Protecionismo
N. do T.: o texto a seguir, da década de 1980, ainda se mantém atualíssimo. Naquela época, o fantasma era o Japão; hoje, a China.
O protecionismo, que era frequentemente refutado e parecia abandonado, retornou com força total. Os japoneses -- que se recuperaram das dolorosas perdas da Segunda Guerra Mundial e atualmente estão aturdindo o mundo produzindo produtos inovadores, baratos e de alta qualidade -- estão servindo de alvo perfeito para a artilharia protecionista. Relembrar os mitos da época da guerra virou o passatempo amargo dos protecionistas, que nos alertam sobre esse novo "imperialismo japonês", que é até mesmo "pior do que Pearl Harbor." Só que esse "imperialismo" consiste em vender aos americanos maravilhosos aparelhos de TV, automóveis, microchips, etc., a preços mais do que competitivos em relação às empresas americanas.
Será que essa "enxurrada" de produtos japoneses é realmente uma ameaça que deve ser combatida pelo governo do EUA? Ou seria esse novo Japão uma dádiva para os consumidores americanos?
Ao escolhermos nosso lado nessa questão, devemos antes de tudo reconhecer que toda a ação do governo significa coerção, de tal maneira que pedir ao governo dos EUA que intervenha significa incitá-lo a usar força e violência para restringir um comércio pacífico. Confia-se que os protecionistas não estão dispostos a levar a lógica da força ao paroxismo, na forma de um outro Hiroshima e Nagasaki.
Fique de Olho no Consumidor
Ao destrincharmos todo o imbróglio que é o argumento protecionista, devemos ter em mente duas coisas: (1) protecionismo significa o uso da força para restringir as trocas; e (2) o que interessa é o que acontece ao consumidor. Invariavelmente, vamos perceber que os protecionistas estão aí para arruinar, explorar e impor severas perdas não apenas aos consumidores estrangeiros, mas especialmente aos americanos. E já que cada um de nós é um consumidor, isso significa que o protecionismo está aí para espoliar a nós todos em benefício de alguns poucos privilegiados, subsidiados e -- principalmente -- incompetentes: pessoas essas que não conseguiriam se estabelecer em um mercado livre e totalmente desimpedido.
Peguemos, por exemplo, a alegada ameaça japonesa. Toda a troca é mutuamente benéfica para ambos os lados -- nesse caso, os produtores japoneses e os consumidores americanos --, pois, caso contrário, essas trocas não ocorreriam. Ao tentar impedir essas trocas, os protecionistas estão tentando evitar que os consumidores americanos desfrutem de um melhor padrão de vida ao comprarem produtos japoneses baratos e de alta qualidade. Ao invés disso, somos forçados pelo governo a recorrer aos produtos ineficientes e mais caros que já havíamos rejeitado. Ou seja: produtores ineficientes estão tentando privar todos nós dos produtos que desejamos, de tal forma que tenhamos que recorrer a suas empresas ineficientes. Os consumidores americanos devem ser pilhados.
Uma Outra Visão das Tarifas e Cotas
A melhor maneira de entender as tarifas ou as cotas de importação ou quaisquer outras medidas protecionistas é ignorar as fronteiras políticas dos países. As fronteiras entre as nações podem ser importantes para outras razões, mas elas não têm qualquer significado político. Suponhamos, por exemplo, que cada estado dos EUA fosse uma nação. Certamente ouviríamos várias lamúrias protecionistas das quais felizmente estamos poupados agora. Mas imagine a gritaria que haveria dos fabricantes têxteis de Nova York ou Rhode Island -- que cobram um preço mais alto -- contra a competição "injusta" e a "mão-de-obra barata" dos países "estrangeiros" Tennessee e Carolina do Norte. Ou vice-versa.
Felizmente, o absurdo de se preocupar com o balanço de pagamentos se torna evidente quando nos focamos no comércio intra-estados. Ninguém se preocupa com o balanço de pagamentos entre Nova York e Nova Jersey, ou entre Manhattan e o Brooklyn, porque não existem agentes da alfândega monitorando tais trocas e, portanto, fazendo tais balanços.
