Desigualdade e multiculturalismo
No meu trabalho como produtor de conteúdo no YouTube, defendendo libertarianismo, liberdade de mercado, direitos naturais e outras ideias radicais, já fui exposto a muitos argumentos ruins e tentativas realmente sofríveis de refutação. Não que possa se esperar muito da seção de comentários do YouTube, é claro.
Mas um artigo este ano me chamou a atenção, tanto que considerei criar o prêmio de "pior artigo do ano" apenas para poder enviar o prêmio para o autor. Pelo correio. A cobrar. O artigo é o "Uma verdade politicamente incorreta sobre a desigualdade". O mais trágico é que este completo descarrilamento argumentativo foi publicado aqui, no Instituto Mises Brasil.
Autor central para a escola austríaca de economia e para o libertarianismo, Murray Rothbard era conhecido por um padrão curioso. Quando um político republicano ou democrata publicava alguma asneira estatista qualquer ou propunha mais uma lei para empobrecer todo mundo sob a desculpa de enriquecer todo mundo, Murray ocasionalmente publicava críticas. Mas quando algum libertário cometia algum erro, mesmo que consideravelmente pequeno, a marreta crítica de Murray descia com força e pouca piedade. O motivo, segundo ele, era simples: é esperado que um estatista qualquer fale todo tipo de baboseiras, mas um libertário? Não podemos deixar que um de nós possa cometer um erro sem ser corrigido, afinal nossos críticos muito frequentemente não são honestos em suas argumentações, e mesmo quando são, raramente se dão ao trabalho de compreender totalmente a situação antes de expô-la para todo o mundo.
Não que o autor daquele desastroso artigo seja libertário. Honestamente não sei, mas o fato é que o veículo de publicação foi este site, o que pode dar a impressão de que aquele artigo é defendido pelos defensores deste site e do libertarianismo. Justo por isso ele precisa ser meticulosamente respondido. Felizmente o artigo já foi removido, mas a memória permanece e pode ainda estar escondido por aí, para ser replicado em algum outro momento.
Para começo de conversa, o problema começa na escolha da premissa do artigo. A ideia exposta é que o multiculturalismo é incompatível com uma sociedade igualitária. Mesmo que o argumento estivesse certo - e o autor faz um péssimo trabalho de argumentar a favor disso - a questão toda seria total e completamente irrelevante.
Desigualdade sequer é um problema. Pobreza é um problema, e é isto que precisa ser discutido. Multiculturalismo também não é um problema. Conflito entre indivíduos é um problema e culturas muito diferentes vivendo em vizinhança podem gerar conflitos, e é este problema que deve ser discutido, mas é perfeitamente possível que pessoas de várias origens diferentes convivam em paz e em riqueza. Se o multiculturalismo atrapalha a igualdade então é um assunto completamente desimportante. O assunto a ser realmente debatido é: por que, embora muita riqueza tenha sido criada nos últimos dois séculos, ainda existe pobreza no mundo? Alternativamente, poderia ser debatido por que buscar a igualdade como métrica não só envolve uma política antiética de confisco de propriedade e redistribuição, mas também não é condutiva a produção de riqueza e combate a pobreza. Também poderia ter sido discutido se políticas multiculturalistas podem aumentar ou reduzir a pobreza. O autor do artigo que critico aqui certamente perdeu uma ótima oportunidade e seu precioso tempo ao escolher uma pergunta totalmente inútil de se responder.
Mas antes de tudo, vamos abordar o claro desleixo argumentativo do autor. Não posso realmente acusa-lo de ser incompetente, pois não conheço a real extensão de suas habilidades, mas podemos analisar o que foi demonstrado no artigo. Avanço: não tem quase nada de bom.
