quarta-feira, 23 mar 2011
Leitores
que nos acompanham há mais tempo sabem que nunca levamos a sério
o modo de se mensurar o PIB.
Se às vezes citamos essa variável em
algum artigo, tal fato se deu por pura falta de outro mensurador padronizado
que fosse igualmente difundido.
Com
um certo atraso, vale a pena fazermos algumas considerações sobre o PIB
brasileiro de 2010, o qual cresceu 7,5%.
A
imprensa, como era de se esperar, noticiou que o PIB é o "total de riquezas
produzidas pelo país" — ou alguma variância dessa frase. Caso o PIB realmente mensurasse o total de
riquezas produzidas no país, então qualquer aumento percentual deveria ser
fortemente comemorado.
Mas
o fato é que o PIB, ao menos da maneira como é calculado, não mensura o total
de riquezas produzidas pelo país. Logo,
quando se diz que o PIB aumentou 7,5% de um ano para o outro, não se pode dizer
que a riqueza do país aumentou 7,5% nesse período.
A
equação do PIB, a qual já foi amplamente debatida neste artigo, mede
apenas o valor monetário de todos os bens e serviços finais que foram comprados
e vendidos dentro das fronteiras do Brasil em um dado ano. Ou seja, o PIB é apenas um cálculo de todas
as transações monetárias envolvendo bens e serviços finais. Ele é utilizado para mensurar o gasto agregado da economia.
A
importância de tal afirmação não pode ser ignorada, pois é ela quem nos permite
uma compreensão bem mais acurada sobre o que realmente se mensura quando se
fala de PIB. O PIB não mensura um aumento na
produção de bens e serviços, tampouco
um aumento genuíno da riqueza, mas sim o valor
monetário (ou seja, preços) de tais bens e serviços. Quanto mais se gasta em bens e serviços —
isto é, quanto maior o volume de gastos —, maior será o PIB.
E
o que significa isso? Significa que o
PIB é uma equação que depende primordialmente da inflação monetária — isto é,
do aumento da quantidade de dinheiro na economia. O valor do PIB aumenta de acordo com essa
inflação. Se o Banco Central aumenta a
quantidade de dinheiro na economia, isso elevará a quantidade de transações
monetárias (volume de gastos) que ocorrem na economia. Mais ainda: aumentará os preços. Logo, o valor monetário dos bens e serviços
será maior. Por conseguinte, o PIB
também será maior.
Quando
se olha por esse ângulo, as coisas podem parecer nebulosas, mas isso ocorre
justamente porque a equação não faz sentido do ponto de vista econômico. O que os economistas chamam de "crescimento
econômico" mensurado pelo PIB de um ano para o outro nada mais é do que aumento
do valor final (preço) das transações monetárias de um ano para o outro. Esse resultado nominal é dividido por um
questionável deflator de preços, para se obter o PIB real.
Logo,
quanto maior for a injeção de dinheiro na economia, maior será o volume de
gastos — e consequentemente maior será o "crescimento econômico" mensurado
pelo PIB. Em suma, mais dinheiro gera
mais gastos, o que gera maior "crescimento econômico".
O
que nos leva a uma importante conclusão: se, de um ano para o outro, o volume
de dinheiro na economia aumentar, e isso levar a um aumento no volume de
gastos, mas, por algum motivo, os preços aumentarem pouco (o que significa que
o deflator será baixo), então haverá um significativo aumento no PIB. Ou seja, por algum tempo, é perfeitamente
possível fazer a economia "crescer" utilizando simplesmente o artifício da injeção
monetária. Caso o aumento dos preços
seja pequeno, o deflator será baixo, e consequentemente o crescimento será
expressivo. Tal artifício pode funcionar
excelentemente em uma democracia, principalmente em ano de eleição. O problema é que o aumento dos preços
inevitavelmente chegará um dia — mas aí o político já estará reeleito.
Quando
se entende essas artimanhas do PIB, fica mais fácil intuir por que é
perfeitamente possível haver um enorme aumento no PIB sem que nada tenha sido
produzido, isto é, sem que tenha havido aumento na riqueza. De mesma forma, é perfeitamente possível o
PIB ficar inalterado de um ano para o outro e, ainda assim, ter havido um
enorme aumento na quantidade de bens e serviços produzidos. Tudo vai depender do volume de gastos e do
deflator.
