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Economia

Um giro pelo Leste Europeu

12/03/2009

Um giro pelo Leste Europeu

Enquanto as economias do continente americano seguem sofrendo com o estouro das bolhas de investimento e consumo criadas pelo crédito fácil, as economias européias já estão lidando com a recessão do pós-bolha.  Mas a recessão nessas economias pode em breve piorar por causa de uma enorme crise de endividamento no Leste Europeu.

A incompetência na administração monetária não foi apenas um "privilégio" americano.  O Banco Central Europeu (BCE) também se transformou em uma máquina de criar de dinheiro e de diminuir artificialmente as taxas de juros.

E um dos efeitos dessa política do BCE é a nascente crise financeira no Leste Europeu.

Desde o colapso do comunismo na Europa Oriental no início da década de 1990, as até então "nações cativas" que estavam presas atrás da Cortina de Ferro abandonaram a economia planejada e se moveram em direção a reformas de mercado para tentar anabolizar suas destroçadas economias.

Algumas delas, mais notavelmente a Polônia, a República Tcheca, a Hungria e as Repúblicas Bálticas da Estônia, Letônia e Lituânia, saíram-se significantemente bem, superando décadas de um fracassado planejamento central socialista.

Investimentos estrangeiros significativos e uma robusta formação doméstica de capital reanimaram essas economias há muito estagnadas.  Após a restauração do direito à propriedade privada e um relativamente amplo grau de concorrência de mercado, a indústria e a agricultura prosperaram.  Houve também um aumento impressionante no turismo, já que o charme antigo de cidades como Praga e Budapeste atraíram dezenas de milhares de visitantes de todo o mundo.

Mas uma boa porção desse vigor econômico foi financiada por empréstimos contraídos em sua maioria junto a bancos e outras instituições financeiras na Europa Ocidental.  Governos, investidores privados e consumidores dos países do Leste Europeu se aproveitaram dos juros baixos e do crédito fácil praticados por aqueles países e contraíram uma quantia vultosa de empréstimos baratos denominados em euros (tenha em mente que esses países do Leste Europeu não adotaram o euro como moeda).

Hoje, esses países que pertenciam ao bloco soviético possuem uma dívida total para com seus credores ocidentais que está entre $1.5 trilhão e $2 trilhões.  Desse total, por volta de $400 bilhões devem ser pagos ou rolados em 2009.

A tabela a seguir mostra que, quando tomado em relação ao seu Produto Interno Bruto (PIB), o encargo do serviço da dívida de muitos desses países é significativo, o que os deixa fortemente dependentes de receitas de exportação para pagarem o que devem.

 Crise da dívida no Leste Europeu

País

PIB per capita

Classificação de risco da S&P

Financiamento necessário (em % do PIB)

Exportações*
(em % do PIB)

Bielorrússia

12.344

B+

7.3

62.1

Bulgária

12.372

BBB

29.4

61.0

República Tcheca

25.757

A

9.4

80.1

Estônia

20.754

A

20.0

72.0

Hungria

19.830

BBB

29.9

80.2

Letônia

17.801

BB+

24.3

46.6

Lituânia

18.855

BBB+

27.1

59.0

Polônia

17.560

A-

13.2

42.3

Romênia

12.698

BB+

20.2

34.4

Rússia

16.161

BBB

2.2

31.7

Sérvia

10.911

BB-

23.5

22.2

Eslováquia

22.242

A+

12.5

90.5

Eslovênia

28.894

AA

-

70.5

Ucrânia

7.634

CCC+

16.1

45.0

* Bens e Serviços, estimativa para 2008

      Fonte: Economist.com

A Letônia e a Hungria são as que mais estão sofrendo nessa crise por causa do encargo de suas dívidas.  Os investidores e consumidores da Letônia e da Hungria acharam mais atraente pegar empréstimos com bancos e outras instituições da Europa Ocidental, que estavam oferecendo taxas de juros bem mais baixas do que as oferecidas pelo mercado financeiro de seus respectivos países.

O problema, como foi dito, é que esses empréstimos estavam denominados em euros e, consequentemente, só podem ser pagos nessa moeda e não na moeda local húngara (o florim) ou letã (o lat).  Se as receitas de exportação declinarem ou o valor da moeda local cair em relação ao euro, o custo do financiamento dessas dívidas ficará ainda mais proibitivo.  E é exatamente isso que está acontecendo.