O autor demonstra implicitamente que não entende Praxiologia, a metodologia fundamental da Escola Austríaca. A prova disso está em tentar provar com estatísticas uma tendência econômica que deveria ser demonstrada a priori. Existem inúmeras razões para que estatísticas de desigualdade sejam mais altas ou mais baixas, e a crítica feita por Ludwig von Mises ao tratamento estatístico dessas tendências é que é impossível quantificar a ação humana e, portanto, calcular suas consequências na sociedade. Dado que existe um praticamente infinito número de variáveis que pode afetar a desigualdade de um país, e que não só não sabemos medi-los, mas teríamos enorme dificuldade em sequer fazer uma lista deles, como podemos isolar a variedade cultural numa sociedade e calcular sua influência na economia? E mais, nenhum multiculturalismo é igual, então como poderíamos usar nos mesmos dados uma sociedade com 33% de muçulmanos e 66% de hindus e outra sociedade com 80% de japoneses, 10% de coreanos e 9% de uruguaios? Obviamente tais culturas, e as religiões que vem com elas, são completamente diferentes e possuem valores completamente diferentes. Uma análise estatística disso é impossível.
E se o autor realmente pretendesse fazer uma análise praxiológica da desigualdade no mundo, no Brasil ou nas cidades que cita como exemplo de igualdade no Brasil, teria que demonstrar como a ação humana na economia leva a equalização de salários e patrimônio, isto é, como a ação de vários indivíduos diferentes com várias vontades diferentes acabaria por convergir em resultados semelhantes. Mais, teria que demonstrar que ações de humanos de diferentes culturas necessariamente divergem em resultados, gerando desigualdade. Um trabalho desses sem dúvida ocuparia no mínimo dezenas de páginas, e não um pequeno artigo como esse. Mas nada disso sequer é tentado.
E mesmo que o tratamento estatístico disso fosse possível, o autor faz um trabalho claramente fraco, e qualquer um que já passou moderadamente perto de um artigo econométrico consegue perceber isso. Onde estão testes estatísticos para isolar as influencias dos fatores? Algum tratamento sobre a margem de erro, ou sobre a precisão da correlação? Nada. Sem nenhuma análise dos poucos dados apresentados ele conclui: a semelhança entre os moradores explica os índices nórdicos de igualdade.Será mesmo?
Como fonte, o autor traz um especialista do IPEA, que diz que "As cidades do Sul são menos desiguais em parte porque a população costuma ser mais educada, a desigualdade educacional costuma ser menor. São populações mais homogêneas". O erro do autor do artigo é 1) saltar inexplicavelmente de um "em parte" para um "explica" e 2) em esquecer que o especialista estava se referindo ao fato de que, por possuírem um nível de educação mais similar, as pessoas acabam por ter rendas similares. O que isso diz sobre sua semelhança de culturas, origem, religião e outros fatores? Rigorosamente nada.
Se pessoas de culturas muito diferentes possuíssem um nível educacional similar, tendo uma contribuição marginal ao processo de produção mais similar, e estivessem inseridas na mesma economia com os mesmos níveis de produtividade do capital investido, seria de se esperar que suas rendas fossem mais similares? Tendo a suspeitar que sim, mas o autor não investiga a hipótese. Outro fator possível para a igualdade de renda nessas cidades é que são simplesmente muito pequenas. Um dos exemplos dados é a cidade de São José do Hortêncio, que possui 4543 habitantes. Com uma baixa população e de perfil agrícola de pequena produção, a economia da cidade é pouco diversificada e não existem muitas oportunidades de receber salários enormes, talvez exceto os salários dos políticos locais. Embora a primeira vista pareçam ser melhores, não pretendo discutir se estas hipóteses explicam ou não a igualdade local, mas apenas que foram completamente ignoradas.
O autor inclusive se contradiz. Ele argumenta que simultaneamente a cidade de São José do Hortêncio, que possui níveis de igualdade iguais aos da Dinamarca, não teve políticas de combate à desigualdade e que está submetida às mesmas políticas públicas que valem para o resto do país. Talvez ele tenha se esquecido que o governo brasileiro possui várias políticas de combate à desigualdade, como o Bolsa Família. Como um brasileiro poderia esquecer da existência desse programa está além da minha compreensão.
E checar isso teria sido muito fácil: o site do Bolsa Família lista os recebedores do benefício por município, e em São José do Hortêncio são 54, segundo dados de 2015 [1]. Parece pouco, mas é 1,2% da população da cidade. Embora esta proporção esteja abaixo da média nacional, já que 6,6% da população brasileira recebe o Bolsa-Família [2], é o suficiente para demolir a afirmação do autor de que "Não houve ali, nem em nenhuma das outras 14 cidades, nenhuma política pública voltada especificamente para reduzir a desigualdade". Fica aqui a lição para quem pretende escrever artigos afirmando absolutos: confira antes se você está realmente certo.
