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Economia

Suíça e Cingapura são ricas por causa de seu sistema financeiro?

Invertendo causa e consequência

11/08/2017

Suíça e Cingapura são ricas por causa de seu sistema financeiro?

Invertendo causa e consequência

Suíça e Cingapura são duas das economias mais ricas do planeta em termos per capita. Em 2016, a renda per capita da Suíça foi de 58.600 dólares (em termos de paridade do poder de compra), ao passo que a de Cingapura chegou a impressionantes 85.200 dólares.

Para se ter uma ideia, a da Finlândia foi de 41.120 dólares, a da Dinamarca foi de 45.700 dólares, a da Alemanha foi de 46.900 dólares, e a da Suécia foi de 47.900 dólares.

À exceção da Alemanha, que possui 81,4 milhões de habitantes, todos os demais países acima têm um número populacional semelhante. A Suíça tem 8,2 milhões de habitantes. Cingapura tem 5,6 milhões. Dinamarca, 5,7 milhões. Finlândia, 5,5 milhões. Suécia, 10,1 milhões.

E, ainda assim, Suíça e Cingapura vencem com folga em termos de riqueza per capita.

E por que faço esta introdução? Porque virou rotina social-democratas e intervencionistas de todos os tipos dizerem que os exemplos de Suíça e Cingapura não servem a ninguém porque a riqueza destes dois países se deve essencialmente a seu "hipertrofiado setor financeiro". Segundo tais pessoas, ambos os países seriam apenas um receptáculo fiscal de todo o capital estrangeiro; meras caixas-fortes para onde os magnatas do resto do mundo enviam seu dinheiro para fugir do fisco de seus respectivos países.

Consequentemente, sempre segundo tais pessoas, ambos os países apresentam bons números apenas por causa desta peculiaridade, de modo que suas economias reais são inexistentes. Suíça e Cingapura seriam apenas os banqueiros do mundo, e não exemplos a serem copiados de economias reais produtivas e competitivas.

De um lado, até é verdade que o peso do setor financeiro na Suíça e em Cingapura seja superior aos de Finlândia, Suécia, Dinamarca e Alemanha. No entanto, não é substantivamente superior de modo a explicar as significativas diferenças de renda per capita entre ambos os grupos de países: afinal, o setor financeiro suíço representa apenas 9,5% de sua economia, e o de Cingapura, 13,7%.

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Agora vem o mais importante: se, de um lado, mantivermos constante a atividade dos outros setores econômicos e, de outro, aumentarmos o tamanho do setor financeiro de Finlândia, Suécia, Dinamarca e Alemanha até que tenham, em relação ao PIB, o mesmo peso do suíço, a renda per capita da Finlândia subiria para 44.250 dólares, a da Dinamarca iria para 49.400 dólares, a da Alemanha, para 50.000 dólares, e a da Suécia, para 50.800 dólares.

Ou seja, as diferenças de renda per capita em relação à Suíça (58.600 dólares) continuariam notáveis.

Se fizermos o mesmo para Cingapura, a renda per capita da Finlândia subiria para 46.300 dólares, a da Dinamarca iria para 51.800 dólares, a da Alemanha, para 52.500 dólares, e a da Suécia, para 53.250 dólares. Ou seja, se estes países adotassem o mesmo peso do setor financeiro de Cingapura, eles não apenas continuariam muito longe da renda per capita de Cingapura (85.200 dólares), como ainda nem sequer alcançariam a Suíça.

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Logo, parece óbvio que as economias de Suíça e Cingapura são muito mais que seus respectivos setores financeiros. Suas economias reais existem e são complexas e gigantescas.

Não em vão, os maiores setores de ambas as economias são o industrial (que opera sem nenhum protecionismo; a tarifa de importação é zero para Suíça e Cingapura) e o comercial, muito à frente do setor financeiro.

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Com efeito, Suíça e Cingapura estão entre os maiores exportadores de mercadorias do mundo (estou desconsiderando totalmente a exportação de serviços, para assim excluir a influência do setor financeiro).

