Uma Teoria do Socialismo e do Capitalismo - novo lançamento do IMB
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Todos os trabalhos do professor Hoppe são criteriosos, incluindo seus livros The Economics and Ethics of Private Property (2003), Democracy: The God That Failed (2001), A Ciência Econômica e o Método Austríaco (2010), e The Great Fiction: Property, Economy, Society, and the Politics of Decline (2012), este publicado no início de 2012 pela Laissez Faire Books. Mas Uma Teoria do Socialismo e do Capitalismo sempre foi o meu favorito. Um tratado integrado e sistemático, e não apenas uma coletânea de ensaios, este livro é a sua obra-prima -- seu Ação Humana, seu Man, Economy and State.
Uma Teoria do Socialismo e do Capitalismo é uma obra tão rica que exige uma leitura cuidadosa e uma releitura periódica. Numa resenha sobre o livro, o professor Robert McGee observou:
Quando eu leio um livro, faço anotações nas margens e sublinho os pontos que acho que merecem ser relidos. Com esse livro, eu tive que me controlar porque eu estava fazendo tantas anotações que tornavam a minha leitura mais lenta. Quase todo parágrafo tem pelo menos um ponto que merece reflexão.[1]
Eu mesmo fiz uma observação parecida sobre a obra, mencionando os outros trabalhos de Hoppe, numa resenha do seu Economics and Ethics of Private Property:
Se os livros e artigos do professor Hans-Hermann Hoppe já viessem com partes sublinhadas e destacadas permitiria aos leitores poupar bastante tempo. Ou, pelo menos, cada livro deveria vir com uma caneta anexada. Pois quando cumpro o meu hábito rotineiro de sublinhar, circular, verificar, marcar com asteriscos ou destacar ideias importantes nos livros que leio, fico com a impressão de que meus exemplares dos livros do Hoppe foram manuseados por uma criança de dois anos com um lápis de cera.[2]
Na verdade, este livro não é só o meu favorito dentre os trabalhos do professor Hoppe; é também o meu livro predileto de não-ficção de todos os tempos, e uma das obras mais importantes que eu já li. A obra estabelece uma análise rigorosa da natureza dos direito de propriedade e o relaciona com a teoria econômica e política. O livro é fundamentado nos conceitos e na análise da praxeologia misesiana e nos insights libertários rothbardianos.
O capítulo 2 é fundamental ao apresentar e explicar os conceitos básicos indispensáveis à teoria econômica e à filosofia política: propriedade, contrato, agressão, capitalismo e socialismo. Com o seu rigor característico, Hoppe identifica os aspectos essenciais desses conceitos. Como ele mesmo escreve:
Depois do conceito de ação, propriedade é a categoria conceitual mais fundamental dentro das ciências sociais. Na verdade, todos os outros conceitos a serem apresentados neste capítulo -- agressão, contrato, capitalismo e socialismo -- são definíveis de acordo com a propriedade: agressão sendo agressão contra a propriedade, contrato sendo um relacionamento não-agressivo entre proprietários, socialismo sendo uma política institucionalizada de agressão contra a propriedade, e o capitalismo sendo uma política institucionalizada de reconhecimento da propriedade e do contratualismo.
Hoppe também explica "a condição prévia necessária para o surgimento do conceito de propriedade": escassez. Se todos os bens fossem superabundantes ou "gratuitos", não haveria possibilidade de ocorrer disputa ou conflito, nem a necessidade de existir direito de propriedade. Sem o direito de propriedade, não faria sentido haver contrato; ninguém seria dono de nada (porque não haveria necessidade) e a ideia de permitir, dar ou vender as coisas também não faria sentido.
Muito mais do que suas duas grandes influências (Mises e Rothbard), Hoppe enfatiza a importância dessa condição prévia fundamental de toda ação humana, da propriedade e da ética política. Mises e, obviamente, Rothbard, reconheceram que a ação humana emprega meios escassos, mas não deram muita atenção à conexão entre escassez e propriedade. David Hume observou que o fato fundamental da escassez leva a conflitos e exige regras (de propriedade), uma ideia que muito influenciou Hoppe.[3] Ele integrou o foco praxeológico nos recursos escassos como meios de ação com o foco humeano na escassez dos recursos como a origem de um possível conflito e à necessidade de regras de propriedade, ampliando e reforçando dessa forma o enquadramento austro-libertário.
