Os
dados recentes sobre a economia americana, acentuados pelos recentes e
desanimadores números sobre o emprego no país, confirmam o cada vez mais
decrescente impacto dos estímulos fiscal e monetário orquestrados pelo governo
Obama e pelo Banco Central americano, o Federal Reserve. No que deve ter sido um enorme desapontamento
para os entusiastas keynesianos, as doses recordes dos narcóticos fiscal e
monetário não produziram os resultados desejados. Com efeito, a "recuperação" econômica dos
últimos dois anos foi bem mais fraca do que a recuperação que tipicamente
ocorreria em um cenário recessivo que não recebesse qualquer tipo
de estímulo governamental. O fato é
que a atual "recuperação" econômica americana é a mais fraca da história do
país, não obstante o pacote de estímulos governamentais implementado ter sido o
maior e mais agressivo de todos os tempos.
Nos
últimos meses, venho prevendo com quase certeza que o QE2 [Quantitative Easing 2 — "Afrouxamento Quantitativo", eufemismo
tecnocrático moderno para "imprimir dinheiro"] não seria o último dos
programas de maciça impressão de dinheiro criados pelo Fed. Minhas suspeitas foram confirmadas tanto pelo
último relatório do Fed quanto pelo depoimento semestral dado pelo presidente
do Fed, Ben Bernanke, à comissão monetária do Congresso, ambos ocorridos na primeira
quinzena de julho. O relatório
explicitou as condições sob as quais uma nova rodada de inflação monetária seria
lançada, e o depoimento de Bernanke reenfatizou — caso ainda restasse alguma
dúvida — que o indigitado não tem nenhuma consideração pelos princípios de um
sistema monetário sólido.
As
atas do Fed continham a primeira indicação de que uma terceira rodada de
afrouxamento quantitativo (QE3) já está sendo considerada. As notas descreviam uma concordância unânime
quanto ao fato de que o QE2 deveria ser integralizado, e foram complementadas
com o seguinte comentário: "dependendo de como as condições econômicas evoluam,
o Comitê pode vir a considerar o fornecimento de estímulos monetários
adicionais, especialmente caso o crescimento econômico permaneça muito lento e
não reduza significativamente a taxa de desemprego no médio prazo".
Dado
que o desemprego está se deteriorando, e, de acordo com a opinião geral,
continuará assim por um bom tempo, o Fed basicamente está prometendo que irá
manter as torneiras abertas. O comitê de
política monetária do Fed também decidiu levar em consideração apenas o atual
"índice de inflação geral" para fazer seus julgamentos, e não as "tendências
inflacionárias". Considerando-se que os
novos dólares criados levam algum tempo para circular pela economia e elevar os
preços, isso significa que o Fed estará muito atrasado para restringir a
política monetária quando a inflação de preços começar a ficar fora do
controle, causando ainda mais descoordenação na economia americana.
Se
ainda havia algum resquício de fé de que o senhor Bernanke tem um plano para
acabar com o vício do governo americano no dinheiro fácil criado pelo Fed, seu
depoimento semestral ao Congresso já deveria ter eliminado por completo essa
ilusão. Além de alegar que suas injeções
monetárias ajudaram a economia americana, Bernanke, ao responder a uma pergunta
feita pelo congressista Ron Paul, disse que "ouro não é dinheiro", que as
pessoas que hoje estão comprando ouro não estão preocupadas com a inflação, e
que o valor do dólar nos mercados internacionais de câmbio não possui nenhuma
influência no poder de compra da moeda no mercado interno dos EUA. Ele até dedicou alguns minutos para discursar
em favor do plano de Obama para elevar o teto da dívida americana.
Ao
alegar que ouro não é dinheiro [veja o vídeo, e observe a
disfemia de Bernanke ao ser confrontado com a pergunta], o presidente do
Fed demonstrou toda a sua ignorância acerca de grande parte da história
monetária do mundo. Ele disse a Ron Paul
que não tem a menor ideia do motivo de os bancos centrais mundiais estocaram
ouro, e completou dizendo que deve ter algo a ver com a tradição. Sim, tradicionalmente ouro é dinheiro, sempre
foi dinheiro, e é exatamente por isso que os bancos centrais têm ouro em seus
ativos. E ouro é dinheiro porque as
pessoas sabem que jamais devem confiar na capacidade de banqueiros centrais, como
o senhor Bernanke, gerirem de maneira decente um dinheiro de papel.
