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Economia

O mundo não está superpovoado - e, exatamente por isso, as consequências futuras podem ser ruins

Há uma consequência não-prevista pelos defensores do controle populacional

10/11/2016

O mundo não está superpovoado - e, exatamente por isso, as consequências futuras podem ser ruins

Há uma consequência não-prevista pelos defensores do controle populacional

O filme Inferno é um ótimo suspense de aventura, com Tom Hanks reprisando o papel do professor Robert Langdon. As adaptações cinematográficas dos livros anteriores de Dan Brown (Anjos e Demônios e O Código Da Vinci) foram um sucesso, e é de se esperar que Inferno também faça bonito.

Langdon é um professor de simbologia cujo conhecimento histórico e habilidade para resolver enigmas se torna altamente demandado quando um bilionário deixa um rastro de pistas -- baseadas em versos do Inferno de Dante -- que levam a uma arma biológica que reduziria a população mundial à metade.

O vilão, por sua vez, tem seus motivos. Sendo um malthusiano radical, ele acredita que a raça humana tem de ser reduzida à metade caso queira continuar existindo no futuro. E ele pretende fazer isso por meio da disseminação de uma praga (uma referência à Peste Negra que aniquilou grande parte da população européia no século XIV).

O nome de Malthus não é mencionado no filme, mas suas idéias certamente estão lá. Inferno nos fornece a oportunidade de revisitar esse recorrente temor sobre um suposto 'excesso populacional', e ver se ele realmente procede.

O excesso de gente é um problema?

Thomas Malthus (1766--1834) acreditava que o potencial crescimento exponencial da população geraria um grande problema. Se a população aumentasse mais rapidamente que os meios de subsistência, então, "o poder superior da população não poderá ser controlado sem se produzir miséria ou vícios".

No entanto, a ciência econômica conta uma história bem diferente, e muito menos assustadora, sobre a questão do tamanho populacional. Comecemos pelo básico.

Embora realmente seja verdade que algumas localidades do planeta podem se tornar excessivamente povoadas -- com uma densidade demográfica alta demais para o gosto de algumas pessoas --, o fato é que, enquanto os indivíduos forem livres para comprar e vender terra por um preço mutuamente acordado, a questão da densidade populacional em uma determinada localidade será resolvida automaticamente.

Por exemplo, se já há muita gente morando em um pequeno pedaço de terra -- como ocorre em Hong Kong --, o preço do metro quadrado irá inevitavelmente aumentar, desestimulando mais pessoas de se mudarem para lá. O problema da densidade populacional é resolvido automaticamente pelo sistema de preços.

Sendo eu um introvertido que aprecia a natureza, a paz e a tranquilidade, estou muito pouco disposto a alugar um apartamento no meio de uma cidade barulhenta e cheia. Os preços que estou disposto a pagar para viver em uma cidade pequena do interior, e não em um metrópole, refletem minhas preferências. E, à medida que as outras pessoas compartilham a mesma preferência que a minha ou têm uma preferência exatamente oposta, o uso e a construção de imóveis será racionalizado em ambas as localidades. Nossas demandas por imóveis, em conjunto com a lucratividade de se oferecer esses imóveis, mantêm o crescimento populacional local sob controle.

Mas e numa escala global? O vilão de Inferno estava preocupado com a população mundial. Ele enfatizou a urgência da situação. Só que, em escala mundial, não há motivos para preocupação.

Novamente, comecemos pelo básico.

Segundo o Google, não apenas toda a população mundial caberia no estado do Texas, como também cada indivíduo teria para si uma área de terra de 100 metros quadrados. Isso é o espaço de um apartamento de classe média alta para cada um dos mais de 7 bilhões de habitantes do mundo. [E se toda a população mundial fosse para o estado do Amazonas, a densidade populacional seria equivalente à da cidade de Curitiba].

Com efeito, há vastas extensões de terra completamente desabitadas ao redor do globo. Canadá, Austrália, África, Rússia, EUA e Brasil possuem uma inacreditável quantidade de espaços abertos e não-povoados.  [No Brasil, apenas 0,2% do território está ocupado por cidades e infraestrutura]. 

