A
grande notícia sobre o iPhone 7 é a eliminação
dos fios do fone de ouvido. O conforto
trazido por essa inovação é sem precedentes: você agora não tem aquela tranqueira
convoluta e emaranhada, que se enrosca nas coisas ao redor, e que você tem de
dobrar pacientemente toda vez que vai guardá-lo. Mais uma inconveniência da vida é abolida. Mais um pequeno progresso ocorre no
mundo.
Analisando
tudo o que ocorreu ao longo dos últimos 15 anos, é impressionante contemplarmos
o quanto se tornou possível levar uma vida que parece ser minimalista e, ainda
assim, com extremo conforto. Digo "parece
ser" porque, na realidade, o "minimalista" é uma ilusão. Temos muito mais coisas do que jamais tivemos
e, ainda assim, tudo está bem mais condensado.
Quase
tudo está em nossos smartphones e computadores, em não em formato físico,
atravancando um espaço precioso em nossas residências.
O que torna o minimalismo possível
Nas
últimas semanas, assisti a vários vídeos sobre o estilo
de vida minimalista e devo dizer que, no geral, concordo com seus
proponentes. Há algo de calmo, de
esclarecedor, de tranquilizante em viver sem muitas coisas ao seu redor. Traz uma certa serenidade à vida.
Um
grande amigo meu é adepto desse estilo de vida, tendo escrito um artigo — "Por
que prefiro viver de aluguel em um pequeno apartamento em vez de comprar uma
enorme casa" — que se tornou altamente popular entre os adeptos do
minimalismo. Eu mesmo também tenho ido
nessa direção.
A
cada ano dos últimos dez anos tenho me desfeito de uma enormidade de coisas,
jogando nas caçambas enormes sacos contendo itens que não uso mais. É algo enormemente gratificante poder se
livrar de entulhos. Sim, em alguns casos
pode ser uma decisão dolorosa — a pior foi a que tive de tomar em 1987, quando
joguei 500 discos de vinil na lixeira. Eles
ocupavam praticamente dois metros e meio em minhas prateleiras e pesavam uma
tonelada. Repentinamente, joguei tudo
fora e os substituí por alguns CDs. E então
comecei a acumular CDs. Vários CDs. Até chegar
ao ponto em que várias gavetas lotadas de CDs também foram para o lixo.
Hoje,
todas essas músicas físicas foram substituídas por... um notebook. E o mesmo ocorreu com várias outras coisas. As prateleiras de livros que costumavam
dominar a casa em que passei minha juventude, ocupando espaço precioso, hoje estão
dentro do meu tablet, do meu smartphone e do meu Kindle.
Com
um detalhe: tenho hoje muito mais livros do que jamais tive. Só que agora eles não ocupam espaço nenhum e não
pesam absolutamente nada. Mais ainda:
posso levá-los (todos eles!) para qualquer lugar e posso lê-los a qualquer momento.
Lembra-se do catálogo?
Quem
é jovem, provavelmente não. Era comum as
pessoas terem pelo menos uns três daqueles tijolos, que ocupavam um enorme espaço
nos armários (eles raramente cabiam em gavetas). Hoje, eles nem existem mais. Pelo
seu smartphone, você descobre o telefone de qualquer empresa. Mais: pelas redes sociais, você entra em
contato com qualquer pessoa do seu passado.
Você não mais precisa de saber onde ela mora para procurar seu telefone
em um catálogo.
Lembra-se
de quando você recebia jornais físicos? Todos
os dias, você tinha de se livrar daquele trambolho, que ocupava um grande espaço
na lixeira. Hoje, você pode lê-los em
seus aplicativos, em sua cama. Revistas? Mesma
coisa.
E
o que dizer então daqueles enormes
armários de arquivos, para armazenar todos os tipos de documentos
burocráticos importantes? Você tinha de tê-los.
Eles
eram desumanamente pesados. Se caíssem
em cima de alguém, poderia matar. Hoje, ninguém
mais os tem, exceto aqueles monumentos ao atraso que são as repartições públicas.
