Dentre
todas as inúmeras concepções erradas e falsas doutrinas que assombram o
pensamento econômico, há uma que se destaca e que pode ser considerada, sem
rivais próximos, a mais destruidora e nociva de todas elas: a ideia de que
vivemos em um mundo de abundância, um mundo em que não há escassez.
Tal
ideia se resume a crer que o principal problema de uma economia não é a criação
de riqueza — isto é, a produção de bens e serviços. O problema seria simplesmente estimular o
consumo de maneira igualitária. Por
exemplo, peguemos o inevitável exemplo da "saúde gratuita e de qualidade para
todos". Seus defensores apenas exigem
que todas as pessoas possam consumir esse bem gratuitamente. Nenhum deles jamais se preocupa em explicar
como tal bem será produzido e distribuído de maneira racional e gratuita entre
todos os seus consumidores. A produção e
a criação não fazem parte da súmula de preocupações destas pessoas. É como se serviços de saúde, remédios e todos
os tipos de tratamento médico, desde cirurgias até engessamento de braço,
fossem bens amplamente disponíveis na economia, bastando apenas que haja uma
"distribuição correta" de dinheiro para que eles possam ser consumidos
igualmente por todos.
Essa
visão de mundo parte do princípio de que bens e serviços surgem do nada e estão
ali, inertes na natureza, apenas esperando serem descobertos e consumidos — e
para que isso ocorra, basta o governo tributar, imprimir dinheiro e gastar.
Porém,
como perfeitamente pode compreender qualquer ser que se disponha a fazer uso de
sua razão, nenhum bem ou serviço surge pronto do nada. Todos eles precisam ser criados e
trabalhados. Um carro não surge do
nada. É preciso trabalhar o aço, o
alumínio, a borracha e o plástico que irão formá-lo. E esses quatro componentes também não surgem
do nada. Eles precisam ser extraídos da
natureza ou fabricados. O mesmo é válido
para todos os outros bens de consumo que você possa imaginar, de laptops a
aviões, passando por parafusos, palitos de dente e fio dental. Todos precisam ser trabalhados. De nada adianta o Banco Central imprimir
dinheiro ou o governo aumentar seus gastos — aumento da quantidade de dinheiro
ou aumento dos gastos do governo não podem abolir a realidade da escassez; não
podem driblar e contornar o problema da produção, fazendo com que os bens
finais surjam como em um passe de mágica.
Vejamos
um exemplo simples que, em sua essência, revela como é extremamente complexa a
estrutura de produção de uma economia. Imagine
uma simples empresa que venda presuntos.
Tudo o que você precisa fazer para adquirir seus produtos é ir até a
gôndola de um supermercado, pegar a iguaria com a marca dessa empresa, ir até o
caixa e pagar. Um cidadão comum dificilmente
faz uma pausa para pensar em todo o processo produtivo por trás daquele simples
presunto. Muitos creem que fazer um
presunto é algo simples. Muito pelo
contrário.
Em
primeiro lugar, a empresa que fabrica presuntos precisa ter instalações
adequadas para mantê-los bem conservados enquanto estiverem estocados.
Isso significa ter um armazém com um bom sistema de refrigeração. O
sistema de refrigeração necessita de manutenção e reparos constantes. Isso
significa custos com mão-de-obra. Esse sistema precisa também de peças de
reposição, e tais peças são geralmente feitas de aço. E como se obtém o
aço? Compra-se de uma siderurgia. E como a siderurgia fabrica o
aço? Como o aço é uma liga de ferro e carbono, é preciso antes escavar
minas para achar ferro. Portanto, a siderurgia tem de comprar ferro das
mineradoras, e as mineradoras têm todo o seu processo de produção. Vamos
parar por aqui, pois, caso contrário, poderíamos nos estender infinitamente.
Após
ter sido produzido pela siderurgia, o aço precisa ser transportado para a
empresa de refrigeração que irá montar todos os insumos para fazer o
equipamento de refrigeração. O transporte normalmente é feito por uma
empresa terceirizada.
