Esse site usa cookies e dados pessoais de acordo com os nossos Termos de Uso e Política de Privacidade e, ao continuar navegando neste site, você concorda com suas condições.

< Artigos

Economia

Após sua estrondosa valorização, ainda vale a pena comprar o Bitcoin?

Sim. Sempre. Mas desde que você saiba o que está fazendo

23/05/2017

Após sua estrondosa valorização, ainda vale a pena comprar o Bitcoin?

Sim. Sempre. Mas desde que você saiba o que está fazendo

Nota do Editor

O artigo abaixo reflete a opinião exclusiva do autor, e não necessariamente a do Instituto Mises Brasil. Tal artigo não deve, de maneira nenhuma, ser considerado como uma sugestão de investimento por parte do IMB.

______________________________________________________

Neste momento, um Bitcoin vale mais de 2.200 dólares. Ainda que isso possa intrigar a muitos, digo que este preço é, neste momento, praticamente irrelevante.

Consequentemente, já adianto que a resposta para a pergunta do título é sim, sem dúvida alguma vale a pena comprar Bitcoins.

Mas para entender o porquê, é preciso ler o artigo na íntegra e com muita atenção.

Uma falsa dicotomia, uma nova classe de ativos

Àqueles que enxergam uma dicotomia entre Bitcoins e as moedas fiduciárias do mundo, vale uma dica: não veja o Bitcoin como uma moeda mutuamente excludente em relação a todas as outras moedas do mundo; apenas veja a moeda digital como um complementário às formas de dinheiro até hoje existentes.

É verdade que não podemos saber se o Bitcoin irá perdurar. Não sabemos se sobreviverá outro ano, ou uma década. Mas arrisco dizer que uma moeda digital (ou criptomoeda) veio para ficar.

Em um artigo de 2013, a revista The Economist afirmou: "O preço do Bitcoin pode até colapsar, e os usuários podem repentinamente migrar para outra moeda, mas há grande probabilidade de que alguma forma de dinheiro digital deixará uma marca duradoura no ambiente financeiro".

De lá para cá, o preço do Bitcoin só fez aumentar. E muito.

1.png

Como já analisado em detalhes em vários artigos deste Instituto (ver aqui, aqui, aqui e aqui), há inúmeras vantagens que fazem de uma moeda digital um excelente complemento no meio financeiro. Em seu atual estágio, o Bitcoin já representa uma substancial redução nos custos de transação. Portanto, independentemente de vir a algum dia tornar-se dinheiro (meio de troca universalmente aceito), ele já atua como um meio de troca secundário.

Dessa forma, poderíamos considerar o Bitcoin o precursor de uma nova classe de ativos: a das "moedas digitais". E como está a precificação do ativo Bitcoin? Está caro ou barato?

Preço e volatilidade

Não sei. Ninguém sabe. O ponto fundamental não é se 1 BTC vale 30, 100 ou 2.000 dólares, mas sim que o preço de uma unidade Bitcoin está acima de zero, e isso, por si só, já é surpreendente. O simples fato de a moeda digital ter um preço e estar sendo utilizada por indivíduos em intercâmbios é sensacional.

Estamos ainda na infância do experimento Bitcoin. A cotação de um Bitcoin em relação a outras moedas, ou o seu preço, é algo que está sendo continuamente descoberto pelo mercado, e não podemos prever a sua evolução. E ainda que, pelo lado da demanda, não saibamos como ela evoluirá, ao menos do lado da oferta não seremos surpreendidos por súbitos aumentos na quantidade de Bitcoins em circulação, pois isto é tecnicamente impossível.

É claro que a alta volatilidade complica a vida dos usuários que querem utilizar o Bitcoin como moeda -- e talvez facilite a daqueles que querem utilizá-lo para especular --, e é por esse fator que, quanto maior o número de aderentes, mais benéfico será para o avanço da moeda digital. Mas não interprete esse argumento como um convite à especulação. Quanto mais indivíduos aderirem e utilizarem a moeda, maior será sua liquidez. Quanto maior a liquidez, menor tende ser a sua volatilidade e aceitação no mercado.

No entanto, e aqui está o aviso, uma maior liquidez não necessariamente significa um preço maior.

Alguns afirmam tratar-se apenas de uma nova bolha que em breve vai estourar levando seus usuários à ruína. Será que estamos presenciando uma bolha de fato? Pode ser que sim. Pode ser que não. Não sabemos. Mas uma bolha especulativa em si não é um fator preponderante ao avanço e futuro do Bitcoin. A bolha da internet no início dos anos 2000 não decretou o fim da internet, e a mania das tulipas, séculos atrás, tampouco fez a lilácea desaparecer do mercado.

