanto para economias capitalistas modernas quanto para situações de autarquia.

O indivíduo, portanto, apenas manterá o seu trabalho enquanto os ganhos decorrentes dele forem apreciavelmente superiores aos custos. 

Isso implica que o mesmo indivíduo cessará o seu trabalho/produção/empreendimento a partir do momento em que o esforço (físico, capital e intelectual) necessário ao seu dispêndio exceder os ganhos oriundos da sua consecução. 

Por conclusão, a partir do momento em que um indivíduo espera sempre ter sua produção coercitivamente expropriada por outrem, ele irá se sentir desestimulado ao trabalho — ou seja, à produção —, já que os ganhos que obteria serão, espera-se, anulados via força expropriatória. 

Mesmo em uma economia moderna, repleta de bens de capital (maquinários, ferramentas e instalações) de última geração, a constatação acima continua sendo irrefutável. Mesmo que o problema do cálculo econômico explicitado por Mises fosse magicamente resolvido pelos socialistas (dica: não há como isso ocorrer), a questão dos incentivos à produção e ao trabalho continuaria inabalada.

A expropriação (estatal), assim, enquanto forma tipicamente soviética de socialização dos bens, acrescenta custos totalmente artificiais aos custos naturais do trabalho. Entre estes custos artificiais está a possibilidade de morte: as demandas irreais (anti-mercado) do expropriador levam à necessidade do expropriado de tentar burlar os braços fiscalizatórios com o intuito de manter um padrão de vida minimamente satisfatório ao atendimento das exigências fisiológicas humanas mais básicas. 

(Daí o surgimento dos mercados negros nas economias socialistas, com preços muito mais altos — porém, sempre bem abastecidos e estocados.)

Tal expropriação, nota-se, reduz os lucros da produção, uma vez que o produtor, ao qual atribui-se originalmente o logro dos referidos lucros, é, sob conjunturas socialistas, obrigado via coação a reparti-los com um que não participou em absolutamente nada do processo de obtenção dos mesmos — por indução, um não-produtor. 

O produtor, desse modo, é coercivamente compelido a repartir os ganhos provenientes do seu trabalho com um não-produtor, ao mesmo tempo em que tem de arcar com custos artificialmente elevados criados pelas demandas expropriatórias do agente coercitivo. 

A expropriação, por acrescer custos totalmente artificiais ao montante natural de custos relativos ao trabalho, e por reduzir forçadamente os lucros da produção em relação ao esforço  (físico, capital e intelectual) necessário, desmotiva o produtor a prosseguir com seus ofícios. 

Ao curso do tempo, sob o socialismo, a produção de qualquer coisa (bem ou serviço) cessará por inteiro, inevitavelmente, uma vez que os ganhos da produção são expropriados (socializados) para muito além do ponto em que a atividade não-produtiva (parasítica) se torna comparavelmente mais preferível que a produtiva (não-parasítica). 

Se um indivíduo ocioso irá, no fim, ter o mesmo que um indivíduo inventivo e trabalhador, que incentivo terá o primeiro para produzir? Que incentivo terá o segundo para continuar produzindo?

Por conseguinte, a longo prazo, até mesmo a existência parasitária do agente expropriador irá se tornar irrevogavelmente inviável. Afinal, se os ganhos da produção são expropriados (socializados) até o ponto em que a mesma irá cessar definitivamente por apresentar mais riscos judiciais que resultados reais compensatórios, de onde o expropriador extrairá, então, o seu sustento? 

Como viverá o parasita ante a ausência do hospedeiro? É o ponto fundamental. 

É neste ponto que surgem os campos de trabalho forçado, que são o estágio final do socialismo.

O gari e o médico

Trocando "expropriador" por "estado" ou "estatal" nos trechos acima, a conclusão torna-se ainda mais reveladora. 

Exemplos são, agora, bem cabíveis. Suponhamos, pois, um regime socialista no qual há um médico, um gari e o leviatã estatal. 

Se o médico, por ganhar mais, é, sob tal regime, expropriado até que sua condição econômica seja perfeitamente equiparável à do gari, por que este, então, irá se esforçar para deixar de ser gari ou se tornar algo mais, uma vez que absolutamente nenhum ganho decorrerá de tal esforço? 

Ou por que um possível enfermeiro desejará tornar-se médico se não poderá usufruir de um salário alto (que lhe permita um padrão de vida melhor)? Por que ele iria almejar a um cargo profissional hierarquicamente mais altivo e que, por consequência, trouxesse uma maior qualidade de bens e serviços prestados à população?

Em suma: por que algum indivíduo iria querer aprimorar a qualidade de sua mão-de-obra, e com isso melhorar a divisão do trabalho

Sendo implantada uma política de distribuição de renda coercitiva e igualitária, de início, a vida do gari melhorará significativamente, ou seja, poderá ser elevada a um alto padrão pelas reservas econômicas do médico; depois, porém, o médico perceberá que, apesar de trabalhar mais complexamente que o gari e fornecer serviços mais especializados (que poucos outros são capazes de fazer), terá exatamente o mesmo salário que ele e, em consequência, não mais buscará funções mais naturalmente complexas (logo, mais remunerativas). 

Ele não mais se esforçará para melhorar a sua especialização e a qualidade da sua mão-de-obra. Ele não terá por que aumentar o volume da sua poupança, visto que não poderá gozar livremente da mesma para além das condições do gari. 

De início, o médico decide simplesmente não se aperfeiçoar, o que já afeta severamente a divisão do trabalho e a qualidade geral da mão-de-obra. Com o tempo, ele decide parar de trabalhar. Por que continuar?

Porém, uma vez decidido o médico em cessar terminantemente o seu trabalho, a oferta (e a qualidade) de serviços medicinais entra em declínio. Por toda a economia, outros profissionais de outras profissões passam a fazer o mesmo. Por que se dedicar a atividades complexas se é possível obter o mesmo fazendo atividades mais simples?

Por que ser engenheiro se você terá o mesmo padrão de vida sendo gari, taxista ou funcionário de repartição?

Com esse comportamento se generalizando, de onde, então, o estado obterá recursos para alimentar o gari e o ex-médico? 

É aí que começam os racionamentos (em simultâneo aos campos de trabalho forçado).

Eis o ponto: se uma pessoa que meramente finge estar trabalhando, sob o socialismo, tem as mesmíssimas condições de uma que trabalha arduamente e de fato produz, por que esta se manterá produtiva se pode simplesmente não trabalhar e ainda assim subsistir como se estivesse suando em labor? 

Se, em virtude do ideal igualitarista, apagam-se compulsivamente as disparidades econômicas entre quem trabalha de modo árduo e quem finge trabalhar, aquele que antes trabalhava arduamente passará a fingir trabalhar. Se, com efeito, absolutamente ninguém se impele à produção em função da nulificação dos seus frutos privativos, quais serão, afinal, os recursos socializados pelo estado? O estado não é o que se mantém pela predação das posses dos que produzem? 

Se ninguém produz, quais recursos o estado destinará à alimentação do povo? A resposta é um bombástico "nenhum!". 

A fome nada é se não o fruto mais cabal do socialismo. E apenas campos de trabalho forçado e racionamento podem ser utilizados como paliativo. 

Daí a morte de milhões e mais milhões na União Soviética e, de forma mais exemplar, na China de Mao Tsé-Tung

Sobre o autor

Bruno Sousa Silva

É estudante de economia, autodidata em filosofia e ciência política e escritor do livro Imposto é Roubo: A ética dos Lambedores de Botas

Comentários (71)

Deixe seu comentário

Há campos obrigatórios a serem preenchidos!