Observe
que ainda estamos falando apenas do sistema de refrigeração que vai conservar o
presunto. Só aí já vimos várias etapas da cadeia produtiva; vários
processos de produção, sendo que cada um desses processos tem várias etapas. Agora vamos falar mais especificamente do
presunto. O presunto, obviamente, não
surge do nada. Quem o traz? Uma empresa de transportes. Ela o
traz de onde? De um frigorífico. E
onde o frigorífico arrumou a matéria-prima (porcos) que se transforma em
presunto? Em um abatedouro. Quem fornece para o abatedouro? Um
suinocultor. Qual a função do suinocultor? Criar os porcos.
Como se cria porcos? Com milho e soja. Onde ele arruma milho e
soja? Com agricultores. E estes precisam de fertilizantes, que
precisam ser manufaturados por vários outros processos de produção, e assim por
diante.
Ou
seja, aquele simples presunto que você compra no supermercado só chegou àquela
prateleira após passar por várias etapas de uma intrincada cadeia produtiva.
E todo esse longo processo não pode ser contornado, driblado, evitado ou
abolido por meras políticas governamentais.
Tampouco políticas sociais ou redistributivas podem fazer com que haja
presunto farto para todas as pessoas de uma economia. Tudo precisa ser trabalhado e produzido para
que venha a existir.
Quando
se entende essa realidade de que vivemos na escassez e de que tudo precisa ser trabalhado
e produzido para que possa existir, é fácil concluir que, sempre e em todo
lugar, haverá trabalho a ser feito. Seja
na fabricação de um bem de consumo, seja na prestação de algum serviço.
E
é justamente a ignorância tanto desta realidade — a de que vivemos na escassez
— quanto de sua consequência direta — que tal escassez significa que há uma
infinita necessidade de trabalho e produção — o que está por trás de
absolutamente todas as políticas danosas que frequentemente são implementadas
com o objetivo de "estimular a economia" ou "proteger os empregos".
É
essa ideia de que não há escassez — e que, logo, há um número fixo de empregos
na economia — que está por trás de políticas inflacionistas, assistencialistas,
regulatórias e de aumento gastos governamentais.
E
é também essa ideia que está por trás de todas as políticas protecionistas.
"As importações destroem empregos!"
Como
todos que se dão ao trabalho — e ao desgosto — de acompanhar o noticiário
econômico bem sabem, o governo brasileiro vem adotando políticas protecionistas
de vários tipos, que vão desde o aumento de tarifas de
importação até a surrada prática da substituição de importações (com
a participação do BNDES, por favor).
A ideia que sustenta tais políticas é uma só: impedir que os chineses e os
coreanos — que se atrevem a nos vender a preços baixos produtos que queremos
comprar — destruam empregos aqui no Brasil, ou, o que dá no mesmo, impedir que
"nossos empregos" sejam exportados.
É
importante fazermos uma análise mais detalhada desta recente e vigorosa
ascensão protecionista e nacionalista, pois a própria existência do livre
comércio — e de toda a prosperidade por ele trazida — depende disso.
Considere
esta notícia:
Em meio a uma invasão de importados, a indústria nacional
de calçados enfrenta dificuldades para manter empregos e até transfere sua
produção para outros países. Dois grandes grupos empresariais do Rio Grande do
Sul, principal pólo do setor no país, fecharam fábricas e levaram a produção
para a Nicarágua e para a República Dominicana. O objetivo é aproveitar acordos
comerciais desses governos com os EUA e criar unidades voltadas ao mercado
americano.
A Abicalçados (associação da indústria do setor) diz que
outras dez empresas podem tomar o mesmo rumo. A Argentina também recebe
empresas brasileiras, que planejaram a mudança devido às barreiras para vender
ao país vizinho. O grupo Schmidt Irmãos, que tinha uma série de fábricas no
interior gaúcho, transferiu a produção para a Nicarágua no ano passado. O
governo nicaraguense divulgou que o investimento da empresa brasileira será de
US$ 25 milhões. A unidade em uma zona franca da Nicarágua precisa receber até
máquinas e insumos vindos do Brasil, devido à escassa estrutura industrial do
país. Procurado, o grupo preferiu não se pronunciar.