Durante o segundo semestre de 2008, a economia da Letônia entrou em parafuso.  E para 2009, espera-se uma contração de 12 por cento na economia letã, de acordo com o Fundo Monetário Internacional (FMI).  Já para a economia húngara, projeta-se uma contração de 6%.  O grosso dessa contração se deve a quedas nas exportações.

Uma boa parte dos gastos dos governos desses países estava voltada para a expansão de programas assistencialistas.  Uma outra fatia dos gastos estava sendo usada para "planejamento industrial", sempre e em todo lugar uma política equivocada.

Na Letônia, ocorreram violentos protestos no mês passado (fevereiro de 2009) quando o governo propôs implementar as exigências do FMI, que só concordaria em conceder mais assistência financeira ao país caso este adotasse um pacote de austeridade fiscal.  Isso levou à derrubada do governo em Riga.  O FMI já havia emprestado algo em torno de $4 bilhões para a Letônia, mas está protelando qualquer assistência adicional até que o país faça cortes em seus programas assistencialistas e em outros programas governamentais.

Ao mesmo tempo, muitas das moedas dos países do Leste Europeu que ainda não aderiram à zona do euro têm sofrido desvalorizações significativas nos mercados internacionais de câmbio.  Nos últimos seis meses, por exemplo, o zloty polonês se desvalorizou em mais de 30 por cento em relação ao euro.  O florim húngaro caiu mais de 22 por cento e a coroa tcheca, mais de 12 por cento.  Já a hyvnia ucraniana perdeu mais de 40 por cento de seu valor, também em relação ao euro.

Isso impactou diretamente os governos, os investidores privados e os consumidores.  Na Hungria, várias pessoas contraíram empréstimos em moeda estrangeira para financiar a compra da casa própria, o que fez com que elas tivessem de pagar suas hipotecas em euros.  Depois que o florim se desvalorizou, os custos desses pagamentos subiram dramaticamente, levando a um aumento dos calotes e da alienação de bens.  O FMI já emprestou ao governo húngaro, até agora, mais de $8 bilhões para ajudar a cobrir os custos da dívida do governo.

Mas o grau em que essa crise de endividamento está afetando o Leste Europeu não é uniforme.  As economias da Polônia e da República Tcheca permanecem relativamente fortes em relação às economias de alguns de seus instáveis vizinhos.  Ambos os países podem até apresentar um modesto crescimento econômico em 2009, se a recessão global não piorar substancialmente.

O impacto sobre os bancos da Europa Ocidental também não é uniforme.  As instituições financeiras que podem sofrer os piores impactos são as da Itália e da Áustria, que possuem o maior grau de exposição.  Os bancos da Áustria, por exemplo, chegaram a emprestar para o Leste Europeu somas que equivalem a quase 70 por cento do PIB austríaco - e os bancos italianos não ficam muito atrás.  É claro que, não fosse o sistema bancário de reservas fracionárias, aliado a uma política monetária frouxa adotada pelo BCE, tal descalabro seria impossível de ocorrer.

No início de março, analistas do J.P. Morgan projetaram que os bancos europeus precisariam de, pelo menos, mais $50 bilhões até 2010 para compensarem esses "empréstimos tóxicos" que estão se avolumando em seus registros contábeis.  Muitos desses bancos protestaram, dizendo que as estimativas do Morgan são exageradas.  Mas quaisquer que venham a ser os números finais este ano ou no ano que vem, os mutuários do Leste Europeu e seus financiadores da Europa Ocidental estão em uma rota com previsão de muita turbulência.

É claro que, no final, o "capitalismo" e os "mercados desregulamentados" serão novamente apontados como os culpados por essa "crise", gerada pelas ingerências governamentais na área monetária.  E vários governos, como consequência, surgirão com mais pacotes de "estímulo" e mais planos de socorro financeiro para salvar os vários grupos de interesse ligados aos corredores do poder político.


Sobre o autor

Richard Ebeling

Leciona economia na Northwood University de Midland, Michigan, é um scholar adjunto do Mises Institute e trabalha no departamento de pesquisa do American Institute for Economic Research.

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