O estado moderno foi criado e construído sob a crença de que traria o progresso
material para o mundo.
E
como as coisas mudaram. Houve uma época
em que, por mais equivocadas que fossem as políticas adotadas, elas ao menos
tinham a intenção de acelerar o progresso.
Hoje, ao contrário, o mesmo estado se esforça para reverter o progresso
de todas as maneiras possíveis. Pior
ainda: ele até mesmo se vangloria das coisas "gloriosas" que está fazendo para
tornar nossas vidas ainda mais miseráveis.
Ele
inclusive tem a cara-de-pau de se auto-elogiar dizendo que, sozinho, é capaz de
fazer retroceder nossa constante batalha em busca de uma vida melhor. E, em troca disso, ele espera que sejamos
gratos aos nossos senhores de engenho — e que paguemos por esse privilégio.
Estes
são os pensamentos que cruzaram minha mente ao ler esta reportagem do The New York Times: Europa
atormenta motoristas em prol de paraíso para pedestres. (Ou, no Brasil, Automóvel
será vetado no centro de SP no Dia Mundial Sem Carro).
Sim,
é isso mesmo: políticos não estão tentando facilitar o ato de dirigir um
automóvel; ao contrário, querem torná-lo mais problemático e irritante, e tudo com o
intuito de que as pessoas abandonem seus carros, esqueçam-nos e voltem a andar
a pé, exatamente como era antes da invenção da roda.
Agora,
sinceramente: o fato de que você pode entrar em um dispositivo de aço,
dirigi-lo a altas velocidades e ir aonde quiser é algo que tem de ser
considerado como uma das maiores façanhas da história da humanidade. Isso representou a libertação da vontade
humana. Nos últimos 100 anos, sempre que
encontrávamos o progresso, a alegria e a satisfação humana, lá estava o
automóvel. O automóvel chegou muito
perto de sobrepujar os grandes problemas gerados pela escassez de tempo e de
espaço, além de ter-nos tornado capazes de realizar tarefas essenciais. Além de nos permitir trabalhar, residir e
fazer compras onde queremos, o automóvel também nos dá a liberdade de viajarmos
para onde quisermos, fazendo com que cheguemos a cada um desses locais em uma
fração do tempo que nossos ancestrais demoravam.
E
o que o estado resolve fazer? Ele tenta
acabar com tudo isso. "Governos estão
criando ambientes urbanos abertamente hostis aos automóveis", diz o Times.
"Os métodos variam, mas a missão é clara: tornar o uso do carro algo
caro e impossível o suficiente para fazer com que os motoristas optem por meios
de transporte mais sustentáveis."
Será
que estes políticos estão ao menos cientes de que estão meramente ressuscitando
o plano de transportes de Mao Tsé-tung? Quando
Mao chegou ao poder em 1950, ele declarou que a China seria um zixingche de
guo, o Reino das Bicicletas. A
bicicleta era um dos três itens que todos os cidadãos obrigatoriamente deveriam
ter (os outros dois: um relógio e uma máquina de costura). A bicicleta supostamente deveria ser um
grande símbolo da igualdade e da disposição do cidadão em utilizar os próprios
músculos para trabalhar pelo triunfo do socialismo.
E
assim já está acontecendo ao redor do mundo ocidental, por enquanto de maneira
mais proeminente na Europa, onde ruas estão sendo fechadas, estacionamentos
estão sendo demolidos, e a gasolina está sendo tributada ao ponto de torná-la
inacessível para o mais pobres — nada mais elitista. Em vários locais, os limites de velocidade
estão sendo reduzidos a um valor equivalente ao de uma caminhada, e, em outras
localidades, os carros estão sendo completamente banidos. A ideia não é a de construir a grande utopia
socialista, mas sim a de "salvar o ambiente" — e que se dane o bem-estar dos
seres humanos que pagam os impostos que permitem a estes governos existir e
prosperar.
É
tudo pela natureza? Não, essa é apenas
uma das justificativas. No caso da
Europa, os políticos também estão dizendo que as ruas são muito estreitas para
lidar com um alto tráfego de automóveis, uma vez que a maioria delas foi
construída antes da invenção do automóvel.
Isso é estranho: as ruas nos EUA também são anteriores ao automóvel, mas
os americanos — como o empreendedor Brigham Young, que construiu Salt Lake
City — tiveram a ideia de fazer suas ruas largas o suficiente para permitir
que carruagens pudessem dar meia-volta.
Na maioria das vezes, o verdadeiro motivo é que os "planejadores
urbanos" simplesmente não gostam de carros e, consequentemente, como afirma a
reportagem, "em geral concordam que um aumento no uso de carros não é desejável
para as cidades."