Dona de marcas como a Ortopé, a empresa Paquetá, de 12.500
funcionários, fechou em agosto uma fábrica em Sapiranga (RS) e a transferiu
para a República Dominicana. Centenas de vagas de trabalho foram perdidas. A
empresa disse que tomou a medida para "manter a competitividade industrial e
continuar crescendo". A valorização do real também influencia na decisão. A
federação dos trabalhadores do setor no Estado fala em risco de
desindustrialização e diz que há debandada para locais que oferecem
salários mais baixos. A produção no acumulado do ano no país caiu. Até agosto,
a exportação de calçados brasileiros recuou 25% ante o mesmo período de 2010.
Enquanto isso, o volume de mercadorias importadas subiu 18%. A Indonésia quase
dobrou suas vendas ao Brasil.
Ou
seja, além dos chineses e dos coreanos, agora pelo visto também temos de nos
"proteger" dos nicaraguenses e dos dominicanos.
E não precisamos ficar apenas nos exemplos diretos de perda de empregos
e transferências de indústrias para o exterior.
Podemos pegar também o exemplo da transferência virtual de empregos. Por exemplo, quem é da área de Tecnologia da
Informação sabe perfeitamente que sua maior concorrência não está aqui no
Brasil, mas sim na Índia, onde há técnicos plenamente capazes dispostos a
trabalhar por salários menores do que seus congêneres brasileiros (e
principalmente americanos). Este é um
dos motivos de os salários desta área, como recentemente nos disse um leitor
que atua neste setor, estarem relativamente estagnados, por mais crescente que
seja a demanda por tais serviços.
E
isso é fácil de entender. Ao passo que
um engenheiro de software americano exige um salário de pelo menos US$ 100.000
por ano, e um brasileiro se contenta com uns US$ 30.000 (R$ 52.000), um
competente indiano fica plenamente satisfeito com um salário de US$
20.000. Fazendo uso de modernos
equipamentos de telecomunicação, este indiano poderá trabalhar desde a Índia
tão eficazmente quanto se estivesse fisicamente presente no Brasil ou nos
EUA. Nos EUA, inclusive, há um fenômeno
que vem assombrando o establishment
médico daquele país (e que rapidamente pode aportar aqui no Brasil): o número
de radiologistas, segundo a imprensa, vem declinando significativamente. Isso ocorre simplesmente porque as imagens
por ressonância magnética podem perfeitamente ser enviadas pela internet para
radiologistas da Ásia plenamente capazes de diagnosticar o problema, e que cobram
por isso apenas uma fração do que cobra o altamente cartelizado setor médico
americano. Tem-se aí um ótimo exemplo de
como o livre mercado trabalha para manter os custos sempre baixos.
O
que nos interessa aqui é observar que não há diferença entre substituir um
trabalhador no Brasil por outro na Ásia, ou transferir uma fábrica para a
Nicarágua e para a República Dominicana, ou desempregar trabalhadores de
indústrias cujos produtos não conseguem concorrer com produtos importados mais
baratos — no final, o desemprego nestes setores aumentará.
E
é aí que surgem os protecionistas com suas lamúrias sobre o livre comércio
gerar desindustrialização, perda de renda, miséria e estagnação econômica.
Donde
vem a pergunta: quais são realmente os fenômenos gerados pelo livre comércio? Eles devem ser temidos? Seriam eles um ataque ao nosso padrão de vida
e, consequentemente, justificariam intervenções governamentais concebidas para
controlá-los?
Para
responder a esta pergunta, temos acima de tudo de entender a lei das vantagens
comparativas e a distinção entre 'valor' e 'riqueza', algo que David Ricardo já
havia feito em seu "Princípios
de economia política e tributação".