Os atuais seguidores de Malthus, ao dizerem que o mundo está superpovoado, possuem uma perspectiva enviesada: olham apenas as ruas congestionadas das grandes metrópoles.

Então, se a oferta de terra e espaço não é um problema, o que dizer dos "meios de subsistência"? Haveria alimentos para todos? Mais ainda: com um contínuo crescimento populacional, será que não corremos o risco de vivenciarmos uma escassez não só de alimentos, mas também de remédios, roupas, saneamento básico e vários outros recursos essenciais?

E a resposta também é não. Se, de um lado, uma população maior significa mais bocas para comer, de outro, também significa mais cabeças para pensar e mais mãos e pés para produzir. Quando a população aumenta, aumentam também a oferta e variedade de habilidades, tornando os processos de produção cada vez mais eficientes.

Um número maior de pessoas significa maior especialização. Quanto mais pessoas, mais indivíduos podem se especializar nas infinitas áreas de conhecimento a serem exploradas neste mundo. Cada indivíduo se concentra naquilo que ele faz de melhor; naquilo em que ele possui uma maior vantagem comparativa em relação aos outros. A divisão do trabalho se aprofunda

Os seres humanos não são apenas consumidores.  Cada consumidor é também um produtor.  E foi exatamente essa nossa contínua produção o que aprimorou sobremaneira o nosso padrão de vida desde o nosso surgimento até a época atual.  Todos os luxos que usufruímos, todas as grandes invenções que melhoraram nossas vidas, todas as modernas conveniências que nos atendem, e todos os tipos de lazer que nos fazem relaxar foram produzidas por uma mente humana. 

Podemos seguir esta sequência lógica: os recursos são finitos; os seres humanos consomem recursos; mas os seres humanos também produzem recursos; logo, se os seres humanos produzirem mais recursos do que consomem, um aumento populacional será benéfico para a nossa espécie.

Que nós produzimos mais do que consumimos é um fato autoevidente: basta olharmos para o padrão de vida que usufruímos hoje e compará-lo àquele que tínhamos há 50, 100 ou 1.000 anos.  À medida que a população aumentou, aumentou também a nossa prosperidade, e a redução no sofrimento humano foi impressionante.

Malthus não seria um malthusiano se ele visse esses dados

A evidência empírica de tudo o que foi dito acima é fascinante.

No gráfico abaixo, podemos ver o tipo de mundo que Malthus imaginou: um mundo no qual a maioria das pessoas mal conseguiria sobreviver. Já o nosso mundo atual, do século XXI, conta uma história diferente. A pobreza extrema está em declínio ao mesmo tempo em que a população mundial está aumentando.

A área vermelha mostra o número de pessoas ao redor mundo vivendo na pobreza extrema; a área verde mostra o número de pessoas ao redor do mundo fora da extrema pobreza. ('Extrema pobreza' é definida como um nível de consumo diário menor que US$ 1,90 por dia, com o valor já ajustado para a inflação e para as diferentes realidades de preço de cada país).

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Gráfico 1: a área vermelha mostra o número de pessoas ao redor mundo vivendo na pobreza extrema; a área verde mostra o número de pessoas ao redor do mundo que não estão na extrema pobreza

Hans Rosling, um médico sueco e "celebridade da estatística", se tornou famoso por sua mensagem endereçada ao mundo sobre o crescimento populacional: "Não há motivo para pânico", disse ele. Para Rosling, à medida que a população e as economias crescem, mais pessoas terão acesso a anticoncepcionais e, com isso, limitarão o próprio crescimento populacional. Neste vídeo, ele mostra que todos os países estão em uma tendência de maior expectativa de vida e maior padrão de vida. O exato contrário do que previu Malthus.

Finalmente, há este famoso gráfico em forma de "bastão de hockey" sobre a prosperidade humana. Ele mostra a evolução do PIB real per capita para vários países e para o mundo, desde o ano 1.000.

