segunda-feira, 28 nov 2016
Fidel
Castro morreu.
Ele estava com 90 anos de idade. Por coincidência, recentemente assisti ao
excelente filme Papa
Hemingway in Cuba, de 2015. O filme mostra a vida do escritor Ernest
Hemingway em Cuba antes da revolução. O cenário de fundo é a Cuba imediatamente
anterior à tomada do poder por Fidel Castro, uma terra de pessoas batalhadoras
e que vivenciava dificuldades (como todos os países da época), mas que prosperava.
E era governada com mão de ferro pelo brutal ditador Fulgencio Batista
(1901-1973).
Trata-se
do primeiro filme de Hollywood com locações em Cuba desde a Revolução Cubana.
O
filme busca recriar o ano de 1959. Ironicamente, isso não foi difícil de ser
feito. A maioria dos filmes ambientados mais de 50 anos atrás teria de ser
filmada exclusivamente em bairros mais antigos, utilizando as construções mais
antigas disponíveis, os carros mais antigos que ainda existissem, as
tecnologias da época, as roupas da época, as ruas sujas da época etc. Este
filme, no entanto, provavelmente teve de fazer o contrário: a produção
certamente teve de retocar a pintura, reformar as fachadas das casas,
reconstruir as ruas e as estradas etc.
Afinal,
tudo em Havana continua do mesmo jeito que estava em 1959, só que bem mais
deteriorado. A cidade parou no tempo. Ou, de certa forma,
regrediu.
Eis
o problema. Quando Fidel Castro tomou o poder, suas políticas comunistas
não apenas interromperam imediatamente todo o desenvolvimento econômico que
vinha ocorrendo, como ainda reverteram. A Cuba de então — depois de Argentina
e Uruguai — era o
terceiro país mais rico da América Latina (sua renda per capita era a igual
à da Itália).
Os
defensores de Castro gostam de falar sobre baixas taxas de analfabetismo (que
já estavam entre as menores do mundo antes da ascensão de Fidel)[1] e
acesso universal ao sistema de saúde (pode até haver "acesso universal", só não há os serviços),
mas as pessoas que viajaram para lá nas últimas décadas facilmente podem
observar a falácia. Fosse realmente assim, a população cubana não seria
mundialmente conhecida como aquela que arrisca a própria vida e a integridade
física atirando-se ao mar sobre qualquer coisa que bóie para tentar escapar do
país.
E
tem sido assim por 50 anos. As pessoas que foram capturadas em sua tentativa de
fuga foram ou assassinadas pelo governo ou mandadas para a prisão. Estima-se que
78.000 cubanos morreram ou tentando fugir do regime ou sendo capturados e
fuzilados. Outros 5.300 (majoritariamente camponeses e seus filhos) foram
mortos lutando contra o regime, nos 6 anos seguintes à revolução, nas montanhas Escambray
e na Baía dos Porcos. Há também os 14 mil cubanos que morreram durante as
aventuras revolucionárias de Fidel no exterior, especialmente quando ele enviou
50 mil soldados para Angola, na década de 1980, para ajudar o governo local —
uma marionete da URSS — a lutar contra
a insurgência da UNITA (União Nacional pela Independência Total de Angola).
Hoje,
Cuba é literalmente um museu a céu aberto, uma refutação viva àquela alegação
— feita há um século — de que o comunismo acabaria com a opressão econômica e
criaria riqueza para todos.
Conheça
o novo chefe
Como Fidel chegou ao poder? O
filme mostra a história. Mesmo que você nada saiba sobre a história de Cuba
além desta mostrada no filme, era perceptível que o regime de Batista não
duraria muito.
Batista
concorreu à presidência em 1952. Sabendo que a derrota era certa, e sendo ele bastante
versado nos métodos de um regime militar, ele comandou um golpe de estado que o
colocou no poder. Ele não era comunista, mas sim um típico ditador militar. Ele aboliu a imprensa livre. Suspendeu o Congresso. Matou
seus inimigos pessoais. Toda e qualquer contestação ao seu governo era
violentamente suprimida. Embora fosse amigável aos negócios estrangeiros e
alegremente aceitasse propinas de empresas americanas que tinham
empreendimentos em Cuba, sua corrupção, suas explícitas
ligações com o crime organizado (especialmente com os mafiosos Meyer Lansky
e Lucky Luciano) e sua brutalidade criaram as condições que levaram à
revolução.
O
lema da revolução era "liberdade ou morte", e Fidel era o líder. E não era um
líder qualquer. Ele se tornou uma figura mitológica, adorado especialmente pela
imprensa americana. Em 1957, o The New
York Times, o carro-chefe da esquerda chique, escreveu:
"Eis um homem culto, dedicado e fanático; um homem de ideais, de coragem e de
extraordinárias qualidades de liderança".
No
entanto, logo após descer a Sierra Maestra, derrubar o governo Batista e tomar
o poder, este "homem culto e de extraordinárias qualidades" começou a executar
publicamente seus rivais, a confiscar propriedade privada, a proclamar sua
lealdade ao ideal marxista-leninista, e a solidificar um regime totalitário que
viria a durar mais de meio século. O resultado da queda de Batista não foi a
democracia e a liberdade que o povo cubano queria, mas sim um incrível
pesadelo.
(Como
curiosidade, eis
a composição do primeiro gabinete deste "governo anti-burguesia": 7
advogados, 2 professores universitários, 3 estudantes universitários, 1 médico,
1 engenheiro, 1 arquiteto, 1 ex-prefeito e 1 coronel que desertou do exército
de Batista.)
