O
artigo a seguir não tem um tema específico, mas sim um propósito, desabafar
alguns pensamentos e análises do nosso cotidiano midiático.
É
lamentável o rumo que a ciência econômica tomou no século XX.
Após
um início de século promissor, partindo das bases sólidas de Carl Menger,
Böhm-Bawerk e especialmente Ludwig von Mises, proeminentes economistas da
época eram influentes personalidades no mundo político e econômico de seus
países e continente.
Um
fato que escapa a iniciantes (e céticos) da Escola Austríaca é que seus
principais autores tiveram extrema influência e presença no cenário político.
Carl
Menger era o tutor do arquiduque Rudolf von Habsburg, príncipe herdeiro do
império austro-húngaro.
Eugen
von Böhm-Bawerk foi ministro de finanças da Áustria. Sim, você leu
corretamente, ministro. Inclusive extremamente preocupado com a solvência do
estado. Sem querer desmerecê-lo, mas com um padrão-ouro, essa tarefa é bem mais
fácil.
Seu
aluno mais importante, Ludwig von Mises foi conselheiro econômico do
chanceler austríaco Engelbert Dollfuss e de Otto von Habsburg, além de ser
amigo influente de Wilhelm Röpke, o qual foi conselheiro econômico de Ludwig
Erhard, que apesar de não ser um austríaco foi capaz de aplicar reformas
agressivas de livre mercado levando a Alemanha a recuperar-se com uma
velocidade impressionante após a Segunda Guerra Mundial.
Porém,
e infelizmente, o furacão keynesiano levou a ciência econômica a um rumo
catastrófico e hoje vivemos as consequências deste episódio.
Não
é difícil entender a desilusão e a falta de interesse pela ciência econômica na
atualidade. Como um cidadão comum pode confiar em um economista, se em um dia ele
abre o jornal e lê "temos que atear fogo para sair da crise", e no
dia seguinte está lá escrito que "é preciso jogar água para sair da
crise".
A
falta de credibilidade dos economistas da atualidade é desconcertante, fato
comprovado pela carta enviada por economistas britânicos à rainha
da Inglaterra, desculpando-se pela incapacidade de prever uma crise inevitável
e inerente ao atual sistema monetário.
Confesso
que me é extremamente difícil aceitar que uma pessoa sensata e inteligente
possa pensar que a simples impressão de dinheiro possa trazer prosperidade.
Tarefa mais árdua ainda, quando tal pessoa é detentora de um prêmio Nobel.
Ben
Bernanke ainda acredita que conseguirá evitar uma recessão ainda mais profunda
nos EUA. Jean-Claude Trichet parece ter se rendido as leis econômicas (ou da
natureza, como preferir).
Robert Skidelsky acredita firmemente ser um erro crasso
reduzir déficits em meio a uma recessão. Diversos economistas austríacos
defendem ser impossível evitar uma recessão após uma expansão creditícia.
Prolongá-la sim, é possível. Por quanto tempo? Complicadíssimo prever.
Entretanto, ao se prolongar a recessão, na ingênua tentativa de evitá-la,
acaba-se por potencializá-la. E quando não for mais possível prorrogar o
inevitável, a queda será ainda mais acentuada.
Com
o conhecimento da ciência econômica que possuímos atualmente, podemos dizer que
Adam Smith cometeu erros gravíssimo em sua obra prima A Riqueza das Nações.
Não obstante, há uma frase sua que capta perfeitamente a essência da sensatez
em matéria de economia: "What is prudence in the conduct of
every private family, can scarce be folly in that of a great
kingdom" (Aquilo que é prudente na condução de qualquer família
dificilmente poderia ser insensato na condução de um grande reino).
Se
um trabalhador está endividado, com possibilidade de perder o emprego, seria
prudente endividar-se ainda mais para tirar férias no Caribe? Por que então, ao
aplicar o mesmo conceito às finanças de um país, economistas abdicam da
sensatez?