'Valor' deve ser entendido como a renda monetária, e 'riqueza' deve ser
entendida como os bens e serviços que a renda monetária pode adquirir. Ou, colocando de outra forma, 'valor' é o dinheiro
utilizado em uma troca, e riqueza é aquilo que é recebido nessa troca.
Assim,
comecemos abordando o exemplo mais fácil: engenheiros de software brasileiros sendo
substituídos por asiáticos que recebem salários menores. O motivo desta substituição estar ocorrendo é
óbvio: os brasileiros não estão dispostos — ou os custos trabalhistas são
maiores aqui, o que dá na mesma — a aceitar salários tão baixos quanto os de
seus concorrentes asiáticos. Logo, o
custo de tal serviço é maior aqui do que na Índia.
E
o fato de os brasileiros não estarem dispostos a aceitar esta redução salarial
implica que eles preferem ir para outras linhas de produção (isto é, outros
empregos) que, embora ofereçam salários menores do que aqueles que receberiam
nos empregos que acabaram de perder, não requerem reduções tão severas quanto
as que seriam necessárias para que eles se tornassem competitivos nos empregos
agora preenchidos por indianos.
Por
exemplo, supondo que os engenheiros de software ganhavam R$ 6.000 por mês e não
aceitaram reduções salariais, de modo que indianos e chineses foram contratados
em seu lugar, eles agora terão de se mudar para empregos que irão pagar,
digamos, R$ 5.000 ou R$ 4.000. Estes
engenheiros, ao se mudarem para outros ramos da economia, irão levar todo o seu
conhecimento e aptidão para estes setores, aumentando a oferta e melhorando a
qualidade dos serviços. E,
principalmente, a maior oferta de mão-de-obra nestes setores irá reduzir os
custos. Caso o fenômeno que está
ocorrendo com radiologistas nos EUA ocorra aqui no Brasil, o efeito será o
mesmo: uma maior oferta de médicos em outras áreas da saúde, o que levará a uma
redução real (isto é, descontada a inflação gerada pelo aumento da oferta
monetária) dos preços — algo sempre bem-vindo.
E,
como explicado no início do texto, o fato de vivermos em um mundo de escassez
implica que sempre haverá, em todo e qualquer lugar, serviços (empregos) a
serem feitos. Em teoria, não há por que
haver desemprego. Logo, o fato de haver
desemprego no mundo real se deve às regulamentações governamentais, as quais
geram esse descasamento entre a demanda por trabalho, sempre infinita, e oferta
de mão-de-obra, naturalmente escassa (tal fenômeno foi explicado mais
detalhadamente aqui). Consequentemente, se são as regulamentações governamentais
que atrapalham o remanejamento da mão-de-obra deslocada pelas forças de
mercado, então são elas que deveriam ser abolidas, e não o livre comércio.
Expandindo o raciocínio
Toda
a explicação acima pode ser expandida para a economia como um todo. Basta generalizarmos a situação. Assim, imagine que vários setores da economia
brasileira — automotivo, calçados, siderúrgicos, têxteis etc. — sejam
confrontados por concorrentes estrangeiros ofertando produtos baratos que os
consumidores brasileiros voluntariamente optam por comprar. Tal concorrência desemprega vários
trabalhadores brasileiros, os quais terão agora de ir para outros setores. Isso irá gerar uma redução na renda monetária
destes indivíduos. Porém, e isso é o
mais importante, a redução na sua renda monetária sempre será menor do que a redução nos custos implantada
por seus concorrentes. Ou, colocando de
outra forma, a redução nos custos será maior do que a redução na renda
monetária.
