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Política

O que esperar do futuro governo Dilma?

01/11/2010

O que esperar do futuro governo Dilma?

Sem que ela tenha nomeado sua equipe de governo, já é possível saber de antemão como será o governo Dilma, sem correr qualquer risco de errar.

Daqui a quatro anos:

1) Suas liberdades civis estarão menores.

2) A quantidade de impostos que você pagará será maior.

3) A economia estará ainda mais regulada.

4) O estado estará ainda mais envolvido em empreendimentos.

5) Quem estiver no setor público estará rindo à toa.

6) Quem for empreendedor e tiver contratos com o governo ou tiver funcionários públicos como o grosso de sua clientela também estará ótimo.

7) Quem for empreendedor autônomo, do tipo que não recebe favores do governo, mas que já está em um mercado maduro, seguirá escorchado e tendo de sustentar todo o trem da alegria acima.

8) E, finalmente, quem for empregado do setor privado (exceto bancos) ficará exclusivamente com o ônus de tudo.  Não estará morrendo de fome, mas dificilmente sairá do lugar.  Por quê?

Salários reais estagnados por 8 anos

Essa tabela de Excel fornecida pelo IBGE mostra que o rendimento médio real dos trabalhadores do setor privado com carteira assinada está atualmente em um nível menor que o de agosto de 2002! 

Você realmente deve clicar na tabela e ver (na coluna da esquerda, desde lá de cima da planilha) que o rendimento real dos trabalhadores do setor privado com carteira assinada caiu continuamente de 2002 até 2010, e apenas em setembro agora é que o valor se igualou ao que era em julho de 2002, porém ainda estando menor que o valor de agosto de 2002.

Isso explica o aumento do número de postos de trabalho com carteira assinada.  Os salários reais estão estagnados há oito anos, o que de fato estimula a demanda por mão de obra e, consequentemente, o emprego.

Quando se ouve falar que o salário real subiu, está-se levando em conta os salários de toda a população, inclusive funcionários públicos.  Porém, se olharmos exclusivamente os assalariados do setor privado com carteira assinada, a situação fica desesperadora: existe emprego (e é disso que o governo se gaba), mas não existe remuneração -- essa está, na melhor das hipóteses, estagnada desde 2002.

Esse fenômeno de oferta de emprego relativamente alta e salários constantemente baixos foi explicado aqui, e mais do que nunca permanece válido.  Enquanto o governo mantiver seus gastos elevados, seus déficits nominais, sua alta carga tributária e seus inúmeros encargos sociais e trabalhistas, ele estará impedindo a acumulação de capital no setor privado.  Consequentemente, ao impedir que haja uma maior quantidade de bens de capital à disposição de trabalhadores, o governo estará tolhendo o aumento da produtividade do setor privado, o que por sua vez impossibilitará substanciais aumentos salariais.

Ao contrário do que ativistas políticos pensam, a prosperidade não pode ser obtida por meio de discursos demagógicos e de ataques à imprensa.  Um alto padrão de vida só pode ser obtido por meio de um aumento da produção.  Apenas quando há uma abundância de bens e serviços -- cuja grande oferta faz com que seus preços sejam baixos --, é que o padrão de vida será maior.  

E ao contrário do que economistas acadêmicos pensam, um país não enriquece imprimindo dinheiro e derrubando sua taxa básica de juros, mas sim acumulando capital e utilizando-o para criar a abundância de bens e serviços acima citada.

A política fiscal do governo -- de gastos crescentes, déficits constantes, alta carga tributária e inúmeros encargos sociais e trabalhistas -- simplesmente impediu qualquer progresso no valor real dos trabalhadores do setor privado.  E isso de acordo com os dados do próprio IBGE.

Se Dilma não estiver disposta a desatar esse nó, apenas um surto milagroso de produtividade poderá fazer com que os salários do setor privado cresçam sustentavelmente em termos reais.  (Curiosamente, nesse campo, nenhum progressista se dispõe a imitar a Escandinávia, com sua economia privada altamente desregulamentada.)

Fazenda e Banco Central

Ademais, dada a alta improbabilidade de haver desestatizações -- pode até haver mais algumas concessões de estradas, pois este é um ramo que só dá dor de cabeça para o governo caso seja mantido totalmente estatal --, a tendência é que o estado siga seu atual e incontido ritmo de expansão.  Por isso mesmo, estamos reduzidos à condição de meros torcedores para nomes sensatos na Fazenda e no Banco Central. 

