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O
reino dos céus é semelhante a um tesouro escondido no campo, que um homem, ao
descobrí-lo, esconde; então, movido de gozo, vai, vende tudo quanto tem, e
compra aquele campo.
Mateus
13:44 |
Todos
nós temos estranhos e contraditórios desejos acerca de como os preços devem
funcionar. Ficamos ultrajados quando os
preços dos alimentos e da gasolina sobem.
Nunca queremos que eles aumentem e nunca achamos que eles devem
aumentar. Em termos reais, queremos que
eles caiam continuamente — e, no caso dos alimentos, eles de fato caíram
durante a última década e meia. Isso é
bom, certo? É assim que o mundo deveria
funcionar.
Mas,
e quanto a imóveis? Agora, sim, estamos
em um terreno distinto. Quando os preços
caem, as pessoas se desesperam. É como
se o fim do mundo estivesse próximo.
Como é possível que minha própria casa caia de preço?! Não é assim que o mundo deveria
funcionar. Todo mundo sabe que os preços
dos imóveis sempre devem subir, ininterruptamente, continuamente, sem parar,
até o fim dos tempos.
O
mesmo vale para ações. Sempre que vamos
checar o valor de nosso portfólio, queremos que os preços das ações em nossa
carteira estejam cada vez mais altos, sempre.
Quando eles caem, entramos em desespero e exigimos justiça.
Mas
paremos um pouco para pensar no quão peculiar é isso tudo. Que tipo de teoria a respeito do mundo
insiste em afirmar que imóveis e ações sempre devem se valorizar, ao passo que
gasolina e alimentos sempre devem cair de preço? Isso não faz sentido algum. Um preço não é determinado por uma lei
natural; tampouco o movimento dos preços deve seguir algum tipo de padrão, como
o movimento das estrelas. Preços nada
mais são do que taxas de câmbio — um ponto de acordo entre o comprador e o
vendedor. Os preços são um reflexo de
vários fatores, e nenhum deles é parte fixa do universo.
Portanto,
por que desejamos que alguns preços sempre subam e que outros sempre
caiam? Tudo depende, é claro, da posição
em que você está: se na do consumidor ou na do produtor. Enquanto proprietários, somos de fato
"produtores" de nossos imóveis; o que quer dizer que estamos mantendo nossos
imóveis com a esperança de que, algum dia, iremos colocá-los à venda. O mesmo se aplica a ações. Já que somos os donos delas, é claro que
queremos que seus preços subam. E então
poderemos vendê-las e obter um lucro.
De
um lado, em relação às coisas que queremos comprar, coisas como gasolina e
alimentos, queremos que seus preços sejam os mais baixos possíveis. Queremos que seus preços caiam
continuamente. Queremos poupar recursos.
Portanto,
o que está em jogo aqui é o interesse próprio.
Pense na mesma situação do ponto de vista de alguém que esteja comprando
um imóvel. Esta pessoa quer preços altos
ou preços baixos? É claro que a resposta
é óbvia. Esta pessoa quer o preço mais
baixo possível, de modo que, para esta pessoa, o estouro de uma bolha
imobiliária não representa de maneira alguma algo ruim. Ao contrário, é uma dádiva. Porém, tão logo esta pessoa se torne uma
proprietária de imóvel, a situação se altera.
Agora ela quer que os preços subam constantemente.
Agora
pense no proprietário de um posto de gasolina.
Se o preço cobrado não afetasse sensivelmente seu volume de vendas, ele
iria querer que os preços subissem ou caíssem?
É claro que ele iria querer os preços mais altos possíveis.
Lembro-me
de certa vez ter pechinchado com um daqueles insuportáveis vendedores de
carros. Eu estava de olho em um carro,
mas havia dito que não tinha condições de bancá-lo. Ele me perguntou quanto eu gostaria de pagar
por aquele carro. Eu disse $0. Ele arregalou o olho e me encarou como se eu
fosse louco, mas eu estava apenas dizendo a verdade. Acrescentei dizendo que sabia quanto ele
queria que eu pagasse: $1 trilhão. E ele
relutantemente concordou. Sendo assim,
como é que a pessoa que quer pagar $0 e a pessoa que quer receber $1 trilhão
chegam a um acordo? Ambos chegam a um
meio termo, um valor no qual o carro vale mais para mim do que o dinheiro que
estou disposto a dar em troca dele, e no qual o dinheiro que darei pelo carro
vale mais para o vendedor do que o carro.
Os termos resultantes são chamados de preço.
E
funciona assim em todos os mercados.
Podemos ver por que é totalmente absurdo tentar moldar a política
nacional em torno dos interesses de apenas um dos lados de uma transação. Tentar, por exemplo, manter os preços dos
imóveis altos e crescentes representaria uma trapaça contra o comprador. Tentar manter os preços baixos seria uma
vigarice contra o atual proprietário. Manter
os preços dos alimentos altos ajuda os agricultores mas prejudica os
consumidores. Algumas petrolíferas podem
gostar de preços altos para a gasolina, mas os consumidores os odeiam
vigorosamente. Por outro lado, uma
redução forçada dos preços da gasolina pode empolgar os consumidores, mas os
produtores podem acabar sendo tão prejudicados a ponto de terem de encerrar
várias de suas operações. E isso não seria
bom para ninguém.