Se
um padeiro produz pães muito além de sua demanda diária usual, os preços
unitários tendem a cair. Por que então devemos evitar a qualquer custo que os
preços dos imóveis americanos caiam? Ah, porque os cidadãos dos EUA têm sua
riqueza medida pelos preços de suas casas. Entendi. Opa, mas e como ficam os
que estão desempregados ou em situação financeira complicada? Não seria
benéfico que os preços caíssem a níveis que os consumidores voltassem a
comprar? Quantos imóveis um cidadão comum precisa? Não interessa, diria Paul
Krugman, temos que continuar construindo casas e comprando, num círculo vicioso
sem fim, até que cada família tenha pelo menos 3 ou 4 casas! E por que parar em
4? Podemos mais, sem fim, o céu é o limite! Ou melhor, o crédito é o limite. E
de onde vem o crédito? Aos leitores do IMB que já captaram a mensagem, sim, a
poupança precede o crédito.
Talvez a
dicotomia entre macro e microeconomia ofusque as mentes dos economistas
keynesianos e do mainstream, incapazes de entender que "dividir" a ciência
econômica de tal maneira impossibilita entender as repercussões que políticas
públicas têm na sociedade, seja em uma grande corporação, em uma banca de
jornal ou em um governo.
Por
fim, e pouparei os leitores de mais desabafos e devaneios econômicos, faço uma
pergunta: estou sozinho ou tem algum leitor que se enraivece ao ver políticos,
economistas, leigos e afins debatendo e opinando sobre qual deva ser a taxa de
juros da economia?
Às
vezes tento estimar a enorme perda de tempo e esforços de milhares de pessoas dedicadas
a estudar e debulhar estatísticas[1] infindáveis com a
finalidade de justificar suas ações. Sem contar todos os membros da equipe
econômica do governo e Banco Central e os jornalistas e repórteres cobrindo os
eventos desta trupe. Quanta improdutividade!
Imaginem
um órgão chamado COPPOF (Comitê de Política do Pão Francês). Agora, imaginem
que seus membros, extremamente qualificados, doutores e com vasta experiência,
se reúnam quinzenalmente com o intuito de decidir qual será o preço justo do
pão francês, afinal de contas, este é um item de elevada importância
nutricional na vida de um cidadão, e nada mais sensato que um órgão
governamental para decidir sobre seu preço.
No
entanto, o preço do pão francês não pode ser definido por nenhuma autoridade ou
grupo de pessoas, por mais sábias que elas sejam, pois ele depende das
valorações subjetivas de cada indivíduo. Da mesma forma com a taxa de juros,
que é a taxa de
preferência temporal de cada indivíduo, ou quanto cada um decide poupar
para consumir no futuro, reduzir o consumo presente para poder consumir mais no
futuro.
Como
já foi habilmente explicado pelo editor do IMB, Leandro Roque, o Banco Central
não pode estabelecer a taxa de juros, ele pode manipulá-la para que se aproxime
de seu alvo. Curiosamente, este procedimento não era possível na época em que o
mundo ainda utilizava aquele "chato e restritivo" padrão-ouro. Nada que
impedisse a criatividade dos políticos. Na Inglaterra do século XVII os
governantes tentavam diminuir a taxa de juros via decreto.[2]
Que
eu não seja mal interpretado, não estou afirmando que as ações do Banco Central
não têm efeito. O BC não pode estabelecer a taxa de preferência temporal de
cada pessoa, assim como nenhum órgão pode definir o quanto um cidadão deseja
consumir de cerveja ou de sanduíche. Entretanto, a sua atuação de manipular as
taxas de juros tem um impacto extremamente prejudicial à economia, pois
influencia o preço mais importante do mercado, o preço do dinheiro no tempo.
Se
alguém é contra subsídios de qualquer espécie, deveria entender que uma taxa de
juros artificialmente baixa, ou seja, abaixo da poupança real da economia,
funciona como o subsídio último. É um subsídio universal, pois atua em toda a
economia simultaneamente.
Com
uma taxa de juros artificialmente baixa, inúmeros projetos que antes não eram
viáveis, se tornam atraentes da noite para o dia.
Subsidiar
é sustentar uma operação economicamente inviável.
Pronto.
Creio ter articulado a minha mensagem.
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Notas:
[1] Segundo Huerta de Soto, "estatística" é algo ruim por
definição, pois etimologicamente vem da palavra estado. Ver https://www.youtube.com/user/josemanuelgonzalezg#p/u/218/xvRX33m0axI
[2] Murray Rothbard, Economic Thought Before Adam Smith,
(Alabama, Mises Institute, 2006), p. 320