O
problema com os "planejadores urbanos" é que eles não pensam nas pessoas como
sendo indivíduos com interesses próprios e que agem de acordo com seus próprios
planos, resultando disso uma ordem espontânea que torna as cidades
grandiosas. Ao contrário, eles querem
planejar tudo — como se possuíssem um olhar de águia sobre toda a cidade e
realmente fossem oniscientes —, e obrigar todas as pessoas a obedecer aos seus
caprichos, mesmo que estes sejam deprimentes.
Na pior das hipóteses, estes planejadores estão secretamente
horrorizados pela visão de milhões de pessoas vivendo bem e cuidando de suas
próprias vidas, e, assim como Mao, clamam desesperadamente por aquilo que
acreditam ser um sistema mais ordeiro.
Armados
com o poder do estado contemporâneo — que está destruindo a prosperidade e o
avanço civilizacional porque, na realidade, é somente isso que o estado sabe
fazer bem —, os planejadores urbanos estão realmente conseguindo seus
objetivos. Mas a que custo? Reverter um século de progresso é uma boa
maneira de melhorar nossas vidas? Os
planejadores juram que sim, pois não apenas eles têm outras ideias sobre como
nossas vidas deveriam ser, como também querem nos obrigar a aceitar suas
imposições. Eles querem que as cidades
sejam mais parecidas com um viveiro de formigas do que com um local onde as
pessoas escolhem, sonham e realizam. A
existência estática de operários e camponeses sob o comunismo parece ser um
arranjo muito mais parecido com o mundo com que sonham.
A
questão é que o automóvel nunca realmente foi bem visto pelos governos. O automóvel é produto do mercado, e é
utilizado por pessoas que querem alcançar objetivos individuais. Em meu livro It's a Jetsons
World, mencionei que, se o governo não fosse o proprietário das ruas e
se ele não regulasse de maneira tão pesada as inovações nos meios de
transporte, já poderíamos estar usufruindo carros voadores a esta altura. É claro que esta minha afirmação não pode ser
comprovada e nem refutada, mas é assim mesmo em um mundo no qual não há como se
verificar alegações a respeito do que poderia existir na ausência de controles
estatais e de medidas punitivas sobre a inovação e a produção.
Pense
no quão pequeno está sendo o progresso mesmo naquelas localidades em que o
automóvel é tolerado. Recentemente, um
novo modelo do Honda Accord passou por mim e eu pensei que fosse um Lexus. Logo depois, um Lexus passou por mim e eu
jurava que fosse um Accord 1995. E então
pensei: os carros estão realmente se aperfeiçoando ou será que estamos apenas
girando em torno de estilos e designs? É
isso o que fazem empresas de setores nos quais os consumidores querem apenas
inovação no estilo, mas não na estrutura (roupas masculinas, por exemplo). Mas isso não é verdade para o setor de
transportes. Sim, há novos apetrechos de
segurança e alguns penduricalhos a mais nos carros. Mas por que os "carros-conceito" das
principais fabricantes nunca chegam às ruas?
Quais inovações estamos perdendo?
Foi
após pesquisar tudo isso que resolvi escrever um artigo específico sobre o
assunto. [Ver Por que os carros de hoje
são todos iguais]. O fato é que há um
vasto aparato de planejamento central controlando a produção de carros. Há imposições de emissão e de consumo, há regulações
sobre absolutamente tudo, do pneu ao ar-condicionado, há leis federais sobre
segurança e tamanho do motor, e há vários outros milhares de quesitos. Não há um único elemento do carro que não
esteja sujeito a alguma regulamentação específica, inclusive o formato exato
das luzes de alerta no painel. Qual
espaço realmente restou para inovações?
Tudo
ocorre exatamente como Bastiat havia alertado que ocorreria em uma economia mista. Jamais saberemos ao certo quais inovações não
puderem existir e jamais farão parte de nosso mundo por causa das regulações
que paralisam os inovadores. Jamais
saberemos ao certo quais tipos de bênçãos materiais poderiam estar amplamente
disponíveis não fosse a espoliação diária de capital e criatividade que ocorre
sob os auspícios do leviatã.
Governos
sempre foram inimigos do progresso, mesmo quando alegam querer o
progresso. Nos últimos anos, estamos
ouvindo declarações cada vez mais francas desta gente (proibição de sacola
plástica é apenas o começo). Eles querem
o retrocesso, e querem isso com volúpia.
Caso vençam, o único terreno que ainda vivenciará um progresso real será
aquele criado no universo digital, o qual os planejadores são muito lentos (e
muito idiotas) para regular e, com isso, incapazes de nos levar de volta à
Idade da Pedra que eles consideram ser o ideal.