Se pensarmos a respeito, fica claro que um pedido de tarifas por parte das empresas de Nova York contra a Carolina do Norte é puramente uma extorsão dos consumidores de Nova York (bem como dos da Carolina do Norte), um privilégio especial e descarado para as empresas menos eficientes. Se os 50 estados fossem nações separadas, os protecionistas estariam aptos a usar os adornos do patriotismo e da desconfiança dos estrangeiros como camuflagem para poder pilhar os consumidores de sua própria região.
Felizmente, tarifas intra-estaduais são inconstitucionais. Mas mesmo sem essa barreira, e mesmo sem poderem se enrolar no manto do nacionalismo, os protecionistas têm conseguido impor tarifas intra-estaduais sob um outro disfarce. Parte do esforço de se aumentar continuamente o salário mínimo federal é para impor um aparato protecionista contra a Carolina do Norte e outros estados do sul -- que têm baixos salários e baixo custo de mão-de-obra. Nesse caso, os grandes interessados nessa barreira protecionista são seus competidores na Nova Inglaterra e no estado de Nova York.
Por exemplo, em 1966, durante a batalha no Congresso pelo aumento do salário mínimo federal, o falecido senador Jacob Javits (R-NY) admitiu abertamente que uma de suas principais razões para apoiar esse aumento era prejudicar os concorrentes sulistas da indústria têxtil de Nova York. Já que os salários no sul são geralmente menores que no norte, as empresas que seriam mais fortemente abaladas por um aumento no salário mínimo (e cujos trabalhadores sofreriam um maior aumento no desemprego) estariam localizadas no sul.
Um outro jeito que tem sido utilizado para impor restrições no comércio entre os estados ganhou o elegante nome de "segurança". No estado de Nova York, por exemplo, produtores de leite organizaram um cartel bem sucedido, com o apóio do governo do estado, para impedir a importação de leite do estado vizinho de Nova Jersey. O motivo patentemente espúrio seria o de que a viagem através do Hudson tornaria o leite de Nova Jersey "inseguro."
Se tarifas e restrições são coisas boas para um país, então por que não seriam para um estado ou região? O princípio é precisamente o mesmo. Na primeira grande depressão americana, o Pânico de 1819, Detroit era uma diminuta cidade fronteiriça com apenas algumas centenas de pessoas. Ainda assim, houve choradeiras protecionistas -- felizmente não obedecidas -- para se proibir todas as "importações" de fora de Detroit. Os cidadãos foram incitados a comprar apenas produtos de Detroit. Se essa tolice tivesse sido posta em prática, a fome generalizada e o alto índice de mortalidade resultantes teriam liquidado todos os outros problemas econômicos dos cidadãos de Detroit.
Então por que não restringir e até mesmo proibir o comércio, ou seja, as "importações", para uma cidade, ou para uma vizinhança, ou mesmo para um quarteirão, ou, para resumir tudo à conclusão lógica, para uma família? Por que a família Jones não deveria expedir um decreto dizendo que, de agora em diante, nenhum membro da família pode comprar quaisquer bens ou serviços produzidos fora de casa? A fome rapidamente aniquilaria essa ridícula tentativa de auto-suficiência.
E ainda assim devemos perceber que toda essa absurdidade é inerente à lógica do protecionismo. O protecionismo padrão é tão insensato quanto, mas a retórica do nacionalismo e das fronteiras nacionais tem sido capaz de obscurecer esse fato vital.
O resultado final é que o protecionismo não é apenas uma tolice, mas uma tolice perigosa, destruidora de toda a prosperidade econômica. Nós não somos, e creio que nunca fomos, um mundo de fazendeiros auto-suficientes. A economia de mercado é uma vasta rede entrelaçada pelo mundo afora, na qual cada indivíduo, cada região, cada país, produz aquilo que ele faz melhor, com maior eficiência relativa, e então troca esse produto pelos bens e serviços de outros. Sem a divisão do trabalho e o comércio baseado nessa divisão, o mundo inteiro iria passar fome. Restrições coercivas nas trocas -- tais como o protecionismo -- mutilam, dificultam e destroem o comércio, que é a fonte de vida e prosperidade. O protecionismo é simplesmente um pretexto para que consumidores, bem como a prosperidade geral, sejam prejudicados apenas para garantir privilégios especiais e permanentes para um grupo menos eficiente de produtores, às custas de empresas mais competentes e às custas dos próprios consumidores. Mas é também um tipo de salva-guarda peculiarmente destruidor, porque ele permanentemente amarra o comércio, sob o manto do patriotismo.