Bernanke
prosseguiu contestando os fatos ao alegar que a única razão por que as pessoas
estão comprando ouro é para se protegerem contra incertezas, ou "riscos de
cauda" [distúrbio financeiro cuja
probabilidade de acontecer é inferior a 1%], como ele nomeia tal
fenômeno. Meu conselho ao presidente
Bernanke: pergunte às pessoas por que elas estão comprando ouro, e aí o senhor
começará a ter alguma idéia do motivo de o metal já estar acima dos US$ 1.600 a
onça. Como alguém que vem comprando ouro
há uma década, posso assegurar que essas minhas compras de ouro nada têm a ver
com "incerteza". Na realidade, é
exatamente o oposto. Estou comprando
ouro por causa daquilo que é certo, e não do que é incerto. Estou certo de que a incompetência de
Bernanke irá destruir o valor do dólar e desencadear uma inflação
descontrolada.
Se
fosse verdade que as pessoas compram ouro para se proteger contra as incertezas
do mercado, como Bernanke alega, então o metal deveria ter disparado no ápice
da crise financeira de 2008. No entanto,
ocorreu o contrário, e o ouro caiu junto com a maioria dos outros ativos. As pessoas instintivamente correram para o
dólar e para os títulos do Tesouro americano por causa do seu histórico de
estabilidade. O que Bernanke parece não
entender é que sua política monetária irresponsável está solapando a fé das
pessoas nos ativos americanos, que foram arduamente construídos ao longo de
gerações. É isso que está valorizando o
ouro: crédito fácil, taxas de juros reais negativas e afrouxamento
quantitativo.
Finalmente,
ao alegar que o valor do dólar no mercado internacional de câmbio não gera
efeitos sobre os preços dentro dos EUA, Bernanke demonstra não ter sequer a
competência para ser um caixa de banco, muito menos o presidente do Banco
Central americano. Um dólar
desvalorizado significa que os preços dos bens importados pelos americanos
serão mais altos. Significa também que
os produtores americanos terão de pagar mais por matérias-primas, insumos e
outros componentes importados, o que também eleva os custos da produção
doméstica nos EUA. E também significa
que mais bens produzidos nos EUA serão exportados, o que irá reduzir a oferta
de produtos na economia americana, gerando uma elevação dos preços daquilo que
sobrar para os americanos. Isso é
economia introdutória.
Dado
que Bernanke não sabe nem mesmo economia básica, não é surpresa alguma que ele
tenha voltado a considerar uma nova rodada de afrouxamento quantitativo — o
qual, apesar de toda a retórica moderada, vem ocorrendo ininterruptamente. O Fed sempre esteve disposto a manter o
programa; está apenas em busca de uma desculpa plausível para poder
"implementá-lo" novamente.
O
problema é que combater uma recessão imprimindo dinheiro é como combater um
incêndio jogando gasolina. À medida que
as chamas da recessão são revigoradas, mais impressão monetária, embora encharquem
momentaneamente o cenário, irão apenas produzir um inferno econômico ainda
maior.
Em
um dado momento do depoimento, Bernanke diz que "A analogia correta para o não
aumento do teto da dívida é ir às compras, fazer uma gastança com seu cartão de
crédito e depois se recusar a pagar a fatura."
A analogia até esta correta, mas a conclusão está completamente
errada. Sim, o Congresso americano
incorreu em uma gastança profusa e chegou a hora de pagar a conta. Mas elevar o teto da dívida é o equivalente a
utilizar um Mastercard para pagar a fatura do Visa — apenas piora o
problema. Se você e eu resolvemos sair
todas as noites para a farra, nos embebedarmos constantemente e falarmos para o
garçom não economizar na comida e na bebida, sendo que, ao final da cada noite
pagamos tudo no cartão de crédito, quando a fatura chegar no final do mês o
valor será assustador. E aí saberemos
que a maneira de corrigir essa situação e não ficar com o nome sujo será
apertando os cintos e pagando a fatura.
Talvez tenhamos de adiar os planos de férias, deixar de trocar de carro,
cancelar a assinatura da TV a cabo e da academia de ginástica. O fato é que teremos de reduzir o consumo
presente para podermos pagar o consumo excessivo do passado.
Obama
alega que elevar o teto da dívida americana é o equivalente a controlar a
dívida do governo federal. Você conhece
alguém que acha inteligente se endividar mais para sair de uma dívida
atual? Conhece alguém que já reduziu seu
endividamento sem ter reduzido o consumo?
Como pode o presidente do Banco Central americano defender uma ideia tão
ilógica e afrontosa?
Bernanke,
na verdade, foi ainda mais longe e alertou contra a redução dos gastos federais
atuais, alegando que, caso sejam reduzidos, isso poderia impedir a "recuperação". Ele aparentemente acredita que a função do
Congresso americano é cair na gastança, e que a função dele, Bernanke, é pagar
as contas que vão se avolumando com dinheiro recém-criado pelo Fed. O fato de que esta fórmula vem, ao longo do
tempo, produzindo crises econômicas cada vez mais severas não parece
incomodá-lo. A ignorância é
de fato uma benção.