Também vale lembrar que o governo possui vários programas de geração de desigualdade, como os altos salários pagos a funcionários públicos, o BNDES, bancos de fomento agrícola, protecionismo e as universidades públicas, mas isso é assunto para outra hora.
O autor então argumenta que origens étnicas e a origem luterana contribuíram para tal igualdade, gerando uma cultura mais homogênea. Enquanto é verdade que comunidades protestantes promovem a alfabetização e educação de seus membros e outros fatores religiosos podem levar a maior produção econômica, como a crença de que a "mente vazia é a oficina do diabo", isto não diz nada sobre características culturais que podem ser contrárias a produção de riqueza. E mais, esquece completamente o fato de que outras culturas podem possuir costumes também condutivos ao trabalho, estudo e produção de riqueza, inclusive em mais força em relação a cultura protestante. Embora muitos entendam que isso é apenas um argumento muito mal feito, muitos podem enxergar isso como simples xenofobia. É verdade que uma pessoa é apenas culpada pelo que diz e não pelo que é entendido, mas é boa prática, especialmente quando escrevendo para um grande público, fazer um esforço para ser bem compreendido.
Pelo menos o autor traz uma breve discussão sobre a inutilidade do índice Gini de desigualdade como medida desejável de se buscar. O triste é que ele faz isso apesar de direcionar seu argumento para uma análise da desigualdade. Dinamarca, Afeganistão, Noruega, Iraque, Finlândia e Cazaquistão possuem um índice Gini de entre 0,26 e 0,29. São populações muito mais homogêneas e possuem resultados econômicos vastamente diferentes, e usar a desigualdade como objetivo para avaliar tais nações é inútil. Mas o que é útil então? Por que algumas nações são mais ricas e outras mais pobres? Nada disso é discutido.
Pode parecer um desvio de assunto, mas não é. Se a real causa da riqueza não é apontada, fica aberta a porta para que alguém chegue a conclusão de que como os EUA ou o Reino Unido são muito mais diversos do que o Iraque e o Afeganistão, então o multiculturalismo pode trazer riqueza e deve ser uma política de estado. O mais correto, é claro, seria observar que dado que existem países desiguais pobres, como o Brasil, e ricos, como os EUA, ou países igualitários pobres, como o Iraque, e ricos, como a Noruega, então a desigualdade de renda pode muito bem não ser relevante para o enriquecimento da população, e outros fatores devem ser responsáveis pelo processo de erradicação da pobreza.
E qual a real causa da riqueza? É o capitalismo. É o sistema que defende a propriedade privada, permite o comércio e investimentos e que vem erradicando a pobreza de maneira sistemática. Onde temos liberdade de mercado a riqueza logo segue. Onde o estado é pesado, a estagnação ou retrocesso domina.
O autor conclui dizendo que se a população do Brasil fosse formada inteiramente por uma população como a do Rio Grande do Sul ou do Maranhão, a desigualdade no país seria baixa, mas não há real motivo para acreditar nisso, nem o autor apresenta provas ou argumentos convincentes. O autor está extrapolando uma observação de cidades pequenas para uma nação de 205 milhões de pessoas e uma economia muito mais complexa. Além disso, existem países muito homogêneos em população que são muito desiguais: Lesotho, Zambia, Haiti, Paraguai, Chile, China, e por aí vamos. Em bom português, a conclusão do autor não faz sentido e a própria fonte de índices de desigualdade que ele utilizou teria mostrado isso facilmente.
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Mas vamos além. Vamos escrever ao menos um dos artigos que deveriam ter sido feito sobre o assunto: Multiculturalismo e direitos de propriedade
Devo confessar que concordo com o desejo apresentado pelo artigo a que respondo, que o autor caracteriza como uma ideia "de esquerda", embora eu a fraseie de maneira diferente. Também desejo viver numa sociedade diversa, onde cada pessoa é livre para exercer sua religião, suas crenças, manter seus costumes e se relacionar com quem quiser. Ninguém deveria ser obrigado a ser igual, nem eu deveria ser proibido de me relacionar como quiser com outra pessoa que consente, só porque somos diferentes.