O Brasil em 2010
Eis
os principais pontos relatados
pelo IBGE sobre a economia brasileira em 2010:
No acumulado no ano de 2010, em relação ao mesmo período de 2009, o PIB
variou 7,5%, resultado do crescimento de 6,7% no valor adicionado e 12,5% nos
impostos. Nessa comparação, a agropecuária (6,5%), a indústria (10,1%) e os
serviços (5,4%) cresceram. Assim, segundo as informações das Contas Nacionais
Trimestrais, em 2010, o PIB em valores correntes alcançou R$ 3,675 trilhões. O
PIB per capita ficou em R$ 19.016, apresentando uma alta de 6,5%, em volume, em
relação a 2009 (R$ 16.634).
Na análise da demanda, a despesa de consumo das famílias cresceu
7,0% em 2010, sétimo ano consecutivo de aumento. A formação bruta de capital
fixo cresceu 21,8%, maior taxa acumulada em quatro trimestres da
série iniciada em 1996. Já a despesa do consumo da administração pública
também aumentou 3,3%.
No âmbito do setor externo, as exportações tiveram crescimento de
11,5%, e as importações se expandiram 36,2%. Contribui para este quadro a
valorização cambial ocorrida entre 2009 e 2010. A taxa de câmbio (medida pela
média anual das taxas de câmbio R$/US$ de compra e venda) variou de 2,00 para
1,76.
Ou seja: consumo,
investimentos e gastos do governo aumentaram (exportações e importações não
serão o enfoque desse artigo) em 2010 em relação a 2009.
O que provocou
esse aumento generalizado nessas três variáveis? Como demonstrado nesse artigo sobre as
causas do atual surto inflacionário brasileiro, a expansão monetária ocorrida
no período de setembro de 2009 a novembro de 2010 foi de 19,7% — para um
período de 14 meses, algo substantivo.
Essa expansão
monetária sem dúvidas aditivou o PIB de 2010.
Para exemplificar
o quão incoerente é esse sistema contábil, o IPC (Índice de
Preços ao Consumidor) de 2008 foi 6,07%.
O de 2010 foi de 6,24%. Ainda
assim, o deflator utilizado para calcular o PIB de 2010 foi menor que o
de 2008: 7,34 contra 8,33.
Ou seja, não
obstante a inflação de preços em 2010 tenha sido maior que em 2008, o deflator
utilizado para corrigir o PIB foi menor — algo que sem dúvidas teve grande
efeito sobre o valor final do PIB de 2010.
Ademais, como o
IPCA e INPC (outros índices de preços ao consumidor) de ambos os anos foram
idênticos, fica ainda mais esquisita essa opção por um deflator mais
baixo. Como os economistas seguidores da
Escola Austríaca sempre enfatizaram, o deflator em todas as ocasiões é uma
medida pra lá de dúbia. Não é à toa que
o próprio IBGE o chama de "deflator implícito", algo não muito científico —
mas não espere ler sobre isso na mídia.
Entretanto,
os mais céticos podem dizer: "Ora, o que interessa é a sensação do povo. E, independentemente de cálculos do PIB, é
indubitável que 2010 foi um ano de grande fartura para todos."
É
verdade que 2010 foi um ano de baixo de desemprego. Mas isso também é explicado pelo fenômeno da
expansão da oferta monetária. Um aumento
da oferta monetária, em conjunto com a redução dos juros, de fato pode provocar
uma redução na taxa de desemprego. Mas
temporária.
Como
explica a teoria austríaca dos ciclos econômicos, uma redução na taxa de juros
e um subsequente aumento na disponibilidade de crédito (ambos causados pela
expansão monetária) estimulam mais investimentos em projetos de longo de prazo
— o que explica, dentre outras coisas, o surto imobiliário que vem ocorrendo
no Brasil. Consequentemente, há um
aumento do emprego nos setores que recebem esses investimentos adicionais. Porém, como essa redução nos juros não foi
causada por um aumento na poupança (isto é, pela abstenção do consumo), mas sim
pela simples manipulação dos juros feita pelo Banco Central, não houve uma
liberação de recursos de um setor para ser utilizado em outro setor.