A Estrada de Ferro Negativa
O protecionismo também é peculiarmente destrutivo porque ele gera um coercivo e artificial aumento no custo do transporte entre regiões. Um dos grandes resultados da Revolução Industrial, uma das maneiras em que ela trouxe prosperidade para as massas famintas, foi a redução drástica do custo do transporte. O desenvolvimento das estradas de ferro no início do século XIX, por exemplo, significou que, pela primeira vez na história da raça humana, bens poderiam ser transportados pela terra de maneira barata. Antes disso, as águas -- rios e oceanos -- eram o único meio de transporte economicamente viável. Ao tornarem o transporte terrestre acessível e barato, as estradas de ferro permitiram que o transporte terrestre inter-regional quebrasse os custosos e ineficientes monopólios locais. O resultado foi uma grande melhora no padrão de vida de todos os consumidores. E, apesar disso, o que os protecionistas querem fazer é descer o machado nessa extraordinária ferramenta de progresso.
Não é à toa que Frederic Bastiat, o grande economista laissez-faire francês de meados do século XIX, chamou as tarifas de "estradas de ferro negativas." Protecionistas são tão economicamente destrutivos quanto se estivessem fisicamente fatiando estradas de ferro, ou aviões, ou navios, e nos forçando a retroceder aos custosos transportes do passado -- trilhas pelas montanhas, jangadas, ou embarcações à vela.
Comércio "Justo"
Vamos agora considerar alguns dos principais argumentos protecionistas. Tomemos, por exemplo, a reclamação padrão de que, conquanto os protecionistas "prezem a competição", essa competição deve ser "justa." Sempre que alguém começar a falar sobre "competição justa" ou qualquer coisa nesse sentido, fique de olho na sua carteira porque ela está prestes a ser batida. O genuinamente "justo" é simplesmente a troca se dar em termos voluntários, mutuamente acordados entre o vendedor e o comprador. Como a maioria dos escolásticos medievais foi capaz de perceber, não existe um preço "justo" fora do preço de mercado.
Então o que poderia ser "injusto" a respeito do preço de livre-mercado? Uma acusação protecionista comum é a de que é "injusto" para uma empresa americana competir com, digamos, uma empresa taiwanesa que paga apenas a metade dos salários da concorrente americana. O governo dos EUA é então chamado a intervir e "igualar" os salários impondo uma tarifa equivalente sobre os taiwaneses. Mas será que os consumidores nunca poderão desfrutar de empresas de baixo custo porque seria "injusto" elas terem custos mais baixos do que seus concorrentes ineficientes? Esse é o mesmo argumento que seria utilizado por uma empresa de Nova York contra sua concorrente na Carolina do Norte.
O que os protecionistas não se incomodam em explicar é por que os salários nos EUA são muito maiores do que
A demanda por qualquer fator de produção, incluindo a mão-de-obra, depende da produtividade daquele fator: a quantidade de receita que aquele trabalhador -- ou quilo de cimento, ou acre de terra -- vai trazer marginalmente. Quanto mais produtiva for a fábrica, maior será a demanda dos empregadores, e maior será o preço dessa demanda, ou seja, os salários. A mão-de-obra americana é mais cara que a taiwanesa porque ela é bem mais produtiva. O que a torna produtiva? Em boa parte, sua melhor qualidade comparada, habilidade e educação. Mas a maior diferença não se deve às qualidades pessoais dos trabalhadores em si, mas ao fato de que o trabalhador americano, em sua maioria, está munido de mais e melhores equipamentos (bens de capital) do que seus equivalentes taiwaneses. Quanto maior e melhor for o investimento em capital por trabalhador, maior será a produtividade do trabalhador e, portanto, maior será seu salário.
Portanto, se o salário americano é o dobro do taiwanês, é porque o trabalhador americano é mais fortemente capitalizado, é equipado com mais e melhores ferramentas, e, por isso, é duas vezes mais produtivo, na média. De uma certa maneira, eu suponho, é correto considerar que não seja "justo" que o trabalhador americano ganhe mais que o taiwanês, já que o primeiro simplesmente se beneficiou do fato de poupadores e investidores terem-no suprido com mais ferramentas (ignorando aqui suas qualidades pessoais). Mas um salário não é determinado apenas pelas qualidades pessoais, mas também pela escassez relativa, e nos EUA há muito mais escassez de trabalhadores em relação ao capital do que em Taiwan.