Lembra-se
da sua escrivaninha? Ela tinha de ter
compartimento para tudo. Tinha grampeadores,
rolodex,
pilhas de papeis, impressoras, corretivos, durex, fita crepe, cola, clips, e
vários calhamaços de manuais de instrução para softwares. Havia materiais acumulados para pesquisa. Havia arquivos de
contas pagas. Havia envelopes e selos
para enviarmos correspondências. Tínhamos
tesouras, relógios, rádios, um globo terrestre, dicionários e variados tipos de
enciclopédias.
Havia
também álbuns de fotos e caixotes e mais caixotes de fotos que um dia colocaríamos
em um álbum, mas que nunca o fizemos. E havia
também cartões de natal do ano passado e de vários anos anteriores.
E
os livros de receita? Em termos de espaço,
eram piores que catálogos. Havia um
livro para cada estilo de comida, para cada canto do planeta, para cada propósito. Hoje, com dois toques no seu smartphone, você
tem acesso a qualquer receita que você queira.
Pense
no interior de uma casa ou apartamento do passado. Era repleto de coisas para guardar
coisas. E de coisas para guardar essas coisas
que guardavam outras coisas. Não é que éramos
mais materialistas. Todas essas coisas eram
necessárias. E essa era a única maneira
de tê-las e mantê-las. Hoje, tudo o que
temos de ter é um lugar para dormir, algo para esquentar comida fria, um forno
e um fogão, alguns pratos e talheres, e algumas roupas. Pronto.
Todo o resto cabe em seu smartphone, tablet e notebook.
Lembra-se
dos mapas? Você tinha uma pilha deles em
sua casa e no porta luvas do seu carro. Caso
quisesse um mapa rodoviário mais detalhado, você tinha de ter um enorme mapa dobrável. À medida que você ia dirigindo, você tinha de
ir desdobrando as páginas e virando o mapa na direção correta. Com o tempo, ele inevitavelmente ia ficando
amarfanhando, se desintegrando e rasgando, até finalmente ficar completamente inútil. Aí você tinha de comprar outro.
Provavelmente,
você tinha uma bússola também.
E,
certamente, uma pilha de fitas cassetes, com oito músicas de cada lado, a qual
tinha de ser manualmente trocada em seu toca-rádio. Ou CDs.
Lembro-me de gente que comprava máquinas gigantes para colocar no
porta-malas do carro, as quais comportavam 250 CDs, e que eram controladas de
dentro do carro.
Uma
insanidade. Hoje, tudo isso já é museu.
Você
pode ter tudo isso em pequenos dispositivos.
Toda a poupança que isso lhe possibilitou é incalculável. Hoje, ao toque dos seus dedos, você tem
acesso a músicas, filmes, fotos, livros, enciclopédias, notícias, e ainda pode
guardar todos os seus arquivos nas nuvens.
Toda
essa transformação é indescritivelmente impressionante, além de ser charmosa e
bela. Hoje, temos aposentos limpos,
abertos, arrumados, sem tralhas e tranqueiras ocupando espaço. E dizemos a nós mesmos: aprendi a viver sem
acumular. Aprendi a viver sem ter
muito. Descobri a maneira certa de viver!
Sim,
mas quem permitiu esse estilo de vida minimalista foi o capitalismo.
Sobre esses encantamentos com o
pouco
Isso deve
ser ressaltado: esse estilo de vida minimalista, o qual eu também sigo, não é simplesmente
uma escolha pessoal. Não precisamos nos
congratular excessivamente por termos esse estilo. Foi a tecnologia o que possibilitou essa vida. E o que possibilitou a tecnologia? O capitalismo, a economia de mercado e a
criatividade de vários empreendedores.
Somos apenas
os beneficiados das idéias
e do trabalho de terceiros.
E eis o
grande paradoxo: o suposto materialismo do capitalismo possibilitou vivermos
com cada vez menos dependência do mundo físico.
Este
excelente vídeo, de apenas 54 segundos, mostra toda essa impressionante evolução
ocorrida.
Agora,
seria bom se pudéssemos eliminar aquele irritante fio que liga nossos aparelhos
eletrônicos às tomadas nas paredes. Por que
ainda temos essa coisa horrorosa e incômoda?
Ah, sim,
porque a eletricidade é fornecida por um monopólio concedido pelo estado. Não conte com seu completo desaparecimento em
um futuro próximo. Nessa área, a inovação
não é ditada pelo livre mercado. Consequentemente,
continuaremos atados e plugados por um bom tempo.