Traduzindo:
mais dinheiro na economia faz aumentar a demanda por mão-de-obra na indústria e
na construção civil, mas ao mesmo tempo o setor de serviços e o de comércio continua
precisando de mão-de-obra, pois não houve aumento na poupança (abstenção de
consumo). Assim, começa a haver uma
batalha por mão-de-obra. Houvesse poupança
genuína, a mão-de-obra de um setor seria liberada para outro setor. Como não há poupança, esses fatores de
produção começam a ser disputados via aumentos salariais.
Veja
na tabela abaixo
o aumento no emprego em todas as áreas da economia, tendo-se a base 100 para
dezembro de 2009:
Período
|
Total
|
|
Indústria
da
|
Comércio
|
Serviços
|
|
Construção
civil
|
|
|
|
|
|
transformação
|
|
|
|
|
|
|
|
|
Observado
|
Dessaz.
|
Observado
|
Dessaz.
|
Observado
|
Dessaz.
|
Observado
|
Dessaz.
|
Observado
|
Dessaz.
|
|
|
|
|
|
|
|
|
|
|
|
|
|
|
|
|
|
|
|
|
|
|
|
|
2009
|
Dez
|
100,00
|
100,00
|
100,00
|
100,00
|
100,00
|
100,00
|
100,00
|
100,00
|
100,00
|
100,00
|
2010
|
Jan
|
100,55
|
100,65
|
100,93
|
100,82
|
99,91
|
100,62
|
100,44
|
100,51
|
102,40
|
101,64
|
|
Fev
|
101,18
|
101,17
|
101,78
|
101,59
|
100,05
|
101,15
|
101,09
|
100,92
|
103,94
|
103,01
|
|
Mar
|
101,99
|
101,87
|
102,75
|
102,45
|
100,45
|
101,83
|
101,89
|
101,60
|
105,64
|
104,16
|
|
Abr
|
102,92
|
102,43
|
103,87
|
103,00
|
101,00
|
102,49
|
102,63
|
102,10
|
107,34
|
105,32
|
|
Mai
|
103,82
|
102,97
|
104,71
|
103,55
|
101,59
|
103,08
|
103,28
|
102,66
|
109,07
|
106,42
|
|
Jun
|
104,46
|
103,47
|
105,31
|
104,11
|
101,95
|
103,58
|
103,72
|
103,20
|
110,16
|
107,21
|
|
Jul
|
105,02
|
103,94
|
105,87
|
104,54
|
102,33
|
104,08
|
104,18
|
103,76
|
111,86
|
108,01
|
|
Ago
|
105,92
|
104,45
|
106,82
|
104,94
|
103,21
|
104,63
|
105,15
|
104,38
|
113,63
|
108,71
|
|
Set
|
106,67
|
104,87
|
108,09
|
105,10
|
103,95
|
105,13
|
105,87
|
104,94
|
114,59
|
109,24
|
|
Out
|
107,29
|
105,32
|
108,72
|
105,37
|
105,05
|
105,71
|
106,52
|
105,48
|
115,10
|
109,81
|
|
Nov
|
107,71
|
105,84
|
108,60
|
105,88
|
106,83
|
106,46
|
107,12
|
106,03
|
114,75
|
110,50
|
|
Dez
|
106,48
|
106,47
|
106,54
|
106,55
|
107,02
|
107,01
|
106,55
|
106,59
|
111,23
|
111,25
|
|
|
|
|
|
|
|
|
|
|
|
|
2011
|
Jan
|
106,93
|
107,00
|
107,25
|
107,08
|
106,77
|
107,50
|
107,09
|
107,14
|
112,69
|
111,85
|
|
Fev
|
107,76
|
107,71
|
108,06
|
107,81
|
107,01
|
108,18
|
108,09
|
107,88
|
114,03
|
112,98
|
Fonte: Ministério do Trabalho e Emprego
Observe
que o aumento no emprego na indústria, no comércio e nos serviços é bastante
semelhante, ao passo que no setor da construção civil ele é bem mais vigoroso. Tudo isso vem provocando uma elevação geral
nos salários.
