São
vários os jornalistas econômicos dizendo que a atual queda no preço do petróleo
será rapidamente contrabalançada por um aumento em sua demanda, o que fará com que
o preço retorne ao seu "valor normal".
Vamos
deixar algo bem claro. Há uma diferença
econômica — ou seja, uma distinção analítica — entre essas duas frases: (1)
aumento da demanda; (2) aumento da quantidade demandada (isto é, disponível
para ser comprada).
Ambas
parecem iguais, mas são analiticamente diferentes.
Abaixo,
um gráfico convencional de oferta (S) e demanda (D). Tal gráfico está presente em praticamente
todos os manuais de economia.
O
eixo X representa a quantidade (Q) de um bem.
O objetivo do gráfico é transmitir a seguinte ideia: há um preço de
equilíbrio (P). Todos os indivíduos que
quiserem vender o bem em questão ao preço P irão conseguir vendê-lo. E todos os indivíduos que quiserem comprar o
bem em questão ao preço P irão conseguir comprá-lo. Nenhum comprador e nenhum vendedor estão
excluídos do mercado. Trata-se de um gráfico
estático, que não leva em consideração uma passagem de tempo.
Já
o gráfico abaixo representa um conceito distinto: há um aumento da demanda
durante um intervalo de tempo. Esse
aumento da demanda não foi causado por uma redução no preço. Ao contrário: o aumento da demanda gerou um
aumento de preço. O aumento da demanda
foi a causa do aumento de preço.
Portanto, a demanda é uma causa,
e não um efeito.
Trata-se
de um gráfico dinâmico. D1 se move para
D2 durante um intervalo de tempo.
O preço do petróleo em 2015
O
preço do petróleo despencou na segunda metade de 2014. Por quê?
Aumento da oferta? Queda da
demanda? Uma combinação de ambos?
Comecemos
por uma redução da demanda. Boa parte do
mundo parece estar entrando em recessão. Sendo
assim, os mercados esperam que haja uma queda na demanda por petróleo. Essa expectativa derrubou o preço do
petróleo. Essa é uma explicação bastante
comum.
Mas
também sabemos que houve um aumento da oferta de petróleo. E não há como armazenar grandes volumes de
petróleo, exceto no subsolo. Tão logo
alguém extrai petróleo, ele tem de vendê-lo.
E a OPEP ainda está vendendo petróleo, e não armazenando-o no
subsolo. Os produtores de óleo de xisto
também ainda estão vendendo. Houve,
portanto, um aumento da oferta de petróleo na margem. E os preços são determinados na margem (e não
pelo estoque total existente no mundo).
O petróleo continua fluindo. E
como ele tem de ser vendido para uso imediato — e não tem como ser armazenado
—, o preço caiu.
Esse
gráfico #3 mostra bem essa situação. (A linha verde representa a oferta inicial
de petróleo; a linha roxa representa a nova oferta de petróleo, maior; a linha
vermelha representa a demanda).
A
curva da oferta se moveu para a direita, que é como economistas ilustram um
aumento da oferta. O preço,
consequentemente, caiu. O mercado se
equilibrou em um novo valor de P e Q.
Observe que, nesse gráfico, a
quantidade demandada aumentou. Esse
é um gráfico dinâmico, que leva em consideração um intervalo de tempo. A oferta antiga se moveu para uma oferta nova
(e maior). Consequentemente, a
quantidade demandada aumentou de Q1 para Q2 (maior).
Mas
há um problema com essa explicação: o preço do petróleo caiu acentuadamente na
segunda metade de 2014. E a oferta não
aumentou tão significativamente assim desde junho. Logo, creio que uma queda na demanda foi a
principal causa.
Eis
um gráfico que representa melhor esse fenômeno: "oferta inelástica" (o que
significa que a oferta não é sensível a alterações de preço) e demanda em queda.
Com essa combinação, o preço cai.