A diferença é que nós libertários não olhamos para fronteiras como limitadores de sociedades. Qualquer um que mora numa região de fronteira sabe como a linha arbitrária desenhada no mapa não impede que povos de dois países passem por trocas culturais e operem com uma sociedade. Se algo de fato divide uma sociedade este algo é as ideias que os indivíduos defendem, como no caso da disputa entre a Palestina e Israel. Se a fronteira fosse abolida, ou se mais fronteiras fossem desenhadas, nada mudaria no sentimento dessas pessoas. A outra possibilidade de divisão vem da mera força, isto é, uma organização armada que fisicamente impede que duas sociedades entrem em contato ou aprofundem seus laços, ameaçando de morte quem desobedecer.
Para um libertário, o conceito de sociedade é algo mais como "pessoas que estão interagindo pacificamente". Obviamente pessoas terão suas diferenças em infinitos assuntos, mas ainda assim estarão interagindo uns com os outros de uma forma ou outra. E o que aumentou a interação entre culturas? O capitalismo. Hoje temos inúmeras formas possíveis de conhecer outras culturas, viajar para outros países, entrar em negócios com todos os tipos de pessoas e de adotar para nós aquilo deles que admiramos.
O que um libertário defende é esta liberdade de interação pacífica entre todos os indivíduos e, por conseguinte, entre todos os povos e culturas.
E tudo isso no fim das contas é uma discussão sobre direitos de propriedade. A única posição eticamente e racionalmente defensável [3] é que todos os indivíduos devem ser livres para viverem como quiserem e estabelecer relações como quiserem, contanto que não agridam outros. Se estes indivíduos possuírem culturas diferentes, que seja. Se eu quiser contratar um sírio ou um moçambicano para trabalhar na minha padaria na Polônia, oras, a padaria é minha e eu contrato quem quiser aceitar o emprego.
Se esta liberdade de contrato for garantida, o que necessariamente implica uma garantia de direitos de propriedade, temos uma sociedade libertária, e esta sociedade pode, mas não necessariamente deve, ser multicultural, pacífica e rica. Isto simplesmente porque uma sociedade com claros e defendidos direitos de propriedade será uma sociedade próspera, e isto atrai pessoas de todas as culturas, desde que não agridam os outros indivíduos.
E o que aconteceria com esses agressores? Seriam dados como criminosos e punidos da mesma forma, não importa de que cultura sejam. É bom lembrar: estamos falando de uma sociedade com proteção de propriedade privada. Que propriedade é essa? A teoria de propriedade segundo Locke, defendida por Rothbard, no seu Ética da Liberdade, e Hoppe, em vários de seus trabalhos, mas fica a recomendação do Economics and Ethics of Private Property: a) se algo não tem um dono e você misturar seu trabalho com este algo, este algo agora é sua propriedade. b) se você é proprietário de algo, pode trocar este algo com outra pessoa, ou livremente dar esta coisa para quem bem entender, inclusive no caso de herança e c) caso alguém agrida sua pessoa ou propriedade, você tem o direito de se defender e defender sua propriedade na medida que necessário para parar a agressão.
Numa sociedade libertária qualquer um que praticasse sua cultura pacificamente poderia continuar fazendo isso sem problemas. É óbvio que uma sociedade assim seria um imã fortíssimo para minorias, especialmente as perseguidas, pois saberão que serão deixadas em paz. Uma pessoa que deseja o bem de todas as culturas, religiões, raças, sexualidades e o que mais for cabível deve defender os direitos de propriedade absolutos destes indivíduos.
É importante lembrar que isso não significa nenhuma obrigação de inclusão ou obrigação de contrato. Se eu sou um francês e quero contratar um queniano, este é meu direito e é direito dele aceitar este contrato, goste o governo ou não disso, mas se eu não quiser contrata-lo ou ele não quiser trabalhar para mim, também é meu direito e dele, quer a sociedade ou o governo não gostem disso. Nenhum muçulmano ou judeu deve ser obrigado por lei a trabalhar num açougue que vende carne de porco, assim como nenhum açougueiro deve ser obrigado a parar de vender carne de porco só porque um muçulmano ou judeu quer trabalhar lá. O mesmo vale para a livre-expressão: todos devem manter o direito de se expressar como quiserem, mesmo que o grupo alvo de uma crítica se sinta ofendido.