À
primeira vista, isso parece bom. Quem
poderia ser contra aumentos salariais e queda no desemprego? O problema é que tal arranjo é insustentável,
simplesmente porque vivemos em um mundo de escassez. Quando começa a haver escassezes — seja de
mão-de-obra, seja de produtos — os preços inevitavelmente tendem a
aumentar. Se nada for feito, eles tendem
a aumentar em ritmo cada vez mais acelerado, que é o que já está acontecendo no
Brasil.
A
expansão monetária, a redução nos juros e o aumento no crédito geram, como
dito, investimentos adicionais em várias áreas até então pouco lucrativas. Esses novos investimentos requerem
mão-de-obra adicional, a qual passa a ser retirada de setores como comércio e
serviços. Assim, ao mesmo tempo em que
uma construtora passa a demandar mais engenheiros, arquitetos, mestres-de-obras,
corretores, vendedores, relações públicas etc., o setor de serviços e o
comércio continuam demandando com a mesma intensidade esses profissionais, pois
as pessoas não estão poupando, o que significa que o consumo segue aquecido em
todos os setores — a redução dos juros, como dito, não veio da poupança, mas
sim da criação de dinheiro pelo Banco Central.
Essa
disputa por mão-de-obra provoca uma redução no desemprego e um aumento nos
salários médios.
Da
mesma forma, toda essa expansão monetária inevitavelmente gerará, a partir de
algum momento, um forte aumento de preços nos bens e serviços.
Enquanto
estiver havendo essa expansão do dinheiro e do crédito, mas os preços
continuarem contidos, os números positivos da economia irão durar. A demanda por bens e serviços irá continuar em alta.
Os estoques das empresas serão prontamente
vendidos. Apartamentos continuarão sendo
vendidos na planta. Novos
empreendimentos continuarão sendo iniciados.
Carros zero continuarão sendo vendidos aceleradamente. Novos restaurantes e novas lojas continuarão
sendo abertos. Os preços e os lucros
continuarão subindo. Trabalhadores
continuarão encontrando empregos a salários nominais cada vez maiores.
O
único detalhe chato de tudo isso é que tal expansão não pode durar.
Em
algum momento, essa expansão monetária começará a provocar um aumento
generalizado nos preços, como já vem acontecendo no Brasil. Caso o Banco Central nada faça, os juros
subirão naturalmente, pois os bancos terão de encarecer os seus empréstimos —
caso contrário, eles simplesmente irão receber, no momento da quitação do
empréstimo, um dinheiro com um poder de compra menor do que o que esperavam
receber quando concederam o empréstimo.
Esse
aumento dos juros inviabilizará a conclusão de empreendimentos de longo prazo
— sejam eles a construção de shoppings, a construção de prédios, a expansão de
indústrias ou até mesmo a abertura de franquias de restaurantes. Descobre-se, finalmente, que não havia
poupança suficiente para sustentar a viabilidade de longo prazo desses
investimentos. (Na atual crise
americana, mais de 600
franquias do Starbucks foram fechadas, simplesmente porque a empresa se
expandiu excessivamente durante o período do crescimento econômico insustentável. Veio a recessão e descobriu-se que não havia
demanda — ao menos ao nível vigente de preços — para tamanho investimento).
Quando
isso acontecer no Brasil, haverá um processo de correção na economia, também
conhecido como recessão. A mão-de-obra
que foi desviada para setores que se expandiram apenas por causa dos juros
artificialmente baixos — qualquer grande empreendimento de longo prazo —
descobrirá que suas habilidades não mais estão sob demanda. Elas perdem o emprego e passam a ter de se
reeducar para adquirir novas habilidades para outros empregos, os quais
provavelmente estarão agora no setor de serviços e comércio.
Portanto,
uma política de expansão monetária e redução de juros — como a que ocorreu no
Brasil desde meados de 2009 até o final de 2010 — de fato pode criar aumentos
no emprego e nos salários. Mas, por uma
simples questão de escassez (não vivemos na abundância), esses aumentos serão
temporários, pois o que motivou a redução nos juros não foi a poupança genuína
(abstenção do consumo), mas sim a mera criação de dinheiro. E, como se sabe, criar dinheiro não faz com
que haja mais bens disponíveis na economia.
