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Direito

Sobre futebol, leis e regulamentações

18/07/2009

Sobre futebol, leis e regulamentações

Há dez anos a sina é a mesma: sempre que um time brasileiro joga uma final do torneio Libertadores da América contra um time estrangeiro, é derrota certa.

A perda do título da Libertadores pelo Cruzeiro para o Estudiantes no último dia 15 de julho é só mais um entre os diversos vexames que os clubes do país do futebol têm dado no século XXI. O último time a conquistar o mais importante torneio continental da América do Sul em cima de um time estrangeiro foi o Palmeiras em 1999, ao vencer o Deportivo Cali em São Paulo. De lá pra cá, Palmeiras (2000), São Caetano (2002), Santos (2003), Grêmio (2007), Fluminense (2008) e Cruzeiro (2009) pipocaram bonito e deixaram que festas latinas ocorressem em gramados brasileiros. Os únicos dois títulos da Libertadores conquistados por times brasileiros (em 2005 e 2006) foram resultantes de finais nacionais (São Paulo x Atlético Paranaense e São Paulo X Internacional).

E o que isso nos diz?

O futebol brasileiro sempre se destacou por ser um celeiro de craques. Contudo, o sucateamento dos clubes, que são desestruturados e amadores, e a total incapacidade de se reter grandes talentos por um período suficiente para se montar um time competitivo e conquistar títulos, nos tornou menos capazes de competir com os clubes dos nossos vizinhos sul-americanos.

E por que não temos essa capacidade, já que o Brasil é um dos países mais estruturados e com o maior PIB da América do Sul e não nos faltam craques?

Há muitos fatores que podem explicar a decadência do futebol de clubes brasileiro na última década. Mas eu quero me prender a um especificamente que, para mim, é o mais relevante: a Lei do Passe Livre/Lei Pelé, em vigor desde 2001.

É de conhecimento geral e irrestrito que, hoje, todos os times do Brasil são completamente dependentes da boa vontade dos empresários do futebol. Seja por meio de uma parceria aberta, como é o caso da Palmeiras/Traffic, ou não explícita, como ocorre entre o São Paulo e Juan Figer (que é dono do passe de grande parte dos jogadores do elenco tricolor), das menores agremiações às camisas de maior tradição do futebol, todos os clubes de futebol hoje precisam de empresários para sobreviver. Ninguém anda com as suas próprias pernas, ninguém compra jogadores inteiros com dinheiro vindo de seu próprio bolso.

E, tudo isso, graças à adorada por tantos Lei do Passe/Lei Pelé.

O estado brasileiro, ao tentar regulamentar algo sobre o qual ele não sabe e não tem a menor ideia de como funciona, conseguiu fazer um grande gol contra o esporte mais amado no país.

Quando foi implantada, a desculpa oficial para a regulamentação nas relações de trabalho entre jogadores e clubes era de que a lei beneficiaria os atletas, que teriam maior liberdade para negociar seus contratos. Na prática, tirou-se o poder dos clubes e jogou-se na mão de empresários - que não estão muito preocupados com títulos, mas sim com a venda de jogadores por quantias milionárias para algum time obscuro do Leste Europeu ou da Ásia.

Não que eu esteja elogiando a lei anterior, que tornava um jogador escravo do time e era tão ruim quanto a atual. O ponto principal aqui é que é absurdo o governo definir como deve ser uma relação de troca entre um indivíduo e uma associação esportiva. Os termos de um contrato de trabalho deveriam ser definidos única e exclusivamente entre o jogador, com o auxílio de seu procurador/advogado/empresário e o clube, chegando-se a um acordo que seja bom para ambas as partes. Jamais essa negociação deveria ser definida por uma terceira parte que não entende absolutamente nada sobre o futebol.

Não precisamos de uma lei para definir a relação contratual entre times x clubes. Cada caso deveria ser definido e negociado entre as partes envolvidas. É isso que configura a livre troca entre indivíduos. Se a lei anterior era ruim, a Lei do Passe/Pelé é muito pior. Importante observar que o futebol deve ser uma das únicas atividades do mundo em que o empregador (o clube) lucra, na maior parte dos casos, menos que o empregado (o jogador). 

Ao favorecer a balança ainda mais para o lado do jogador, o estado brasileiro acabou com qualquer possibilidade de um clube de futebol conseguir montar um time competitivo e reter bons jogadores por dois, três anos. Não que isso se dê apenas por conta da Lei Pelé. Mas é inegável a contribuição do estado ao atual (péssimo) nível do futebol brasileiro. Tanto é verdade que os clubes que mais têm se destacado positivamente nos últimos anos são aqueles cujos departamentos jurídicos melhor conhecem as brechas jurídicas da Lei do Passe.

Diante desses fatos, como brasileira apaixonada por futebol que sou, só posso concluir que a melhor solução para que os clubes brasileiros voltem a ter times competitivos é simplesmente acabar com qualquer tipo de regulamentação na relação de trabalho entre jogadores e clubes. Num cenário assim, tanto o jogador quanto o clube ganham mais poder de barganha. E o torcedor ganha um futebol digno de ser considerado "brasileiro". 

Sobre o autor

Núbia Tavares

É jornalista e foi diretora de operações do Instituto Mises Brasil.

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