segunda-feira, 14 dez 2009
A
liberdade de uma pessoa agir de acordo com sua vontade em sua propriedade
implica, por simetria, que agressões contra outras são eticamente
inaceitáveis. Uma agressão ilegítima é
qualquer interferência física adversa e suficientemente intensa causada por uma
pessoa à propriedade de outra.
Um
caso problemático e possivelmente importante é a alteração das condições
ambientais - como na hipotética mudança climática -, algo que poderia ter efeitos
tanto positivos quanto negativos, dependendo das avaliações subjetivas e das circunstâncias
particulares dos seres humanos. Se a
mudança climática é considerada um problema, disso não se pode concluir
automaticamente que ela precisa ser interrompida ou minimizada a qualquer
custo: os seres humanos são especialmente bons em se adaptar, e o governo
normalmente faz mais mal do que bem.
Liberdade, propriedade e agressão
Uma
ética normativa, com regras universais, simétricas e funcionais, deve se basear
no princípio fundamental dos direitos de propriedade. A ética da liberdade e dos direitos de
propriedade está no direito natural - o sistema de normas adequadas à natureza
humana que permite o desenvolvimento e a coexistência social harmoniosa e
pacífica ao evitar, minimizar ou solucionar conflitos o tanto quanto
humanamente possível.
A
propriedade é o domínio onde as decisões do proprietário são legítimas, o
espaço no qual cada pessoa é livre para agir de acordo com suas preferências
sem sofrer interferências violentas de terceiros - cujas avaliações nesse
aspecto são eticamente irrelevantes.
Todas as ações pacíficas do proprietário em sua propriedade são
permitidas, e nenhuma ação é obrigatória (não existem direitos naturais
positivos).
O
direito à propriedade é um direito negativo: você tem o direito de que não
interfiram em sua propriedade. Os seres
humanos não têm direitos naturais positivos, isto é, terceiros não são
obrigados a fazer nada por um indivíduo; da mesma forma, esse indivíduo não tem
deveres naturais para com terceiros (presente ou futuro). Direitos e deveres positivos surgem apenas
por meio de contratos.
A
liberdade não significa a absoluta ausência de restrições: minha liberdade
termina onde começa a dos outros; minha propriedade é finita e limitada pelas
propriedades de terceiros. Liberdade e
direitos de propriedade são equivalentes ao axioma da não-agressão: a iniciação
de força não é legítima; a força pode ser usada apenas para defesa e justiça. Agressões - a invasão da propriedade de
terceiros sem o consentimento deles - são proibidas. O agressor deve reparar os danos e compensar
a vítima.
Agressão
não é somente a noção mais estreita de violência criminal praticada por uma
pessoa contra outra e suas posses (assassinato, assalto, lesões, estupro,
sequestro, roubo). Agressão, em um
sentido abstrato, é qualquer interferência física nociva ou suficientemente
intensa e adversa feita por uma pessoa - ou por sua propriedade - na
propriedade de outra.
Ser
o proprietário de um bem não é sempre algo bom: a propriedade não implica
somente o direito de usufruir e fazer uso de meios de ação. A propriedade pode ser ruim: o proprietário é
responsável pelos danos que suas ações e suas posses podem causar a terceiros
(premeditados ou não premeditados, conhecidos ou desconhecidos, previstos ou
imprevistos). Toda ação implica a
produção de resíduos indesejados que precisam ser recolhidos para que não
avariem terceiros.
Todas
as coisas reais estão direta ou indiretamente interligadas por forças fundamentais,
de modo que uma mudança em uma entidade provoca algum efeito, grande ou
pequeno, em outras entidades. Porém as
regras éticas referem-se somente às mudanças e efeitos causados pela ação
humana que podem danificar terceiros e criar conflitos.
Essas
interações podem envolver matéria (sólido, líquido, gasoso; partículas
macroscópicas ou microscópicas), energia (calor, ondas eletromagnéticas, ondas
de pressão) ou alterações das condições ambientais naturais (luminosidade,
pressão, temperatura, ventos, umidade).
Os efeitos podem ser fortes ou fracos, concentrados ou difusos, diretos
ou indiretos, locais ou globais, frequentes ou raros, cumulativos ou não
cumulativos, instantâneos ou retardados, temporários ou permanentes.
Devido
às limitações da mente humana, a realidade é sempre estudada de forma
simplificada, como se fosse linear e simples; mas a natureza é na verdade uma
complexa rede de entidades e relacionamentos.
Uma causa pode ter múltiplos efeitos sobre diferentes pessoas, alguns
positivos e alguns negativos.