A
única e genuína solução aqui é deixar o livre mercado decidir — o que é apenas
outra maneira de dizer que as pessoas devem ser livres para fazer suas próprias
negociações a respeito dos preços que elas estão dispostas a pagar ou a aceitar
por isso e por aquilo. Tais termos de
acordo devem ser tão flexíveis quanto à própria valoração humana. Isso significa que nós devemos ser livres
para mudar de opinião, com cada troca sendo considerada um fim em si mesma, sem
nenhum vínculo com futuros termos de acordo para futuras trocas deste mesmo bem
ou de quaisquer outros bens.
Isto
não apenas está de acordo com os pré-requisitos da liberdade — qualquer
tentativa de forçar os preços a fazer isto ou aquilo será uma transgressão da
nossa liberdade de negociação —, como também é essencial para o bom
funcionamento de uma economia. Isto
porque o preço é fortemente influenciado por fatores como a disponibilidade de
recursos, as valorações subjetivas dos consumidores e a lucratividade do
empreendimento à luz dos custos de produção.
No final, os registros contábeis têm de estar no azul. Os preços que são aceitos no mercado devem
sustentar este estado de coisas. Mesmo
em mega-indústrias, como a petrolífera, a diferença entre receitas e gastos
pode ser surpreendentemente pequena. E
mesmo pequenas mudanças tributárias ou regulatórias podem levar empresas de
todos os tamanhos à falência.
Preços
são cruciais para fazer com que uma quantidade escassa de recursos seja
distribuída de maneira racional e sensata em um mundo que possui desejos
ilimitados de consumo. Preços afetam a
maneira como utilizamos as coisas, seja conservando-as ou jogando-as fora. Preços mais altos para a gasolina alteram a
maneira como você toma decisões sobre viagens, deslocamentos e quaisquer outros
movimentos, por menores que sejam. E
isso é algo bom. Preços mais altos
sinalizam uma necessidade de se conservar os bens — e tudo sem que haja mandatos
e decretos impraticáveis do governo. E
do ponto de vista de um produtor, os preços vigentes fornecem informações
cruciais a respeito da previsão de lucros futuros — portanto, das decisões
atuais de investimento.
Mas
temos também de abordar a questão da justiça.
Pensamos saber o que é um preço justo.
Mas será que realmente sabemos? E
o que realmente constitui justiça nos preços?
A primeira coisa que me vem à mente é a Parábola
do Tesouro no Campo. Um desavisado
proprietário de terras vive sua rotina diária sem saber que existe um tesouro
em seu quintal. Mas um outro sujeito, no
entanto, possui conhecimento deste tesouro.
Consequentemente, este indivíduo vende tudo o que possui, bate à porta
do desavisado proprietário da terra e, de forma relaxada e casual, diz que gostaria
muito de poder comprar sua propriedade.
O proprietário a vende.
Mas
sejamos claros aqui: o proprietário não sabia que havia um tesouro enterrado em
seu quintal. Tampouco o comprador disse
qualquer palavra a respeito — caso contrário o preço da propriedade iria para
as galáxias. Nos dias de hoje, as
pessoas diriam que o proprietário foi espoliado. Mas Jesus não diz isso. Ele apresenta o comprador como um homem sábio
e moral. Interessante, não? Houve justiça nesta troca? Certamente.
E por quê? Porque ambos os
envolvidos concordaram voluntariamente em fazer a transação. E isso é tudo o que interessa.
Não
há nenhuma maneira de observar um preço vigente e declarar se ele é justo ou
injusto. Como disse São Bernardino de
Siena, um perspicaz observador de assuntos econômicos,
A água é geralmente barata porque é abundante. Mas pode
ocorrer que, em uma montanha ou outro lugar, a água seja escassa, não
abundante. Pode muito bem ocorrer que a água seja muito mais valiosa que o
ouro, caso o ouro seja mais abundante nesse lugar que a água.
Os
escolásticos tardios, seguidores de Santo Tomás de Aquino, concordaram que o
preço justo não possui valor fixo. Tudo
depende da avaliação comum dos vendedores e compradores. Luis de Molina resumiu a
questão:
Um preço é
considerado justo ou injusto não em razão da natureza das coisas em si — isto
nos levaria a valorá-las de acordo com sua nobreza ou perfeição — mas devido à
sua capacidade de servir à utilidade humana. Porque essa é maneira pela qual
são avaliadas pelos homens, elas assim impõem um preço no mercado e nas trocas.
Agora,
há maneiras de um preço se tornar uma questão de injustiça. Ele pode mascarar uma fraude. Os preços podem resultar de um ato de força
ou serem influenciados por ele, como ocorre quando há controle de preços, ou
tributação, ou restrições artificiais da oferta e da demanda. Por trás de cada um destes atos, encontramos
coerção; um grupo de pessoas ditando ordens ou restringindo transações
voluntárias de uma maneira que é incompatível com a liberdade de escolha. Comprovadamente, isto não é justo.
Podemos
concluir, portanto, que, quando reclamamos que algum preço é injusto, temos
antes de analisar quais restrições estão ocorrendo no mercado, ou examinar o
papel que os impostos estão desempenhando em jogar os preços para um nível
muito acima do que estariam caso houvesse um ambiente de plena liberdade de
mercado.
E
no que diz respeito àqueles que acreditam que todos os preços deveriam sempre
se mover de tal maneira a beneficiar seus próprios e específicos interesses
econômicos em detrimento de todos os outros indivíduos, apenas uma observação: não
confundam seus desejos com justiça. Os
preços vigentes em uma economia de mercado são um reflexo de acordos
cooperativos envolvendo pessoas dotadas de liberdade de escolha. Ninguém tem o direito de interferir
nisso. Não seria algo justo.