Obviamente todos terão considerações morais sobre quem frequentemente critica outros grupos, especialmente de maneira preconceituosa e difamatória, e todos os indivíduos também possuem o irrevogável direito de não se relacionar com pessoas preconceituosas, racistas, xenofóbicas ou o que o valha. Tolerância é um valor moral, e como todo valor moral é uma escolha, que deve ser explicada e entendida. Não se pode impor valores morais de tolerância via lei, acima como não se pode impor castidade, prudência ou qualquer outro valor via força. Se um indivíduo não entende a importância de um comportamento, não vê valor nele ou acredita em valores contrários, a caneta do legislador tem pouco ou nenhum poder para mudar uma ideia. Pior, morais legisladas podem acabar por apenas criar um ressentimento contra aquele valor moral, já que está sendo imposto à força. Aqueles que buscam uma sociedade tolerante não devem buscar a lei, e sim o convencimento via argumentos.
Isto posto, por que o multiculturalismo tem apresentado resultados desastrosos? Justamente porque ele é um multiculturalismo forçado, em sociedades onde o direito a propriedade privada não é resguardado como um absoluto.Até agora estávamos tratando de uma sociedade pacífica que atrai pessoas de todos os tipos pelas oportunidades que oferece. O que vemos acontecendo na realidade são governos atraindo imigrantes usando o dinheiro dos pagadores de impostos, e depois se perguntando por que estes pagadores não gostam do multiculturalismo.
Em 2015 na Alemanha 5,91 bilhões de dólares foram distribuídos em benefícios diversos para as 975 mil pessoas que foram buscar asilo no país até então, o que resulta em pouco mais de 6mil dólares por pessoa, por ano, ou 1661 reais por mês. [4] Para referência, o salário médio brasileiro em 2015 foi de 1853 reais [5], ou seja, 90% do salário médio brasileiro com 100% menos trabalho. Fala-se agora, inclusive, de pagar tais pessoas para irem embora do país.[6] Exilados na Suécia recebem repasses para alimentação e moradia. [7] Podemos seguir muito longe nesta lista de benefícios, mas suspeito que o leitor já entendeu o ponto.
E sobre criminalidade, em muitos países que receberam enormes números de imigrantes desde 2014, como Suécia, Alemanha, França, Bélgica e outros, forças policiais são incentivadas a não registrar os crimes, não reportar estatísticas de crimes, não ir atrás de suspeitos, não prender suspeitos e até incentivar vítimas, em alguns casos mulheres vítimas de estupro, a não prestar queixa contra os criminosos. [8][9][10][11][12][13]
Um outro problema é grave, mas muito pouco abordado: a exclusão econômica. Estes imigrantes poderiam encontrar empregos ou abrir seus próprios negócios, mas isto é simplesmente inviável dadas as leis de salário mínimo e as regulações estatais que atravancam o mercado. Dado que muitos não falam a língua local e de maneira geral possuem baixos níveis de escolaridade quando comparados aos europeus, é essencialmente impossível contrata-los até pelo salário mínimo corrente na Alemanha, Bélgica ou França. Não é surpreendente, afinal a origem histórica da lei de salário mínimo não é "garantir os direitos dos trabalhadores" e sim eugenia descarada. A ideia original era que se fosse proibido que "pobres e indesejáveis" trabalhassem via um salário mínimo que eles nunca iriam conseguir, estas pessoas simplesmente morreriam. [14][15][16] Durante os anos 20 e 30 era comum na América do Norte que leis de salário mínimo fossem passadas especificamente para excluir japoneses, negros, mulheres e outros grupos.[17]
Ademais, como esperar que um refugiado entenda a burocracia local para começar um pequeno negócio se ele sequer entende a língua local? Caso tal burocracia não existisse, se tornaria apenas uma questão de abrir seu negócio conforme possível e começar por aí, ou mesmo aceitar um emprego por um salário inferior ao salário mínimo atual, mas em nome de ajudar os pobres e oprimidos o governo cria barreiras que, embora pequenas para os moradores locais, são insuperáveis para os refugiados, criando uma condição de perpétua dependência estatal e marginalização. Como uma sociedade pode se integrar se uma seção inteira dela não tem como trocar com a outra, se não tem como encontrar a outra no mesmo ambiente de trabalho, e esta outra é obrigada pelo estado a sustentar indefinidamente os refugiados?