Um
efeito pode ter múltiplas causas, naturais ou artificiais. Pode ser provocado por uma pessoa ou por várias
pessoas fazendo a mesma coisa (como respirar) ou coisas complementares (como
fabricar e dirigir automóveis, ou produzir e consumir energia). Em sistemas caóticos não lineares, pequenas
causas podem gerar grandes efeitos (devido a amplificadores,
desestabilizadores, ou mecanismos de retroalimentação positiva), da mesma forma
que grandes causas podem gerar pequenos efeitos (devido a amortecedores,
estabilizadores ou mecanismos de retroalimentação negativa).
Para
serem qualificados como agressões, eventos reais devem ao menos ser fisicamente
detectáveis, psicologicamente perceptíveis, e relevantes para as preferências
humanas. Condições reais objetivas não
constituem automaticamente problemas.
São as avaliações humanas que interpretam as situações como sendo
oportunidades ou ameaças, benefícios ou danos, boas ou ruins. E é a possível incompatibilidade das preferências
subjetivas dos homens que origina os conflitos: uma pessoa pode gostar de uma
coisa ao mesmo tempo em que outra detesta essa mesma coisa.
Os
conteúdos específicos da noção de agressão estão em aberto e são
contestáveis. Não se trata de um
conceito com fronteiras rígidas; ele é parcialmente nebuloso e arbitrário. Ele não pode ser completamente determinado por
dedução, utilizando-se da razão pura; ele depende de costumes, tradições,
convenções (bloquear a luz solar, luzes de alta intensidade, sons em alto
volume, poluentes). Alguns critérios
objetivos podem ser utilizados para determinar se um evento é mais apropriadamente
considerado uma agressão ou não: intensidade, direção, extensão, duração,
acumulação.
Para
que uma ética da liberdade seja funcional, ela precisa incluir princípios de
responsabilidade e regras para uma legítima defesa. Os princípios de justiça tradicionais e
sensatos colocam no acusador o ônus da prova de que houve alguma agressão, sendo
sua a obrigação de provar acima de qualquer dúvida razoável a culpa do
acusado. Não é o acusado que precisa
provar sua inocência (se fosse assim, cada pessoa teria de apresentar alguma
prova de sua inocência para cada ação e momento de sua vida, pois ela sempre
poderia ser acusada de algo).
A
legítima defesa pode ser invocada pelo real ou possível recebedor dos efeitos
da uma ação caso haja um perigo claro, imediato e comprovável. A defesa se torna ilegítima (ou seja,
torna-se agressão) caso não seja possível provar que há o perigo de danos
reais.
O
princípio
da precaução proposto por muitos ambientalistas exige que o iniciador de
uma atividade comprove sua completa inocuidade ao mesmo tempo em que o governo
não precisa provar que haja alguma probabilidade de danos para proibi-la. Provar que algo é absolutamente inócuo é
impraticável no mundo atual, no qual o aprendizado se dá na base da tentativa e
erro - o que significa que esse princípio iria paralisar as inovações. A aquisição do conhecimento é custosa, e o
conhecimento pleno é impossível.
A
noção de agressão se baseia nas consequências ou resultados das ações (os
efeitos reais no mundo), e não no conhecimento ou nas intenções dos
agentes. Sentimentos morais instintivos
tendem a desculpar ou a diminuir a responsabilidade se não houver
intencionalidade, ou se os danos forem efeitos secundários e inesperados: isso
é assim parcialmente porque os sentimentos morais se desenvolveram como
instintos genéticos no passado, quando nossos ancestrais humanos possuíam
poucas habilidades de ação.
Mas
com a acumulação tecnológica e de capital, é necessário exigir um uso
responsável de ferramentas poderosas, e alertar as pessoas de que sua
ignorância ou falta de presciência não poderão servir como desculpas para os
danos que podem causar. Esse tipo de
regra fornece incentivos para que os agentes considerem completamente todas as
possíveis consequências de suas ações, e não somente aquelas que pretendem
alcançar, pois eles serão julgados de acordo com os efeitos reais de suas
ações.
Direitos
de propriedade funcionam bem quando a realidade é facilmente separável, e
quando os efeitos das ações são diretos, locais, concentrados e recaem
principalmente sobre o proprietário e outros indivíduos próximos e fáceis de
ser identificados. Mas os elementos da
realidade são frequentemente entrelaçados de maneira confusa e
desordenada. Objetos macroscópicos
sólidos tendem a permanecer em suas posições estáveis; mas os fluidos (líquidos
e especialmente gases) tendem a se mover, ao passo que os fótons e a energia
térmica tendem a circular; esses fatores se dispersam e ultrapassam fronteiras
definidas, a menos que sejam impedidos por alguma barreira física.
Externalidades
são efeitos das ações de um agente sobre a propriedade de outros; elas podem
ser positivas (como presentes, que não são proibidos e nem obrigatórios) ou
negativas. Uma agressão é uma
externalidade negativa. Externalidades
negativas difusas são problemáticas e difíceis de serem reguladas. Muitas vítimas podem sofrer transtornos muito
pequenos decorrentes das ações de um agente: pode parecer absurdo considerar
ilegítimas aquelas ações que produzem efeitos tão pequenos, e seria muito
custoso para cada uma das vítimas exigir que o agente seja impedido ou que ele as
recompense.