De certa forma, o preço de uma unidade BTC é irrelevante. A questão-chave é que a moeda digital tem verdadeiras vantagens comparativas, oferecendo excelentes serviços de pagamentos e reduzindo de forma significativa os custos de transação. Como diz Tony Gallipi, sócio do site de pagamentos BitPay, "Bitcoin é simplesmente a maneira mais fácil até hoje inventada de enviar dinheiro de A para B".

Mercados, desafios e façanhas

A principal referência do preço de mercado da moeda digital é originada nas casas de câmbio específicas do Bitcoin, que operam em regime concorrencial. Essas casas de câmbio, essenciais ao progresso e desenvolvimento do Bitcoin, são o ponto de contato das moedas fiduciárias com o mundo Bitcoin. Por essa razão, são presas fáceis e óbvias aos ataques dos governos e reguladores -- possivelmente, são o elo fraco do ecossistema Bitcoin.

Isso fica evidente quando analisamos uma tentativa de regulação do governo norte-americano, em 2013, cujo efeito prático foi o de atravancar ou até mesmo impossibilitar empresas start-ups de operarem no mercado Bitcoin. Mas a consequência não-intencionada desta medida do governo dos EUA foi a concorrência jurisdicional que ela gerou. As casas de câmbio foram se espalhando para as mais diversas localidades e, desde então, todo o tipo de legislação cujo intuito seja coibir de alguma forma o avanço de empresas nesse mercado irá apenas conduzir empreendedores a buscar refúgio em outras jurisdições.

Outra complicação já enfrentada foi com o próprio sistema bancário. No Canadá, por exemplo, em 2013, duas casas de câmbio tiveram suas contas bancárias congeladas, repentinamente e sem esclarecimentos. Isso impossibilitou a continuidade normal de suas atividades. Vale ressaltar, contudo, que derrubar tecnologicamente alguma casa de câmbio, ou forçar legalmente o seu fechamento, em nada afeta a resiliência da rede Bitcoin. Mas com certeza impõe algumas complexidades adicionais à rápida adoção da moeda digital por parte de usuários e grandes comerciantes.

Uma vez que compreendemos o potencial revolucionário do Bitcoin, torna-se claro que não poderíamos esperar nada diferente de governos e bancos. Por esse motivo, talvez o futuro das casas de câmbio não esteja no modelo tradicional e mais evoluído -- em que há um servidor central --, mas sim em casas de câmbio peer-to-peer. Da mesma forma como a rede Bitcoin é descentralizada, e por essa razão não pode sofrer ataques de governos, é preciso fazer com que a compra e venda de Bitcoins com moedas fiduciárias ocorra de forma descentralizada, longe do alcance de legislações nocivas.

Embora as regulações desestimulem o investimento no setor, é notável o fato de ter havido nomes sérios da indústria de venture capital que injetaram dinheiro pesado no desenvolvimento de start-ups Bitcoin. A Union Square Ventures, cujo portfólio engloba empresas como Twitter, Zynga e Kickstarter, fez o maior investimento da história do projeto, investindo 5 milhões de dólares na Coinbase, empresa com sede em São Francisco, Califórnia.

A moeda digital também inspirou soluções criativas para a débâcle econômica da Grécia. Embora o Bitcoin não seja uma solução aos apuros fiscais do governo do país, ele serviu como refúgio genuíno para o povo grego, impossibilitado de transferir dinheiro ao exterior e refém de um possível confisco ou retorno ao antigo dracma.

Hoje, empresas do calibre de Dell e Microsoft aceitam Bitcoins como forma de pagamento. Consultorias como a Deloitte testam a utilização do blockchain -- o grande "livro-contábil" do Bitcoin -- para processos de auditoria. O governo de Honduras estuda um projeto-piloto para registrar a titularidade de terras no blockchain.

A Nasdaq está experimentando a infraestrutura da tecnologia para registro de transações e de propriedade de valores mobiliários. A New York Stock Exchange, por sua vez, investe em uma das maiores processadoras de pagamento de Bitcoin. Já a SWIFT ofereceu, recentemente, uma bolsa de 15 mil euros ao melhor trabalho de pesquisa sobre o impacto e o potencial da tecnologia do blockchain para as transações de ativos.

A cada semana, novas empresas buscam explorar as possibilidades do Bitcoin, endossando e legitimando cada vez mais essa grande inovação tecnológica.