Colocando de outra maneira, o fato de os salários americanos serem, na média, duas vezes maiores do que os salários taiwaneses, não significa que o custo da mão-de-obra nos EUA seja o dobro da de Taiwan. Como a mão-de-obra americana é duas vezes mais produtiva, isso significa que o salário americano duplamente maior é compensado pela produtividade também duplamente maior, de tal maneira que o custo da mão-de-obra por unidade produzida tende, na média, a ser o mesmo nos EUA e
Assim, o problema dos empregadores americanos não é realmente com a "mão-de-obra" barata taiwanesa, uma vez que a "cara mão-de-obra" americana é precisamente o resultado da disputa dos empregadores por essa mão-de-obra, que é escassa. O problema vivido pelas indústrias têxteis e automotivas americanas menos eficientes não advém realmente da mão-de-obra barata em Taiwan ou no Japão, mas, sim, do fato de que outras indústrias americanas são eficientes o suficiente para bancar essa mão-de-obra, elevando os salários a um patamar mais alto.
Então, ao impor tarifas protecionistas e cotas para salvar, ajudar, e manter operando empresas americanas menos eficientes -- sejam elas têxteis, automotivas ou de microchips --, os protecionistas não estão apenas lesando o consumidor americano. Eles estão também prejudicando as empresas e indústrias americanas eficientes, as quais são impedidas de empregar recursos que agora estão presos nas empresas incompetentes. Essas empresas eficientes poderiam, se não fosse por isso, se expandir e vender seus eficientes produtos em casa e no exterior.
"Dumping"
Uma outra linha contraditória de ataque protecionista ao livre mercado afirma que o problema não é tanto os baixos custos desfrutados pelas empresas estrangeiras, mas a "injustiça" de elas venderem seus produtos a preços "abaixo dos custos" para os consumidores americanos, praticando, dessa forma, o pernicioso e pecaminoso "dumping." Ao praticar esse dumping, essas empresas podem obter uma vantagem injusta sobre as empresas americanas que presumivelmente nunca fazem tal prática e que sempre se certificam de que seus preços são sempre altos o suficiente para cobrir os custos. Mas se vender abaixo dos custos é uma arma tão poderosa, por que é que tal prática nunca é feita por empresas dentro do país?
Nossa primeira resposta a esse ataque é que, novamente, mantenhamos o olho nos consumidores em geral e nos consumidores americanos
Mas e quanto às pobres empresas americanas que produzem aparelhos de TV, cujas vendas irão sofrer enquanto a Sony estiver praticamente dando seus aparelhos? Bem, certamente, uma política sensata para a RCA, Zenith, etc. seria parar a produção e as vendas até que a Sony fosse à falência. Mas suponhamos que o pior acontecesse, e a RCA, a Zenith, etc. fossem elas próprias levadas à falência pela guerra de preços feita pela Sony. O que aconteceria? Bem, nesse caso, nós consumidores ainda assim estaríamos melhores, já que as plantas das empresas que faliram ainda existiriam e seriam compradas por um preço irrisório em um leilão -- e os compradores americanos desse leilão estariam aptos a entrar no ramo de TV e bater a Sony, pois esses novos competidores agora gozam de custos de capital bem mais baixos.
Na verdade, durante décadas os opositores do livre mercado alegaram que muitas empresas ganharam poder no mercado praticando aquilo que chamam de "cortes de preços predatórios", isto é: essas empresas forçariam seus concorrentes menores à falência vendendo produtos abaixo do custo, e, logo em seguida, colheriam a recompensa desse método injusto aumentando seus preços e, assim, cobrando "preços de monopólio" dos consumidores. A alegação é que mesmo que os consumidores tenham algum benefício no curto prazo -- com guerras de preços, "dumping", e vendas abaixo dos custos --, eles perderiam no longo prazo com esse alegado monopólio. Mas, como temos visto, a teoria econômica mostra que isso seria um empreendimento inútil, onde essas empresas praticantes de "dumping" perderiam dinheiro e nunca atingiriam o preço de monopólio. Além disso, uma investigação histórica não encontrou um único caso em que preços predatórios, quando tentados, foram bem sucedidos. Na verdade, há poucos casos em que eles realmente foram tentados.