E
isso é fácil de entender. Quando uma
empresa busca reduções de custo (a genuína concorrência no mundo atual se dá
por meio da redução de
custos e não da redução de preços nominais) e consegue continuar produzindo
o mesmo tanto de antes com uma mão-de-obra menos dispendiosa — ou com insumos
mais baratos —, isso gera um aumento líquido na produção total de toda a
economia. Reduzir custos de produção
significa, geralmente, encontrar uma maneira de produzir a mesma quantidade de
bens com menos mão-de-obra. Isso faz com
que haja um aumento na produção total da economia, pois a mão-de-obra que foi
dispensada deste setor está agora livre para ir produzir mais bens em outras
áreas do sistema econômico.
Vale
a pena enfatizar esse fenômeno: o que
ocorre nestes casos é que a mão-de-obra e os insumos mais dispendiosos são
liberados de um setor (calçadista, automotivo etc.) e, com isso, podem ser
utilizados para expandir a produção de outros setores comparativamente mais
importantes. Ao mesmo tempo, mão-de-obra
e insumos menos dispendiosos são retirados das linhas de produção
comparativamente menos importantes e direcionados para este setor em que houve
as demissões — e cujo tamanho agora foi reduzido.
Este
contínuo processo de substituição de mão-de-obra e materiais mais caros por
mão-de-obra e materiais menos caros gera um ganho econômico líquido,
equivalente a um aumento na produção, pois a produção de algo considerado mais
importante pelos consumidores está sendo aumentada em detrimento da produção de
algo considerado menos importante.
As
fronteiras geográficas que delimitam estes processos são irrelevantes. O efeito de trabalhadores da indústria de
calçados gaúcha sendo desalojados por sapatos chineses é o mesmo de uma padaria
de bairro dispensar seus empregados porque uma grande rede varejista se
instalou na vizinhança e está roubando clientes. Em ambos os casos, desde que haja plena liberdade de comércio e desimpedida mobilidade da mão-de-obra, haverá uma maior produção em
outros setores e uma consequente maior oferta de bens na economia como um todo. É desta forma que as reduções de custo
trazidas pelo livre comércio beneficiam os próprios brasileiros.
Logo,
vale repetir: se são as regulamentações estatais que atrapalham o remanejamento
da mão-de-obra deslocada pelas forças de mercado, então são elas que deveriam
ser abolidas, e não o livre comércio.
Apenas
quando se entende todo esse processo é que se torna possível entender como as
reduções de custos geradas pelo livre comércio aparecem como reduções reais de preços nos bens e serviços que
os brasileiros compram. Tais reduções de
preços ocorrem porque as reduções nos custos são maiores do que o declínio nos
salários. Em outras palavras, os
salários reais dos brasileiros — e
não os salários nominais — aumentam. E
isso é algo totalmente visível. O número
de horas trabalhadas necessárias para se adquirir bens e serviços vem caindo ao
longo dos anos, não obstante toda a inflação monetária e consequente aumento
nominal dos preços gerados pelo governo.
Esse fenômeno representa bem o princípio ricardiano das vantagens
comparativas e da distinção entre valor e riqueza.
Não
obstante tudo o que foi dito, é claro que, se analisarmos exclusivamente a
situação de um grupo isolado da economia, principalmente o daqueles
assalariados que tendem a ganhar salários mais altos — como os engenheiros de
software, os radiologistas ou mesmo os operários sindicalizados da indústria
automotiva —, o declínio de sua renda é muito mais acentuado do que qualquer
eventual declínio nos preços de bens e serviços que os membros destes grupos
tendem a consumir. Porém, da mesma
maneira, para cada um destes exemplos pode-se citar inúmeros contra-exemplos de
brasileiros que são beneficiados por reduções nos custos de serviços de
informática e serviços médicos e nos preços de automóveis e sapatos. E sem terem sofrido nenhuma redução salarial.
Conclusão
A
divisão do trabalho é algo infinito, e o fato de vivermos em um mundo de
escassez significa que sempre haverá serviços a serem feitos. Consequentemente, sempre haverá empregos para
todos. O fato de isso não ocorrer hoje
se deve às várias intervenções do governo no mercado de trabalho — são os encargos
sociais (INSS, FGTS normal, FGTS/Rescisão, PIS/PASEP, salário-educação, Sistema
S) e trabalhistas (13º salário, adicional de remuneração, adicional de férias,
ausência remunerada, férias, licenças, repouso remunerado e feriado, rescisão
contratual, vale transporte, indenização por tempo de serviço e outros benefícios),
além do salário mínimo, que provocam esse descasamento entre demanda por
trabalho e oferta de mão-de-obra.