Os
EUA, de início abertos ao regime castrista (antes de este se declarar
comunista), passaram a reagir com denúncias, sanções e embargos, os quais
serviram duplamente aos propósitos do regime: de um lado, Fidel utilizou as
sanções e os embargos como desculpa para justificar suas políticas estatais; de
outro, as sanções e os embargos se tornaram o bode expiatório perfeito ao qual
atribuir o horrendo fracasso de suas políticas econômicas.
Não
importa o quão pior estivesse a vida do povo cubano em decorrência do regime
comunista, a narrativa dentro de Cuba utilizada pelo governo era sempre a
mesma: vejam o mal que os EUA estão fazendo conosco.
A
fanática ideologia de Fidel Castro não o protegeu da mortalidade, que é o
limite supremo ao poder de todo e qualquer ser humano. Fora isso, seu poder não
conhecia limites. Nenhum dos tributos que você ler na imprensa e nos meios
intelectuais sobre este "grande revolucionário" pode ocultar a realidade: ele
foi um ditador sanguinário que manteve o povo cubano — ao menos aqueles que
ele permitiu continuar vivendo — refém de suas próprias ambições totalitárias.
Agindo assim, Fidel foi o primeiro a trair sua própria revolução.
Fervendo a panela até o seu
derretimento
Mas
Cuba é apenas um caso de destaque entre dezenas de outros que ocorreram ao longo
do século XX: uma ditadura de direita (ou de esquerda) é derrubada e
substituída por uma ditadura de esquerda (ou de direita), a qual, algum tempo
depois, é derrubada e substituída por uma ditadura de direita (ou esquerda). E
assim vai, sem um fim aparente. Já vimos isso reiteradas vezes.
O
desejo por uma revolução é sempre o mesmo: liberdade ou morte. É uma ideia, em
si mesma, inspirada e inspiradora. Mas ela rapidamente desaparece tão logo os
revolucionários experimentam as delícias do poder e passam a copiar todos os
métodos que antes condenavam em seus rivais. E, quando estes são finalmente
derrubados, seus sucessores e opositores fazem o mesmo. (Aliás, funciona
exatamente da mesma maneira na democracia, mas sem as torturas e os
assassinatos).
Em
1944, F.A. Hayek já alertava que, no mundo contemporâneo formado por estados intrusivos,
o manto ideológico pode se alterar, mas a ameaça à liberdade permanece a mesma.
A ameaça do comunismo leva ao surgimento do fascismo. A realidade do fascismo
inspira o comunismo. O inevitável fracasso do comunismo volta a impulsionar
novas esperanças no fascismo. E por aí vai. Os detalhes e sequências destes
eventos variam de país para país. Mas a dinâmica é a mesma e vive se repetindo.
Há
diferenças na ênfase, na propaganda, no tom cultural, e nas prioridades
políticas entre essas formas de governo, mas todas têm em comum o mesmo
desprezo pela liberdade.
Enquanto
o mundo — e isso vale também para os países democráticos — continuar à
procura de homens supostamente cultos, iluminados, corajosos e idealistas para
exercitar o poder de cima para baixo, seremos eternamente traídos e fustigados,
vítimas de justificativas ideológicas em prol do despotismo.
E
qual é o erro fundamental? Hayek também já havia respondido: a crença de que
toda a ordem econômica e social pode ser moldada por um desejo, por um plano,
por um projeto, por uma aspiração. Trata-se de um erro fundamentalmente intelectual. Tal
erro conceitual surgiu na academia no final do século XIX. E foi entregue a
alguns dos mais sádicos e perversos indivíduos do século XX, os quais o
utilizaram para cometer inenarráveis atrocidades contra a humanidade.
Liberdade ou poder?
E
então, qual é a alternativa? Uma sociedade pacífica, organizada, ordeira e
desenvolvida é um arranjo em contínua evolução; uma instituição que emerge de
acordo com as escolhas voluntárias e pacíficas de seus indivíduos; uma na qual
eles agem pacificamente, de acordo com considerações mútuas que visam a seu
próprio interesse e ao bem-estar dos outros.
Não
há um plano feito de cima para baixo com o intuito de corrigir e controlar toda
a sociedade. Os únicos planos são aqueles que estão dentro das mentes de cada
indivíduo. E mesmo estes planos devem sempre, e continuamente, ser testados e
alterados de acordo com as condições vigentes do momento.
No
final, a verdadeira batalha não é entre direita e esquerda, mas entre liberdade
e poder. Jamais podemos perder de vista esse ponto central, e jamais podemos
nos dar ao luxo de interromper a luta em prol de um mundo genuinamente livre.
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Leia também:
Os números de Cuba,
divulgados pelo seu próprio governo, comprovam: socialismo é pobreza
Um giro por Havana
Por que Cuba é pobre
A desconhecida história do
embargo cubano
A precária situação
alimentar cubana
Alerta de um cubano: tomem
cuidado com os estímulos morais do socialismo
A medicina cubana - um
modelo?
O verdadeiro Che Guevara
[1]
Como bem lembrou o editor do site Spotniks, Rodrigo da Silva:
- Não há uma mísera universidade cubana entre as 500
melhores do mundo.
- A taxa de analfabetismo em Cuba é a mesma de países como Antígua e Barbuda,
Armênia e Tajiquistão.
- Não há um mísero Nobel, uma Medalha Fields e uma Medalha Copley na história
cubana.
- A produção acadêmica em Cuba é menor que a de Bangladesh.
- No ranking da World Intellectual
Property Organization, Cuba aparece na lista com apenas 10 patentes
registradas em 2013.
- Cuba se nega a participar dos principais exames internacionais de educação -
como o Pisa, o Programa Internacional de Avaliação de Alunos.
Ou seja, a única coisa que sustenta que a educação
cubana seja exemplar para o mundo são os dados oficiais do governo cubano.