Outra acusação diz que empresas japonesas e outras estrangeiras têm condições de fazer "dumping" porque seus governos estão dispostos a subsidiar seus prejuízos. Mas, novamente, deveríamos ainda assim dar boas vindas a tal absurda política. Se o governo japonês está realmente disposto a gastar escassos recursos subsidiando as compras dos consumidores americanos de aparelhos da Sony, quanto mais, melhor! Essa política seria tão auto-destrutiva para as empresas japonesas, que seria como se suas perdas fossem privadas.
Há ainda um outro problema com a acusação de "dumping", mesmo quando esta é feita por economistas ou outros "experts" alocados em comissões tarifárias independentes ou escritórios governamentais. Não há maneira alguma de observadores de fora -- sejam eles economistas, executivos ou outros peritos -- decidirem quais podem ser os "custos" de outras empresas. "Custos" não são entidades objetivas que podem ser aferidas ou mensuradas. Custos são subjetivos ao próprio executivo, e eles variam continuamente, dependendo de qual o horizonte temporal do executivo, ou o estágio de produção ou o processo de venda com o qual ele esteja lidando em um dado momento.
Suponhamos, por exemplo, que um negociante de frutas comprou uma caixa de pêras por $20, ao preço de $1 o quilo. Ele espera conseguir vender essas peras por $1,50 o quilo. Mas se algo acontecer ao mercado de pêras, e ele descobrir que é impossível vender a maioria das pêras por qualquer valor perto daquele preço, ele vai perceber que terá que vendê-las pelo preço que conseguir antes que elas apodreçam. Agora suponha que ele descubra que só poderá vender seu estoque de pêras por $0.70 o quilo. O observador de fora poderá dizer que o fruteiro praticou "preços predatórios", vendendo "injustamente" suas pêras a preços "abaixo dos custos," imaginando que os custos do fruteiro foram de $1 o quilo.
Indústria "Infante"
Outra falácia protecionista diz que o governo deveria garantir uma tarifa protecionista temporária para ajudar, ou mesmo criar, uma "indústria infante." E então, quando a indústria estivesse bem estabelecida, o governo iria, e deveria, remover a tarifa e jogar a agora "amadurecida" indústria para o mundo competitivo.
A teoria é falaciosa, e essa política já se provou desastrosa na prática. Além do mais, a necessidade que haveria para o governo proteger essa nova e jovem indústria da competição estrangeira deveria ser a mesma para protegê-la da competição doméstica.
Nas décadas recentes, as indústrias "infantes" de plástico, televisão e computadores se saíram muito bem sem tal proteção. Qualquer subsídio governamental para uma nova indústria vai canalizar muito mais recursos para essa indústria em relação às empresas mais velhas, e também vai inaugurar distorções que podem persistir e deixar a empresa ou a indústria permanentemente ineficiente e vulnerável para a concorrência. Como resultado, essas tarifas para proteger a "indústria infante" tendem a se tornar permanentes, independentemente da "maturidade" da indústria. Os proponentes dessas tarifas se deixaram enganar por uma analogia biológica, pensando que elas são "infantes" que precisam de cuidados adultos. Mas uma empresa não é uma pessoa, nem nova, nem velha.
Indústrias Mais Velhas
Também é verdade que, em anos recentes, indústrias mais velhas que são notoriamente ineficientes começaram a usar o que pode ser chamado de argumento para proteção da "indústria senil." Siderúrgicas, automotivas e outras indústrias sem competitividade têm reclamado que precisam de "espaço para respirar" para poderem se re-equipar e se tornarem competitivas contra suas rivais estrangeiras. Segundo elas, esse espaço para respiração pode ser providenciado com vários anos de tarifas e cotas de importação. Esse argumento é tão cheio de furos quanto a abordagem da indústria infante, exceto pelo fato de que será muito mais difícil determinar quando é que a indústria senil terá magicamente rejuvenescido. De fato, a indústria siderúrgica tem sido ineficiente desde sua concepção, e sua idade cronológica não parece ter feito diferença. O primeiro movimento protecionista nos EUA foi lançado em 1820, liderado pela indústria de ferro (que depois se tornou ferro e aço) da Pensilvânia. Essa indústria foi artificialmente alimentada pela Guerra de 1812 e, em 1820, já se encontrava em grave perigo frente os concorrentes estrangeiros bem mais eficientes.