O
livre comércio por si só não gera desemprego.
Muito pelo contrário: ele possibilita a expansão do emprego e o consequente
desenvolvimento de outros setores até então pouco ou nada explorados, além de
gerar redução de custos e aumento dos salários reais na economia. As pessoas que são demitidas das indústrias
menos eficientes (que não conseguem concorrer com os produtos importados) e não
conseguem outros empregos devem debitar ao estado e às suas regulamentações
esse seu atual suplício. O que elas não
podem fazer é utilizar justamente o governo para impedir que outras pessoas
voluntariamente adquiram os produtos de seus concorrentes.
Há
também efeitos indiretos gerados pelo livre comércio. Países que abrem suas economias expõem seus
empreendedores ao mercado global, algo que os obriga a ser eficientes,
inovadores e ousados. De quebra, todo o
país é obrigado a melhorar suas referências em educação e a aperfeiçoar seu
ambiente burocrático, diminuindo impostos e regulamentações, e aprimorando sua
infraestrutura — um setor em que, caso o estado se retirasse de cena, haveria
grandes oportunidades para a livre concorrência fazer seu trabalho.
Por
trás do protecionismo está justamente a ideia de que os empregos são limitados
e de que não há a possibilidade de exploração de novas áreas da economia. Fosse o governo habitado por seres
minimamente racionais em termos econômicos, todas as leis anti-emprego e
anti-empreendedorismo já teriam sido repelidas juntamente com todas as tarifas
de importação e todas as regulamentações anti-comércio. E isso traria um benefício enorme para toda a
população, principalmente em termos de renda real.
Por
fim, nunca é demais ressaltar que o desenvolvimento econômico da China, da
Índia, dos países do leste asiático e de todos os países considerados como de
terceiro mundo, em conjunto com sua total integração a um sistema de divisão
global do trabalho, é algo que deve ser fervorosamente desejado por qualquer
pessoa que genuinamente entenda os benefícios do livre comércio e reconheça
toda a prosperidade por ele gerada. Tal
desenvolvimento econômico, se deixado livre, geraria, além de todos os
benefícios das vantagens comparativas, a máxima economia de escala possível em
cada setor da produção. Mais ainda: cada
ramo da ciência, da tecnologia, da invenção e da inovação empreendedorial
passaria a ser buscado por um número cada vez maior de indivíduos inteligentes
e altamente motivados. O resultado
inevitável seria um progresso econômico mais acelerado ao redor de todo o
globo, o que elevaria o padrão de vida de todos para um nível muito acima do
atual padrão vigente nos países mais ricos da atualidade — algo
desesperadoramente necessário nesses tempos de crise econômica aguda.
O
protecionismo nada mais é do que o medo dos incapazes perante a inteligência e
as habilidades alheias. Tal postura,
além de moralmente condenável, por ser covarde, é também extremamente
perigosa. Como já alertava Bastiat, se,
ao invés de nos permitirmos os benefícios da livre concorrência e do livre
comércio, começarmos a atuar incisivamente para impedir o progresso de outras
nações, não deveríamos nos surpreender caso boa parte daquela inteligência e
habilidade que combatemos por meio de tarifas e restrições de importações acabe
se voltando contra nós no futuro, produzindo armas para guerras ao invés de
mais e melhores bens de consumo que eles querem e podem produzir, e os quais
nós queremos voluntariamente consumir.
Como
disse Bastiat, quando bens param de cruzar fronteiras, os exércitos o
fazem. O mundo seria incalculavelmente
mais rico e desenvolvido caso as pessoas lessem mais Mises e Bastiat, e menos
Marx e Keynes.