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Se você é contra o livre comércio, você nunca viveu sem ele

20/05/2015

Se você é contra o livre comércio, você nunca viveu sem ele

Todos nós trabalhamos porque queremos trocar os frutos do nosso trabalho (dinheiro) por aqueles bens e serviços que ainda não temos ou dos quais necessitamos continuamente.  Trabalhamos e produzimos para que então possamos demandar bens e serviços.  Por isso, nossa produção representa, tautologicamente, nossa demanda.

Se as fronteiras do território dentro do qual você vive estão completamente abertas para todos os bens e serviços produzidos mundialmente, então você é uma pessoa de sorte: você está na privilegiada situação de ter os indivíduos mais talentosos do mundo trabalhando e produzindo para atender às suas demandas.  Mais ainda: esses indivíduos talentosos estão concorrendo acirradamente entre eles para fornecer a você as melhores ofertas. 

Todos aqueles que gostam de barganhas e de pechinchas adoram, intuitivamente, o livre comércio.

Henry Hazlitt, em seu livro Economia Numa Única Lição, disse que "o que é ruim e desastroso para um indivíduo tem de ser igualmente ruim e desastroso para o coletivo de indivíduos que formam uma nação".  Essa frase, tão poderosa em si, permite algumas reflexões.

Em primeiro lugar, a economia de um país não é uma bolha completamente isolada do resto do mundo, vivendo uma vida própria.  A economia de um país é simplesmente uma coleção de indivíduos.  Esses indivíduos que formam a economia de um país recebem um salário em troca de sua mão-de-obra.  Se as fronteiras do país são abertas para os bens e serviços produzidos em todos os pontos do globo -- ou seja, o governo não proíbe, restringe ou tributa importações --, então, por definição, o poder de compra dos salários desses indivíduos alcança sua máxima capacidade.

Nesse cenário, qualquer empresa nacional que eventualmente seja dominante em um determinado setor do mercado irá gradualmente perder seus lucros monopolistas graças à chegada de novos entrantes.  Não há como haver monopólio ou oligopólio se a concorrência é livre para vir de qualquer ponto do planeta.  Fronteiras abertas ao comércio naturalmente aceleram o processo por meio do qual o maior número possível de produtores globalmente talentosos se esforçam vigorosamente para nos servir aos preços mais baixos possíveis.

Contrariamente ao que você ouviu dos economistas keynesianos, a poupança não apenas é boa para um indivíduo, como também é ótima para a economia como um todo.  Keynesianos afirmam que a economia entrará em colapso se os indivíduos não estiverem continuamente gastando e consumindo, mas esse raciocínio fraudulento pode ser exposto quando aplicado ao indivíduo.  Como indivíduos, sabemos intuitivamente que levar uma vida sem poupança é algo totalmente brutal e apavorante.  Sabemos o que significa viver de salário a salário, e sabemos o que é estar em uma situação em que, se perdermos o próximo salário, teremos de contar com a boa vontade de estranhos ou então entrar em algum programa assistencialista do governo.  Pior de tudo: uma falta de poupança nos deixa desprovidos de qualquer segurança financeira no longo prazo. 

Por tudo isso, o livre comércio, ao nos fornecer bens e serviços fartos a preços baixos, nos permite uma maior poupança.

Vale enfatizar que toda a nossa poupança acumulada se traduz em crescimento econômico.  Não há empreendedores e não há investimentos sem poupança.  A ausência de poupança impede que empreendedores e investidores utilizem sua genialidade e criatividade para produzir bens e serviços.  Afinal, se população consome todos os recursos existentes, então é fisicamente impossível utilizar esses mesmos recursos no processo produtivo.  Já se a população, então esses recursos que não foram consumidos podem ser direcionados para processos produtivos.

Consequentemente, alguém, em algum lugar, tem de ter postergado seu consumo para que empreendedores possam então transformar suas ideias em realidades tangíveis.  Não houvesse poupança, ainda estaríamos morando em cavernas. 

Por tudo isso, não apenas o livre comércio amplifica o valor de cada salário que recebemos, como também possibilita uma maior poupança.  E essa maior poupança possibilitada pelo livre comércio representa uma forma de capital que irá financiar ideias e empreendimentos que nos impulsionarão ao enriquecimento e ao progresso.

Os luditas e protecionistas de sempre irão dizer que o livre comércio "destrói empregos nacionais".  Ora, o progresso econômico também.  E isso é bom.  Se "criar empregos" fosse o único propósito de uma economia, então o próximo passo lógico, além de fechar todas as nossas fronteiras aos bens estrangeiros, seria banir os automóveis, os tratores, os computadores e a internet. 

Todas essas quatro invenções representaram uma maciça destruição de empregos (explicado em detalhes aqui).  No entanto, como evidenciado pelo fato de que não estamos na miséria e nem "fila do pão" em decorrência da proliferação dessas invenções, avanços econômicos que destroem empregos antiquados não abolem a necessidade de trabalho e nem a demanda por novos bens e serviços.  Ao contrário: invenções liberam mão-de-obra e recursos escassos, e reorientam investimentos para novas áreas da economia e novas formas de comércio que simplesmente alteram a natureza do nosso trabalho.  Isso é bom. 

