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Economia

A China é o novo exemplo clássico da Teoria Austríaca dos Ciclos Econômicos

05/12/2011

A China é o novo exemplo clássico da Teoria Austríaca dos Ciclos Econômicos

A seguir, um editorial do Wall Street Journal, que faz uma descrição bastante correta de como a China se enquadra no padrão descrito pela TACE (Teoria Austríaca dos Ciclos Econômicos): crédito fácil gerando investimentos errôneos e insustentáveis, os quais, por sua vez, levam a uma crise.

 

O surpreendente anúncio feito pelo Banco Central da China, na quarta-feira passada, de que irá reduzir em meio ponto percentual a taxa dos depósitos compulsórios representou uma admissão explícita de que a economia chinesa já está enfrentando fortes ventos contrários.  A inflação de preços ao consumidor permanece relativamente alta, em 5,5%.  Porém, o verdadeiro valor da inflação -- aquele refletido pelo deflator do PIB -- já está próximo dos 10%.

A maioria dos analistas esperava que o afrouxamento monetário fosse começar apenas no ano que vem, quando a inflação de preços já estivesse mais sob controle.  Só que a maioria destes analistas também previa um "pouso suave" para a economia chinesa.  Os dados divulgados nos últimos dias sugerem que a atual tendência de estagflação irá continuar, e o pouso poderá ser brusco.

Os preços dos imóveis vêm caindo por três meses consecutivos, e essa tendência está acelerando.  Os índices sobre a saúde do setor industrial (que mensuram variáveis como novos pedidos, nível dos estoques, produção, entregas de fornecedores e situação do emprego) -- tanto aqueles mensurados pelo próprio governo quanto os mensurados pelo HSBC -- sofreram um enorme baque em novembro, entrando em território negativo pela primeira vez desde o início de 2009.  A diferença é que, desta vez, a China não poderá resolver seus problemas domésticos recorrendo a um aumento das exportações, dado que a demanda externa está encolhendo.

A China é um exemplo clássico da teoria dos ciclos econômicos criada pela Escola Austríaca de pensamento econômico.  Após incorrer no maior programa de estímulos que o mundo jamais testemunhou, como resposta à crise financeira global, o país está afogado em investimentos improdutivos financiados com crédito fácil.

O governo gastou 15% do PIB majoritariamente em obras públicas em regiões do interior do país, financiadas com empréstimos de bancos estatais.  O investimento como porcentagem do PIB disparou para 48,5% em 2010, e o agregado M2 da oferta monetária aumentou para um valor 40% maior que o M2 americano.

E agora vem a ressaca.  Os projetos de obras públicas estão se arrefecendo, o que está desencadeando uma onda de desemprego e estimulando algumas inquietações sociais.  O número de empréstimos bancários que não geram o retorno esperado está aumentando, e os governos locais estão insolventes.  O país está repleto de prédios governamentais luxuosos, cidades fantasmas cheias de apartamentos vazios, linhas de trem de alta velocidade inseguras, e rodovias em estado calamitoso que vão do nada a lugar nenhum.

Um dos efeitos das taxas de juros reais negativas foi uma bolha imobiliária em nível nacional, com o preço médio de um apartamento urbano chegando a oito vezes o valor da renda média anual.  Imóveis representam o investimento mais apreciado pelos ricos, de acordo com uma pesquisa feita pelo Banco Central chinês em setembro.  Milhões de apartamentos luxuosos estão vagos, mesmo havendo uma escassez de imóveis a preços acessíveis para os mais pobres.

A construção de imóveis se transformou no "mais importante setor do universo", segundo as palavras do economista do UBS Jonathan Anderson.  Ela é a responsável direta por aproximadamente 13% da economia -- 20% se incluirmos as indústrias relacionadas, como aço e concreto.  Também é responsável por 40% da receita dos governos locais por meio da venda de terrenos (os quais são propriedade dos governos).

Uma piora nos indicadores da inflação de preços forçou o governo chinês a pisar no freio este ano.  Assim como ocorre com a maioria das bolhas imobiliárias que estouram, as transações secaram.  A isso se seguiu uma queda livre nos preços.  Em setembro, os preços dos terrenos já haviam caído 60% em relação aos últimos doze meses.  As incorporadoras estão cortando os preços dos novos lançamentos para adiar a falência.

Pequim reconhece os perigos de uma bolha imobiliária e, por isso, deliberadamente estourou a atual ao ordenar aos bancos que restringissem os empréstimos às incorporadoras.  O governo parece determinado a pressionar algumas das pequenas incorporadas contra a parede, tanto para forçar algumas fusões na indústria quanto para convencer as incorporadoras restantes a entrar no programa governamental de construir imóveis para as pessoas de baixa renda.

Ainda no início deste ano, os reguladores do sistema bancário conduziram testes de estresse para mensurar a solidez dos bancos.  Os resultados supostamente mostraram que o sistema financeiro pode suportar uma queda de 40% nos preços dos imóveis.  Hipotecas e empréstimos às incorporadoras representam aproximadamente 20% dos empréstimos dos bancos.  Porém, dado que a saúde da economia como um todo depende do setor imobiliário, a China pode vir a enfrentar um cenário semelhante ao enfrentado pelos EUA nos últimos anos.  Como o mercado privado de imóveis era minúsculo até uns 10 anos atrás, quando o atual boom imobiliário começou, o país jamais vivenciou um amplo declínio nos preços dos imóveis.  Portanto, não há nenhuma experiência anterior quanto a este cenário.

O governo e os analistas mais otimistas dizem que a construção de imóveis de baixa renda irá estimular qualquer possível enfraquecimento da economia, à medida que as atividades da ponta final do mercado forem esfriando.  O problema é que mesmo que o governo alcance seus objetivos, o programa ainda é muito pequeno para salvar a economia.  O Banco Barclays estima que ele irá contribuir com apenas um ponto percentual para o crescimento em 2011, e 0,5 ponto percentual em 2012. [Aqui o Wall Street Journal dá sua inevitável derrapada keynesiana, dando a entender que o programa seria melhor caso o governo estimulasse ainda mais as construções.  Mas é perdoável.]

Não há maneira fácil de evitar a recessão que está por vir.  O consolo é que o modelo chinês de crescimento, cada vez mais dependente de estímulos estatais, será desacreditado, abrindo espaço para um debate sobre o reinício das reformas que foram interrompidas em meados da década de 2000.  Um setor financeiro que distribui crédito baseando-se em conveniências políticas em vez de em preços de mercado levou a China a esta bagunça.  A pressão popular para desmantelar esse capitalismo clientelista está crescendo, e o Partido Comunista se daria bem caso se adiantasse a esses eventos enquanto ainda há tempo.

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Veja também:

Preço do imóvel cai e chineses protestam

A bolha imobiliária chinesa e o espectro de uma grande recessão


Sobre o autor

The Wall Street Journal

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