Falando formalmente, isto significa que tais refugiados e imigrantes não dispõem completamente de seus direitos de propriedade. Não podem abrir um negócio, não podem contratar ou ser contratados pelo preço que bem entenderem. Igualmente os moradores de tais países não dispõem completamente de seus direitos de propriedade. Não podem contratar como quiserem, nem podem se recusar a sustentar outras pessoas ou a ceder suas propriedades quando ordenados pelo governo.
Um dos resultados disso é que muitos moradores destes países, os mesmos que estão pagando a conta de todos estes almoços grátis e vitimados por crimes que a polícia não pode ou não vai resolver, se sentem invadidos, ameaçados, atacados. Este sentimento está correto, pois toda ação estatal envolve usar o dinheiro de outra pessoa, e quem tem sua propriedade confiscada terá ressentimento ou do estado que lhe roubou, ou, caso não entenda este processo, terá ressentimento da pessoa que recebeu este dinheiro. Esta agressão estatal obviamente gera uma vontade de revidar, e em parte por isso vemos um crescimento de ideias anti-imigração e crescimento de partidos radicais. Também por isso vemos grupos se armando como podem e indo as ruas para "combater o crime", afinal se o governo se recusar a proteger a propriedade privada, em muitos casos as pessoas farão isso por conta própria [18].
Notem que esta conclusão não depende de quem está recebendo o dinheiro, afinal, vemos um processo muito semelhante aqui no Brasil, inclusive com fenômenos de justiça popular.
Até aqui estávamos tratando de refugiados e do experimento multiculturalista europeu, mas se toda a população fosse homogênea, ainda existiria um ressentimento entre os que pagam e os que recebem, embora talvez um pouco mitigado por alguma proximidade cultural. Quando o estado toma de um para dar para outro, seu vizinho vira seu inimigo, pois ele pode votar para que você seja obrigado a pagar algo para ele. Seu vizinho também enxerga a situação da mesma maneira, e assim começa uma divisão política na sociedade até que o dinheiro dos pagadores acaba, e o conflito tende a se aprofundar ainda mais, pois o histórico nos mostra que recebedores raramente encaram tais cortes com paz e naturalidade, e sim com revolta.
A conclusão aqui é simples: quando direitos de propriedade são erodidos, quando um pode pegar o que é do outro, a sociedade descamba em conflito, não importa a cultura do pagador e do recebedor. O experimento multiculturalista na Europa também envolveu sérios ataques a propriedade privada, principalmente pesada taxação, e ao invés de aproximar os diferentes membros da sociedade, isto apenas os distanciou.
A lição disso? Se o seu objetivo é aproximar as culturas e povos, isto deve ser feito de maneira voluntária, pacífica, via a criação de um sistema legal que incentiva a aproximação daqueles que enxergam vantagem nessa aproximação e pune criminosos corretamente, independente de quem são, e a sociedade libertária é o melhor exemplo disso. Quase todos reconhecem que um casamento à força é algo repudiável. Devemos reconhecer que este mesmo princípio se aplica ao "casamento" de culturas.
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[1] https://www.bolsa-familia.com/pessoas/rio-grande-do-sul/sao-jose-do-hortencio/1/1/1
[3] Ethics and Economics of Private Property, Hoppe, capítulo 13
[4] https://www.wsj.com/articles/germanys-welfare-bill-rises-169-as-refugee-numbers-grow-1473077920
[6] http://www.dw.com/en/program-paying-asylum-applicants-to-leave-germany-voluntarily-begins/a-37374656
[10] https://www.nytimes.com/2016/01/12/world/europe/swedish-police-coverup-sexual-assault.html
[13] https://www.rt.com/news/328628-german-police-officer-refugees/
[14] https://mises.org/blog/racist-history-minimum-wage-laws
[16] https://fee.org/articles/the-eugenics-plot-of-the-minimum-wage/
[17] https://nypost.com/2013/09/17/why-racists-love-the-minimum-wage-laws/
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