quinta-feira, 15 out 2009
Nota
do IMB: o artigo a seguir faz parte do concurso de artigos promovidos pelo
Instituto Mises Brasil (leia mais aqui). As
opiniões contidas nele não necessariamente representam as visões do Instituto e
são de inteira responsabilidade de seu autor.
1.
Introdução
Neste artigo faremos uma comparação entre as
teorias neoclássica e austríaca sobre a eficiência no mercado. A primeira
defendendo falhas no mercado que precisam ser corrigidas pelo governo e a
segunda apenas enxergando erros em planos individuais. Vamos ver que a
conclusão para a solução dos problemas no mercado, e a causa destes, é
diferente entre as teorias, e, enquanto uma utiliza um modelo irreal, a outra
procura a explicação na ação humana.
2.
Falhas de mercado
Para se compreender como a teoria neoclássica
entende a eficiência no mercado é preciso ter em mente o conceito de otimização
de Pareto: um indivíduo deve obter uma melhoria sem causar uma piora na
situação alheia. Sabendo disso, podemos perfeitamente apresentar casos onde o
mercado falha, como no clássico exemplo de poluição: uma fábrica polui o
ambiente, atingindo pessoas que moram perto, logo essas terão sua situação
piorada, e a partir disso achamos uma ineficiência no mercado. A solução que é
normalmente apresentada para tal problema é a intervenção do governo, que
através de subsídio, taxação, regulação etc, estabelece planos que diminuam
essa ineficiência.
3.
Eficiência na teoria
austríaca
A teoria austríaca tem uma abordagem diferente e realista
sobre o assunto. Ela tem como parâmetro a ação humana: o homem agindo em busca
de uma situação mais confortável que a atual. Para isso, o homem deve saber que
existe forma de melhorar a situação atual e ter uma perspectiva que agindo de
determinada maneira irá atingir seu objetivo. Isso pode parecer tão óbvio que
surge a seguinte questão: então os austríacos acham que são os únicos que sabem
que o ser humano age? Os neoclássicos não sabem disso? O problema ocorre porque
os últimos restringem a ação em seu modelo de equilíbrio. Partindo desse modelo
irreal (que inclusive eles próprios dizem isso) eles explicam como o agente age
no mercado. Ou seja, a ação é restrita a situações inexistentes.
Ao contrário do foco no equilíbrio, a eficiência
austríaca é explicada em termos individuais. O agente estabelece um plano com
determinados objetivos e se conseguir cumpri-lo terá agido eficientemente.
Vamos exemplificar: Rothbard é um estudante de economia que deve apresentar um
trabalho no dia seguinte. Como ele quer sair à noite, cria um plano de terminar
o trabalho em quatro horas, pois assim daria tempo de se preparar para sair sem
se atrasar. Se não conseguir atingir tal objetivo, a execução do plano terá
sido ineficiente.
Mas nem toda eficiência é explicada por ações
isoladas. Quando os agentes agem em conjunto, podem surgir casos de falta de
conhecimento. Vamos imaginar que Rothbard deseja comprar o livro Ação Humana,
de Ludwig von Mises, e está disposto a pagar 100 reais. A livraria A vende o
livro por 80 reais. Se um não sabe da existência do outro, temos um caso de
ineficiência no mercado por conta da limitação do conhecimento (CORDATO, p.
398). Outro ponto a se notar é que a diferença de preços entre bens que sejam
homogêneos para X agente é mais um caso de ineficiência. Ou seja, se Rothbard
encontrasse uma livraria B que vendesse o livro por 150 reais, essa diferença
de preço seria sinal de ineficiência. Mas se uma segunda pessoa, Murphy,
digamos, conhecesse a livraria A e soubesse que Rothbard deseja o livro,
poderia comprá-lo e vendê-lo pelos 100 reais (CORDATO, p. 399). Murphy
diminuiria assim a ineficiência no mercado[1].
Nota-se que os problemas de eficiência no
mercado se dão por conta da limitada capacidade de conhecimento dos agentes.
Apesar disso, seria errado considerar que isso fosse uma evidência de que a
intervenção governamental seja necessária. Pelo contrário, se os agentes que
conhecem seus desejos não conseguem agir sempre com eficiência, é impossível
para o governo que não dispõe dessa informação. Como veremos na próxima seção,
a solução para esse problema é o processo competitivo no mercado que gera
incentivos para a disseminação e segurança das informações.
4.
Comparação das
Abordagens
Como vimos, para os neoclássicos, é considerado
ineficiente para a sociedade que um indivíduo obtenha melhoria à custa da piora
alheia. Sendo assim, a propriedade precisa ser regulada pelo governo. Uma
diferença importante com os austríacos está na consideração de uma utilidade
social: é errado considerar a sociedade como uma entidade homogênea, se
dissermos que a eficiência social aumentou, isso se traduz apenas como o
conjunto de ações dos indivíduos. Ou seja, é completamente errado considerarmos
que o governo pode alocar os recursos considerando uma "eficiência social
única" para todas as pessoas.
O que se nota nessa diferença é que para os
neoclássicos o mercado tem falhas que precisam ser corrigidas, já para os
austríacos a ineficiência aumenta quando
o governo intervém, pois já que não possui conhecimento perfeito distorce a
execução dos planos dos agentes. Mesmo "bens públicos", como estradas, justiça,
segurança etc. são considerados por alguns austríacos[2] de inteira
responsabilidade do mercado.
A forma mais eficiente de cumprir os planos dos
agentes no mercado é através do elemento empresarial, como vimos no exemplo de
Murphy, onde este achou uma ineficiência no mercado e uma oportunidade de
lucro. A criatividade do empresário, que busca lucros, é o motor do mercado.
Por isso o economista Ludwig von Mises dizia que no livre mercado o consumidor
é soberano, pois se o empresário pensa em obter lucro, deve achar formas mais
eficientes de atender a demanda. Essa ação empresarial aloca melhor os
recursos, pois garante o direito de propriedade dos consumidores e busca
atender demandas individuais, sem levar em conta algum tipo de "utilidade da
sociedade".
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Notas
[1] Apesar
de existir ineficiência no mercado, isso não significa que há melhor forma de
alocação fora do mesmo, pelo contrário, só as ações em busca dos planos
individuais que diminuem o desconforto.
[2] Ver
os trabalhos de Murray Rothbard.
Referências:
CORDATO, Roy E. (1980) The Austrian Theory of Efficiency
and The Role of Government. The Journal of Libertarian Studies, Vol. IV, Nº 4.
MURPHY, Robert P. (2001) Coordination vs Efficiency. New York University.