Oito dias depois de afirmar diante do
parlamento
japonês que "juros negativos" não estavam sendo seriamente considerados
pelo Banco do Japão, Haruhiko Kuroda surpreendeu os mercados financeiros ao
anunciar justamente uma nova
política
de "juros negativos".
Kuroda agora se junta ao crescente grupo de
banqueiros centrais que adotaram a inédita política de juros abaixo de zero — um clube
ainda restrito, mas que ganha novos adeptos a cada ano.
Primeiro foram os bancos centrais da Suécia e
Dinamarca. Depois veio o Banco Nacional da Suíça e logo em seguida o Banco
Central Europeu do audacioso Mario Draghi.
O Japão é, sem dúvida alguma, um dos grandes enigmas
do mundo financeiro. Qualquer investidor sério que acompanhe a economia
japonesa e as contas do governo chegará a uma conclusão óbvia: o governo
nipônico está quebrado, e quando o restante do mercado se der conta, os juros
dos bônus do governo irão para as alturas. Diante dessa constatação, nada mais
natural que apostar contra os famosos JGBs (japanese
government bonds).
Não há investidor no mercado financeiro que já não
tenha feito esse trade ou ao menos
pensado seriamente em fazê-lo. Ora, com um déficit orçamentário na ordem de 8% do
PIB sem perspectivas de melhora e um
endividamento de 230% do PIB, bastam os juros dos JGBs subirem um pouquinho
para esse trem descarrilar.
O problema é que esse diagnóstico é válido há
décadas e desde então os juros dos títulos de 10 anos do governo japonês vêm
caindo sistematicamente. Quem tem apostado contra o governo do Japão está
apanhando ano após ano.

Juros
dos títulos de 10 anos do governo do Japão
E é por esse motivo que apostar contra os JGBs é
notoriamente conhecido como o "widowmaker trade", o "trade fazedor de viúvas".
Logo, não deve ter sido surpresa nenhuma constatar
que, após o anúncio-surpresa dos juros negativos de Kuroda, houve mais viúvas. Em questão de um mês, o JGB com vencimento de
10 anos caiu
de 0,27% para 0,1%. Os títulos de 5 anos estão com rendimentos negativos.
Toda a curva
de juros dos bônus japoneses está menor do que um ano atrás. Kuroda está
fazendo novas viúvas.
Isso significa que os traders estão errados em apostar contra o governo do Japão?
Francamente, o diagnóstico não pode ser mais claro. O problema é que os JGBs
teimam em desafiar as leis da economia. Em algum momento os traders vão acertar a mão. Mas como nos
mercados financeiros não basta ter razão — é preciso ter razão na hora certa,
o velho timing —, é bem possível que
haja uma nova leva de viúvas.
Até qual patamar conseguirá Kuroda manipular as
taxas de juros?Até quando o Japão conseguirá evitar o dia do juízo final? Essa
é pergunta que vale alguns de trilhões de ienes e algumas viúvas.