Essa ênfase permitiu a Hoppe verificar facilmente por qual razão a suposta propriedade intelectual não pode ser justificada, e isso bem antes da internet ter forçado os libertários a adotarem um olhar mais severo sobre essas questões. Em um painel de debates em 1987 no Mises Institute com o professor Hoppe, Rothbard e outros, ocorreu o seguinte diálogo:
Pergunta: Eu tenho uma pergunta para o professor Hoppe. A ideia da soberania pessoal se estende ao conhecimento? Eu sou soberano sobre meus pensamentos, ideias e teorias?
Hoppe: (…) para ter um pensamento você tem que ter direito de propriedade sobre o seu corpo. Isso não significa que você é o dono dos seus pensamentos. Os pensamentos podem ser usados por qualquer um que seja capaz de compreendê-los.[4]
Aqui, Hoppe antecipou a posição anti-propriedade intelectual que se tornou predominante atualmente entre a maioria dos libertários, especialmente entre os anarquistas e os austro-libertários. Por causa do seu foco na escassez como condição prévia da propriedade, ele pode facilmente verificar que coisas não-escassas como o conhecimento não podem ser possuídas, ou seja, não podem estar sujeitas ao direito de propriedade.
O enquadramento praxeológico de Mises mostra que toda ação humana emprega meios escassos para se alcançar os objetivos desejados, além de ser orientada pelo conhecimento. Os meios escassos são propriedade privada em um sistema de direitos de propriedade porque eles são escassos; já o conhecimento, enquanto indispensável para uma ação bem-sucedida, não é um meio escasso de ação e, portanto, não é o tipo de coisa sobre o qual se aplica o direito de propriedade.
Ao ter uma compreensão clara sobre os conceitos fundamentais da teoria política e econômica, Hoppe é capaz de verificar facilmente que a propriedade intelectual não faz sentido -- uma conclusão que ainda é difícil para muitos libertários chegar, especialmente os não-austríacos.
Uma vez que Hoppe identificou as características essenciais da agressão e do socialismo no que diz respeito ao contrato e à propriedade, ele passa então a ser capaz de dissecar os vários tipos de socialismo do mundo real: o socialismo ao estilo russo, o socialismo ao estilo social-democrata, o socialismo do conservadorismo e o socialismo de engenharia social.
No capítulo 7, o professor Hoppe apresenta a sua provocadora defesa "ético-argumentativa" dos direitos libertários.[5] A ideia aqui é que, quando buscamos avaliar quais normas políticas são justificáveis -- por exemplo, se o socialismo ou o capitalismo é justificável --, temos que nos envolver na argumentação, ou no discurso, para resolver essas questões. No entanto, a argumentação é, por natureza, uma forma de interação livre de conflito que exige o controle individual dos recursos escassos (observe novamente como o fato fundamental da escassez desempenha um papel na análise de Hoppe; sem a escassez, o conflito é impossível e, portanto, a ideia de interação livre de conflito não faz sentido, e a argumentação sobre quais normas adotar seria impossível e desnecessária).
Em um discurso genuíno, as partes tentam persuadir umas as outras pela força do argumento, não pela força real. Cada parte é livre para discordar sem ser agredida se assim o fizer. Ambas as partes reconhecem que cada uma delas emprega meios escassos (toda ação emprega meios escassos, incluindo a argumentação), inclusive os meios escassos do próprio corpo, e que cada pessoa está respeitando a autopropriedade do outro.
Em outras palavras, dado que em um mundo de escassez há a possibilidade do conflito interpessoal sobre os recursos escassos, é possível surgir a prática da discussão de quais normas deveriam ser adotadas ou quais são justificadas (sem a escassez, nenhum conflito é possível e nenhuma propriedade ou outras normas são necessárias ou até mesmo fazem sentido).
Um discurso livre de conflito é aquele no qual ambos os lados respeitam os direitos de propriedade dos demais em relação aos seus próprios corpos, ou seja, a autopropriedade. Como explica Hoppe, a argumentação dessa forma pressupõe a validade da autopropriedade e, portanto, qualquer argumento para as normas políticas que violem a autopropriedade será sempre contraditório, uma vez que será incompatível com os pressupostos inevitáveis das normas de autopropriedade de qualquer argumentação possível.
Hoppe também mostra que a argumentação pressupõe o direito de ser o dono de recursos escassos que foram apropriados originalmente. É por essas razões que nenhuma ética socialista (isto é, a agressão institucionalizada ou pública) não pode jamais ser justificada argumentativamente, ou seja, não pode ser justificada, pois toda justificação é uma justificação argumentativa (Agressão privada, ou seja, crime, obviamente também não pode ser justificada). A ética libertária de cooperação e do respeito pelos corpos de terceiros e pelos recursos apropriados originalmente ou contratualmente é a única ética possível compatível com as normas da argumentação.