Apenas Cingapura, por exemplo, exporta mais materiais eletrônicos em relação ao seu PIB (38,5% do PIB) do que exportam, em relação a qualquer produto, Finlândia, Suécia, Dinamarca ou Alemanha.

E, evidentemente, tão proeminente competitividade também se reflete em um enorme superávit no setor externo (balança comercial e conta-corrente): de 11,9% do PIB para a Suíça e de 19% do PIB para Cingapura). O país que mais se aproxima é a Alemanha, com 8,4% do PIB.

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Causas

Definitivamente, a prosperidade de Suíça e Cingapura não gira em torno de -- e nem muito menos está ligada exclusivamente ao -- seu setor financeiro. Muito pelo contrário: ambos os países possuem economias reais extraordinariamente desenvolvidas, modernas e competitivas.

As razões que explicam este impressionante desenvolvimento são as mesmas que, historicamente, explicam o crescimento de qualquer outra economia: segurança jurídica e institucional, respeito à propriedade privada, população produtiva, baixos impostos, livre comércio com os estrangeiros, abertura total a investimentos estrangeiros, poucas regulações, facilidade de empreender, e leis confiáveis e estáveis.

E, acima de tudo, estabilidade monetária e moeda forte: o franco suíço e o dólar de Cingapura estão entre as moedas mais estáveis do mundo; elas continuamente se apreciam em relação ao dólar (vide os links anteriores). Consequentemente, ambos os países apresentaram as mais baixas taxas de inflação das últimas décadas.

Nada fomenta mais investimentos do que segurança jurídica, moeda estável e baixos impostos e regulações. Quando a moeda é estável, quando há segurança jurídica, quando há facilidade de se empreender e quando há a garantia de que os frutos do seu empreendimento poderão ficar com você, investidores de todo o mudo têm mais incentivos para se arriscar e financiar ideias novas e ousadas, e mais disponibilidade para financiar a criação de uma riqueza que ainda não existe. O investimento em tecnologia é maior. O investimento em soluções ousadas para a saúde é maior. O investimento em infraestrutura é maior. O investimento em ideias para o bem-estar de todos é maior. 

Além de ser o meio de troca, a moeda é a unidade de conta que permite o cálculo de custos de todos os empreendimentos e investimentos. Se essa unidade de conta é instável -- isto é, se seu poder de compra cai contínua e rapidamente, principalmente em termos das outras moedas estrangeiras --, não há incentivos para se fazer investimentos. Logo, não há como haver grande progresso.

Com efeito, todas estas características constituem exatamente os principais pontos fortes para que estes dois países tenham se convertido nos refúgios prediletos da poupança global: estas economias são ricas e prósperas não porque seu setor financeiro é hipertorfiado; seu setor financeiro é pujante porque estas economias são ricas e prósperas.

E elas são ricas e prósperas, e seu setor financeiro é pujante, exatamente porque estes países respeitam a propriedade privada (inclusive a moeda) muito mais do que qualquer outra região do planeta.

Conclusão

Por tudo isso, Suíça e Cingapura -- dois países culturalmente muito diferentes, mas com resultados econômicos muito semelhantes -- proporcionam, sim, lições valiosas para todos os países do mundo: quem quer mais crescimento e mais prosperidade deve apostar -- exatamente como vem fazendo a Irlanda -- em menores impostos, regulações e burocracia, maior segurança jurídica, mais estabilidade monetária, e livre comércio pleno.

Tal arranjo sempre estimula a livre concorrência, a qual leva ao aumento da produção e da oferta de bens e serviços, gerando todo um aumento no padrão de vida da população.

Realmente, não é necessário muito mais do que isso para multiplicar o bem-estar de todos os cidadãos.

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Leituras complementares e imprescindíveis:

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Sobre o autor

Juan Ramón Rallo

É diretor do Instituto Juan de Mariana e professor associado de economia aplicada na Universidad Rey Juan Carlos, em Madri.

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