Esse site usa cookies e dados pessoais de acordo com os nossos Termos de Uso e Política de Privacidade e, ao continuar navegando neste site, você concorda com suas condições.

< Artigos

Economia

"Quanto mais complexa a sociedade, maior a necessidade de regulações estatais." Certo ou errado?

13/05/2014

"Quanto mais complexa a sociedade, maior a necessidade de regulações estatais." Certo ou errado?

É mesmo?
Certa vez, participei de um debate sobre economia em uma universidade.  O então reitor daquela universidade, que defendia a necessidade de a economia ser estritamente regulada pelo governo, recorreu ao seguinte argumento contra mim:

Suas teorias sobre livre mercado, propriedade privada e governo limitado funcionavam bem no século passado, quando a sociedade era menor, a economia era menos interligada, e vivíamos sob arranjos mais simples. Hoje, no entanto, tais teorias seriam simplesmente inviáveis pelo simples fato de que a economia na qual vivemos é muito mais complexa. Quanto mais complexa a sociedade, maior é a necessidade de controles e regulamentações governamentais.  Isso, para mim, é algo tão lógico e evidente que chega a ser axiomático.

Essa falácia frequentemente utilizada -- a qual leva direta e logicamente a uma defesa do planejamento socialista -- possui muita influência porque é aparentemente plausível e, superficialmente, parece ter algum sentido. 

Por isso, ainda mais importante do que desmascará-la, é fazer isso de forma simples e direta, sem recorrer a teorias complexas e de explicações demasiado longas.

E foi essa a resposta dada por um dos participantes daquele debate:

Muito bem.  Imaginemos então a situação mais simples possível: apenas você e eu.  Agora, suponhamos que eu seja um indivíduo indiscutivelmente competente e brilhante. 

Com essas qualidades em mente, você realmente crê que eu teria a competência para determinar (1) em que você deve investir, (2) como você deve efetuar o seu empreendimento, (3) o que você pode produzir, (4) quantas horas você pode trabalhar, (5) qual o salário que você deve receber, (6) qual o preço que você pode cobrar, (7) qual deve ser a sua margem de lucro, (8) com quem você deve se associar, (9) o que você deve vender, e (10) com quem você deve comercializar?

Consequentemente, a minha incompetência já não estaria por demais óbvia nesta forma extremamente simples de sociedade?

E então este mesmo cidadão arrematou:

Agora, vamos dar um passo adiante e imaginar uma sociedade mais complexa.  Imaginemos uma sociedade formada por todas as pessoas que estão nesta sala.  Qual seria a minha competência para controlar coercivamente as ações criativas de cada uma destas pessoas aqui presentes?  Seria eu tão brilhante assim?

Por fim, contemplemos uma situação realmente complexa: uma sociedade formada por 200 milhões de indivíduos.  Se eu me apresentasse dizendo que eu deveria estar no controle da vida de todos eles e de todos os bilhões de trocas voluntárias que eles efetuariam diariamente, tenho certeza de que você diria que eu estaria sofrendo de alucinações.

Logo, não seria algo demasiado óbvio que, quanto mais complexa uma economia, maiores serão os efeitos retardadores gerados pelos controles governamentais?   

Não seria algo lógico que, em uma economia complexa, o controle governamental sobre os esforços produtivos irá exercer uma influência, no mínimo, restritiva sobre essa economia?

Por conseguinte, não seria algo axiomático afirmarmos que, quanto mais complexa a economia, mais deveríamos recorrer às iniciativas individuais, mais deveríamos estimular a liberdade de empreendimento e mais deveríamos usufruir os resultados gerados por essa liberdade empreendedorial? 

Nenhuma mente individual e nem nenhuma combinação de mentes pode prefigurar, nem muito menos controlar de maneira inteligente, as inúmeras trocas voluntárias e as inúmeras manifestações de criatividade que ocorrem em uma sociedade simples.  Imagine, então, em uma sociedade complexa...

O reitor não contra-argumentou.  Creio, aliás, ser improvável que ele venha a utilizar essa mesma argumentação novamente.

Embora o ato de desmascarar falácias cotidianas possa ser comparado ao ato de apagar incêndios com um pedaço de pano, o exercício não deixa de ser útil (além de ser um estímulo à mente).  Treinar a arte da contra-argumentação sempre será uma atividade proveitosa. 

No que mais, a capacidade de desmascarar falácias -- uma tática negativa -- é um prefácio necessário para se aprender a ressaltar de maneira influente tudo aquilo que é positivo.  Se uma pessoa não for capaz de demonstrar competência em destruir teorias socialistas, ela provavelmente não atrairá grandes multidões apenas falando sobre as maravilhas criadas por homens livres.

Dentre todas as mentiras ouvidas em salas de aula ou em nosso dia a dia, não há absolutamente nenhuma que não possa ser refutada.  Tudo o que temos de fazer é colocar nossa mente para funcionar. 

A complexidade de um arranjo não implica automaticamente a necessidade de centralização de poder.  Você e eu já temos um trabalho em tempo integral, que é o de cuidar de nossas respectivas vidas.  Nossa carga horária aumentaria exponencialmente caso tentássemos cuidar também da vida de algumas outras pessoas.  E explodiria para além do concebível caso tentássemos controlar as vidas de milhões de indivíduos.


Sobre o autor

Leonard Read

Foi o fundador do institutoFoundation for Economic Education -- o primeiro moderno think tank libertário dos EUA -- e foi amplamente responsável pelo renascimento da tradição liberal no pós-guerra.

Comentários (57)

Deixe seu comentário

Há campos obrigatórios a serem preenchidos!