Externalidades
podem se tornar importantes em decorrência dos efeitos cumulativos e
persistentes de pequenas ações de muitos agentes. Em uma agressão clara, é possível e
relativamente fácil determinar quem está fazendo o que a quem, quem precisa ser
barrado e quem precisa recompensar quem pelo quê. Para o caso de externalidades difusas, pode
ser muito difícil determinar e correlacionar os agentes, as ações, os efeitos e
as vítimas desses efeitos.
Uma
vez que agressões implicam danos, pode-se ingenuamente considerar ser melhor
torná-las uma noção abrangente, de modo a fazer com que muitos prejuízos sejam
evitados. Mas aceitar que algo é uma
agressão e tentar proibi-lo tem consequências que podem ser piores do que
simplesmente tolerá-lo. Quanto mais
ações forem consideradas agressões ilegítimas, mais o uso da força é
justificável.
Os
custos do sistema necessários para detectar e punir os agressores e recompensar
as vítimas poderiam exceder seus benefícios (sempre tendo em mente que é
extremamente problemático fazer comparações interpessoais e adições ou
subtrações de utilidade ou análises sociais de custo-benefício). Pode ser melhor aprender a viver com algumas
realidades mutáveis - se adaptar a elas - a tentar evitá-las. Especialmente porque os seres humanos são
bons em se adaptar - foi por meio da adaptação que eles colonizaram grande
parte do planeta - a condições ambientais bastante diferentes.
Dar
automaticamente ao estado a responsabilidade de lidar com externalidades
negativas difusas pode ser um erro enorme.
O estado detém o monopólio da justiça e da violência, e é frequentemente
ilegítimo (ditadores ou mesmo líderes democráticos, de acordo com os
anarquistas), extremamente ineficientemente e possivelmente corrupto (falta de
motivação ou incentivos e falta de conhecimento).
Aquilo
que é comumente chamado de falha de mercado é quase sempre o resultado de uma
determinação inadequada dos direitos de propriedade. O mercado nunca será perfeito simplesmente
porque os seres humanos são limitados em suas capacidades; propor que o estado
corrija supostos problemas que os indivíduos não podem resolver livremente
parece ignorar o fato de que o estado também é composto de seres humanos - e
talvez não dos melhores deles (burocratas não são anjos imparciais e abnegados,
e os piores sempre podem chegar ao topo).
Mudança climática
A
ética concerne apenas os seres humanos: não há um dever natural de se preservar
o meio ambiente - algo que não possui valor intrínseco -, pois as valorações
são produto da atividade mental de agentes emocionais e cognitivos.
Contaminações
acima de determinados níveis são normalmente consideradas agressões ilegítimas
porque os poluentes prejudicam diretamente os seres humanos e não trazem
efeitos benéficos. A mudança climática
está relacionada ao meio ambiente, porém é muito diferente de uma contaminação.
A
mudança climática antropogênica pode ocorrer devido a mudanças no uso da terra
e a emissões de gases causadores do efeito estufa. Mudanças no uso da terra podem alterar a
refletividade ou albedo da
superfície do planeta, e parece difícil considerá-las uma ação ilegítima.
O
dióxido de carbono é um gás estufa que resulta da respiração e da queima de
combustíveis fosseis. Rotulá-lo como
poluidor é um abuso de linguagem, uma vez que ele é necessário para a fotossíntese
e não é tóxico. Algumas atividades
humanas, como o cultivo de árvores, retiram dióxido de carbono da
atmosfera. É extremamente difícil
comprovar relações específicas entre as emissões humanas de dióxido de carbono,
as mudanças climáticas locais e seus efeitos específicos.
A
mudança climática, seja ela aquecimento ou resfriamento global, possui
múltiplas causas e efeitos possíveis, e a avaliação dos efeitos pode ser
diferente em diferentes partes do planeta.
Regiões frias podem acolher positivamente um aquecimento e lamentar um
resfriamento, ao passo que regiões quentes podem receber bem um resfriamento e
lastimar um aquecimento. Os alarmistas
da mudança climática parecem ser reacionários climáticos que não aceitam
absolutamente nenhuma mudança.
Não
existe um clima ideal ou ótimo, e, caso os humanos adquiram o controle parcial
do clima, podem surgir conflitos quanto à determinação climática. Mesmo quando se considera que os humanos estão
adaptados ao clima atual, isso não significa que seria difícil se adaptar a
diferentes climas caso as mudanças não sejam excessivas.