Com efeito, há não mais do que 100 anos, a maior parte da humanidade trabalhava no campo, fazendo trabalhos manuais e excruciantes.  O livre comércio intensificou a divisão do trabalho e permitiu a invenção de maquinários agrícolas que libertaram a maioria dos seres humanos da necessidade de trabalhar no campo.  Essas pessoas puderam finalmente se dedicar a outras áreas da economia, aumentando nossa riqueza.  Por isso, deveríamos dar glórias ao progresso econômico e à criação de novos empregos permitidos pelo livre comércio.  Quão habilidoso e produtivo você seria com uma retroescavadeira?

O que nos traz ao melhor argumento -- e, no entanto, o menos utilizado -- em prol do livre comércio: ele maximiza a possibilidade de fazermos o trabalho que mais bem se adapta aos nossos talentos individuais.  Apenas pense nisso.  Uma economia nada mais é do que uma coleção de indivíduos, e o livre comércio maximiza a possibilidade de cada indivíduo fazer justamente aquele tipo de trabalho que mais acentua suas habilidades.

Se essa conclusão ainda não foi devidamente apreciada, apenas imagine viver em uma sociedade na qual nosso trabalho diário serve unicamente ao propósito de sobrevivermos, e não para desenvolver nossos talentos.  Pois essa é a realidade nos países que restringem o livre comércio: as pessoas, ao serem praticamente proibidas de utilizar os frutos do seu trabalho para adquirir aqueles bens e serviços que são mais bem produzidos por estrangeiros, acabam sendo obrigadas a desempenhar várias atividades nas quais não têm nenhuma habilidade.  Uma pessoa boa em informática acaba tendo de trabalhar como operário em uma siderurgia, pois seu governo restringe a importação de aço, que poderia ser adquirido mais barato de estrangeiros.

Estando isoladas da divisão mundial do trabalho, tais pessoas trabalham apenas para sobreviver, e não para desenvolver seus talentos.  Elas não podem trabalhar naquilo em que realmente são boas, pois a restrição ao livre comércio obriga os cidadãos a fazerem de tudo, inclusive aquilo de que não entendem.

Isso é uma vida cruel.  Em países que usufruem o livre comércio, seus cidadãos possuem uma miríade de opções de trabalho: eles podem ser financistas, instrutores de ioga, artistas, cineastas, chefs, contadores e empreendedores do ramo de tecnologia.  Tão rica e com tamanha liberdade de comércio é a economia, que todos têm opções.  Já em sociedades fechadas, as pessoas passam suas vidas lutando para apenas sobreviver, sendo obrigadas a desempenhar várias atividades que não são do seu domínio. 

Em países de economia aberta, as pessoas, justamente por poderem adquirir bens e serviços fornecidos por estrangeiros que são melhores no suprimento destes, podem se concentrar naquilo em que realmente são boas.  Em países de economia fechada, as pessoas não têm essa opção, e engenheiros acabam virando operários de fábricas.

Em países de economia aberta, o lazer é um dado da realidade.  As pessoas, justamente por não terem de perder tempo trabalhando naquilo em que não são boas, podem dedicar boa parte do seu tempo a passatempos de luxo, como esquiar.  Quantas pessoas podem se dar ao luxo de se divertir luxuosamente em países como Myanmar, Zimbábue e Venezuela?

Ainda mais importante de ser ressaltado, nossos diversos estilos de vida são possibilitados justamente pelo livre comércio.  Se você está lendo este artigo, você sabe exatamente por quê, mesmo que inconscientemente.  O computador em que você está lendo esta carta de amor ao livre comércio foi um dos maiores destruidores de empregos na história do mundo, depois do automóvel.  As roupas que você está vestindo, a comida que você come, e o apartamento, casa ou escritório em que você está agora lendo este artigo só estão disponíveis em grande escala graças à divisão global do trabalho, a qual aumentou exponencialmente a produtividade individual.  Não fosse o livre comércio, além de não poder ler este artigo em um computador (ou tablet ou smartphone), você nem sequer teria tempo para enviar um comentário criticando o autor.

Se ainda não está convencido disso, apenas imagine como seria sua vida se você tivesse de fabricar o computador (ou tablet ou smartphone) no qual você está lendo este artigo, cultivar a comida que você come, criar as roupas que você veste, e construir a estrutura na qual você mora.  Caso tivesse de fazer tudo isso, você certamente morreria esquálido, faminto, nu, desabrigado e desempregado. 

Graças ao livre comércio, no entanto, você não é obrigado a se concentrar naquilo que você não é bom.  Em vez disso, você pode apenas trocar os frutos do seu trabalho por todos aqueles bens de consumo que você não é capaz de fabricar.

Livre comércio é sobre barganhas e pechinchas.  A vida seria macabra sem o livre comércio.  Quanto mais livre comércio, melhor a qualidade de vida.  Eis aí uma bandeira a ser diariamente defendida.

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Sobre o autor

John Tamny

É o editor do site Real Clear Markets, contribui para a revista Forbes

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