quarta-feira, 16 set 2009
Grãos de café não podem ser cultivados em
qualquer lugar. Eles têm de ser
plantados em lugares que, durante a maior parte do ano, recebam a incidência
moderada de chuva e luz de sol. Logo, praticamente
todo o café do mundo é produzido dentro do 'cinturão do café' - aquela região
que fica entre o Trópico de Câncer e o Trópico de Capricórnio.
Dentre as commodities naturais, o valor
monetário do café é considerado menor apenas que o do petróleo. E para aqueles viciados em café, seja do
Starbucks ou mesmo o caseiro, o preço pago por galão consumido supera de longe
o que pagam enchendo o tanque do carro.
Para os usuários de café em geral,
principalmente do hemisfério norte, a marca colombiana Juan Valdez sempre foi o
símbolo da produção cafeicultora - e a Colômbia ainda hoje é a segunda maior
produtora mundial de café, depois do Brasil.
Localizada bem ao lado desses dois gigantes
do café está a Venezuela, um país que em uma época chegou a rivalizar com a
Colômbia na produção de café. E embora
abençoada com um solo poroso e um clima perfeito, ambos pré-requisitos
necessários para o bom cultivo, a Venezuela hoje produz menos do que 1% do café
mundial - quantia insuficiente até para satisfazer sua própria população.
Após ter sido uma das principais exportadoras
de café na primeira metade do século XX, a situação reverteu-se a tal ponto
que, no mês passado, a Venezuela começou a importar o fruto do Brasil, ainda
que, como reportou
o Financial Times, os nativos
digam que o produto brasileiro "não se compara com a qualidade do grão Arábica
local".
Ou seja: embora tenha as melhores sementes e
as condições perfeitas para cultivá-las, a Venezuela está hoje praticamente
fora do setor cafeeiro. Uma das
explicações padronizadas é que, após ter sido descoberto petróleo nas décadas
de 1960 e 1970, o cultivo de café atrofiou, pois o país preferiu enriquecer
extraindo petróleo.
Porém, o cultivo de café na Venezuela sempre
foi dominado por fazendas familiares.
Não é crível dizer que esses fazendeiros, abandonando décadas de
tradição, resolveram desenterrar suas cafeeiras e começaram a cavar o solo em
busca de petróleo.
Ao contrário: o poder do governo venezuelano
fez a escavação em nome da reforma agrária - supostamente em prol da classe
trabalhadora. "A reforma agrária é uma
arma voltada para o coração da oligarquia," escreveu em 2006 o The Marxist, "e,
desde o início do novo programa agrário, os latifundiários, os capitalistas e
seus partidários na mídia nacional e internacional se organizaram contra a
ameaça da mudança agrária".
Mas a mudança veio quando o Estatuto da Terra
foi aprovado em dezembro de 2001. Desde
então o Instituto Agrário Nacional já distribuiu milhões de acres de terras
para cooperativas gerenciadas por camponeses.
Essa política foi batizada de "guerra ao latifúndio". De acordo com o Financial Times, a redistribuição de terra promovida pelo governo
venezuelano "gerou um clima de incerteza que arrefeceu os investimentos".
Portanto, ao invés de receber o plantio de
cafeeiras, a terra fica devoluta ou vira pasto, reduzindo a oferta de café e
aumentando seu preço, certo? Errado,
pois o governo impôs congelamento de preços do café vendido no varejo. Assim, não há incentivo para os agricultores
plantarem café. Da mesma forma, muitos
torrefadores já quebraram. O pouco que
os agricultores e torrefadores conseguem salvar é contrabandeado para a
Colômbia, onde os preços não são controlados por Hugo Chávez e são duas vezes
mais caros.
E enquanto os preços do café estão
congelados, os custos do cultivo continuam subindo. É difícil encontrar mão-de-obra a um salário
razoável, porque "muitos trabalhadores vivem do assistencialismo que recebem do
governo e não estão interessados em trabalhar", disse um fazendeiro ao Financial Times.
Com a população clamando por uma solução para
a escassez de café, Chávez expropriou as duas maiores torrefadoras do país,
Fama de América e Café Madrid, culpando essas duas empresas pela escassez e
alegando que as torrefadoras estavam estocando, especulando e
contrabandeando. "Já estamos cheios disso. Temos de fazer o mesmo com todas as empresas
que se comportarem dessa maneira. O Estado
venezuelano está combatendo todas as medidas que prejudiquem o direito à
alimentação do povo, não vamos aceitar que isso aconteça e, se necessário,
expropriaremos", disse Chávez. "Vamos
continuar estatizando monopólios para transformá-los em negócios produtivos nas
mãos dos trabalhadores, do povo, da revolução."
Ludwig Von Mises, entretanto, mostra em Ação
Humana que
O efeito da interferência [do estado] é
que as pessoas são impedidas de utilizar seus conhecimentos e habilidades, sua
mão-de-obra e seus meios materiais de produção, de uma maneira na qual elas
iriam obter o máximo de retorno e satisfazer ao máximo possível suas
necessidades.
"Tal interferência", ele acrescenta, "torna
as pessoas mais pobres e menos saciadas".
Enquanto isso, nos EUA, o presidente Obama
insiste na ideia de que todas as pessoas devem ter acesso à assistência médica,
pois a saúde "deve ser um direito de todo americano".
Houve uma época, não muito tempo atrás, em
que a medicina americana era considerada a melhor do mundo, e era
financeiramente acessível a todos. E
então o governo decidiu que era hora de regular melhor a relação paciente-médico.
Como explicou Gabriel E. Vidal em seu recente artigo no mises.org, "os custos
da saúde americana agora refletem as distorções que as regulamentações
governamentais introduziram via mecanismos de reembolso. Esses mecanismos foram criados por
burocracias de estilo soviético que operam nos níveis federal e estadual".
Em um debate entre democratas, em 2007, Obama
disse: "Minha ênfase é diminuir os custos da saúde atacando as empresas de
seguro, impondo limites em sua capacidade de extrair lucros e de recusar
coberturas; e as empresas farmacêuticas têm de fazer o que é de direito de seus
pacientes, e não simplesmente acumularem seus lucros".
"[As montanhas da Venezuela] costumavam ser
cobertas por cafeeiras", disse tristonhamente Don Luis Paparoni ao Financial
Times. "Hoje você dificilmente encontra
alguma". Certamente será melancólico
quando a medicina de qualidade nos EUA se tornar tão escassa quanto o café na
Venezuela.