Alguns libertários, eu que vos falo sinceramente incluído, consideram essa teoria como um desenvolvimento profundamente importante na filosofia política. Rothbard também considerava:
Numa descoberta brilhante para a filosofia política em geral e para o libertarianismo em particular, ele conseguiu transcender a famosa dicotomia entre o é/tem de ser e o fato/valor que tem atormentado a filosofia desde a época dos escolásticos e que levou o libertarianismo moderno a um enfadonho beco sem saída. E não apenas isso: Hans Hoppe conseguiu estabelecer o argumento para os direitos anarcocapitalista-lockeano de uma forma fundamental e sem precedentes e que faz com que a minha própria posição em relação à lei natural e aos direitos naturais pareça fraquíssima na comparação.[6]
Além do material fundamental do capítulo 2, da análise sistemática dos tipos de socialismo nos capítulos 3 a 6 e da nova e radical defesa dos direitos libertários e do capitalismo no capítulo 7, Uma Teoria do Socialismo e do Capitalismo contém uma riqueza de outros insights, muitos dos quais contidos nas detalhadas notas de rodapé. Esses incluem uma crítica ao empirismo-positivismo e aos argumentos socialistas que se baseiam nessas ideias cheias de falhas (capítulo 6), e eviscerações das abordagens econômicas convencionais em relação aos bens públicos e à teoria do monopólio (capítulos 9 e 10), bem como uma explicação de por que a "escravidão pública" do socialismo é ainda menos eficiente do que o sistema de escravidão privada (capítulo 4, n. 26).
Outro insight profundo é a explicação do professor Hoppe de que a agressão é uma agressão à integridade física da propriedade de outrem; de que não há direitos de propriedade em relação ao valor da propriedade[7] (esse insight também explica os problemas com a ideia de propriedade intelectual, argumentos que muitas vezes consideram os direitos de propriedade como valor). Por fim, veja também a importante discussão trazida por Hoppe a respeito da distinção entre direitos de propriedade em relação aos corpos e aos recursos escassos externos, e de como eles são adquiridos, o que tem relevância para o debate da autopropriedade e alienabilidade versus a inalienabilidade.[8]
E você verá muito mais neste livro.
Este livro é surpreendente, profundamente importante, estimulante e divertido. Prepare-se para um banquete intelectual.
Stephan Kinsella,
Houston, Texas, Setembro de 2012
Veja também: Por que é impossível argumentar contra a propriedade privada sem cair em autocontradição
[1] Robert W. McGee, "Book Review" (de Hans-Hermann Hoppe, A Theory of Socialism and Capitalism), The Freeman: Ideas on Liberty (September 1989), disponível em thefreemanonline.org.
[2] Stephan Kinsella, "The Undeniable Morality of Capitalism," St. Mary's Law Journal 25 (1994): 1419–47, p. 1420, disponível em stephankinsella.com.
[3] Ver, por exemplo, Uma Teoria do Socialismo e do Capitalismo, capítulo 2, n. 2 (citando Hume em conexão com o argumento da escassez), e o vídeo no YouTube "Hoppe and Hume," (publicado em 10 de junho de 2012).
[4] Transcrito do painel de debates publicado em Austrian Economics Newsletter, vol. 9, no. 2 (Inverno 1988), p. 7, disponível em mises.org.
[5] Para mais fundamentos, ver Stephan Kinsella, "Argumentation Ethics and Liberty: A Concise Guide," Mises Daily (27 de Maio de 2011), disponível em mises.org/daily/5322.
[6] Murray N. Rothbard, "Beyond Is and Ought," Mises Daily (Aug. 24, 2010), publicado originalmente em Liberty (Nov. 1988) e disponível em mises.org/daily/4629.
[7] Uma Teoria do Socialismo e do Capitalismo, capítulo 2, nota (n.) 11, capítulo 7, n. 127 et seq.
[8] Uma Teoria do Socialismo e do Capitalismo, capítulo 2, n. 12 e 14–15. Para uma discussão mais aprofundada sobre essas questões, leia meus artigos "Como nos tornamos donos de nós mesmos," Mises Daily (7 de setembro de 2006), "A Libertarian Theory of Contract: Title Transfer, Binding Promises, and Inalienability," Journal of Libertarian Studies 17, no. 2 (Primavera de 2003): 11–37, e "What Libertarianism Is," Mises Daily (21 de agosto de 2009), disponível em stephankinsella.com.
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