O Problema Inexistente do Balanço de Pagamentos
O conjunto final de argumentos, ou alarmes, está centrado nos mistérios do balanço de pagamentos. Protecionistas se concentram no horror que seria se as importações superassem as exportações, insinuando que se as forças de mercado continuarem desimpedidas, os americanos podem acabar comprando tudo de fora, e sem vender nada aos estrangeiros, de tal maneira que os americanos teriam se fartado a si próprios, às custas da permanente ruína das empresas americanas. Mas se as exportações realmente caíssem para perto de zero, onde os americanos iriam achar dinheiro para comprar bens estrangeiros? Como dissemos antes, o balanço de pagamentos é um pseudo-problema criado pela existência de estatísticas alfandegárias.
Durante a era do padrão-ouro, um déficit no balanço de pagamentos nacional era um problema, mas somente devido ao fato de os bancos praticarem o sistema de reservas fracionárias. Se os bancos americanos, estimulados pelo Fed ou por formas anteriores de bancos centrais, inflassem a moeda e o crédito, essa inflação americana levaria a preços mais altos nos EUA, e isso desestimularia as exportações e estimularia as importações. O déficit resultante teria que ser pago de alguma maneira, e durante a era do padrão-ouro isso significava que ele seria pago em ouro, a moeda internacional. Então, assim que o crédito bancário se expandisse, ouro começava a fluir para fora do país, o que debilitava ainda mais a situação dos bancos que operavam com reservas fracionárias. Para contornar essa ameaça à sua solvência trazida por essa saída de ouro, os bancos eventualmente eram forçados a contrair o crédito, precipitando uma recessão e revertendo o déficit do balanço de pagamentos, trazendo assim o ouro de volta para o país.
Mas atualmente, na era do papel-moeda (dinheiro fiduciário), déficits no balanço de pagamentos são verdadeiramente sem significado, pois o ouro já não mais é um "item de equilíbrio." Na verdade, não existe déficit no balanço de pagamentos. É verdade que, nos últimos anos, as importações foram mais altas que as exportações em aproximadamente $150 bilhões por ano. Mas nenhum ouro saiu do país por causa disso. Nem mesmo dólares "vazaram" para fora. O alegado "déficit" foi pago por estrangeiros investindo essa mesma quantia de dólares americanos: em imóveis, bens de capital, títulos e contas bancárias.
E, na realidade, nos últimos anos, estrangeiros têm investido boa parte de seus fundos em dólares para manter a cotação do dólar alta, permitindo assim que nós efetuemos importações mais baratas. Ao invés de nos preocuparmos e reclamarmos desse acontecimento, deveríamos nos regozijar com o fato de que os investidores estrangeiros estão dispostos a financiar nossas importações baratas. O único problema é que essa bonança já está chegando ao fim, com o dólar se desvalorizando e as exportações ficando mais caras.
Concluímos assim que todo o molho de argumentos protecionistas, à primeira vista muito plausível, é na verdade um tecido de falácias conspícuas. Esses argumentos mostram uma completa ignorância da mais básica teoria econômica. Na verdade, alguns dos argumentos são quase que réplicas constrangedoras das alegações mais ridículas do mercantilismo do século XVII: por exemplo, dizer que, de alguma maneira, é um problema calamitoso que os EUA tenham um déficit na balança comercial, não no geral, mas com apenas um país em especial -- por exemplo, o Japão.
Será que devemos reaprender as réplicas dos mais sofisticados mercantilistas do século XVIII? Mais especificamente, aquelas que dizem que balanças com países individuais vão se cancelar mutuamente, e que, assim sendo, devemos nos preocupar apenas com o balanço geral? (Sem falar que devemos entender que o balanço geral também não será problema algum). Mas não precisamos reler a literatura econômica para perceber que o ímpeto protecionista não vem de teorias econômicas insensatas, mas, sim, da busca por privilégios especiais e coercivos e da restrição do comércio às custas dos competidores mais eficientes e dos consumidores. No exército daqueles que têm interesse especial em usar o processo político para reprimir e saquear o resto de nós, os protecionistas estão entre os mais veneráveis. Já passou da hora de tirarmos essas criaturas das nossas costas de uma vez por todas, e então tratá-los com a indignação adequada que eles tão fartamente merecem.
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