A
oferta é inelástica? Bastante. O líder do ministério do petróleo da Arábia
Saudita afirmou que seu
país continuará vendendo petróleo mesmo se o preço do barril cair a US$20. Dado que todos os outros exportadores
precisam de dinheiro, eles não podem se dar ao luxo de interromper sua produção
e parar de vender. E eles não têm o poder
de afetar o preço por meio de uma redução na oferta. A Arábia Saudita é o gorila de 2.000kg que
dita as regras. Se o país se recusar a
reduzir a oferta, o preço irá cair.
Sendo assim, todos os outros são obrigados a continuar extraindo
petróleo. Eles precisam do
dinheiro. Isso define uma "oferta
inelástica".
Alguns
economistas estão argumentando o seguinte: o preço do petróleo está baixo hoje,
e, como consequência, haverá um aumento da demanda por petróleo. Esse argumento é analiticamente incorreto. Ele parte do princípio que o mercado irá sair
do gráfico #1 (gráfico estático, que não
leva em consideração uma passagem de tempo) e irá para o gráfico #2 (gráfico
dinâmico). Pode até haver algum aumento
da demanda, pois a economia mundial pode melhorar nesse ínterim. Mas qual a evidência de que isso irá
acontecer? Ainda não há nenhuma.
A
queda no preço do petróleo em 2014, qualquer que seja seu motivo, é um
fato. Isso significa que, por causa do
aumento da produção, haverá uma maior
quantidade de petróleo sendo demandada (isto é, disponível para ser
comprada) a esse novo preço, pois um aumento
na produção gerou essa maior quantidade a ser demandada. Por outro lado, uma redução na demanda por
petróleo levou a uma queda no preço, e sem que essa queda gerasse um aumento na
quantidade de petróleo comprada: oferta inelástica.
Sei
que a linguagem é semelhante e gera confusão: a palavra "demanda" parece ser
sinônima de "demandada". Porém,
conceitualmente falando, as duas frases acima são diferentes. Causa e efeito são distintos.
Se
o preço do petróleo caiu por causa de um aumento da produção, então a
quantidade de petróleo demandada (isto é, disponível para ser comprada) irá
aumentar. Todos aqueles que quiserem
vender petróleo a esse preço conseguirão fazê-lo, e todos aqueles que quiserem
comprar petróleo a esse preços conseguirão fazê-lo.
Mas
isso não é o mesmo que dizer que haverá um aumento na demanda por petróleo em
2015. Um aumento na demanda indicaria
que algum novo elemento foi acrescentado às condições econômicas atuais.
Não
vejo hoje nenhum motivo forte para acreditar que haverá um grande aumento na
demanda por petróleo em 2015, significando um deslocamento para a direita em
toda a curva da demanda. Creio ser muito
mais provável que a demanda por petróleo irá cair por causa das recessões no
Japão e na Europa Ocidental, e também por causa de uma desaceleração econômica
na China.
Qualquer
argumento sobre um eventual aumento futuro no preço do petróleo tem de ser mais
robusto do que simplesmente dizer que "o atual preço baixo do petróleo irá
aumentar a demanda por petróleo". Isso
pode acontecer apenas se o preço baixo do petróleo estimular a economia mundial
o suficiente para contrabalançar a recessão.
Porém, até o momento,
não há sinais disso.
Se
você quer argumentar que haverá um aumento no preço do petróleo, você tem de
argumentar que a demanda por petróleo irá aumentar por conta própria. Em outras palavras, a curva demanda irá se
deslocar para a direita. É isso o que
mostra o segundo gráfico. Algo de
fundamental irá ocorrer e irá alterar a demanda por petróleo, e essa alteração
irá deslocar toda a curva da demanda para a direita. Qualquer pessoa que argumentar nesses termos
terá de explicar por que a demanda por petróleo irá aumentar. Ela tem de explicar por que toda aquela curva
irá se deslocar para a direita. E, no
gráfico, a alteração da demanda altera os preços. Nesse caso, a demanda é uma causa, e não um
efeito.
Analiticamente,
um aumento na demanda não é a mesma coisa que um aumento na quantidade
demandada (isto é, disponível para ser comprada). Sei que a linguagem confunde muita
gente. Se você pretende especular com o
preço do petróleo, é crucial que você não confunda esses dois conceitos.