Mudanças
climáticas podem acontecer rapidamente em um escala geológica, mas são lentas
em uma escala humana, permitindo adaptações inteligentes e planejamentos para o
futuro. Já as políticas de mitigação das
mudanças climáticas possuem custos enormes no presente e proporcionariam
benefícios pequenos e incertos no futuro.
Os relativamente pobres de hoje seriam sacrificados para ajudar os
relativamente ricos de amanhã.
A
temperatura não é o único fenômeno associado à mudança climática e
possivelmente não é o mais relevante para o bem-estar humano, uma vez que os
humanos vivem dentro de uma grande variedade de temperaturas. O nível dos oceanos, as precipitações e eventos
meteorológicos severos podem ser muito mais importantes.
O
nível dos oceanos pode aumentar lentamente devido ao aquecimento global, mas o
processo é muito vagaroso, o que possibilita a preparação de proteções e o
emprego de capital caso necessário. A
liberdade de migração pode ajudar a realocar as pessoas cujas terras se tornarem
inabitável. As precipitações no geral
devem aumentar com o aquecimento global, embora sua distribuição possa se
alterar. E a relação de dependência entre
temperatura e eventos meteorológicos severos é complexa e pouco conhecida.
Para
quase todos os problemas humanos associados ao aquecimento global, a influência
do clima sobre eles é geralmente pequena se comparada aos outros fatores mais
importantes que podem ser mais fácil e eficientemente tratados. Os alarmistas da mudança climática parecem
ignorar as soluções relativamente simples para os problemas que eles próprios
levantam. Os seres humanos são
proativos; eles não se submetem passivamente às influências naturais. E a anulação das mudanças climáticas não é
necessariamente a melhor opção.
A
água potável é um problema onde não existem direitos de propriedade, mercados e
preços para a água. Doenças tropicais
dependem fortemente das condições socioeconômicas. Nações subdesenvolvidas são pobres
principalmente devido às inadequadas instituições sociais, e não por causa das
condições ambientais.
Ondas
de calor podem ser enfrentadas com equipamentos adequados de ar condicionado (e
o aquecimento global iria reduzir as ondas de frio e as mortes causadas por
elas). A extinção de espécies se deve
principalmente à destruição de seus habitats ou à invasão de humanos (ou à
matança, à caça e à pesca) - todas elas relacionadas à ausência de propriedade.
Os
catastrofistas do aquecimento global parecem se esquecer de outras questões
mais importantes e urgentes que estão competindo pelos mesmos recursos escassos
que estão sendo desviados para a mitigação da mudança climática. É ilógico, ridículo e absurdo declarar o
aquecimento global como o pior problema da humanidade quando ainda temos
guerras, fome, doença e pobreza.
Para
alguns ambientalistas radicais e para a maioria dos políticos, a mudança
climática é o problema mais importante para a civilização humana; e eles se
imaginam falando em nome de toda a humanidade.
Mas todos os problemas lhes parecem ser extremos, pois eles não têm
nenhuma noção dos custos de oportunidade relativos. Sua linguagem moral impõe deveres aos
cidadãos, que mais parecem estar recebendo ordens sobre o que devem fazer e o
que devem evitar, aconteça o que acontecer.
Supõe-se
que os governos são necessários para proteger seus cidadãos contra agressões,
porém eles são extremamente incompetentes nessa tarefa. Eles frequentemente realizam suas próprias
agressões institucionais ao proibir atividades perfeitamente pacíficas e
voluntárias; e agora com as mudanças climáticas eles parecem considerar o
aquecimento global antropogênico uma ação ilegítima e indesejável.
Alguns
radicais até mesmo tentam censurar e criminalizar a opinião divergente dos
céticos, negacionistas ou minimizadores.
Porém ideias, pensamentos e discursos, mesmo se errados ou falsos, não são
e nem nunca serão crimes reais. Ademais,
pode haver grupos de interesse dos dois lados do debate lutando pela
implementação de suas políticas públicas preferidas: não apenas petrolíferas,
carvoarias e empresas de energia nuclear, mas também as altamente subsidiadas
empresas de energia renovável.
Mesmo
que a ciência climática oficial e predominante esteja correta, sua ignorância
no que concerne economia, filosofia política e direito é enorme. As entidades mais importantes para um ser
humano são os outros seres humanos (para o bem e para o mal), e não o meio ambiente. Os humanos podem ser especialmente nocivos
quando organizados politicamente e inspirados pelo coletivismo.
Os
possíveis danos da mudança climática devem ser comparados aos possíveis danos
da intervenção burocrática estatal e da opressão política. Pode ser que todo o alarmismo do aquecimento
global seja uma desculpa para aumentar a extensão do poder político ou uma
distração de outros problemas mais sérios.
As instituições sociais são o que mais importam, e elas estão muito
equivocadas atualmente: um enorme aprimoramento é possível, e a liberdade é a
resposta.