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Gráfico 2: evolução do PIB real per capita para vários países e para o mundo, desde o ano 1.000

O ponto de virada coincide exatamente com a Revolução Industrial. A adoção de bens de capital movimentados por motores a vapor em conjunto com outras tecnologias que ajudaram a aumentar a produtividade desencadearam uma revolução no bem-estar humano ao redor do globo.

Desde então, a mente humana em conjunto com a maior oferta de mão-de-obra disponibilizada pelo crescimento populacional criou o motor a vapor, o tear têxtil automático, a linha de montagem, a orquestra sinfônica, a ferrovia, a empresa, a imprensa a vapor, o papel barato, a alfabetização universal, o aço barato, a placa de vidro barata, a universidade moderna, o jornal moderno, a água limpa, o concreto armado, a luz elétrica, o elevador, o automóvel, o petróleo, o plástico, meio milhão de novos livros em inglês por ano, o milho híbrido, a penicilina, o avião, o ar urbano limpo, direitos civis, o transplante cardíaco e o computador.

Novas fontes de energia foram dominadas e novos e mais modernos computadores entraram em cena. Hoje, computadores ao redor do mundo estão conectados entre si pela internet e se tornaram tão pequenos ao ponto de caber em nosso bolso. Temos literalmente acesso a todo o conhecimento do mundo na palma de nossa mão.

Bens, serviços e idéias cruzam o globo, possibilitados por um aumento da produtividade humana totalmente impensável há 50 anos.

E quanto mais mentes existirem, mais inovações surgirão para melhorar nossas vidas. A cura para o câncer tem mais chances de ser descoberta em uma sociedade com sete bilhões de pessoas do que em uma com apenas um punhado de indivíduos.

Não creio que Malthus seria um malthusiano se ele pudesse ver o mundo de hoje.

E se os neo-malthusianos ganhassem espaço?

Agora, imagine que houvesse uma acentuada queda na natalidade. Nem estou falando de uma redução na população mundial -- como queria o vilão de Inferno --, mas apenas de uma redução na taxa de crescimento da população.

Qual seria a consequência direta?

Ironicamente, o primeiro arranjo a ser atingido seria justamente aquele que é tão caro às esquerdas adeptas do controle populacional: a seguridade social.  E isso não é nem uma questão ideológica ou econômica, mas sim puramente matemática: uma população crescente tem um número suficiente de pessoas trabalhando para sustentar os idosos. Já uma população declinante simplesmente não terá mão-de-obra jovem para pagar a aposentadoria desses idosos. 

Uma coisa é você ter 10 pessoas trabalhando para pagar a Previdência de um aposentado; outra coisa é você ter apenas duas pessoas, ou mesmo uma, trabalhando para pagar a Previdência desse mesmo aposentado. Alguém terá de ceder.

Menos jovens e mais idosos significa que uma fatia cada vez maior dos recursos será consumida pelos idosos, uma vez que as gerações mais jovens estarão em número insuficiente para compensar essa diferença. A consequência inevitável é que, à medida que a força de trabalho vai declinando, toda a produção vai junto.  Se a força de trabalho encolhe, a produção diminui. Máquinas e equipamentos deixam de receber manutenção, começam a se deteriorar e caem em desuso.  Fábricas são abandonadas.  Empreendimentos imobiliários não são vendidos e os imóveis ficam desocupados. 

Tudo isso resulta em menos crescimento econômico, menos criação de riqueza, menos seguridade social e menos prosperidade para todos. Menos pessoas significa menos atividade econômica.

Todo o padrão de vida cai.

E é exatamente em nome do "padrão de vida" que os defensores da tese do mundo superpovoado falam.

Conclusão

Como disse o doutor Hans Rosling, "não entrem em pânico". Quanto mais pessoas no mundo, maior a nossa qualidade de vida. Por outro lado, "tenham muito pânico" tão logo a população começar a encolher.

 

Sobre o autor

Jonathan Newman

Professor no Mises Institute.

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