Se no mundo desenvolvido Bitcoin está na sua infância, no Brasil o projeto ainda engatinha. Mas há cada vez mais interessados em abrir casas de câmbio e cedo ou tarde gente séria estará investindo bastante capital nesse setor aqui no Brasil também. E em outros países emergentes a moeda tem ganhado cada vez mais espaço. Na Ásia, os chineses já despertaram o interesse pela moeda digital. Apenas imagine o impacto que uma adoção maciça pelos chineses pode ter na evolução do Bitcoin.

Sem dúvida alguma, o experimento enfrentará enormes obstáculos ao longo do percurso. Haverá volatilidade, bolhas e quedas, exchanges serão fechadas, outras quebrarão, e novas formas de usar a moeda surgirão. O livre mercado certamente saberá contornar os percalços e progredir. A inata capacidade criativa do ser humano é o motor do progresso, e nela reside meu otimismo em relação ao futuro da moeda digital.

Mas agora é preciso explicar claramente por que julgo valer a pena comprar Bitcoins.

Tirania monetária

Sim, a moeda digital criada por Satoshi Nakamoto proporciona enormes vantagens comparativas em relação às demais moedas fiduciárias. Mas Bitcoin não é apenas uma forma de realizar transações globais com baixo ou nenhum custo. Bitcoin é, em realidade, uma forma de impedir a tirania monetária. Essa é a sua verdadeira razão de ser.

O entorno do surgimento da moeda digital não foi nenhuma coincidência. Bitcoin emergiu como uma resposta natural ao colapso da atual ordem monetária, à constante redução de privacidade financeira e a uma arquitetura bancária cada vez mais prejudicial ao cidadão comum. Governos não podem inflacionar Bitcoins. Governos não podem apropriar-se da rede Bitcoin. Governos tampouco podem corromper ou desvalorizar Bitcoins. E também não podem nos proibir de enviar Bitcoins a um comerciante no Maranhão ou no Tibet.

Imaginem um mundo sem inflação, sem bancos centrais desvalorizando o seu dinheiro para financiar a esbórnia fiscal dos governantes. Sem confisco de poupança. Sem manipulação da taxa de juros. Sem banqueiros centrais deificados e capazes de dobrar a base monetária a esmo e a qualquer instante para salvar banqueiros ineptos que se apropriaram dos seus depósitos em aventuras privadas. A verdade é que o Bitcoin, ou o que vier a substituí-lo no futuro, poderá remover os bancos dos banqueiros e o dinheiro dos governos. Por isso, não espere nenhuma boa vontade dessa dupla simbiótica em relação ao Bitcoin.

A internet nos permitiu a liberdade de comunicação. O Bitcoin tem o potencial de devolver nossa liberdade sobre nossas próprias finanças. Bitcoin é a internet aplicada ao dinheiro.

Portanto, criem suas carteiras, comprem alguns bitcoins e familiarizem-se com a nova tecnologia. Quanto mais indivíduos empregarem a moeda, quanto maior a sua aceitação no mercado, maiores serão suas chances de sucesso.  Mas deem atenção ao aviso de Gavin Andresen, desenvolvedor líder do projeto:

"Somente invista o tempo e o dinheiro que você pode perder, pois o Bitcoin ainda é um experimento. Quanto mais ele perdurar apesar de toda volatilidade e problemas técnicos, mais saberemos. Mas a confiança requer tempo."

Aos economistas, deixo um recado: estudem a moeda digital a fundo. Não a desmereçam pela simples aparência virtual. De fato, o Bitcoin tem forçado os estudiosos da teoria monetária e bancária a revisitar conceitos que pareciam estar completamente compreendidos e superados. Temos uma oportunidade ímpar de refinarmos a teoria acerca dos fenômenos monetários.

Àqueles que prezam a liberdade, reitero que, pela primeira vez na história da humanidade, a possibilidade de não dependermos de nenhum órgão central controlando nosso dinheiro é real e está se desenrolando nesse exato instante diante de nossos olhos. À liberdade individual e ao desenvolvimento da civilização, as consequências desse arranjo são extraordinárias e sem precedentes.

Dinheiro honesto é uma questão sobretudo moral e basilar para qualquer sociedade que almeja a paz e a prosperidade. E é precisamente essa a essência do experimento Bitcoin.


O artigo acima foi originalmente escrito em 2013, tendo sido apenas atualizado com algumas informações mais recentes.

_______________________________________________________

Leia também:

Bitcoin - a moeda na era digital

 

Sobre o autor

Fernando Ulrich

Fernando Ulrich é mestre em Economia da Escola Austríaca, com experiência mundial na indústria de elevadores e nos mercados financeiro e imobiliário brasileiros. é conselheiro do Instituto Mises Brasil, estudioso de teoria monetária.

Comentários (70)

Deixe seu comentário

Há campos obrigatórios a serem preenchidos!