A boa equipe montada por Antônio Palocci no primeiro mandato de Lula, com Joaquim Levy, Marcos Lisboa e Murilo Portugal na Fazenda, além de Henrique Meirelles, Ilan Goldfajn e Alexandre Schwartsman no Banco Central, dificilmente será repetida em um governo Dilma -- se for, ela estará adotando uma postura ideologicamente contrária a tudo aquilo em que ela sempre professou acreditar (quem não se lembra do arranca-rabo público que ela protagonizou com Palocci no final de 2005, quando ela queria que o governo abrisse os cofres irrefletidamente, sem qualquer preocupação com a disciplina fiscal?).

Ver como a futura equipe da Fazenda vai lidar com a debilitada situação fiscal do governo, com gastos crescentes e déficits contínuos, além de reajustes já comprometidos para o funcionalismo até 2012 -- para os quais a única receita adicional esperada é o fictício pré-sal --, vai ser bastante interessante.  Ou trágico.

Por fim, a única coisa que resta a nós trabalhadores do setor privado é torcer para que o Banco Central tenha aprendido uma lição com as atuais agruras impostas pelo Federal Reserve à economia americana: keynesianismo não apenas não funciona, como só traz desgraça.  Juros só podem ser baixados se houver aumento na poupança e na acumulação de capital.  Qualquer tentativa de manipulação de juros via impressão monetária resulta em bolhas e subsequentes recessões. 

A atual diretoria do Banco Central, que vinha se comportando bem até o último trimestre de 2009, resolveu inovar e emular o comportamento do Fed.  A base monetária disparou, como mostra o gráfico abaixo.

BM.png

 

Tal crescimento vem elevando enormemente o volume de depósitos em conta corrente, como mostra esse outro gráfico:

DV.png 

No gráfico acima, vale ressaltar que, em todas as vezes que o ritmo de crescimento dos depósitos em conta-corrente se reduziu, houve recessão, mesmo trimestral.  Isso ocorreu em 2003, no último trimestre de 2008 e em todo ano de 2009.  E, em todas as vezes, essa redução se deu após um período de forte expansão (veja que a redução ocorrida em no final de 2008 veio após dois anos de forte crescimento).

Os atuais (e bons) números do PIB brasileiro, que vêm garantindo a alta popularidade do governo, são um mero reflexo desse aumento da oferta monetária.  Após ter ficado um período estável em 2009, os depósitos em conta-corrente começaram a aumentar vertiginosamente -- e isso aditivou o PIB. 

Como o PIB mede apenas gastos monetários, quanto maior o aumento da oferta de dinheiro, maior será o volume de gastos e, consequentemente, maior será o valor do PIB.  O problema é que gastos por si só não geram riqueza -- ao contrário, eles destroem capital, pois o consumo é maior que a produção.

Um aparente "crescimento" econômico trazido por uma expansão monetária -- como esse que estamos vivendo agora -- não chega sequer a ser um crescimento econômico.  Tampouco há um genuíno aumento da produção econômica.  Inflação e crédito fácil jamais podem aumentar a disponibilidade de bens em uma economia; jamais podem aumentar a produção total.  Todo e qualquer aumento na produção que porventura esteja ocorrendo atualmente é um aumento que ocorreria de qualquer forma, independente da criação desse dinheiro adicional.

A única coisa que a inflação e o crédito fazem é provocar uma realocação de recursos, favorecendo aqueles que recebem esse dinheiro antes de todo o resto da população, e prejudicando aqueles que recebem esse dinheiro por último.

Durante esse período de realocação dos fatores de produção dentro da economia -- período esse que estamos vivendo agora e que é confundido com crescimento econômico genuíno --, as pessoas erroneamente creem que estão vivendo um período de bonança, quando na verdade estão vivendo um período de desperdício de recursos.  Bens de capital estão sendo empregados em projetos que serão insustentáveis no longo prazo.

Esse processo é camuflado pelo fato de que alguns membros da sociedade realmente estão enriquecendo.  Porém tal enriquecimento foi trazido apenas e exclusivamente pela criação de dinheiro.  E sempre em detrimento daqueles que serão os últimos a receber esse dinheiro recém-criado.

Como atualmente estamos na fase do boom econômico, somos levados a crer que tudo está bem.  Mas quando os juros começarem a subir e os bancos começarem a contrair seus empréstimos, levando a uma redução do crescimento das contas-correntes, a atual expansão econômica dará lugar à contração -- que é quando as pessoas descobrem que eram menos ricas do que imaginavam, pois estavam na verdade apenas consumindo capital. 

A arte é saber exatamente quando isso irá acontecer.  Mas que vai acontecer, vai.

E é nesse momento que iremos ver como irá se comportar o novo Banco Central dilmesco.  Esteja preparado.

Sobre o autor

Leandro Roque

Leandro Roque é editor e tradutor do site do Instituto Ludwig von Mises Brasil.

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