O que genuinamente provoca aumento da riqueza de uma economia é a
poupança, a acumulação de capital e a divisão do trabalho. E não manipulações monetárias.
Quando
a política de expansão monetária for interrompida, todos os empregos que foram
criados em decorrência dessa política serão destruídos. É a própria expansão monetária que cria o
terreno para uma futura recessão.
Conclusão
Um
sinal de que podemos estar nesse fenômeno da expansão dos investimentos
motivada pela expansão monetária pode ser vista no gráfico abaixo do IBGE. A taxa de investimento, linha azul, tem se
mantido acima da taxa de poupança, linha amarela, há 3 anos.
É
difícil saber separar investimento bom de investimento insustentável, seja ele
investimento feito por agentes domésticos ou estrangeiros. O que se sabe ao certo é que todos os
investimentos insustentáveis representam uma destruição de capital. Recursos que poderiam estar sendo utilizado
proveitosamente em outras áreas estão sendo desperdiçados em investimentos que
não serão viáveis a longo prazo. E tudo
isso, vale ressaltar, é contabilizado positivamente pelo PIB, como ocorreu em
2010. Ou seja, mesmo que possa estar
havendo destruição de riqueza, todos os investimentos são contabilizados
positivamente.
Como
brilhantemente resumiu o
professor Antony Mueller:
[...]Investimentos que estão sendo feitos em produtos que
ninguém quer, ou pelos quais ninguém está disposto a pagar, contam como
produção. Imagine uma economia onde os investimentos ruins aumentam cada vez
mais. Todos esses maus investimentos
contam como produção e contribuem para uma maior taxa de crescimento econômico.
Apesar de a economia estar caminhando
para o desastre, os indicadores macroeconômicos mostram uma economia em
expansão.
Estatisticamente, esses maus investimentos contribuem para
mostrar o crescimento econômico, mas o que cresce, na verdade, é uma estrutura
de capital cada vez pior. O que as estatísticas mostram é uma bolha de maus
investimentos. O crescimento mostrado
pela contabilidade nacional é uma ilusão estatística. A alta agregação das variáveis, como acontece
nos números oficiais, esconde o quadro real. Ao mesmo tempo em que a economia se torna mais
pobre na realidade, as estatísticas macroeconômicas mostram que a receita
nacional e o emprego aumentam. Assim, é
natural que para os observadores macroeconômicos que baseiam suas análises
nessas estatísticas oficiais a recessão já prevista frequentemente chegue como
uma surpresa. Somente quando a economia já estiver em recessão soará o alarme
de um PIB em queda.
Finalmente,
uma observação adicional: se houvesse um sistema bancário com 100% de reservas
— isto é, caso não houvesse reservas fracionárias —, o crédito tenderia a ser
maior e menos danoso. Afinal, ninguém
iria deixar todo o seu dinheiro na conta corrente, tendo de pagar uma taxa de
serviços. Grande parte seria destinada a
investimentos, sendo que, durante o período de aplicação, tal dinheiro estaria
indisponível para o poupador, obviamente.
Isso
significa que o dinheiro concedido como crédito estaria vindo da poupança
genuína (abstenção do consumo). Mais
ainda: o dinheiro emprestado não poderia ser utilizado pelo credor e pelo
devedor ao mesmo tempo — que é o que ocorre no sistema bancário de reservas
fracionárias; que é o que causa os ciclos econômicos.
Ao
contrário do que se imagina, tal sistema tenderia a elevar o volume de
crédito. Em busca de maiores
rendimentos, todos iriam emprestar o máximo possível de dinheiro, mantendo em
sua conta-corrente apenas a quantia que julgassem necessária para suas despesas
correntes e para demais contingências.
Sem um banco central para fazer manipulações monetárias, os juros seriam
determinados de acordo com a oferta e a demanda de crédito, exatamente como
deve ser.
Isso
forneceria crédito de maneira saudável, sem atritos, sem inflação de preços e
sem ciclos econômicos violentos.
Principalmente: os investimentos dar-se-iam de acordo com a genuína
preferência temporal dos poupadores, minimizando a destruição de capital e
riqueza.